SIDNEY ARIDE
taniaride@hotmail.com
Rio de Janeiro, RJ (Brasil)
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Descentralizar o centro
Desde o surgimento da
primeira sociedade
espírita em Paris, temos
o desafio de coordenar
um ou mais modelos
possíveis de
organização, sobretudo,
no que se refere a
gestão com pessoas. Esse
tema deve ser motivo de
reflexão para todos os
grupos de irmãos que
pretendem evoluir a
prática de seus núcleos
espiritistas.
Do século XIX para o
XXI, mantendo sua
essência, os centros
espíritas cresceram em
atividades e
complexidade
organizacional.
Allan Kardec, no livro
Obras Póstumas,
propõe que com a
conclusão das bases
fundamentais da Doutrina
Espírita a direção
poderia ser composta de
uma comissão de 12
membros, migrando do
individual e se tornando
coletiva, porque maior
garantia apresenta um
conjunto de indivíduos.
Coincidência, ou não, na
colônia espiritual de
Nosso Lar, somos
informados pelo Espírito
Lísias que cada
ministério é igualmente
administrado por 12
integrantes à frente de
cada uma das seis
instituições,
totalizando 72
ministros.
Quando um conjunto de
pessoas dirige
determinada
coletividade,
denominamos de gestão
colegiada.
Alguns centros
espíritas, dependendo de
suas características,
têm experimentado esse
tipo de direção, cuja
composição abrange as
atividades finalísticas,
tais como: mediunidade,
educação espírita, arte,
evangelização,
assistência social,
finanças, movimento de
unificação, divulgação,
administração,
assistência espiritual
etc.
Devido à multiplicação
de áreas de atuação das
instituições espíritas e
consequente necessidade
de ampliação dos grupos
de trabalho e estudo, o
dirigente deve evitar o
gargalo decisório, onde
sempre precisa de sua
opinião para o centro
resolver problemas ou
implementar projetos.
Se a formação de uma
diretoria colegiada é um
desafio interessante
para nossa reflexão,
será possível imaginar
algo ainda mais
descentralizado, a tal
ponto, que os
colaboradores da
instituição também
poderiam participar das
decisões estratégicas e
operacionais?
Não raro, descobrimos
trabalhadores que se
frustram por não obterem
espaço no centro para
desenvolver todo o seu
potencial, enterrando os
talentos.
Alguns confrades
explicam que uma das
causas é o crescimento
do centro espírita que,
ao tornar-se “grande”,
tende a ficar frio: a
estrutura se torna
complexa, centralizada e
distante.
Não raro ocorrem tristes
rupturas de uma parte
dos colaboradores que
não encontram espaço
para criar, se desligam
do centro e formam novos
núcleos espíritas.
Eventualmente, esse
processo é penoso e
abala, inclusive,
relações fraternas.
Por observação e
experiência, percebemos
que o maior problema não
é exatamente o
crescimento da casa
espírita.
O que talvez ocorra é
que a direção continuou
o modelo de uma
instituição pequena e
centralizada.
À medida que os centros
crescem deve-se refletir
sobre como se
descentraliza o centro,
para que os novos
integrantes possam se
sentir acolhidos e
cofundadores de novas
possibilidades de
atuação no bem.
O Codificador propôs
então que na condução
das atividades
espiritistas devemos
“suprimir toda
autocracia ou supremacia
pessoal”, dividindo o
processo de condução das
atividades com um grupo
maior de pessoas.
No capítulo XXIX d’O
Livro dos Médiuns,
como solução para o
crescimento das
instituições, Kardec
incentiva a
multiplicação de
pequenos núcleos
espíritas. Neste caso,
os dirigentes podem
“fundar pequenos centros
espíritas” dentro de sua
própria casa,
proporcionando autonomia
de ação.
Com responsabilidade e
união, todos conseguirão
expandir o trabalho
espiritual da
instituição de forma
sustentada e, ao mesmo
tempo, “multiplicar os
talentos”, impedindo um
processo quase
inevitável de
represamento das
demandas dos
trabalhadores e
contingenciamento do
bem.
Existem centros
espíritas que passam por
situação inversa, em
crise com a baixa adesão
de colaboradores. Mas
essa questão pode também
ser reflexo de uma
gestão com tendência
centralizadora.
Já presenciamos essa
experiência em uma,
quase centenária, casa
espírita localizada na
cidade de Nova Iguaçu,
no Rio de Janeiro. Lá
foi implementada a
descentralização
decisória e operacional
de suas atividades,
tendo como consequência
um comprometimento
entusiasmado de seus
integrantes.
Só para citar alguns
exemplos, em quatro
anos, o centro:
triplicou o número de
voluntários; multiplicou
por quatro o número de
associados; por meio de
sistema de
apadrinhamento realizou
obras de reforma em 90%
dos cômodos da
instituição sem que o
centro retirasse um real
de seu caixa; criou
parcerias com mais de
uma dúzia de
instituições espíritas e
de assistência social;
e, multiplicou por cinco
os grupos de educação
espiritual.
Mas o mais importante
dificilmente se medirá
em números: o
crescimento da
integração entre os
voluntários e as
“relações familiares”,
construída nos círculos
de amizade e
companheirismo dos
grupos.
Assim como há estudos
sobre pedagogia
espírita, ou filosofia
espírita, percebe-se que
há um campo importante a
ser pesquisado e
experimentado no
movimento: a gestão de
pessoas sob a ótica
espírita, que é
diferente daquelas
voltadas para um
conjunto de
funcionários, alunos,
sócios, voluntários de
ONGs, fiéis religiosos
etc.
Partilhar o poder
decisório de forma
organizada na casa
espírita não reduz o
papel de liderança do
dirigente, ao contrário,
pois liderar
verdadeiramente é
produzir novos líderes.
É incentivar os
colaboradores a deixarem
de ser “criaturas” para
serem cocriadores da
instituição. Como
ensinou Jesus: vós sois
deuses, podem fazer o
que eu faço e ainda
muito mais!
Seria um gesto de
caridade do dirigente
distribuir confiança aos
confrades?
Somos abençoados pelo
Senhor com o
livre-arbítrio.
Estender, de forma
assistida, orientada e
incentivada, a liberdade
aos colaboradores para
deliberar estratégias de
ação pode ser uma das
características desta
gestão com
espiritualidade.
A Doutrina Espírita se
faz com Espíritos, no
plural mesmo, é:
coletiva, múltipla,
plural...
Descentralizar o centro
de forma coordenada
pode, seguramente, ser
um instrumento acolhedor
para os trabalhadores da
última hora, que, sem
grandes limitações
estruturais, poderão
exercitar suas
potencialidades,
aprimorar o
comprometimento e
melhorar as relações
humanas e espirituais da
casa espírita.