EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Paideia
perene
Quando se trata
de aprender a
conviver,
necessitamos de
uma formação
integral,
porquanto na
educação
convencional,
irrigada pela
normose social,
uma pessoa
poderá conseguir
títulos, segundo
um fazer
mecanicista e
alienado, porém
seguirá, no
geral, como um
analfabeto
psíquico,
desorientado
para esses
tempos críticos
de desalentos e
massificação.
Talvez fosse
necessário, com
humildade e
consistência, o
resgate da
educação perene
das antigas
escolas de
sabedoria. Desse
modo, com
coragem,
precisamos
integrar nos
currículos
escolares (do
fundamental à
universidade) a
atenção com o
despertar
integral.
Esse despertar
integral chama
as práticas da
meditação, da
contemplação,
das artes do
espírito, que
complementam os
saberes do
corpo, segundo
uma dinâmica que
valorize a
aliança entre a
escuta e o
olhar, entre o
feminino e o
masculino, entre
as forças
yin-yang.
Sem dúvida, há
um desejo
profundo que
habita o coração
de cada ser
humano: o desejo
de tornar-se o
Si-mesmo, isto
é, desenvolver a
consciência e
talentos de modo
a oferecer à
outridade
(1) algo
novo, a
singularidade da
própria essência
refletindo na
existência.
À medida que o
saber facilita a
habilidade para
a passagem de
conhecimentos,
práticas e
habilidades mais
vastos, muito
além das
exigências do
paradigma
materialista do
racionalismo
positivista,
essa proposta
educacional
deixa de servir
apenas aos
campos restritos
do conhecer e
do fazer,
abrindo-se à
ousadia do
conviver e do
ser...
Essa maneira de
educar-se, uma
paideia
perene, não
se inclina
apenas ao
acúmulo, mas
compreende que
não basta o
abrir-se para a
apreensão
quantitativa das
coisas, pois o
grande desafio é
o exercício do
discernimento,
precariamente
desenvolvido
pela
proliferação das
diversas
disciplinas
gestadas
continuamente
pela educação
convencional
moderna.
É fato:
conhecemos cada
vez mais e, no
entanto,
compreendemos
cada vez menos.
As funções dos
especialistas
não dão conta
das lacunas
presentes no
cerne da crise
contemporânea,
uma crise do
conhecimento do
conhecimento,
pois se trata de
recuperar,
urgentemente,
um aprender a
aprender...
E do ponto de
vista do ser e
do conviver,
necessitamos
aprimorar, de
maneira cordial
e harmoniosa,
razão e
sentimento,
sensação e
intuição.
Infelizmente, o
Ocidente
ocupou-se em
enfatizar nos
últimos séculos
as funções do
princípio
masculino –
razão e sensação
–, e isso em
prol, sobretudo,
do paradigma
científico
(racional e
empírico) e do
capital.
Uma educação
integral, então,
necessariamente
sugestiva à
inteligência
emocional,
onírica e
relacional,
pede, por sua
vez, que seja
também
valorizada a
trilha do
sentimento e da
intuição –
funções do
princípio
feminino.
O contexto da
educação formal
estimula uma
sociedade
competitiva,
fragmentada,
conduzida pela
normose, pela
repressão do
feminino,
refletindo um
mundo de
exclusão e de
consumismo
extremo, muito
apropriado ao
modelo
newtoniano-cartesiano...
Onde
aprendemos a
existir?
Finitude e
eternidade se
entrelaçam na
arte de viver o
cotidiano...
Certezas e
incertezas
também estão
implicadas com
as lições do
amor, do perdão,
de uma pedagogia
que deixe de nos
aprisionar no
sistema fechado
do domínio
egoico, que se
alimenta do
não-aprofundamento,
de um contato
relacional
estéril, gerador
do fracasso da
intimidade e do
ser.
Onde
aprendemos a
existir? Uma
formação
integral pode
nos preparar
para a
compreensão que
focaliza a
dimensão da
alma, do pessoal
e do
transpessoal, da
convergência
entre ciência e
saberes
milenares, entre
sociedade e
natureza, entre
masculino e
feminino, entre
matéria e
espírito,
segundo o
potencial humano
de abrir-se à
qualidade e à
florescência.
Como ninguém
aprende sozinho,
lembro-me,
finalmente, de
um poema de
Pessoa:
Baste a quem
baste o que lhe
basta
O bastante de
lhe bastar!
A vida é breve
(2),
a alma é vasta;
Ter é tardar.
Notas:
(1) Outridade
é termo bem
formado em
português, que
deriva não do
latim alter,
«outro», como
alteridade, mas
do próprio
indefinido outro;
daí talvez poder
ocorrer como
sinônimo de alteridade.
Trata-se também
de um termo
especializado,
criado a partir
das propostas do
investigador
francês Eric
Landowski.
(2) O termo
“vida” deve ser
entendido, aqui,
como
existência...
Esta última,
sim, temporária,
pois o Espírito,
imortal, nunca
morre... Logo, o
Espírito sempre
vive!