Claro que
não vamos encontrar explicação específica nas obras
fundamentais da doutrina espírita, mas apenas em obras
mediúnicas mais recentes, da lavra dos médiuns Francisco
Cândido Xavier e Divaldo Franco.
O caso
Marcelo, relatado por André Luiz em seu livro No
Mundo Maior, pode ajudar o leitor na elucidação das
dúvidas apresentadas.
Eis um
resumo de sua história, conforme informações prestadas
pelo instrutor Calderaro:
1. Marcelo
possuía, como quase todos nós, um pretérito intensamente
vivido nas paixões e excessos da autoridade. Senhor de
vigorosa inteligência, planou em altos níveis
intelectuais, de onde nem sempre desceu para confortar
ou socorrer. Portador de vários títulos honoríficos,
muitas vezes os esqueceu, precipitando-se na vala comum
dos caprichos criminosos. Chegada a época da colheita,
experimentou sofrimentos atrozes. Inúmeras vítimas o
esperavam além do sepulcro, e arremeteram contra ele,
retendo-o longo tempo nas regiões inferiores, onde
saciaram velhos propósitos de vingança, seviciando-lhe a
organização perispiritual.
2. Em
plena sombra de consciência, Marcelo rogou, chorou e
penitenciou-se por vastos anos. Por mais que suplicasse
e por muito que insistissem os elementos intercessórios,
a ansiada libertação demorou muitíssimo, porque o
remorso é sempre o ponto de sintonia entre o devedor e o
credor, e ele trazia a consciência fustigada de remorsos
cruéis. Os desequilíbrios perispiríticos flagelaram-no,
assim, logo que atravessou o pórtico do túmulo,
obstinando-se anos a fio.
3.
Reportando-se ao caso Marcelo e, especificamente, à
epilepsia, Calderaro explicou que o fenômeno epileptoide
raramente ocorre por meras alterações no encéfalo, pois,
geralmente, é enfermidade da alma, independente do corpo
físico, que apenas registra, nesse caso, as ações
reflexas. Céu e inferno, em essência, são estados
conscienciais; se alguém agiu contra a Lei, ver-se-á
dentro de si mesmo em processo retificador, tanto tempo
quanto seja necessário. Assim como há inúmeras
enfermidades para as desarmonias do corpo, há outras
inúmeras para os desvios da alma.
4. Depois
de muitos padecimentos, Marcelo viu clarearem-se seus
horizontes internos, tendo afinal logrado entender-se
com prestimoso orientador espiritual, a quem se ligara
no passado remoto. Ele o socorreu e amparou e contou-lhe
que seus familiares mais queridos já se encontravam de
novo encarnados, em testemunhos e labores dignificantes.
Foi assim que retornou à esfera carnal e reiniciou o
aprendizado. Preocupava-se agora, sinceramente, em
reajustar as preciosas qualidades morais,
caracterizando-se, desde menino, pela bondade e
obediência, docilidade e ternura naturais.
5. Passara
a infância tranquilo, embora espreitado continuamente
por antigos perseguidores invisíveis. Contudo, logo que
ultrapassou os catorze anos de idade, Marcelo passou a
rememorar os fenômenos vividos, e surgiram as chamadas
convulsões epilépticas com certa intensidade. O rapaz,
todavia, encontrou imediatamente os antídotos
necessários, refugiando-se na "residência dos princípios
nobres", ou seja, na região mais alta da personalidade,
pelo hábito da oração, pelo entendimento fraterno, pela
prática do bem e pela espiritualidade superior. Limitou,
assim, a desarmonia neuropsíquica e reduziu a disfunção
celular, reconquistando o próprio equilíbrio, dia a dia.
6.
Esforçando-se e atendendo às sugestões daqueles que o
beneficiavam, Marcelo vinha sendo o médico de si mesmo,
única fórmula em que o enfermo pode encontrar a própria
cura. Dispensava com isso a terapêutica dos hipnóticos e
dos choques, a qual, provocando estados anormais no
organismo perispirítico, quase sempre nada consegue
senão deslocar os males, sem os combater nas origens.
7. Certo
dia, Marcelo recolheu-se ao seu quarto e, em breves
minutos, afastou-se do corpo denso e foi ter com
Calderaro, a quem saudou com especial carinho. Ele
mostrava profunda lucidez e estava feliz. Daí a pouco,
porém, dois vultos sombrios cautelosamente se
aproximaram do grupo. Pareciam dois transeuntes
desencarnados. Marcelo empalideceu, levou a destra ao
peito e arregalou os olhos desmesuradamente. Suas ideias
pareciam embaralhar-se no cérebro e foi nesse estado
que, desprendendo-se, célere, da companhia de Calderaro,
correu desabalado, retornando ao corpo físico. O
Instrutor explicou que a simples reaproximação de
inimigos do passado alterava-lhe as condições mentais.
Receoso e aflito, temia o regresso à situação dolorosa
em que se viu, há muitos anos, nas esferas inferiores, e
buscava, assim, o corpo físico, à maneira de alguém que
se escondia em casa, em face de uma tempestade iminente.
8. Depois
que André Luiz o abraçou como a um filho querido, a
crise amainou. Ficara, porém, a dúvida: por que tal
distúrbio, se ali no quarto só estavam Marcelo, André
Luiz e Calderaro? André passou, então, a observar o
cérebro de Marcelo. A luz habitual dos centros
endócrinos empalidecera; somente a epífise emitia raios
anormais. No encéfalo o desequilíbrio era completo. Os
vários centros motores, inclusive os da memória e da
fala, jaziam desorganizados, inânimes. Marcelo-espírito
contorcia-se de angústia, justaposto ao Marcelo-forma,
encarcerado na inconsciência orgânica, presa de
convulsões que confrangiam André. Calderaro aplicou-lhe
passes; Marcelo aquietou-se; refez-se a atividade
cerebral; as células nervosas retomaram sua tarefa. O
rapaz caiu então em profundo sono, pois o Instrutor
entendeu conveniente proporcionar-lhe maior repouso.
9.
Calderaro fitou André Luiz e perguntou se ele se
lembrava dos reflexos condicionados de Pavlov. O caso de
Marcelo verificava-se em consonância com os mesmos
princípios. No passado, ele errou de muitos modos e o
remorso guardou-lhe a consciência, entregando-o aos seus
inimigos nos planos inferiores e conduzindo-o à colheita
dos espinhos que semeara. Em face desses desvios,
perambulou desequilibrado, de alma doente, exposto à
dominação das antigas vítimas, desarranjando os centros
perispirituais e enfermando-os para muito tempo. Eis a
explicação da crise epiléptica.
10. Na
verdade, Marcelo tinha registrada no perispírito a
lembrança fiel dos atritos experimentados fora do
veículo denso. "As zonas motoras de Marcelo, em razão
disso – salientou o atencioso orientador –, simbolizando
a moradia das forças conscientes, em sua atualidade de
trabalho, constituem uma região perispiritual em
convalescença, quais as sensíveis cicatrizes do corpo
físico. Ao se reaproximar de velhos desafetos, o rapaz,
que ainda não consolidou o equilíbrio integral,
sujeita-se aos violentos choques psíquicos, com o que as
emoções se lhe desvairam, afastando-se da necessária
harmonia." A mente desorientada abandona o leme da
organização perispirítica e dos elementos fisiológicos,
assume condições excêntricas, dispersa as energias, em
movimentos desordenados. Essas energias passam, então, a
atritar-se e a emitir radiações de baixa frequência,
aproximadamente igual à da que lhe incidia do pensamento
alucinado de suas vítimas. Daí às convulsões, era um
passo.
11. O caso
de Marcelo mostrava ser impossível pretender a cura dos
alienados mentais e dos chamados loucos à força de
processos exclusivamente objetivos. É indispensável
penetrar a alma, devassar o cerne da personalidade,
melhorar os efeitos socorrendo as causas; por
conseguinte, não se restauram corpos doentes sem os
recursos do Médico Divino das almas, que é Jesus Cristo.
Os fisiologistas farão muito, tentando retificar a
disfunção das células; no entanto, é mister intervir nas
origens das perturbações. O caso em pauta era tão
somente um dos múltiplos aspectos do fenômeno
epileptoide, mas esse desequilíbrio perispiritual
assinala-se por gradação demasiado complexa. A
confirmação da teoria dos reflexos condicionados não se
aplica exclusivamente a ele. Há milhões de pessoas
irascíveis que, pelo hábito de se encolerizarem
facilmente, viciam os centros nervosos fundamentais
pelos excessos da mente sem disciplina, convertendo-se
em portadores do "pequeno mal", em dementes precoces, em
neurastênicos de tipos diversos ou em doentes de franjas
epilépticas, que andam por aí, submetidos à hipoglicemia
insulínica ou ao metrazol, quando a educação mental,
para a correção das próprias atitudes internas no
ramerrão da vida, lhes seria tratamento mais eficiente e
adequado, pois regenerativo e substancial.
12. Isso
não significa que todos os doentes, sem exceção, possam
dispensar o concurso dos choques renovadores. O que se
deseja salientar é que o homem, pela sua conduta, pode
vigorar a própria alma, ou lesá-la. "O caráter
altruísta, que aprendeu a sacrificar-se para o bem de
todos, estará engrandecendo os celeiros de si mesmo, em
plena eternidade; o homicida, esparzindo a morte e a
sombra em sua cercania, estabelece o império do
sofrimento e da treva no próprio íntimo", acrescentou
Calderaro. (Cf. cap. 8 do livro No Mundo Maior,
de André Luiz, obra psicografada por Francisco Cândido
Xavier, publicada em 1947 pela Federação Espírita
Brasileira.)
Outra obra
importante que focaliza situações semelhantes que se
refletem na vida dos enfermos da alma no além-túmulo é
Tormentos da Obsessão, de Manoel Philomeno de
Miranda, psicografada por Divaldo Franco e publicada em
2001.
Essa obra
apresenta-nos a narração de várias vidas e suas
histórias reais. As experiências nela relatadas foram
vivenciadas no Hospital Esperança, situado na esfera
espiritual, no qual se encontram internados inúmeros
irmãos falidos e comprometidos com o próximo, em
lamentáveis estados de perturbação, após haverem
abandonado os compromissos nobres que substituíram pela
alucinação e pelo transtorno moral que se permitiram.
Nesse Nosocômio Espiritual encontram-se recolhidos
especialmente pacientes que foram espiritistas
fracassados, os quais são ali tratados graças à
magnanimidade do benfeitor Eurípedes Barsanulfo, que o
ergueu.
Aprendemos
com as lições contidas nas duas obras mediúnicas que
mencionamos que qualquer tipo de enfermidade tem no
Espírito a sua origem, em face da conduta mental,
emocional e moral que ele se permite, produzindo
transtorno vibratório que se refletirá na área
correspondente do corpo perispiritual, e mais tarde no
físico. “Somente agindo-se no mesmo nível e campo,
propondo-se simultaneamente a mudança de atitude
psíquica e comportamental do paciente, se pode aguardar
resultados satisfatórios na correspondente manifestação
da saúde.” (Cf. Tormentos da Obsessão, cap. 2 – O
Sanatório Esperança.)
Ainda
sobre o tema epilepsia sugerimos ao leitor e demais
interessados que leiam, quando for possível, os
seguintes textos publicados nesta revista:
a) Estudo
do livro No Mundo Maior, de André Luiz, parte 11
- para acessá-lo,
clique aqui
b) “Nas
fronteiras da epilepsia”, artigo de autoria do Dr. Nubor
Orlando Facure – para acessá-lo,
clique aqui
c) O
Espiritismo responde – para acessar o texto,
clique aqui