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Crônicas e Artigos
Ano 3 - N° 112 - 21 de Junho de 2009

JANE MARTINS VILELA
limb@sercomtel.com.br
Cambé, Paraná (Brasil)
 

Doloroso remédio


Uma casa miserável, num lugar onde quase todas são assim, no meio do sofrimento econômico-social intenso, e no meio destes, também, o sofrimento moral.

Nossa equipe adentrou aquela casa para visitar um bebê de quatro meses. Lá, a mãe encontrava-se num estado de desequilíbrio emocional intenso, simplesmente porque o bebê havia engasgado. É pessoa, a mãe, portadora de doença psiquiátrica grave, e o juiz da Vara da Família já lhe tinha retirado quatro filhos anteriores, ficamos sabendo. O pai, de comportamento difícil, agressivo, violento e usuário de drogas.

Naquele dia, ao fazermos a visita, o pai estava lúcido e é ele que está cuidando do filho, porque a mãe realmente não tem condição emocional alguma para isso. O pai queixou-se de que não pode se ausentar de casa por nenhum instante desde que o bebê saiu da internação hospitalar, porque simplesmente ela entra em desespero, não sabe o que fazer com a criança.

Ela repetia mesmo: “Eu não sei cuidar, não consigo”, completamente em desequilíbrio.

O bebê, com microcefalia, ou seja, cabeça muito pequena, epiléptico, usava sonda nasogástrica, porque, aos quatro meses, ainda não aprendeu a sugar.

A despeito de todas essas dificuldades, quando olhamos, verificamos o olhar. Que olhos lindos, cheios de vida, ainda não comprometidos em sua expressão, demonstrando lucidez no olhar, apesar da microcefalia e da epilepsia! Os cílios, magníficos, enormes, sobressaindo, mais altos do que as sobrancelhas!

Naquela família... chances de sobrevivência difíceis, chance de recuperação mais difícil ainda. Ouvimos que o juiz tinha ficado na dúvida se punha a criança numa Casa Abrigo ou se a deixaria com a família. Optou pela segunda situação. Até quando, não sabemos.

Um leigo teria problemas para entender tais coisas. Ao vermos tudo aquilo, pensamos, porém, na justiça da reencarnação. Uma escolha do Espírito? Uma imposição? Uma necessidade?, pois nada ocorre por acaso.

Na questão 132 de “O Livro dos Espíritos”, vemos a resposta dada por eles a Kardec, de que a encarnação é-nos dada com a finalidade de alcançarmos a perfeição. Para uns, é expiação, para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm os indivíduos de sofrer todas as vicissitudes da existência corporal.

Na questão 133-a, ensinam que as aflições da vida são, muitas vezes, a consequência da imperfeição do Espírito. Quanto menos imperfeições, tanto menos tormentos.

Na questão 258, comentam que é o próprio Espírito que escolhe o gênero de provas por que há de passar, e nisso consiste o seu livre-arbítrio. Dando ao Espírito a liberdade de escolha, Deus lhe deixa a responsabilidade de seus atos e suas consequências.

Na questão 264, dizem que o Espírito escolhe, de acordo com a natureza de suas faltas, as que o levem à expiação destas e a progredir mais depressa. Uns impõem a si mesmos uma vida de misérias e privações, objetivando suportá-las com coragem; outros preferem experimentar as tentações da riqueza e do poder, muito mais perigosas, pelos abusos e má aplicação a que podem dar lugar, pelas paixões inferiores que uma e outro desenvolvem; muitos, finalmente, se decidem a experimentar suas forças nas lutas que terão que sustentar no contato com o vício.

Em O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo V, na comunicação “O Mal e o Remédio”, Santo Agostinho comenta: “No estado de desencarnados, quando planáveis no espaço, escolhestes vossa prova porque vos acreditastes bastante fortes para suportá-la; por que reclamar nessa hora? ... Vós que pedistes lutar de corpo e alma contra o mal moral e físico, é porque sabíeis que quanto mais a prova seria dura, tanto mais a vitória seria gloriosa, e que se dela saísseis triunfantes, devesse vossa carne ser lançada sobre um monturo, em sua morte, ela deixaria escapar uma alma brilhante de brancura e tornada pura pelo batismo da expiação e do sofrimento...”

Delfine de Girardin, nesse mesmo capítulo, em “A Infelicidade Real”, comenta que “a infelicidade é a alegria, é o prazer, é a fama, é a agitação vã, é a louca satisfação da vaidade, que fazem calar a consciência, que comprimem a ação do pensamento, que atordoam o homem sobre seu futuro; a infelicidade é o ópio do esquecimento que reclamais ardentemente... Que o Espiritismo vos esclareça, pois, e recoloque em sua verdadeira luz a verdade e o erro, tão estranhamente desfigurados pela vossa cegueira!”

O Espiritismo nos esclarece, sim, a entendermos casos como o dessa família que aqui colocamos.

Tranquilizemos os nossos pensamentos ante as dores e sofrimentos inenarráveis do mundo,  deixemos a compaixão nos atingir e olhemos o nosso próximo com o sentimento com que gostaríamos que nos olhassem perguntando a nós mesmos: O que Deus gostaria que fizéssemos para diminuirmos essa dor, esse sofrimento? O que está em nosso alcance fazer para que sejamos um bálsamo a diminuir a amargura, a dor, um remédio para consolar as aflições?

Tal pensamento desperta a generosidade. A compaixão faz esse sentimento vir à tona e a ação no bem é um dever para aquele que tem a consciência lúcida. Façamos, pois, o que pudermos para auxiliar com amor aqueles que padecem.


 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita