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por Marcus Braga

 
Pé de barro, pé no barro
 
Vivemos um tempo curioso. Após a chegada do homem à lua, do telescópio Hubble ter ajudado a desvendar o espaço, de uma grande expansão de nosso conhecimento do Universo, nos decepcionamos com o que encontramos. Esperávamos algo divino, maravilhoso. 

Esperávamos, na ratificação de nossa imaginação fértil, algo de civilizações intergalácticas, de descobertas de outros mundos, como um Cabral ou um Colombo moderno à busca de novas civilizações. Mas encontramos rochas e gases, e fomos buscar abrigos em teorias conspiratórias e fábulas modernas, sem ver a magnitude do que encontramos.

Da mesma forma, a profusão das comunicações; as redes nos colocaram em tempo real em contato com a natureza humana. Ponto a ponto, sem filtros, viralizamos e nos comparamos com o vizinho nas redes sociais, e vemos do que o Espírito encarnado é capaz. Mas nos decepcionamos. Quebramos as nossas expectativas com o homem que vemos no espelho. Sentimos vergonha da raça humana.  

Sim, por ver não somente o mal, mas por vê-lo sendo propagado, comemorado e consumido, misturando o mundo real e a ficção, destruindo a crença no homem como centelha divina, com potencial para fazer mais e melhor nesse mundo. Por ver que desperdiçamos soluções e criamos problemas, e a despeito de toda a tecnologia, ainda padecemos da fome, da ignorância e da violência.

A decepção é o sentimento que habita bocas e corações. Uma tristeza infinda. Uma vontade de não se levantar, em um tempo curioso, de falta de fé, ainda que existam tantas religiões. De ídolos de “pé de barro”, ainda que existam tantas celebridades instantâneas. Uma falta de esperança, de concepção de um mundo melhor, abatido pela realidade que se descortina.

O Espiritismo, como doutrina libertadora, que concilia a vida eterna com a vida real, traz uma nova proposta de fé. Não somente por ser raciocinada. Não uma proposta de “pés de barro” e sim uma proposta de “pé no barro”, na qual essa decepção não se justifica.  Uma proposta de mundo em transformação, pelas nossas mãos e guiado pelos nossos pés.

Sim, o Espiritismo convida-nos, Espíritos encarnados, a uma fé ativa, producente. A assumir as rédeas do mundo, para romper os determinismos da natureza humana, colocando os pés no barro e mostrando que pode ser feito diferente. Um mundo que será o que nós fizermos dele. Nós, as diversas gerações que encarnam sucessivamente no planeta.

Imagine uma mulher, um negro, um indígena no Século XVII. Ele olhava também para o mundo de baixo, sem fé. E hoje, apesar dos pesares, muita coisa mudou na relação do mundo com esses grupos. A evolução se fez e se faz. Às vezes lentamente, as vezes de forma imperceptível, mas o mundo melhora e pode melhorar. Só depende de nós.

Essa lógica que o Espiritismo traz, de deixar em nossas mãos a construção de um mundo melhor, converte essa decepção em trabalho, essa falta de fé em esforço, esse vazio em sede. Temos a ideia de reencarnação, não como um dogma de sofrimento e karma determinista, mas como uma chave libertadora do sofrimento e de promoção da fraternidade.

A pergunta 171 de “O Livro dos Espíritos” traz que “(...) a doutrina da reencarnação, isto é, a que consiste em admitir para o Espírito muitas existências sucessivas, é (...) a única que pode explicar o futuro e firmar as nossas esperanças, pois que nos oferece os meios de resgatarmos os nossos erros por novas provações”. Esse resgate não é somente na dimensão individual, mas também na dimensão coletiva.

A continuidade da vida permite ao homem-espírito exercitar a sua capacidade de se reinventar, de fazer diferente, de romper barreiras e construir novas pontes entre os fossos que se apresentam. E isso exige trabalho, esforço e dedicação. A fé sem obras é morta, diz o evangelho, e, nesse sentido, temos que avançar, com o pé no barro e os olhos no céu.

Pois o nosso destino está nas estrelas. Mas o momento, aqui e agora, é que ele está sendo construído.
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita