Mediunidade não se desenvolve
apenas em salas mediúnicas
Observa-se como orientação básica em algumas agremiações
espíritas a ideia de ser absolutamente necessário aos
médiuns formados na Instituição estarem sempre
envolvidos nas reuniões de prática mediúnica da Casa,
afinal, “formaram-se” com qual objetivo?
Nota-se, de igual modo, inadvertidamente nos programas
“caseiros” de orientação aos médiuns, o ensino de que
médium, propriamente dito, só trabalha em atividade
mediúnica específica.
Alguns instrutores de mediunidade, com pouca ou escassa
experiência, mas com a já famosa “boa vontade”,
aventuram-se a coordenar programas de mediunidade,
quando, sem embasamento teórico e, muito menos prático,
acabam não por formar médiuns, mas desorientá-los em
relação aos princípios básicos do entendimento espírita,
fundamentos estes que os acompanharão pelo resto da
vida. Caso estes últimos não tenham a oportunidade de
frequentar outras Casas, e, nestas, filiarem-se
novamente a outro programa de formação mais conforme com
os postulados da Doutrina espírita, permanecerão
prisioneiros dos equivocados princípios inicialmente
apreendidos.
Um médium com a sua mediunidade mal desenvolvida e,
igualmente deseducado doutrinariamente, acaba
acreditando deva passar as vinte e quatro horas do dia
em salas mediúnicas, criando embaraços e dificuldades
para a Casa em que busca servir, pois crê, conforme lhe
foi ensinado: quanto mais presente estiver em trabalhos
mediúnicos, melhor para sua vida mediúnica, certeza de
cumprimento de sua vida missionária.
Uma das corriqueiras atitudes destes médiuns, no afã de
trabalhar diariamente é envolver-se em mais de uma
reunião de assistência espiritual por semana, caso
existam na Casa, e, se por ventura não lhes for
permitida esta conduta, procuram e descobrem outros
Centros, se apresentam e passam a trabalhar
mediunicamente, quando autorizados nestas outras
Instituições, satisfazendo assim o seu entendimento
distanciado dos princípios doutrinários.
Surpreendentemente, há ainda aqueles, não satisfeitos em
trabalhar apenas em Centros espíritas, envolvendo-se
ainda com atividades mediúnicas ligadas aos cultos
africanos, locais, de modo geral, onde prevalece apenas
a prática mediúnica, sendo raros os estudos, alegando,
para perplexidade dos estudiosos espíritas, ser tudo a
mesma coisa, afinal, em última instância, o importante é
o fenômeno, enfatizam do alto de suas cátedras do saber.
Estas condutas só se fazem presentes no meio espírita em
função dos dirigentes das Casas, nas figuras de seus
conselheiros, coordenadores, diretores de doutrina,
quando efetivamente existem, às vezes até por
desconhecimento, não atuarem doutrinariamente, pois, de
fato, muitos nada entendem de mediunidade, aceitando as
idiossincrasias dos médiuns, como se eles estivessem com
a razão, afinal, são médiuns e precisam interagir
objetivamente com os Espíritos.
Um quadro preocupante dentro do movimento, pois não se
enxerga, a curto espaço de tempo, solução para tal
conduta, aumentada na razão direta do desconhecimento de
um livro raro hoje em dia de ser lido e escassamente
estudado nos arraiais espíritas, o único tratado sobre
mediunidade, deveria ser a “Bíblia” dos médiuns, o cada
vez mais desconhecido O Livro dos Médiuns.
Lançado em 1861, há mais de cento e cinquenta anos, com
tradução para o idioma português desde o ano de 1875,
teve o seu tempo de glória em passado distante, quando
era livro de cabeceira dos médiuns, e qualquer programa
de formação destes trabalhadores tinha por base este
compêndio singular sobre mediunidade. Agora, observam-se
programas de formação à moda da Casa, cada qual com suas
apostilas redigidas por alegados conhecedores da
Doutrina, quando muitos ditam normas e condutas, sem
jamais terem sequer folheado O Livro dos Médiuns,
muito menos o estudado.
E assim caminha o movimento, conscientizar estes médiuns
é tarefa espinhosa, pois, malformados, resistem a
qualquer argumentação contra as suas distanciadas
rotinas de trabalho do verdadeiro Espiritismo, mesmo
quando a orientação é baseada em O Livro dos Médiuns,
porquanto, para estes trabalhadores, este livro é coisa
do passado, plenamente superado pelas “modernas
técnicas” difundidas na atualidade, por exemplo, a
apometria.
Mas, afinal, onde posso desenvolver a minha mediunidade,
trabalhar em prol da grande massa de necessitados
encarnados e desencarnados, cumprir plenamente a minha
missão, senão nas reuniões mediúnicas? Há outros
caminhos? Quais seriam?
Antes de alinhar algumas recomendações espíritas, seria
interessante refletir como agiam os médiuns na
antiguidade para trabalhar mediunicamente, pois sempre
os houve em quantidade na Terra, tempos onde nem
existiam salas reservadas para mediunidade, aliás, nem
existia a palavra mediunidade.
Todos eles trabalhavam, não há sombra de dúvida, pois
seria um contrassenso dos Espíritos encarregados nos
processos das reencarnações permitirem ser este ou
aquele portador de mediunidade, sem haver condições
plenas de se atuar mediunicamente. Por qual motivo estes
encarnados seriam médiuns? Lembremo-nos de ser a
mediunidade lei de Deus, não é privilégio de ninguém.
A razão assim nos informa: deveria haver atividade
mediúnica, sem existir sequer programa de formação,
muito menos reunião de médiuns, ou seja, a atuação
mediúnica propriamente dita era viabilizada na figura
dos Hierofantes, Xamãs, Feiticeiros, Bruxos, Pitonisas,
Magos, Benzedeiras, todos estes, detentores de certas
percepções espirituais mais acentuadas – mediunidades –
desempenhando o papel de intermediários – médiuns –
entre os encarnados e os desencarnados. Isto ao ar
livre, nas cavernas, nas catacumbas, de casa em casa...
Fazendo menção ao cenário do passado, de forma alguma,
estamos sugerindo aos modernos médiuns do século XXI se
embrenharem pelas selvas e grutas para estabelecer
contato mais íntimo com os Espíritos; muito menos bater
de porta em porta oferecendo seus préstimos mediúnicos a
qualquer um, o objetivo da lembrança do que acontecia
nos tempos antigos seria apenas para demonstrar ter o
intercâmbio mediúnico possibilidade de acontecer fora da
sala mediúnica.
Outro fato valendo a pena ser comentado se relaciona aos
muitos médiuns não espíritas da atualidade, pois, não
foram e não são adeptos do Espiritismo, no entanto, são
tão médiuns quanto os médiuns espíritas. Como fizeram e
fazem para exercitar a mediunidade, considerando
desconhecerem Allan Kardec, muito menos as obras
fundamentais?
A atuação propriamente dita mediúnica ocorre em variadas
situações:
1. em
uma orientação a um amigo ou desconhecido a nos procurar
no dia a dia;
2. através
do atendimento às muitas necessidades materiais humanas,
por exemplo, ajudando na distribuição de sopa aos
famintos;
3. no
ambiente de trabalho em conversas edificantes com os
conhecidos;
4. no
seio da família, distribuindo ensinos;
5. evangelizando
os pequeninos;
6. em
atividades de passe, Johrei...;
7. na
atuação sincera religiosa dentro das igrejas, templos,
pagodes...
Sem qualquer necessidade de incorporações ou
psicografias, estas sim, atividades típicas de salas
mediúnicas em Centros espíritas, concretizando-se:
1. pelas
intuições recebidas ou captadas e transmitidas aos
necessitados;
2. pelos
fluidos transmitidos quando do envolvimento sincero com
os semelhantes;
3. através
da leitura de obras de cunho moral e ético elevado;
4. pela
disciplina dos pensamentos não dando guarida às más
ideias;
5. se
afastando das conversas maliciosas;
6. durante
estudos sérios sobre a Doutrina, não precisando ser
necessariamente sobre mediunidade;
7. pela
leitura atenta de O Livro dos Médiuns, em
momentos de recolhimento íntimo;
8. pela
interação com o guia espiritual que tudo acompanha ao
solicitar orientação via mensagens espíritas;
9. orando
com fervor pelos necessitados de toda ordem...
Se não fosse assim, só registraríamos médiuns após
Kardec e somente entre os espíritas.
A propósito do último item, interação com o guia
espiritual, recordemos os dizeres de um dos mais
atuantes médiuns que já existiu, e viveu aqui no Brasil
- Francisco Cândido Xavier - quando há décadas já
exercitava suas várias mediunidades1:
1- Chico, aos quarenta anos de serviço mediúnico,
pode você explicar o que seja desenvolvimento de
mediunidade? “Do ponto de vista técnico, não sei
responder. Pela prática da vida, creio, porém, que
desenvolvimento mediúnico é o aumento da intimidade do
médium com as entidades espirituais ou a penetração
gradativa da pessoa humana na esfera de atividades da
alma, habitualmente invisível para os olhos.”
Vale a pena também lembrar aos médiuns sobre a concreta
possibilidade de atuarem mediunicamente durante o sono,
contudo, raros são aqueles se lembrando de orar ao
deitar, se preparando para tanto, e raríssimos são
aqueles verdadeiramente se colocando à disposição para
trabalhar no plano espiritual durante o período de
descanso do corpo físico. A espiritualidade ligada aos
trabalhos mediúnicos nas Casas, após a atividade
rotineira do dia a dia, sempre está conclamando os
médiuns a dar continuidade ao serviço no plano astral,
contudo, infelizmente, estes encarecidos pedidos
encontram pouca ressonância junto aos muitos
trabalhadores.
Desta forma, deixemos de lado a falsíssima ideia de que
só as salas mediúnicas viabilizam o intercâmbio
mediúnico, vejamos o mundo como uma imensa região de
variadas possibilidades e nos coloquemos à disposição
dos sofredores; em situação delicada, emocionalmente ou
materialmente, nossos guias estarão atentos, como
sempre, e nos ajudarão a bem exercer o compromisso
mediúnico firmado ainda no plano astral, de modo
satisfatório e produtivo tanto para nós mesmos, quanto
para aqueles interagindo conosco.
Referência:
1
BARBOSA, Elias. No mundo de Chico Xavier. 1. ed.
São Paulo: Edição Calvário, 1968. Encontro com Chico
Xavier - capítulo 5 - pergunta 1.
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