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Crônicas e Artigos
Ano 2 - N° 83 - 23 de Novembro de 2008

ROGÉRIO COELHO
rcoelho47@yahoo.com.br
Muriaé, Minas Gerais (Brasil)

Cismas e atritos

“(...) Cuidemos de instruir-nos, mas não nos injuriemos.”  (Platão)


As dificuldades e limitações das criaturas ampliam-se quando reunidas em sociedades, provocando – não raro – entrechoques que minam as mais elevadas intenções na lavoura do Bem... O egoísmo, a vaidade e a presunção estão na raiz desses males.   

As lutas intestinas estão quase sempre presentes nos conglomerados humanos inclusive e, incompreensivelmente, nos arraiais cristãos, onde todos deveriam ser reconhecidos por muito se amarem, conforme estipulou o Mestre Maior. 

Certamente, como células cristãs, as Sociedades Espíritas não estão infensas a essas convulsões, em conseqüência do personalismo soez, do egoísmo, do autoritarismo, do azinhavre do “homem velho” e do generalizado despreparo para os trabalhos em equipe. Existem criaturas absolutistas, tenazes, refratárias e que não medem esforços para terem seus nomes sob os “spotlights” da evidência; criam novidades só para poderem dizer que não pensam e agem como os outros, pois lhes sofre o amor-próprio por ocuparem uma posição secundária. Logicamente o que conseguem criar é apenas o que podemos chamar de confusão, cizânia, cismas... 

Se, porém, o Espiritismo não pode escapar às fraquezas humanas, com as quais se tem de contar sempre, pode-se, todavia, neutralizar-lhes as conseqüências, minimizando-lhes o mal. Há que se detectar e, quanto possível, dentro dos parâmetros e ética cristã, oferecer cuidadoso combate aos movimentos desagregadores, sustentando, por todos os meios possíveis, a unificação em torno dos objetivos do Cristo do qual somos servidores. Isso é o que podemos depreender das oportunas palavras de Kardec contidas no livro Obras Póstumas. 

Segundo ainda o Mestre Lionês, um dos maiores obstáculos com o qual se vê a braços o Espiritismo e que pode retardar-lhe a propagação é – sem sombra de dúvida – a falta de unidade. Que fazer para eliminar o divisionismo e as discórdias intestinas dos arraiais espiritistas? Qual seria a vacina profilática contra a cizânia? 

Joanna de Ângelis responde (1): 

“A cizânia deve ser combatida frontalmente onde quer que o bem instaure o seu reinado. Para tanto, faz-se necessário que cada membro ativo do grupo da ação nobilitante compreenda o impositivo da humildade. 

A cizânia constitui, pela sua própria estrutura, adversário ferino da obra de edificação do bem, onde quer que se manifeste. Parte integrante da personalidade humana, o espírito da cizânia facilmente se instala onde o homem se encontra. Estimulada pelo egoísmo, distende com muitas possibilidades as suas tenazes, surpreendendo quantos incautos se permitem, por invigilância, trucidar... 

Soez, persistente, contínua, a cizânia, ao manifestar-se, divide o corpo coletivo em falsos grupos de eleição, que logo se entredisputam primazia, estabelecendo o combate aguerrido e franco sob os disfarces da pusilanimidade ou da simulação. A cizânia nasce sempre no seio da vaidade que se faz nutrir pela presunção. 

Esquece, portanto, os títulos e valores a que te apegas, pois que eles nada valem diante d’Aquele a quem serves ou a quem procuras servir.    

A obra do bem tem passado sem ti e depois que passes ela prosseguirá passando.

Algumas vezes o veneno da ira amargurará teus lábios; em muitas ocasiões a balbúrdia dos desocupados te atordoará, envolvendo-te em atroada avassaladora; repentinamente sentirás a mágoa insidiosa e injustificável, açulando a indiferença muda, que te ameaça cruel; a tentação de “tudo abandonar”, reiteradamente chegará à tua casa mental; a deserção de inúmeros companheiros será estímulo para o teu desânimo; as facilidades do caminho estarão fascinantes à tua frente, convidativas; e perguntarás: Que fazer? Reage à cizânia, impedindo que ela te domine no pensar, no falar, a fim de que não se desdobre através do agir. Se te sentires inquieto no serviço que te compete realizar, insultado por companheiros que não acreditam no teu esforço, silencia e produze mais; trabalha pelo bem de todos, utilizando os recursos de que disponhas e preenche os espaços mentais vazios, não concedendo trégua à ociosidade. 

Recorre aos recursos espíritas: vigia e ora, ora sempre, para adquirires resistência contra o mal que infelizmente ainda reside em nós; permuta conversação enobrecida, pois que as boas palavras e os pensamentos bons renovam as disposições espirituais; utiliza o recurso do passe socorrista, rearticulando as forças em desalinho; sorve um vaso de água fluidificada, restaurando a harmonia das células em desajustamento e, sobretudo, realiza o bom serviço. Nenhum mal consegue triunfo no terreno reservado ao bem atuante... 

Não te concedas a insensata cooperação com o pessimismo ou o desalento, a rebeldia ou o egoísmo, estimulando a produção do erro ou a multiplicação da anarquia”. 

Completa Santo Agostinho (2): 

Por bem largo tempo, os homens se têm estraçalhado e anatematizado mutuamente em nome de um Deus de paz e misericórdia, ofendendo-o com semelhante sacrilégio. O Espiritismo é o laço que um dia os unirá, porque lhes mostrará onde está a verdade, onde o erro. Durante muito tempo, porém, ainda haverá escribas e fariseus que o negarão, como negaram o Cristo. Quereis saber sob a influência de que Espíritos estão as diversas seitas que entre si fizeram partilha do mundo? Julgai-o pelas suas obras e pelos seus princípios. 

Jamais os bons Espíritos foram os instigadores do mal; jamais aconselharam ou legitimaram o assassínio e a violência; jamais estimularam os ódios dos partidos, nem a sede das riquezas e das honras, nem a avidez dos bens da Terra. Os que são bons, humanitários e benevolentes para com todos, esses os seus prediletos e prediletos de Jesus, porque seguem a estrada que este lhes indicou para chegaram até Ele”.
 

Referências:

(1) FRANCO, Divaldo. Florações Evangélicas. 4 ed., Salvador: LEAL, 2000, cap. 35, pp. 153-155.

(2) KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 88 ed.,  Rio [de Janeiro]: FEB, 2006, Conclusão (in fine).

 


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