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Jóias da poesia contemporânea
Ano 2 - N° 82 - 16 de Novembro de 2008
 

Miniaturas da Sociedade elegante

Artur Azevedo

 

1

Adriano Gonçalves de Macedo,

Homem de cabedais e alma sem siso,

Penetrou no seu quarto com um sorriso

Às dez horas da noite, muito a medo.

 

Uma carta de amante — era um segredo —

Ia abri-la, e, assim, era preciso

Que a sua esposa, dama de juízo,

Não na visse nem mesmo por brinquedo:

 

Dona Corália Augusta Colavida

Estaria nessa hora recolhida?

Levantou a cortina, devagar...

 

Mas, que tragédia após esse perigo...

Viu que a esposa beijava um seu amigo,

Sobre o divã, da sala de jantar.

 

2

No belo palacete do Furtado,

Palestrava a galante Mariquita

Com um pelintra afetado, assaz catita,

Bacharel delambido e enamorado.

 

De sobre a grande cômoda bonita,

Toma o moço um livrinho encadernado,

Revirando-o nas mãos, interessado,

Mas a jovem retoma-o, muito aflita:

 

- “Esse livro, Antonico, é meu breviário!”

Diz inquieta. E ele, cínico e falsário,

Arrebata-o às frágeis mãos trementes

 

Abriu-o. Mais o olhava e mais se ria...

Era um compêndio de pornografia,

Recamado de quadros indecentes.

 

3

Dom Castilho, notável latinista,

Realizara alentada conferência,

Sobre rígido assunto moralista,

Protegido dos membros da regência.

 

Foi um sucesso. E a esposa Ana Fulgência,

Nele via uma grande alma de artista,

Louvando-lhe a utilíssima existência

De homem probo e notável publicista.

 

Que primor de moral! e os companheiros

Escritores, poetas, conselheiros,

Foram levar-lhe um abraço camarada.

 

Numa corrida louca, esses senhores

Foram achá-lo em seus trajes menores,

No apartamento escuro da criada...


 

Artur Azevedo nasceu em São Luís, Maranhão, a 7 de julho de 1855 e faleceu na cidade do Rio de Janeiro a 22 de outubro de 1908. Diretor Geral de Con­tabilidade do Ministério da Viação, foi poeta, comedió­grafo, jornalista e crítico. Membro e fundador da Academia Brasileira de Letras, ocupou a ca­deira de Martins Pena. Os sonetos acima foram psicografados por Chico Xavier e fazem parte do Parnaso de Além-Túmulo.


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita