Especial

por Anselmo Ferreira Vasconcelos

Desvendando os efeitos da misericórdia divina

 
Gradualmente adentramos numa era de constantes flagelos e tragédias que atingem implacavelmente milhares de pessoas. As tempestades e hecatombes da natureza tornaram-se agora extremamente mortais - fruto da nossa própria invigilância e profunda falta de bom senso ao lidar com a natureza -, levando ao desespero indivíduos de todas as classes sociais, bem como destruindo sonhos, aniquilando a fé e a esperança daqueles cuja confiança no Criador carece de real convicção. 

Diante do onipresente quadro de devastação, muitos cogitam até mesmo de um suposto abandono de Deus à humanidade. Nesse sentido, o Espírito Emmanuel observa, na obra Vinha de Luz (psicografia de Francisco Cândido Xavier), que os observadores menos esclarecidos atribuem à espiritualidade a causa dos eventos atuais que ora nos atordoam. No entanto, nada mais equivocado assim pensar. É preciso, pois, ampliar o entendimento para compreender o que se sucede e as suas razões.

Posto isto, iniciamos nossas ponderações recorrendo ao Espírito Joanna de Ângelis, que nos informa, no livro Oferenda (psicografia de Divaldo Pereira Franco), que ninguém há na Terra isento de problemas ou testemunhos, ou seja, todos nós temos nossos próprios dramas, não raro, ocultos aos olhos da maioria. Apesar disso, Emmanuel eloquentemente argumenta na referida obra, que:

“As oportunidades do Senhor continuam fluindo incessantes, sobre a Terra.

A misericórdia do Pai não mudou.

A Providência Divina é invariável em todos os tempos.

Ainda segundo o ínclito mentor espiritual:

“A atitude dos cristãos na atualidade, porém, é muito diferente. Raríssimos perseveram na doutrina dos apóstolos, na comunhão com o Evangelho, no espírito de fraternidade, nos serviços da fé viva. A maioria prefere os chamados “pontos de vista”, comunga com o personalismo destruidor, fortalece a raiz do egoísmo e raciocina sem iluminação espiritual.”

De modo geral, parece que não conseguimos aquilatar ainda a grandeza da misericórdia divina, que nos sustenta e ampara, aliás, ao longo dos séculos para que conquistemos a lucidez. Apesar das inúmeras concessões e moratórias concedidas pelo Alto em nosso benefício, continuamos a errar indiscriminadamente e, assim, fracassando em nossos compromissos com o Pai celestial. Todavia, o Senhor nos coroa de misericórdia, e espera o mesmo de nós na prática diária de viver.

Aprofundando a análise, o Espírito Emmanuel observa, em Caminho, Verdade e Vida (psicografia de Francisco Cândido Xavier), que:

“Entre os homens, o criminoso é enviado a penas cruéis, seja pela condenação à morte ou aos sofrimentos prolongados.

A Providência, todavia, corrige, amando... Não encaminha os réus a prisões infectas e úmidas. Determina somente que os comparsas de dramas nefastos troquem a vestimenta carnal e voltem ao palco da atividade humana, de modo a se redimirem, uns à frente dos outros.

Para a Sabedoria Magnânima nem sempre o que errou é um celerado, como nem sempre a vítima é pura e sincera. Deus não vê apenas a maldade que surge à superfície do escândalo; conhece o mecanismo sombrio de todas as circunstâncias que provocaram um crime.

O algoz integral como a vítima integral são desconhecidos do homem; o Pai, contudo, identifica as necessidades de seus filhos e reúne-os, periodicamente, pelos laços de sangue ou na rede dos compromissos edificantes, a fim de que aprendam a lei do amor, entre as dificuldades e as dores do destino, com a bênção de temporário esquecimento.”

Com efeito, em nossa limitada capacidade de percepção não vislumbramos os dramas e complexidades que cercam nossas existências atuais. Não consideramos que somos herdeiros de um passado geralmente eivado de graves equívocos e desacertos, e que nos compete ora consertar para que possamos prosseguir a nossa jornada ascensional sem jaças ou máculas pendentes. Desse modo, é inequívoco que o Senhor quer que brilhemos como Ele, isto é, com perfeição e virtudes plenamente assimiladas. Como bem ressaltou o instrutor Druso, na importante obra Ação e Reação (ditada pelo Espírito André Luiz e psicografada por Francisco Cândido Xavier), o Senhor empresta-nos “... os tesouros do trabalho e do sofrimento, como favores da sua infinita misericórdia, para que obtenhamos a “reabilitação dolorosa, mas justa...”

Explicitando os caminhos à necessária reparação, o destacado mentor também salienta que:

“[...] Grandes faladores que escarneceram da divina missão do verbo, conturbando multidões ou enlouquecendo almas desprevenidas, suplicam doenças das cordas vocais, para que, atravessando afonias periódicas, desistam de tumultuar os espíritos por intermédio da palavra brilhante. E milhares de pessoas que transformaram o santuário do sexo numa forja de perturbações para a vida alheia, arruinando lares e infelicitando consciências, imploram equipamentos físicos atormentados por lesões importantes no campo genésico, experimentando, desde a puberdade, inquietantes desequilíbrios ovarianos e testiculares. A cegueira, a mudez, a idiotia, a surdez, a paralisia, o câncer, a lepra, a epilepsia, o diabete, o pênfigo, a loucura e todo o conjunto das moléstias dificilmente curáveis significam sanções instituídas pela Misericórdia Divina, portas adentro da Justiça Universal, atendendo-nos aos próprios rogos, para que não venhamos a perder as bênçãos eternas do espírito a troco de lamentáveis ilusões humanas.”

Cabe igualmente sublinhar que a misericórdia está situada, por assim dizer, naquele grupo de virtudes essenciais à nossa evolução espiritual. Exalçada por Jesus no inesquecível Sermão da Montanha, temos o desafio de incorporá-la, pois constituí caminho vital às nossas realizações espirituais. Por outro lado, se Deus nos culmina com a sua (incessante) misericordiosa compreensão, de nossa parte também devemos aplicá-la, particularmente num orbe repleto de desigualdades e injustiças. Aliás, dói-nos identificar que até mesmo em amargas provações coletivas como as que atingem o sul do nosso país, indivíduos desalmados usem a sua inteligência e talentos para nefastamente surrupiar as doações financeiras dadas para socorrer os desabrigados, entre outros crimes abomináveis.

Assim sendo, imaginamos que por alguma razão de força maior O Criador estende a sua infinita bondade também aí ao ainda permitir que o Brasil abrigue em seu solo criaturas tão perversas e desajustadas. Mais ainda: cogitamos que é para que a sensibilidade desses seres seja finalmente tocada e, assim, lhes aflorem sentimentos mais elevados. Seja como for, esses indivíduos continuarão certamente recebendo a misericórdia divina, inclusive nas densas regiões umbralinas. No futuro poderão certamente se ajustar às leis cósmicas através de experiências corporais purificadoras. Em outras palavras, até mesmo os mais contumazes criminosos e malfeitores do mundo recebem a ajuda misericordiosa de Deus. Talvez isso signifique, cabe também cogitar, a premente necessidade de reencarnarem em mundos mais atrasados para que despertem para luz. Portanto, é absolutamente correta a afirmação de Emmanuel, dada em Caminho, Verdade e Vida, de que “O homem ainda não percebeu toda a extensão da misericórdia divina, nos processos de resgate e reajustamento”.

Quando o infrator é embalado pelo genuíno espírito de fraternidade, “Ajudando aos outros, desbasta, dia a dia, o montante dos seus débitos, de vez que a Misericórdia do Pai Celestial permite que os nossos credores atenuem o rigor da cobrança, sempre que nos vejam oferecendo ao próximo necessitado aquilo que lhes devemos...”, conforme também esclarece o Espírito Silas na obra acima mencionada. Posto isto, no sempre altamente sensível capítulo das relações humanas, o emprego da misericórdia atua como profilaxia eficaz. Nesse sentido, o Espírito Meimei comenta, no livro Amizade (psicografia de Francisco Cândido Xavier), que “Deus é a misericórdia integral, contudo, nada te impede sustentar o perdão das ofensas”.

Com efeito, é muito raro, se não impossível, passarmos por uma existência inteira sem colher os espinhos da maledicência, incompreensão, traições, deslealdades, desrespeito ou inveja. Na visão divina, no entanto, tais cometimentos constituem excelentes oportunidades à aplicação da misericórdia. Afinal, o Senhor espera que assim nos comportemos em todos os degraus da vida. Como sugere Emmanuel em Instrumentos do Tempo (psicografia de Francisco Cândido Xavier):  

Inicia a obra de benemerência, em tua própria casa, distribuindo algumas palavras de incentivo com quem te comunga o cálice de luta.

Ajuda aos mentores de teu caminho com algum sorriso de compreensão, restaura a coragem na alma da esposa, restabelece o bom ânimo do companheiro, auxilia os irmãos, usando a chave milagrosa do carinho, e não te esqueças do apoio que os corações juvenis reclamam de tua boa vontade e de tua experiência que o Cristo enriqueceu.

Há mil meios de praticar a misericórdia a cada dia.

Não olvides o silêncio para a calúnia, a bondade para com todos, a gentileza incessante, a frase amiga que reconforta, a roupa que se fez inútil para o corpo, suscetível de ser aproveitada pelo irmão mais necessitado, o pão dividido, a prece em comum, a conversação edificante, o gesto espontâneo de solidariedade...

Ninguém é tão pobre que não possa dar alguma coisa aos semelhantes, e aquele que se compadece e ajuda cede ao próximo algo de si mesmo.

Não te detenhas, portanto.

Não admitas que a incerteza ou o temor te imobilizem o passo.

Vale-te das horas e auxilia sempre, sem ostentação de virtude, sem reclamação, sem alarde, e a vida entesourará as tuas migalhas de amor, delas formando a tua riqueza imperecível na bem-aventurança espiritual.”

Para os que estão sob intensa provação, o que não é incomum nos dias presentes, Emmanuel recomenda, na obra Palavras da Vida Eterna (psicografia de Francisco Cândido Xavier), que nos asserenemos e sejamos confiantes “...porque, se a Misericórdia de Deus ainda não está alcançando o teu quadro de luta, permanece a caminho (ênfase minha).

Não podemos aspirar a misericórdia para conosco se não a empregarmos, como já sugerido. Posto isto, não podemos esquecer que a vida sempre nos devolve aquilo que semeamos. Assim sendo, tenhamos em mente que as duras experiências em curso pelas quais a humanidade passa vão muito além de oportunidades de retificação individual e coletivas. São também ótimas possibilidades de colocarmos em prática a nossa capacidade de misericórdia através dos nossos recursos – tangíveis ou não – em favor dos nossos semelhantes. 

Cabe, por fim, acrescentar que podemos igualmente moldar as nossas instituições pelo arcabouço moral da misericórdia através de ações e medidas empáticas e solidárias. Quando observamos caminhões levando ajuda humanitária às regiões de guerra e flagelos, quando notamos médicos e atendentes se esforçando por minorar a dor dos sofredores, quando identificamos ajuda à reconstrução das moradias das vítimas das grandes tragédias, quando os políticos e administradores trabalham para servir o povo mitigando as suas incontáveis necessidades e quando vemos a efetiva ajuda à recuperação do viciado, descobrimos Deus inspirando o coração humano na implementação da misericórdia.

Avancemos, pois ainda há muito a fazer!

   

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita