A omissão e as suas consequências
espirituais
Toda criatura humana retorna à ribalta da vida material
carregando em seu átrio um conjunto de metas a cumprir,
isto é, fracassos e desajustes a reparar, virtudes e
capacitações a desenvolver, aprendizados para
aperfeiçoar o comportamento e os sentimentos, lições de
vida para assimilar e situações de testemunho, que
aferirão, por fim, o seu real progresso espiritual. As
experiências redentoras serão mais ou menos acentuadas a
depender dos seus compromissos e débitos perante as leis
divinas.
Nesse sentido, cada um de nós tem a sua própria história
de erros e desacertos. E por não termos alcançado a
necessária elevação, tropeçamos, não raro, em nossas
imperfeições e defeitos milenares.
No decorrer da vida, a maioria das pessoas tende a
internalizar o dever de não praticar o mal e
realizar o bem. Ocorre que, entre esses dois
extremos, há um estágio intermediário representado pela omissão comportamental. Trata-se
de uma postura igualmente comprometedora à evolução das
criaturas, embora muito praticada, conforme atestam as
evidências. Aliás, cabe destacar que muitas atrocidades
foram cometidas ao longo da trajetória humana devido à
omissão dos atores envolvidos. O próprio Jesus, nas
horas mais pungentes do seu messianato, sentiu-a através
do abandono dos seus seguidores e beneficiados.
O assunto merece profunda reflexão, já que vivemos num
mundo onde a noção do bem não foi devidamente instalada
não apenas por causa da prevalência do mal, mas também
pela nossa omissão em sufocá-lo. Allan Kardec explorou o
tema na questão 642
d’O Livro dos Espíritos ao indagar as entidades
espirituais o seguinte: “Para
agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará
que o homem não pratique o mal? Não;
cumpre-lhe fazer o bem no limite de suas forças,
porquanto responderá por todo mal que
haja resultado de não haver praticado o bem”.
Notem que a neutralidade aqui em nada contribuí para o
bem-estar espiritual do indivíduo claudicante.
O assunto é retomado na obra O
Céu e o Inferno no
trecho: “[...] Não fazer o bem quando podemos é,
portanto, o resultado de uma imperfeição. Se toda
imperfeição é fonte de sofrimento, o Espírito deve
sofrer não somente pelo mal que fez como pelo bem que
deixou de fazer na vida terrestre”. Segue daí,
portanto, que a ausência de atitudes concretas na
direção do bem provoca consideráveis infortúnios ao
Espírito tergiversante. Assim sendo, consoante a
conclusão do Codificador, “A cada um segundo as suas
obras, no Céu como na Terra — tal é a lei da Justiça
divina”.
Quando olhamos a abundante imperfeição presente nas
instituições, nos governos, nos ambientes de trabalho,
no funcionamento das sociedades e sobretudo nas relações
humanas, identificamos também que o imperativo do bem
não é uma prioridade. Infelizmente, deixamos de
praticá-lo em situações e contextos onde a nossa boa
vontade e empatia são altamente requeridas. Não
cogitamos que pequenas ações e iniciativas de nossa
parte poderiam ser implementadas, o que certamente
redundariam em benefícios aos nossos semelhantes. Com
efeito, o nosso engajamento em fazer o bem, além de
ajudar em nossa própria autoiluminação, atenua as
agruras dos nossos irmãos. Desse modo, evitar a prática
maléfica constitui apenas um dos nossos desafios. Mas
não é suficiente à nossa evolução.
Por isso, alerta-nos com propriedade o Espírito
Emmanuel, no livro Justiça Divina (psicografia de
Francisco Cândido Xavier):
“Asseveras não haver praticado o mal; contudo, reflete
no bem que deixaste a distância.
“Não permitas que a omissão se erija em teu caminho, por
chaga irremediável.
“Imagina-te à frente do amigo necessitado a quem podes
favorecer.
“Não te detenhas a examinar processos de auxílio.
“[...]
“Não percas a divina oportunidade de estender a alegria.
“[...]
“Faze,
em cada minuto, o melhor que puderes.”
Contudo, deixamos de fazer por inúmeras razões – até por
pura indiferença, ou casuísmo – coisas boas e positivas
que, em muitas ocasiões, estão ao nosso alcance e não
exigem nenhum grande esforço de nossa parte em
realiza-las. Mais ainda: não percebemos que elas
poderiam aliviar a cruz dos nossos irmãos de jornada.
Desperdiçamos, devido à nossa incúria e imaturidade
espiritual, oportunidades excepcionais de fazer brilhar
a nossa luz através dos sublimes mecanismos da
solidariedade, compaixão e boa-fé. Não cogitamos que
nessas ocasiões estamos sendo efetivamente testados pela
providência divina. Não lembramos – muito menos
deduzimos - que concordamos em assumir e executar
tarefas benéficas em prol dos outros. No entanto, diante
da oportunidade sagrada normalmente fracassamos.
Lamentavelmente, o comportamento omisso continua
causando consideráveis aflições em nosso mundo.
O Espírito Joanna de Ângelis, na obra Celeiro de
Bênçãos (psicografia de Divaldo Pereira Franco), faz
observações contundentes a respeito. Por exemplo, a
elevada entidade afirma que “A omissão, no entanto, é
responsável pelo desmoronamento de ideais enobrecedores
com que a Humanidade sempre foi contemplada, porquanto
estimula a desordem, no silêncio conivente; açula a ira,
pela morbidez que dissemina; favorece a fuga dos
dubitativos que se resolvem pela atitude mais fácil.
Omissão, é, também, ausência de firmeza de caráter,
covardia moral”.
Para ela ainda, “O cristão omisso é alguém em vias de
decomposição emocional, que está em processo de morte
sem o perceber. Desse modo, constrói sempre e
convictamente o bem em toda parte, comunicando
entusiasmo e otimismo, descobrindo, por fim, que o
contágio do amor e da esperança...”
Por outro lado, é comum nos queixarmos dos problemas e
obstáculos que surgem desafortunadamente em nosso
caminho. São experiências – perfeitamente evitáveis, em
muitos casos - sofríveis que adicionam mais transtorno
às nossas vidas. Sendo essa a realidade, meditemos se,
de nossa parte, também nós contribuímos para isso devido
à nossa omissão e silêncio diante das coisas erradas.
Vivendo num mundo onde a imperfeição tudo abarca,
podemos, pelo menos em nossa esfera de ação, averiguar
se o comportamento omisso ainda nos inspira. Com efeito,
chegar no plano espiritual carregando tal passivo só nos
fará mal.
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