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por Rogério Miguez

 

Por que é preciso esquecer o passado?


Uma das dúvidas mais corriqueiras do iniciante na compreensão do Espiritismo é: Se a lei das muitas vidas é um princípio de Deus, e eu já as tive muitas vezes, por qual razão não me lembro dessas existências? É simples assim, uma pergunta lógica e até esperada.

É importante que estas questões sejam esclarecidas, pois de dúvida em dúvida pode-se chegar à descrença. Sem esclarecimentos sobre este tema, podemos facilmente enveredar pelos caminhos do materialismo, crendo termos sido criados durante o processo de gestação biológico.

Há uma explicação técnica para este fenômeno e se liga ao aspecto fisiológico, o processo do próprio renascimento, isto é, o revestimento de um novo corpo, que, interligando-se ao perispírito, age como um apagador ou abafador. E ademais, ocorre também a diminuição do estado vibratório do Espírito ao reencarnar.

Mas as razões mais significativas se prendem ao ângulo moral, e estas são muito contundentes.

Sabe-se que as famílias são formadas, geralmente, com integrantes que já tiveram anteriores experiências em conjunto, positivas ou negativas. Caso nos lembrássemos em detalhes sobre estes acontecimentos passados, a manutenção da estrutura familiar ficaria instável, pois, por exemplo, desde cedo o filho se lembraria do mal que fez no passado aos seus pais e vice-versa, resultando disso enorme dificuldade no relacionamento entre eles.

Como sabemos, e alguns talvez já tenham sentido isso na pele, existem inexplicáveis preferências entre os familiares, ou seja, uma mãe pode ter mais carinho por um filho em detrimento de outro. Um pai pode demonstrar mais atenção por uma das filhas. Como se conduziriam se, por exemplo, a mãe se lembrasse que já foi casada com o filho, anteriormente? E o pai se recordasse que já foi amante de uma de suas filhas, sendo exatamente por este motivo que retornaram como pai e filha, para superar o amor sensual do passado, pelo sadio amor paternal e filial?

De que forma agiríamos, se nos encontrássemos com um antigo inimigo no ambiente de trabalho?

Antigas personalidades de destaque de nossa História, ao serem reconhecidas, poderiam ser imediatamente hostilizadas ou, por outro lado, veneradas, trazendo prejuízos claros para o bom andamento da sociedade. Imaginemos se Gengis Khan ou Átila, o Flagelo de Deus, fossem nossos vizinhos? E como nos portaríamos caso fôssemos apresentados a Martin Luther King ou a Gandhi? Os grandes agressores da Humanidade seriam imediatamente atacados e, em relação aos beneméritos, poderia iniciar verdadeira romaria para falar com essas dignas figuras do passado.

Para este planeta são enviados, de modo geral, Espíritos com consideráveis débitos perante a justiça divina. Atualmente, estamos resgatando apenas pequena parte deste passivo moral e já consideramos muito, sempre acusando a Providência de nos ter dado fardo maior do que as nossas forças podem suportar. Agora ajuizemos se a estas lembranças, juntássemos as dificuldades surgidas na vida presente, por conta de deslizes de todo a ordem, e que já estamos arrependidos tentando não lembrar?

Em realidade, quando tentamos esquecer atos e palavras ditas no calor da discussão e nos momentos de atritos, que agora nos trazem certa envergonha, estamos tomando uma providência semelhante a que Deus toma regularmente ao nos fazer esquecer o passado, de modo provisório e natural, ao reencarnarmos.

Ensina o Espiritismo que podemos lembrar algo do passado durante o período do descanso corporal. Se, algo estiver nos incomodando sobremaneira, é possível solicitar a Deus, aos Espíritos protetores que, se possível, tenhamos um encontro com entidades esclarecidas que nos mostrem por qual razão estamos passando por este atual desafio. Tentemos, pois de qualquer modo, se não pudermos conhecer a razão que se esconde em nossa existência pregressa, receberemos novas forças para continuar a nossa atual jornada, o que já é muito.

Contudo, o nosso foco não deve ser no passado, e sim no presente. Vivamos no bem, na moralidade e ética e, seguramente, prepararemos um bom futuro.

Se cremos em Deus, em sua misericórdia infinita, no seu amor por todos os seus filhos, aquietemos o nosso coração e a nossa mente e, através da oração, roguemos que Ele nos dê a paciência e resignação necessárias para dar prosseguimento às nossas particulares jornadas, mesmo que ainda existam algumas lacunas de entendimento sobre o que fomos, o que fizemos, por qual razão passamos por esta situação e não aquela... Isso é, certamente, o melhor a fazer.

Deixemos o passado, por enquanto, no esquecimento, pois esta medida obedece à lei divina, e quando, mais cedo ou mais tarde, voltarmos à vida no espaço, tudo se esclarecerá, considerando não haver acaso no ordenamento divino.

 
  
    

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita