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A política no Espiritismo
No Centro Espírita que frequento, opinando acerca de um
determinado tópico, um sujeito deu o seu parecer sobre a
questão proposta por mim, discordando, coisa que acho
até saudável, pois afinal não sou o “dono da verdade” e
esta é uma oportunidade de nós aprendermos com as nossas
divergências.
Triste foi ver que, inopinadamente, o meu interlocutor
distorceu o assunto e o levou para o lado político, indo
de encontro ao que o emérito professor lionês nos
orientou, ou seja, que nós não devemos falar de política
estando em um ambiente espírita.
Vejam bem, toda pessoa pode e deve ser politizada e até
debater sobre o tema. O que não é admissível pelo
Codificador é que uma polêmica nasça e cresça nos
Centros Espíritas.
Quem não segue essa orientação, seja quem for,
definitivamente não conhece a fundo Kardec, como
deveria, e até se deixa passar por grande estudioso e
sabedor do Espiritismo.
Penso que o mais incorreto é a ordem em que a maioria lê
os livros espíritas. Primeiramente deveriam ler as obras
básicas, depois as fundamentais, para só então conhecer
as complementares. Mas não acontece assim. É por isto
que Kardec é pouco conhecido. Quando muito, a pessoa já
deu uma passada de olhos em O Livro dos Espíritos ou
já foleou O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Falar em A Gênese ou Revista Espírita? Isto é uma
grande novidade para eles. Nunca ouviram isto.
Infelizmente o Movimento Espírita está cheio de pessoas
deste jeito.
Na maravilhosa lista de livros que o ínclito francês,
Codificador do Espiritismo, publicou, lemos que os
obsessores muitas vezes usam destes estratagemas para
lhes imputar confiança e fazer com que o foco seja o
político ou o religioso. Os Espíritos bons não alimentam
esta fogueira[1].
Creio que o referido
indivíduo que dialogou comigo no Centro Espírita e se
denominava kardecista tinha apenas um conhecimento
superficial de Kardec. Pois, se ele realmente conhecesse
o que foi deixado pelo Codificador, jamais teria
aventado um tópico no qual a cizânia é espalhada entre
os profitentes desta Augusta Doutrina que seguimos. Na
verdade estas controvérsias nos afastam do Espiritismo,
o que se torna uma tática muito ardilosa a favor dos
nossos antagonistas[2].
Kardec nos adverte para que não nos deixemos cair nessa
manobra ardilosa dos nossos irmãozinhos inferiores; que
vigiemos e não caiamos na cilada deles, ou seja, não
devemos discutir sobre política ou questões irritantes,
as quais não nos levarão a lugar algum. Que nós nos
prendamos à constante melhora de nossa moral. No
Espiritismo, devemos ter cuidado com aqueles que querem
nos induzir a caminhos tortuosos[3].
No ano seguinte, o Codificador diz que essa “legião de
Espíritos” se compraz em nos incitar a contestações
mútuas e polêmicas, assuntos que são controversos, como
a política e a religião, para que nós nos digladiemos e
consequentemente nos desarmonizemos. Estes “falsos
espíritas” são os bajuladores do Espiritismo[4].
No mesmo artigo Kardec continua dizendo que alguns acham
que leem muito sobre o Espiritismo, mas acontece que
suas leituras são desordenadas e conseguintemente
erradas[5].
Fica claro a seguinte
especificação de Kardec: “O objetivo da Sociedade é o
estudo da ciência espírita, principalmente no que
concerne à sua aplicação à moral e ao conhecimento do
mundo invisível. As questões políticas e de economia
social lhe são interditas, bem como as controvérsias
religiosas”.[6]
Kardec não se furta em alertar os espíritas de que o
assunto da política é um meio que os nossos opositores
usam para nos afastar do Espiritismo em geral, de fazer
com que nos separemos. Mais ainda, é uma forma que Deus
permite para experimentar a fé, a coragem e a
perseverança de seus verdadeiros servidores[7].
A Sociedade Parisiense de
Estudos Espíritas, primeiro Centro Espírita dos tempos,
tinha por meta o estudo de todos os tipos. Mas, de forma
alguma, haveria ali lugar para a política e demais
dissertações que tragam contendas entre seus partícipes[8].
Para o insigne
Codificador, a “política e a religião” eram como se
fossem barreiras materiais, obstáculos morais, que
deveriam ser apagados para o reinado da fraternidade
imperar[9].
Vale dizer que dentro do
Centro Espírita ou no periódico espírita a “política e a
religião” acima citados possuem o sentido de embate,
discussão, desarmonia, clima ruim, à diferença dos
princípios de amor e fraternidade que emolduram esta
Doutrina, que é o Consolador Prometido por Jesus[10],
que esposamos.
Nós trabalhamos para dar a fé aos que em nada creem;
para espalhar uma crença que os torne melhores uns para
os outros, que lhes ensine a perdoar aos inimigos, a se
olharem como irmãos, sem distinção de raça, casta,
seita, cor, opinião política ou religiosa; numa palavra,
uma crença que faz nascer o verdadeiro sentimento de
caridade, de fraternidade e deveres sociais. (KARDEC,
Allan. Revista
Espírita de
1863 – 1. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. – Janeiro de
1863.)
Certamente a política em si é um tema polêmico. Agora,
como bem disse Kardec, no Centro Espírita ou mesmo em um
periódico Espírita, ela não é apenas polêmica, mas sim
inadmissível. Pois, além de desrespeito e falta de
caridade para com o irmão que tenha uma opinião
diferente, mostra que essa pessoa até pode concordar com
o Espiritismo, achar lógica na reencarnação, assistir às
palestras espíritas no Centro Espírita, “tomar passe”
regularmente, vibrar com as mensagens ditadas por
Emmanuel, André Luiz, Joanna de Ângelis etc. Contudo não
se preocupa com o principal, que é estudar e analisar
Kardec e praticar seus ensinamentos.
Triste!
[1] KARDEC,
A. Revista Espírita, 12/1859, FEB, Aforismos
Espíritas e Pensamentos Avulsos, (.pdf).
[2] KARDEC,
A. Revista Espírita, 02/1862, FEB, Resposta
Dirigida aos Espíritas Lioneses por ocasião do
Ano Novo, (.pdf).
[3] KARDEC,
A. Revista Espírita, 02/1862, FEB, Votos de Boas
Festas, (.pdf).
[4] KARDEC,
A. Revista Espírita, 03/1863, FEB, Falsos Irmãos
e Amigos Inábeis, (.pdf).
[5] KARDEC,
A. Revista Espírita,03/1863, FEB, Falsos Irmãos
e Amigos Inábeis, (.pdf).
[6] KARDEC,
A. Viagem Espírita, FEB, Proposto pela Sociedade
Central de Paris, tendo em vista manter a
unidade de princípios e de ação, item 1, (.pdf).
[7] KARDEC,
A. Revista Espírita, 01/1864, FEB, Estado do
Espiritismo em 1863, (.pdf).
[8] KARDEC,
A. O Livro dos Médiuns, FEB, cap. XXX,
Regulamento da Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas, cap. I, Fins e formação da Sociedade,
Art. 1º. (.pdf).
[9] KARDEC,
A. O Livro dos Médiuns, FEB, cap. XXXI,
item II, Sobre o Espiritismo, (.pdf).
[10] KARDEC,
A. A Gênese, FEB, cap. I, Caráter da
Revelação Espírita, (.pdf).
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