MARCUS
VINICIUS DE AZEVEDO
BRAGA
acervobraga@gmail.com
Guará II, Distrito
Federal (Brasil)
Crônicas
de Natal
Folia
Com maestria as cordas
da viola são dedilhadas
à porta de cada
residência. Violeiros
devotos, em coro
uníssono de vozes
acostumadas à luta
cotidiana, abeiram-se
das humildes portas para
cantar o nascimento do
Deus Menino.
O vento sibilante pelas
ruelas não desanima
aqueles que sustentam a
tradição de, amparados
pelo luar, cantar até o
nascer do sol as glórias
daquele dia tão
significativo na
história da humanidade.
Residência após
residência, segue a
folia renovando a fé e a
esperança de todo o
povo.
Naquele ano,
aproximava-se o início
do amanhecer e a folia,
já exaurida, completava
o que julgava ser a
última visita daquela
noite. Os amigos
cantadores já começavam
a guardar os seus
instrumentos, quando
Geraldo, um dos
cantadores mais antigos,
começa a soluçar em
prantos. Os amigos logo
acodem o companheiro,
que desabafa que seu
filho padecia de doença
em estado terminal e que
tinha certeza que
daquele Natal ele não
passaria.
Os amigos, após levar a
lembrança da noite de
Belém a tantos lares,
não tinham o que dizer
para consolar o amigo
que estava sempre à
frente da ação de fé de
todo final de ano.
Caminhavam então
abraçados, no retorno
para suas residências,
mudos e preocupados com
o destino do menino.
Ao se despedir de seus
amigos, Geraldo caminhou
para sua casa,
mentalizando as cantigas
de Santos Reis,
agarrando-se firmemente
à sua viola com
coloridas fitas
amarradas.
Ao ver sua residência,
que ficava no pé de uma
elevação, nota vultos em
volta da mesma, o que
aumenta a sua
preocupação e o faz
apertar o passo. Ao
aproximar-se, ele vê
bois, burros e carneiros
deitados em volta do seu
lar, como que
reverenciando-o.
Rapidamente ele entra em
casa e vai direto para o
quarto do menino, que
está sentado com sua
mãe, lendo uma passagem
da Bíblia.
Geraldo abraça-os
afetuosamente e pergunta
se está tudo bem. O
filho narrou que acordou
com uma luz clara na
janela e olhou por ela e
viu uma grande folia com
muitos violeiros
cantando belas cantigas.
Ele
acordou a mãe e ficaram
ambos da janela olhando
a folia. Ao final, a
dona da casa ofereceu a
esmola de costume, que
os violeiros disseram
não ser preciso,
afastando-se para trás
da serra.
A mulher interroga
Geraldo se ele sabia de
outra folia que também
estava cantando nas
redondezas. Geraldo
acena a cabeça
negativamente... E seu
filho passou dezenas de
natais ainda junto de
sua família.