As coisas simples
“Para ser feliz é
preciso ser simples.”
¹
A questão da felicidade
tem desafiado filósofos
e pensadores desde
sempre. Muito já se
pensou sobre ela na
tentativa de se
encontrar caminhos que
levem o homem a tomá-la
nos braços. Em relação à
grande massa humana, os
resultados dessa busca
milenar, porém, não têm
sido muito animadores,
pois já se sabe que a
felicidade independe do
“ter”, e é exatamente aí
que a grande maioria dos
homens a procura. E como
o sentimento de posse em
nosso mundo é traiçoeiro
demais, ninguém consegue
retê-la para si por
muito tempo, como não se
consegue prender a
fumaça entre as mãos.
Na Terra, a felicidade
está associada ao
prazer, mas geralmente
ao prazer egoísta e
ambicioso que faz o
homem se perder nas
mentiras em que
acredita. Renúncia é
algo pouco comum porque
não se compreende
direito a vida.
Pouquíssimos estão
verdadeiramente
dispostos a abdicar de
um prazer pessoal em
favor do que seja mais
importante para o
semelhante. As carências
nascem daí, e as
injustiças também.
Nessa busca obsessiva do
maior, do muito, do
primeiro, o homem exaure
suas energias e
desperdiça o tempo da
encarnação.
Na realidade em que
vivemos no mundo, a
felicidade não é um
todo, são partes. Um dia
será, mas não nesse
plano de miserabilidade.
A filosofia espírita
propõe que a felicidade
está no caminho oposto
do que temos percorrido.
Desde tenra idade, em
função de uma educação
não voltada para o
Espírito, mas apenas
para a regulação e
manutenção das relações
sociais, temos sido
estimulados a procurá-la
nas ilusões. E passamos
a achar que tudo o que
brilha tem valor. E a
não perceber que, ao
contrário da qualidade,
a quantidade pode
aumentar as nossas
preocupações. E na vida
cada vez mais acelerada
e mal compreendida,
confundimos o sonho com
a paixão, o desejo com o
vício, a conquista com a
cobiça, o dever com o
direito.
Somos demais apegados
aos bens da matéria,
escravos dos sentidos. A
vontade de superar os
outros sempre nos faz
esquecer que somos
iguais, humanamente
falando. Complicamos a
vida. Por isso sofremos
tanto e nos achamos
infelizes. Talvez
sejamos mais infelizes
do que maus.
No entanto, e se
tentássemos modificar
nossos critérios de
busca, de escolha, de
avaliação? Se nos
contentássemos com o
necessário, com o
razoável, com o justo,
com o ético? Se
educássemos o Espírito
para os bons e os maus
momentos que todos
temos, não tendo assim
que sofrer a sensação de
culpa ou de perda? Isso
fatalmente nos levaria a
prestar mais atenção às
lições que a natureza
dá, onde tudo é simples
e funciona muito bem.
Com o que já sabemos e
sofremos, creio que dá
para dizer que o caminho
da felicidade está na
essência das coisas
simples.
Se observarmos à nossa
volta veremos que, pelo
que Deus nos deu e dá,
não temos do que
reclamar. “O mais rico é
aquele que tem menos
necessidades”, diz a
questão 926 de O
Livro dos Espíritos.
O mais feliz é aquele
que verdadeiramente é
mais simples e humilde,
e que por isso já se
desprendeu do que não
lhe faz mais falta.
¹
Notas de um diarista
– 1ª série,
Humberto de Campos,
Editora Mérito, 1962.