O
leitor Luís Carlos P. Nascimento, em mensagem publicada
nesta edição, na seção de Cartas, enviou-nos a seguinte
mensagem:
Uma
pessoa levantou em nosso grupo de estudos a seguinte
questão: diante das vicissitudes e aflições que podem
nos atingir, que valor tem a oração, ainda que sincera e
fervorosa? Os companheiros dessa revista podem elucidar
a questão proposta?
Allan Kardec examinou essa questão no capítulo XXVII de
seu livro O Evangelho segundo o Espiritismo.
A
dúvida formulada pelo leitor só tem sentido para aqueles
que não possuem uma noção exata da ação e dos efeitos da
prece em nossa vida.
Como sabemos, e Kardec o diz claramente na obra a que
nos reportamos, o homem obtém pela prece o concurso dos
bons Espíritos, que acorrem a sustentá-lo em suas boas
resoluções e, com esse propósito, inspiram-lhe ideias
sadias. Ele adquire, então, a força moral necessária
para vencer as dificuldades e regressar ao caminho reto,
caso dele se tenha afastado. Por esse meio, ele pode
também desviar de si os males que atrairia por suas
próprias faltas, visto que a prece lhe propicia a força
de resistir às tentações.
A
fim de compreendermos em profundidade o pensamento de
Kardec a respeito do tema em análise, atentemos para o
texto abaixo que ele escreveu e inseriu na obra acima
mencionada:
Se
em duas partes se dividirem os males da vida, uma
constituída dos que o homem não pode evitar e a outra
das tribulações de que ele se constituiu a causa
primária, pela sua incúria ou por seus excessos (cap. V,
n. 4), ver-se-á que a segunda, em quantidade, excede de
muito à primeira. Faz-se, portanto, evidente que o homem
é o autor da maior parte das suas aflições, às quais se
pouparia se sempre obrasse com sabedoria e prudência.
Não menos certo é que todas essas misérias resultam das
nossas infrações às leis de Deus e que, se as
observássemos pontualmente, seríamos inteiramente
ditosos.
Se
não ultrapassássemos o limite do necessário, na
satisfação das nossas necessidades, não apanharíamos as
enfermidades que resultam dos excessos, nem
experimentaríamos as vicissitudes que as doenças
acarretam. Se puséssemos freio à nossa ambição, não
teríamos de temer a ruína; se não quiséssemos subir mais
alto do que podemos, não teríamos de recear a queda; se
fôssemos humildes, não sofreríamos as decepções do
orgulho abatido; se praticássemos a lei de caridade, não
seríamos maldizentes, nem invejosos, nem ciosos, e
evitaríamos as disputas e dissensões; se mal a ninguém
fizéssemos, não houvéramos de temer as vinganças etc.
Admitamos que o homem nada possa com relação aos outros
males; que toda prece lhe seja inútil para livrar-se
deles; já não seria muito o ter a possibilidade de ficar
isento de todos os que decorrem da sua maneira de
proceder? Ora, aqui, facilmente se concebe a ação da
prece, visto ter por efeito atrair a salutar inspiração
dos Espíritos bons, granjear deles força para resistir
aos maus pensamentos, cuja realização nos pode ser
funesta. Nesse caso, o que eles fazem não é afastar de
nós o mal, mas, sim, desviar-nos a nós do mau pensamento
que nos pode causar dano; eles em nada obstam ao
cumprimento dos decretos de Deus, nem suspendem o curso
das leis da Natureza; apenas evitam que as infrinjamos,
dirigindo o nosso livre-arbítrio. Agem, contudo, à nossa
revelia, de maneira imperceptível, para não nos subjugar
a vontade. O homem se acha então na posição de um que
solicita bons conselhos e os põe em prática, mas
conservando a liberdade de segui-los, ou não. Quer Deus
que seja assim, para que aquele tenha a responsabilidade
dos seus atos e o mérito da escolha entre o bem e o mal.
É isso o que o homem pode estar sempre certo de receber,
se o pedir com fervor, sendo, pois, a isso que se podem
sobretudo aplicar estas palavras: "Pedi e obtereis”.
Mesmo com sua eficácia reduzida a essas proporções, já
não traria a prece resultados imensos? (O Evangelho
segundo o Espiritismo, cap. XXVII, item 12.)