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por Ricardo Baesso de Oliveira

 

Escolho não sofrer


É possível escolher não sofrer? Claro que não! O sofrimento está no DNA da evolução humana. Sofremos ao nascer, ao crescer para gerar outros filhos, sofremos com as enfermidades que surgem independentemente de nosso comportamento, sofremos ao nos despedirmos de entes queridos que desencarnaram antes de nós.

Os Espíritos também sofrem. São sofrimentos diferentes dos nossos. Se deparam, principalmente, com a dor moral do sentimento de culpa: a noção do tempo perdido, a constatação de que foram desleais com afetos sinceros, as atitudes desonestas e muitas outras. Sofrem igualmente quando percebem que seres que amam, ainda domiciliados na dimensão corpórea, estão fazendo escolhas erradas, complicando seu futuro espiritual.

Quando propomos, então, escolher não sofrer, estamos nos referindo ao conjunto de pensamentos que alimentamos diante do sofrimento. Isso não vai nos livrar do sofrimento em si mesmo, mas pode reduzir a sua intensidade, e evitar que nosso sofrimento gere mais sofrimento nas pessoas que amamos.

Sobre isso, lembro-me de Dona Natalina, uma senhora residente no Rio de Janeiro, que conheci em uma Semana Espírita de Astolfo Dutra.

Nessa tradicional Semana Espírita, na parte da manhã, ocorre o que denominam Reabastecimento. Os confrades sentam-se em círculo, no pátio da Fundação Abel Gomes, alguém lê um pequeno trecho de um dos livros de Allan Kardec, e aqueles que desejam tecem comentários, em torno do texto lido.

Naquela manhã, o texto calhado referia-se ao sofrimento humano. Muitos deram a sua colaboração, até que Dona Natalina pediu a palavra e se manifestou de forma comovente:

- Como muitos de vocês sabem, eu tenho um filho que é dependente químico. Completa este ano 38 anos de idade e se iniciou nas drogas aos 15. É meu único filho. Sou viúva, há muitos anos, e lido sozinha com esse problema. Ele nunca estudou, e poucas vezes permaneceu no emprego, por mais de um ano. Não é uma má pessoa, não me maltrata, nunca me agrediu. Vai ao centro, de vez enquanto, tomar passes. Mas nunca se afastou das drogas.

Confesso que minha vida havia perdido a graça: meu único filho era um inválido, alguém sem serventia, vivendo apenas para saciar seu vício. Quantas noites fiquei sem dormir, ou dormia chorando. Nada tinha graça para mim; arrastava-me pela existência, triste e melancólica.

Até que, certa manhã, acordei diferente. Era um belo dia; o sol nascera radiante, os passarinhos na vizinhança começaram cedo sua cantoria. Debrucei-me, então, na janela e pus-me a pensar sobre a criatura que havia me tornado. E, nesse momento, algo estranho e diferente aconteceu comigo, como se uma força misteriosa tivesse me tomado por inteira. Disse, então, a mim mesma:

- Não vou sofrer mais! Basta! Vou continuar amando-o como ele é, mas não vou sofrer mais.

Saí do quarto, fui até a sala onde ele se encontrava, abracei-o ternamente, lhe desejei um bom dia e fui cuidar dos meus afazeres.

Isso se deu há 5 anos. Meu filho continua na droga; eu o amo com sempre amei, mas eu sou uma pessoa diferente. Escolhi não sofrer mais. 


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita