EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Meditação – uma
prática que
sustenta o ser
Se a vigilância
é um
procedimento que
ajuda a expandir
os efeitos da
consciência,
operando como
veículo do
Self e a
serviço da vida
socioanímica,
inclinar-se ao
silêncio pode
favorecer o
itinerário
adequado que
incentive a
pessoa a largar
as impressões
particulares ou
coletivas,
limitadas por
rasas opiniões e
preconceitos,
sob as quais
julga a
realidade. Com
isso, é possível
ir além do ego e
em direção do
Self, o guia
interior, que
desperta para a
memória da
semelhança com o
divino que
habita cada ser
humano.
Nossa verdadeira
realidade, mesmo
que isso
contrarie o ego,
medroso e
inquieto, está
fundada em nossa
unidade com a
vida total. O
instante
silencioso, por
meio da prática
da meditação,
amplifica as
limitações de
tempo e de
espaço vividas
pela perspectiva
do ego, pondo-o
em contato com o
coração,
locus da
serenidade e das
virtudes, tais
como o amor, a
justiça, a
caridade.
Desse modo, o
gozo do
recolhimento
causa no
praticante a
experiência no
qual ele aprende
que Eu e o
Pai somos Um,
ponto de partida
para a
florescência do
princípio da
compaixão, senda
que viabiliza
uma compreensão
generosa da vida
em todas as suas
manifestações.
Sem dúvida, para
se conhecer e se
aperfeiçoar é
necessário
visitas
constantes ao
próprio interior
para nele
experimentar as
fontes de
inspiração, a
fim de se tornar
ciente de seus
propósitos,
deveres e
bênçãos.
Na luta contra o
conformismo e
disposto à
viagem para a
expansão das
virtudes, entre
outras sadias
possibilidades,
deve haver por
parte do
indivíduo uma
abertura para a
busca do
Self, apto a
orientar uma
existência rica
e com
significado.
Contudo, essa
expansão não é
sem ônus, embora
haja meios
capazes de guiar
os passos para a
humanização do
ser e, ao mesmo
tempo, lograr
inspirar um
sustentável
discernimento
nos momentos de
crise e de
sofrimento que
qualquer um
experimenta
durante a sua
sinuosa
jornada.
Desse modo, como
passo
importante, é
aconselhável
socializar-se
para o silêncio,
pelo exercício
da meditação
como meio sutil
para a vivência
e o entendimento
das forças
organizacionais
internas, pois é
sabido que
realizar a
própria
humanidade
pressupõe
abandonar o
padrão da
dependência, os
subterfúgios
emocionais, a
tendência da
imitação e da
intolerância em
prol do caminho
do coração, que
habilita o ser
humano para a
consideração
mais essencial:
dar cumprimento
ao próprio
programa e, com
isso,
melhorar-se e
avançar, segundo
a prerrogativa
evolutiva.
A meditação
auxilia no
processo de
auto-sondagem e
traz a
recompensa da
harmonia
interior à
medida que cria
a ambiência para
um diálogo
metafórico entre
ego e Self,
Self e o
Invisível.
Quando voltamos
a atenção para
esse hábito
sadio, somos
iluminados por
uma forma
preciosa de
autocompreensão,
que nos ajuda a
enxergar tudo o
que somos e tudo
o que podemos
nos tornar em
sintonia com a
expressão da
nossa alma.
Claramente, o
objetivo do
trabalho com a
meditação é
ajudar a
personalidade
consciente (ego)
a dar menos
valor ao
julgamento
racional e às
concepções
pessoais e
coletivas da
realidade, que
geralmente
intervêm na
integração de
todas as suas
partes,
cristalinas ou
obscuras, num
todo harmonioso,
ou seja, é
auxiliar no
processo da
visão interior
qualitativa, uma
das metas do
Self.
Dessa
perspectiva, a
noção de
julgamento
externo adquire
menos peso,
pois, o que está
em jogo, de
fato, é o
esforço que a
pessoa deve
fazer para não
continuar no
caminho
inconsciente.
Para isso,
cativar o
silêncio pela
prática
meditativa
facilita a
consciência da
própria
individualidade
e torna o homem
inspirado e, por
isso, vivo.
(1)
Se a práxis
espiritual da
nossa
civilização é
ainda alvo de
suspeita ou de
zombaria, para
muitos,
felizmente, o
hábito
meditativo ajuda
no
redirecionamento
da vida que se
tornou tão
materialista e
econômica ao
ponto de a
pessoa
atravessar a
jornada
ignorante de seu
chamado
essencial,
enterrando ou
desprezando seu
talento
essencial.
Em suas
Meditações,
Descartes
escreveu:
“Fecharei agora
os olhos,
tamparei meus
ouvidos,
desviar-me-ei de
todos os meus
sentidos,
apagarei mesmo de
meu pensamento
todas as imagens
de coisas
corporais ou,
pelo menos, uma
vez que mal se
pode fazê-lo,
reputá-las-ei
vãs e falsas; e
assim,
entretendo-se
apenas comigo
mesmo e
considerando meu
interior,
empreenderei
tornar-me pouco
a pouco mais
conhecido e mais
familiar a mim
mesmo”.
(2)
A
disponibilidade
para o silêncio
certamente
auxilia o ser
humano a
percorrer o
caminho
espirálico que
leva da infância
à maturidade
integral.
Entretanto, em
um tempo de
retórica para as
massas, de
costumes
inconsistentes,
de
individualismo
competitivo, de
recalcamento
espiritual, a
disponibilidade
para o silêncio
é sine qua
non, pois,
quando o Self
conduz, a
inspiração surge
desembaraçada e
as experiências
conscientes se
modificam
radicalmente, ou
seja, o ser
colhe otimismo,
inala esperança
e criatividade.
E somente essa
condução pode
preparar o
caminho para a
sabedoria.
Notas:
(1) Essa
expressão advém
de Rollo May
que, ao chamar o
homem “uma coisa
viva”, entende
que ele “não
cresce
automaticamente
como uma árvore,
mas realiza suas
potencialidades
somente quando
planeja e
escolhe
conscientemente”
(in: O homem
à procura de si
mesmo. 24
ed. Petrópolis:
Vozes, 1998, p.
77). (itálico
meu)