Damos continuidade nesta edição ao estudo do livro Obras Póstumas, publicado depois da desencarnação de Allan Kardec, mas composto com textos de sua autoria. O presente estudo baseia-se na tradução feita pelo Dr. Guillon Ribeiro, publicada pela editora da Federação Espírita Brasileira.
Questões para debate
157. Onde e como Kardec conheceu as irmãs Baudin?
158. Que assuntos eram tratados nessas reuniões?
159. Foi ali que se iniciaram os primeiros estudos de Kardec em matéria de Espiritismo?
160. A partir de que momento as sessões na casa do Sr. Baudin tomaram novo rumo?
161. Quando Kardec conheceu a Srta. Japhet?
Respostas às questões propostas
157. Onde e como Kardec conheceu as irmãs Baudin?
Foi num dos saraus na casa da Sra. Plainemaison. A família Baudin morava então na Rua Rochechouart. O Sr. Baudin convidou-o para assistir às sessões semanais que ocorriam em sua casa, e para as quais ele foi, desde esse momento, muito assíduo. As médiuns eram as Srtas. Baudin (Julie e Caroline), que escreviam sobre uma ardósia com a ajuda de uma cesta, dita pião, descrita em O Livro dos Médiuns. Esse processo, que exige o concurso de duas pessoas, excluía a possibilidade de participação das ideias do médium. Ali, Kardec viu comunicações seguidas e respostas dadas às perguntas propostas, algumas vezes mesmo a perguntas mentais, as quais acusavam, de maneira evidente, a intervenção de uma inteligência estranha. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Os primeiros trabalhos.)
158. Que assuntos eram tratados nessas reuniões?
Geralmente os assuntos eram frívolos; ocupava-se ali sobretudo de todas as coisas ligadas à vida material, ao futuro, em uma palavra, a nada de verdadeiramente sério. A curiosidade e o divertimento eram os principais móveis dos assistentes. O Espírito que se manifestava habitualmente tomava o nome de Zéfiro, nome bem de acordo com seu caráter e o da reunião; todavia, era um bom Espírito, e se declarara o protetor da família. Frequentemente risonho, sabia dar sábios conselhos, e manejar, sendo o caso, o epigrama mordaz e espirituoso. Constantemente deu ele a Kardec provas de uma grande simpatia. Zéfiro não era um Espírito muito avançado; contudo, mais tarde, assistido pelos Espíritos superiores, ajudou o futuro Codificador nos seus primeiros trabalhos. Algum tempo depois, em uma dessas reuniões ele disse que deveria reencarnar e dele não mais se ouviu falar. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Os primeiros trabalhos.)
159. Foi ali que se iniciaram os primeiros estudos de Kardec em matéria de Espiritismo?
Sim, mas a importância desses primeiros estudos decorreu mais das observações feitas do que das revelações obtidas. O professor aplicou a essa nova ciência, como o fizera até então, o método da experimentação. Jamais formulou teorias preconcebidas; observava atentamente, comparava, deduzia as consequências; dos efeitos procurava remontar às causas, pela dedução e pelo encadeamento lógico dos fatos, não admitindo uma explicação como válida senão quando podia resolver todas as dificuldades da questão. Foi assim que ele procedera em seus trabalhos anteriores, desde a idade de 15 anos. Desde logo compreendeu a seriedade da exploração que iria empreender e entreviu nesses fenômenos a chave do problema, tão obscuro e tão controverso, do passado e do futuro da Humanidade, a solução de algo que havia procurado em toda a sua vida. Diante disso, era preciso, pois, agir com circunspeção, e não levianamente; ser positivo e não idealista, para não se deixar iludir.
Um dos primeiros resultados de suas observações foi que, não sendo os Espíritos senão as almas dos homens que desencarnaram, não tinham eles a soberana sabedoria nem a soberana ciência; que o seu saber estava limitado ao grau de seu adiantamento e que sua opinião não tinha senão o valor de uma opinião pessoal. Essa verdade, reconhecida desde o princípio, preservou-o do grande escolho de crer na infalibilidade dos Espíritos e impediu-o de formular teorias prematuras sobre o pensamento expresso por um ou por alguns Espíritos.
O fato da comunicação com os Espíritos, independentemente do que disso resultasse, já constituía a prova da existência do mundo invisível ambiente; era isso um ponto capital, um campo imenso aberto à exploração e a chave de uma multidão de fenômenos inexplicados. O segundo ponto, não menos importante, era a possibilidade de se conhecer o estado desse mundo e seus costumes. Cada Espírito, em razão de sua posição pessoal e de seus conhecimentos, desvendava-lhe uma fase, absolutamente como se chega a conhecer o estado de um país interrogando os habitantes de todas as classes e de todas as condições, cada um podendo ensinar alguma coisa, e nenhum, individualmente, podendo ensinar tudo.
O professor agiu, pois, com os Espíritos como o teria feito com os homens; e eles foram para ele, desde o menor ao maior, elementos de informação, não reveladores predestinados. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Os primeiros trabalhos.)
160. A partir de que momento as sessões na casa do Sr. Baudin tomaram novo rumo?
No início, o professor Rivail não tinha nenhum objetivo determinado. Foi então que ele começou a procurar resolver os problemas que lhe interessavam do ponto de vista da filosofia, da psicologia e da natureza do mundo invisível. Chegava, pois, a cada sessão com uma série de perguntas preparadas e metodicamente arrumadas, que eram sempre respondidas com precisão, profundidade e de maneira lógica. Desde esse momento as reuniões tiveram um outro caráter; entre os assistentes se encontravam pessoas sérias que por elas tomaram um vivo interesse, e as perguntas fúteis perderam o atrativo para a maioria. A princípio, o objetivo de Kardec era apenas sua própria instrução; mais tarde, quando viu que aquilo formava um conjunto e tomava as proporções de uma doutrina, decidiu publicá-las para a instrução de todo o mundo. Foram essas perguntas que, sucessivamente desenvolvidas e completadas, fizeram a base de O Livro dos Espíritos. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Os primeiros trabalhos.)
161. Quando Kardec conheceu a Srta. Japhet?
Foi em 1856, quando passou a participar também das reuniões espíritas que se realizavam na Rua Tiquetone, na casa do Sr. Roustan. Essas reuniões eram sérias e mantidas com ordem. As comunicações ocorriam por intermédio da Srta. Japhet, médium, com a ajuda de uma cesta de bico. O trabalho do professor já estava, então, em grande parte terminado, e tomava as proporções de um livro, mas ele pretendia fazê-lo controlado por outros Espíritos, com a ajuda de diferentes médiuns. Veio-lhe então o pensamento de torná-lo motivo de estudos nas reuniões do Sr. Roustan. Ao cabo de algumas sessões, os Espíritos disseram que preferiam revê-lo na intimidade, e lhe assinalaram, para esse efeito, certos dias para trabalhar, em particular, com a Srta. Japhet, a fim de fazê-lo com mais calma e evitar as indiscrições e os comentários prematuros do público. Ele, porém, não se contentou com essa verificação; e assim, toda vez que as circunstâncias lhe permitiam ter relação com outros médiuns, disso se aproveitava para propor algumas das questões que lhe pareciam mais espinhosas. Foi assim que mais de dez médiuns prestaram a sua colaboração para esse trabalho, e foi da comparação e da fusão de todas essas respostas, coordenadas, classificadas e muitas vezes refundidas no silêncio da meditação, que se formou a primeira edição de O Livro dos Espíritos, publicada em 18 de abril de 1857.
Nesse ano mesmo, as duas senhoritas Baudin se casaram, as reuniões não mais ocorreram, e a família se dispersou. Mas, então, as relações de Kardec começaram a se estender, e os Espíritos multiplicaram, para ele, os meios de instrução necessários à realização de seus trabalhos ulteriores. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Os primeiros trabalhos.)