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Crônicas e Artigos
Ano 3 - N° 130 – 25 de Outubro de 2009

EUGÊNIA PICKINA 
eugeniamva@yahoo.com.br 
Londrina, Paraná (Brasil)
 
 

Paideia perene
 

 
Quando se trata de aprender a conviver, necessitamos de uma formação integral, porquanto na educação convencional, irrigada pela normose social, uma pessoa poderá conseguir títulos, segundo um fazer mecanicista e alienado, porém seguirá, no geral, como um analfabeto psíquico, desorientado para esses tempos críticos de desalentos e massificação.

Talvez fosse necessário, com humildade e consistência, o resgate da educação perene das antigas escolas de sabedoria. Desse modo, com coragem, precisamos integrar nos currículos escolares (do fundamental à universidade) a atenção com o despertar integral.

Esse despertar integral chama as práticas da meditação, da contemplação, das artes do espírito, que complementam os saberes do corpo, segundo uma dinâmica que valorize a aliança entre a escuta e o olhar, entre o feminino e o masculino, entre as forças yin-yang.

Sem dúvida, há um desejo profundo que habita o coração de cada ser humano: o desejo de tornar-se o Si-mesmo, isto é, desenvolver a consciência e talentos de modo a oferecer à outridade (1) algo novo, a singularidade da própria essência refletindo na existência.

À medida que o saber facilita a habilidade para a passagem de conhecimentos, práticas e habilidades mais vastos, muito além das exigências do paradigma materialista do racionalismo positivista, essa proposta educacional deixa de servir apenas aos campos restritos do conhecer e do fazer, abrindo-se à ousadia do conviver e do ser...

Essa maneira de educar-se, uma paideia perene, não se inclina apenas ao acúmulo, mas compreende que não basta o abrir-se para a apreensão quantitativa das coisas, pois o grande desafio é o exercício do discernimento, precariamente desenvolvido pela proliferação das diversas disciplinas gestadas continuamente pela educação convencional moderna.

É fato: conhecemos cada vez mais e, no entanto, compreendemos cada vez menos. As funções dos especialistas não dão conta das lacunas presentes no cerne da crise contemporânea, uma crise do conhecimento do conhecimento, pois se trata de recuperar, urgentemente, um aprender a aprender...

E do ponto de vista do ser e do conviver, necessitamos aprimorar, de maneira cordial e harmoniosa, razão e sentimento, sensação e intuição.
Infelizmente, o Ocidente ocupou-se em enfatizar nos últimos séculos as funções do princípio masculino – razão e sensação –, e isso em prol, sobretudo, do paradigma científico (racional e empírico) e do capital.

Uma educação integral, então, necessariamente sugestiva à inteligência emocional, onírica e relacional, pede, por sua vez, que seja também valorizada a trilha do sentimento e da intuição – funções do princípio feminino.

O contexto da educação formal estimula uma sociedade competitiva, fragmentada, conduzida pela normose, pela repressão do feminino, refletindo um mundo de exclusão e de consumismo extremo, muito apropriado ao modelo newtoniano-cartesiano...

Onde aprendemos a existir? Finitude e eternidade se entrelaçam na arte de viver o cotidiano... Certezas e incertezas também estão implicadas com as lições do amor, do perdão, de uma pedagogia que deixe de nos aprisionar no sistema fechado do domínio egoico, que se alimenta do não-aprofundamento, de um contato relacional estéril, gerador do fracasso da intimidade e do ser.

Onde aprendemos a existir? Uma formação integral pode nos preparar para a compreensão que focaliza a dimensão da alma, do pessoal e do transpessoal, da convergência entre ciência e saberes milenares, entre sociedade e natureza, entre masculino e feminino, entre matéria e espírito, segundo o potencial humano de abrir-se à qualidade e à florescência.

Como ninguém aprende sozinho, lembro-me, finalmente, de um poema de Pessoa:

Baste a quem baste o que lhe basta

O bastante de lhe bastar!

A vida é breve (2), a alma é vasta;

Ter é tardar.

 

Notas:  

(1) Outridade é termo bem formado em português, que deriva não do latim alter, «outro», como alteridade, mas do próprio indefinido outro; daí talvez poder ocorrer como sinônimo de alteridade. Trata-se também de um termo especializado, criado a partir das propostas do investigador francês Eric Landowski.  

(2) O termo “vida” deve ser entendido, aqui, como existência... Esta última, sim, temporária, pois o Espírito, imortal, nunca morre... Logo, o Espírito sempre vive!

 

     


 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita