Sutilezas da mediunidade e a lição de
Jorge Rizzini
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Médium desde a tenra idade, o escritor Jorge Rizzini
(1924-2008) passou a sonhar ainda novo com a literatura.
Desde quando se casou |
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com a escritora Iracema Sapucaia, aos 23 anos, o
assunto estava sempre presente. Passados alguns
anos, e levado pelo calor da conversa, Rizzini
disse, certa |
vez, num bate-papo em família, que seria capaz
de escrever um livro infantil como Monteiro
Lobato. E ouviu de sua sogra: |
– Pois faça isso. A literatura infantil é dificílima e
será um bom exercício para você.
Instigado, em menos de três semanas Rizzini já tinha
pronta a sua história com mais de cem páginas¹,
rapidamente publicada pela editora Brasiliense, depois
de ter impressionado o editor, pela semelhança de estilo
com Monteiro Lobato. Rizzini havia escrito sob a
influência do próprio escritor, desencarnado em 1948.
Ainda entusiasmado com sua facilidade, percebia que
‘coisas estranhas’ aconteciam quando escrevia, mas
atribuiu novamente a si a autoria da segunda obra,
escrita uma vez mais sob a influência de Lobato, e que
recebeu igualmente grande destaque.
O sucesso também se fez escrevendo para adultos, com o
livro Beco dos aflitos², premiado, em 1957, pela
União Brasileira de Escritores e tendo recebido os
melhores elogios da crítica literária.
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Jorge Rizzini só se deu conta de que era médium
psicógrafo quando passou a receber Antologia do mais
além³, contendo poesias – gênero literário
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que ele não dominava – assinadas por poetas
desencarnados. |
Foi quando finalmente entendeu: “A fim de que todas as
dúvidas terminassem de uma só vez, começaram mais
intensamente os efeitos físicos e voltei a ouvir vozes
espirituais, agora de poetas e do meu espírito guia, e
então me rendi à evidência da mediunidade psicográfica
que possuía e que minha vaidade literária não queria
admitir”, conta na apresentação da obra.
Em 1978, a espiritualidade mais uma vez o testou, ao ser
convidado para participar da fundação da Academia
Brasileira de Escritores de Literatura Infantil e
Juvenil. “Qualquer escritor veria nesse convite o abraço
da glória e meu primeiro impulso, confesso, foi
aceitá-lo. Mas, refleti, como receberiam os acadêmicos
uma obra psicografada por um de seus pares? Seria mesmo
um escândalo. Mas, ainda assim, a vaidade beliscava-me e
consultei meu espírito mentor, com a vaga esperança de
que ele concordasse:
– O que faria o senhor em meu lugar?
E sua voz se fez ouvir em minha mente. Tentei
argumentar, ainda.
– Mas, a Academia...
– Deixe-a para a próxima encarnação.
Era o que eu tinha a fazer. E recusei o honroso convite.
É evidente que eu não havia passado no teste.
Vacilara... Como é difícil nos libertarmos de nossas
inferioridades.”
1. Carlito e os homens da
caverna, Brasiliense, 1951.
2. Beco dos aflitos, Civilização
Brasileira, 1959.
3. Antologia do mais além, LAKE,
1972.
Este texto foi
publicado originalmente no jornal Correio Fraterno, de
São Bernardo do Campo-SP, em 8 de fevereiro de 2025.