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Entrevista
Ano 1 - N° 37 - 6 de Janeiro de 2008
FERNANDA BORGES
fernanda@oconsolador.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)

Leda Maria Flaborea:

 “É impossível imaginar a Doutrina Espírita como algo dissociado
do seu aspecto religioso”

Leda Maria Flaborea nasceu em Marília (SP) mas vive hoje na capital de São Paulo. Pedagoga, licenciada pela Universidade de São Paulo (USP), já atuou em diversas áreas do Movimento Espírita paulista, buscando sempre levar a orientação àqueles que não conhecem a Doutrina codificada por Kardec. Atualmente, Leda profere palestras e participa de trabalhos práticos mediúnicos, além de escrever sobre a Doutrina em diversos periódicos espíritas, no País e em Portugal.

Para ela, espírita desde a infância, a unidade do Espiritismo é fundamental para o verdadeiro exercício e compreensão da Doutrina.  E  entende  que  as  mudanças   de,

comportamento podem ajudar o relacionamento entre as pessoas principalmente no que diz respeito às atitudes dentro de casa, no seio da família.

Eis a seguir a entrevista que ela gentilmente concedeu à nossa revista:

O Consolador: Sendo do interior de São Paulo, que motivo a levou a residir na capital paulista?

Leda: Saí bem jovem da cidade que nasci, com meus pais e irmãs, para tentarmos melhorar de vida, como se dizia.

O Consolador: Qual a sua formação?

Leda: Sou pedagoga, licenciada pela Universidade de São Paulo.

O Consolador: Quais os cargos e funções que você já exerceu no movimento espírita?

Leda: Quase todos ligados à área de ensino, à assistência espiritual  -- palestras e trabalhos práticos mediúnicos – e à divulgação da Doutrina Espírita como articulista em periódicos diversos.

O Consolador: Que cargo você exerce no momento?

Leda: Ainda permaneço nas mesmas funções, acrescidas de mais tarefas. Hoje, também escrevo para periódicos em Portugal.

O Consolador: Quando você teve contato com o Espiritismo?

Leda: Apesar de ter tido os primeiros contatos com o Espiritismo na infância, ele foi perdido quando minha família veio para São Paulo. Somente depois, bem mais tarde, por problemas familiares, vi-me obrigada a buscar ajuda e não me afastei mais.

O Consolador: Qual foi a reação de sua família ante sua adesão à Doutrina Espírita?

Leda: Não houve aceitação, o que se deu mais por falta de informação do que qualquer outra coisa.

O Consolador: Dos três aspectos do Espiritismo – científico, filosófico e religioso – qual é o que mais a atrai?

Leda: O religioso, sem qualquer dúvida, e depois o filosófico. Mas não podemos perder de vista a unidade doutrinária, que só existe pela junção desses três aspectos.

O Consolador: Que autores espíritas mais lhe agradam?

Leda: Além de Kardec, gosto de todos os seus contemporâneos. Depois, Emmanuel, André Luiz, Yvonne do Amaral Pereira, Joanna de Ângelis, Rodolfo Calligaris, Martins Peralva, fora muitos outros. Difícil citar todos, mas não posso deixar de mencionar dois autores que têm desenvolvido trabalhos excelentes de estudo doutrinário: Orson Peter Carrara e Rogério Coelho, ambos articulistas desta revista.

O Consolador: Que livros espíritas você considera de leitura indispensável aos confrades iniciantes?

Leda: É preciso começar pelo começo. E quem quiser, verdadeiramente, estudar com seriedade o Espiritismo, precisa iniciar pelos livros da Codificação. Kardec publicou um livro interessantíssimo que pode dar um panorama para quem se propõe a um estudo sério. Intitula-se "O que é o Espiritismo". Todavia, existem publicações de Orson Carrara e Rogério Coelho que oferecem possibilidades ótimas para quem é iniciante. Linguagem simples e fidelidade doutrinária. É isso que os torna confiáveis para mim, modernamente.

O Consolador: Se você fosse passar alguns anos num lugar remoto, que livros pertinentes à Doutrina Espírita levaria?

Leda: "O Livro dos Espíritos" e "O Evangelho segundo o Espiritismo". E quem precisa de mais?

O Consolador: As divergências doutrinárias em nosso meio reduzem-se a poucos assuntos. Um deles diz respeito ao chamado Espiritismo laico. Para você, o Espiritismo é uma religião?

Leda: Se não for, estou fora do movimento. Muito se discute e se briga para fazer prevalecer um aspecto ou outro, com cada grupo procurando convencer seus adeptos de ser o dono da verdade. Para mim é impossível imaginar a Doutrina Espírita como algo dissociado do seu aspecto religioso. Como disse acima, para ser uma Doutrina, o Espiritismo tem que ter unidade. Se tirarmos uma só de suas vertentes, a estrutura não mais existirá. Realmente, não entendo o porquê dessas divagações. São espíritas, na acepção da palavra?

O Consolador: Outro tema que suscita geralmente debates acalorados diz respeito à obra publicada na França por J. B. Roustaing. Qual é sua apreciação dessa obra?

Leda: Nunca a li e não perderia tempo com obras assim. Há tanto o que estudar e fazer no campo doutrinário! Estamos começando a descobrir a Doutrina que os Espíritos Superiores nos legaram através de Kardec... A Ciência humana, agora está dando os primeiros passos em direção à descoberta da vida do Espírito. Estamos ensaiando os primeiros movimentos no entendimento de que somos criados Espíritos e não corpos. Não há tempo para ilações, fantasias terrenas...

O Consolador: O terceiro assunto em que a prática espírita às vezes diverge está relacionado com os chamados passes padronizados, propostos na obra de Edgard Armond. Embora saibamos que, em geral, a opção já definida pelas federativas seja tão-somente a imposição das mãos, tal como recomenda J. Herculano Pires, qual é sua opinião a respeito?

Leda: Concordo com Herculano Pires. O muito nem sempre significa o melhor. Nosso modelo é Jesus e Ele apenas impunha as mãos. Será que não conseguimos nem essa simplicidade? Mas, muitas casas já adotam essa postura, pois entende-se que o que vale, no passe, é a vontade real de ajudar. O resto, os Benfeitores Espirituais fazem com a permissão de Deus.

O Consolador: Como você vê a discussão em torno do aborto? Os espíritas deveriam ser mais ousados na defesa da vida como tem feito a Igreja?

Leda: Penso que os espíritas estão fazendo o que devem e podem fazer. Os Centros Espíritas estão lotados de corações aflitos pelos mais diferentes motivos. E a angústia, o sentimento de culpa de quem praticou o aborto devem ser examinados à luz dos princípios da caridade, porque corremos o risco de fazer sangrar, mais ainda, a ferida aberta pela ignorância das Leis de Deus. O apoio a quem sofre, através do conforto e da esperança que podemos levar, é o primeiro passo. Depois, mais fortalecidos, o esclarecimento evitará que permaneçam no erro. Esse é, acima de tudo, a meu ver, o dever do espírita esclarecido nas luzes do Evangelho. O resto é gritar para surdos.

O Consolador: A eutanásia, como sabemos, é uma prática que não tem o apoio da Doutrina Espírita. Kardec e outros autores, como Joanna de Ângelis, já se posicionaram sobre esse tema. Surgiu, no entanto, ultimamente a idéia da ortotanásia, defendida até mesmo por médicos espíritas. Qual a sua opinião a respeito?

Leda: O desvio da Lei de Deus é o mesmo com outro nome. Pergunto: que espírita é esse que concorda com tal crime? Penso que seja dever do médico, espírita ou não, dar ao doente que sofre as melhores condições de ficar confortável, sem interromper a existência de quem quer seja.

O Consolador: O movimento espírita em nosso país lhe agrada ou falta algo nele que favoreça uma melhor divulgação da Doutrina?

Leda: Nosso trabalho é e será sempre de formiguinha. O problema do movimento espírita não está fora dele, mas nessas constantes divergências de opiniões. Fico imaginando se os Espíritos Superiores divergissem como fazemos nós. Não haveria Doutrina, certamente. Melindres demais para meu gosto.

O Consolador: Como você vê o nível da criminalidade e da violência que parece aumentar em todo o país e como nós, espíritas, podemos cooperar para que essa situação seja revertida?

Leda: Que tal começar dentro dos nossos lares? Preocupa-me o fato de espíritas  – melhor dizendo, pseudo-espíritas –  terem uma postura dentro da casa espírita ou em reuniões com companheiros, e em suas casas ou em outros locais agirem de forma a não harmonizar boca e coração. Se necessitamos dar o exemplo da nossa transformação íntima, para mostrar ao mundo a grandeza da Doutrina que abraçamos, por que não iniciar isso junto dos nossos familiares? O exemplo educa. Como cobrar de uma criança ou de um jovem uma postura que não conseguimos ter? O desculpismo  – o político faz, por que não posso fazer?  –  tem sido a brecha que muitos encontram para colocar em prática suas próprias imperfeições. A criança ou o jovem que vê e ouve o adulto agindo assim não tem escolha. Seguirá pelo caminho do mal.

O Consolador: A preparação do advento do mundo de regeneração em nosso planeta já deu, como sabemos, seus primeiros passos. Daqui a quantos anos você acredita que a Terra deixará de ser um mundo de provas e expiações, passando plenamente à condição de mundo de regeneração?

Leda: Que coisa boa se pudéssemos fazer previsões, não é? Gostaria que fosse a partir de amanhã. Entretanto, quantos milhares de séculos já caminhamos para chegar até aqui! E quantos, ainda, nos aguardam! O importante é que continuemos a caminhar, sem esmorecimento. Para que ter pressa ou impaciência se tudo chegará a seu tempo e hora? Dispomos de recursos incríveis para prosseguirmos em direção à felicidade plena. Afinal, não fomos criados para isso?

O Consolador: Em face dos problemas que a sociedade terrena está enfrentando, qual deve ser a prioridade máxima dos que dirigem o movimento espírita no Brasil e no mundo?

Leda: Primeiro, esclarecerem-se através do autoconhecimento. Depois, verificarem se estão, efetivamente, colocando em prática os princípios morais aos quais Jesus nos convida a ter, para que sirvamos de exemplo a esta sociedade tão tumultuada. Aí, sim, buscar esclarecer a todos os que desejarem, como conseguimos viver em paz e sermos felizes no meio de tanta iniqüidade.
 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita