Por que é preciso esquecer o passado?
Uma das dúvidas mais corriqueiras do iniciante na
compreensão do Espiritismo é: Se a lei das muitas vidas
é um princípio de Deus, e eu já as tive muitas vezes,
por qual razão não me lembro dessas existências? É
simples assim, uma pergunta lógica e até esperada.
É importante que estas questões sejam esclarecidas, pois
de dúvida em dúvida pode-se chegar à descrença. Sem
esclarecimentos sobre este tema, podemos facilmente
enveredar pelos caminhos do materialismo, crendo termos
sido criados durante o processo de gestação biológico.
Há uma explicação técnica para este fenômeno e se liga
ao aspecto fisiológico, o processo do próprio
renascimento, isto é, o revestimento de um novo corpo,
que, interligando-se ao perispírito, age como um
apagador ou abafador. E ademais, ocorre também a
diminuição do estado vibratório do Espírito ao
reencarnar.
Mas as razões mais significativas se prendem ao ângulo
moral, e estas são muito contundentes.
Sabe-se que as famílias são formadas, geralmente, com
integrantes que já tiveram anteriores experiências em
conjunto, positivas ou negativas. Caso nos lembrássemos
em detalhes sobre estes acontecimentos passados, a
manutenção da estrutura familiar ficaria instável, pois,
por exemplo, desde cedo o filho se lembraria do mal que
fez no passado aos seus pais e vice-versa, resultando
disso enorme dificuldade no relacionamento entre eles.
Como sabemos, e alguns talvez já tenham sentido isso na
pele, existem inexplicáveis preferências
entre os familiares, ou seja, uma mãe pode ter mais
carinho por um filho em detrimento de outro. Um pai pode
demonstrar mais atenção por uma das filhas. Como se
conduziriam se, por exemplo, a mãe se lembrasse que já
foi casada com o filho, anteriormente? E o pai se
recordasse que já foi amante de uma de suas filhas,
sendo exatamente por este motivo que retornaram como pai
e filha, para superar o amor sensual do passado, pelo
sadio amor paternal e filial?
De que forma agiríamos, se nos encontrássemos com um
antigo inimigo no ambiente de trabalho?
Antigas personalidades de destaque de nossa História, ao
serem reconhecidas, poderiam ser imediatamente
hostilizadas ou, por outro lado, veneradas, trazendo
prejuízos claros para o bom andamento da sociedade.
Imaginemos se Gengis Khan ou Átila, o Flagelo de Deus,
fossem nossos vizinhos? E como nos portaríamos caso
fôssemos apresentados a Martin Luther King ou a Gandhi?
Os grandes agressores da Humanidade seriam imediatamente
atacados e, em relação aos beneméritos, poderia iniciar
verdadeira romaria para falar com essas dignas figuras
do passado.
Para este planeta são enviados, de modo geral, Espíritos
com consideráveis débitos perante a justiça divina.
Atualmente, estamos resgatando apenas pequena parte
deste passivo moral e já consideramos muito, sempre
acusando a Providência de nos ter dado fardo maior do
que as nossas forças podem suportar. Agora ajuizemos se
a estas lembranças, juntássemos as dificuldades surgidas
na vida presente, por conta de deslizes de todo a ordem,
e que já estamos arrependidos tentando não lembrar?
Em realidade, quando tentamos esquecer atos e palavras
ditas no calor da discussão e nos momentos de atritos,
que agora nos trazem certa envergonha, estamos tomando
uma providência semelhante a que Deus toma regularmente
ao nos fazer esquecer o passado, de modo provisório e
natural, ao reencarnarmos.
Ensina o Espiritismo que podemos lembrar algo do passado
durante o período do descanso corporal. Se, algo estiver
nos incomodando sobremaneira, é possível solicitar a
Deus, aos Espíritos protetores que, se possível,
tenhamos um encontro com entidades esclarecidas que nos
mostrem por qual razão estamos passando por este atual
desafio. Tentemos, pois de qualquer modo, se não
pudermos conhecer a razão que se esconde em nossa
existência pregressa, receberemos novas forças para
continuar a nossa atual jornada, o que já é muito.
Contudo, o nosso foco não deve ser no passado, e sim no
presente. Vivamos no bem, na moralidade e ética e,
seguramente, prepararemos um bom futuro.
Se cremos em Deus, em sua misericórdia infinita, no seu
amor por todos os seus filhos, aquietemos o nosso
coração e a nossa mente e, através da oração, roguemos
que Ele nos dê a paciência e resignação necessárias para
dar prosseguimento às nossas particulares jornadas,
mesmo que ainda existam algumas lacunas de entendimento
sobre o que fomos, o que fizemos, por qual razão
passamos por esta situação e não aquela... Isso é,
certamente, o melhor a fazer.
Deixemos o passado, por enquanto, no esquecimento, pois
esta medida obedece à lei divina, e quando, mais cedo ou
mais tarde, voltarmos à vida no espaço, tudo se
esclarecerá, considerando não haver acaso no ordenamento
divino.