A Revue Spirite
de 1864
Allan Kardec
(Parte
21)
Damos prosseguimento
nesta edição ao estudo da Revue
Spirite
correspondente ao ano de
1864. O texto condensado
do volume citado será
aqui apresentado em 26
partes, com base na
tradução de Júlio Abreu
Filho publicada pela
EDICEL.
Questões preliminares
A. No processo da
chamada incorporação,
que é preciso fazer para
que um Espírito
atormentado, como Jaques
Latour, se acalme?
No caso de Latour, que
transmitia todo o seu
desespero, suas
angústias e seus
sofrimentos ao médium,
os assistentes, tocados
por seus lamentos,
dirigiram-lhe palavras
de encorajamento e de
consolo e um deles orou,
após o que, mais calmo,
o Espírito agradeceu e
se retirou comovido.
Essa providência serve
de exemplo para casos
semelhantes, em que a
oração será sempre um
recurso indispensável.
(Revue Spirite de 1864,
pp. 309 a 311.)
B. A expiação pode ser
imediata, ou seja,
verificar-se com relação
a atos praticados no
curso da mesma
existência?
Sim. Kardec diz que os
exemplos de castigos
imediatos são mais
comuns do que se pensa.
Se o homem remontasse à
fonte de suas
vicissitudes – lembra o
Codificador –, veria que
quase sempre elas
decorrem de sua própria
conduta nesta vida, mas,
longe de se acusar por
seus infortúnios, ele
prefere atribuí-los à
fatalidade e à má sorte.
(Obra citada, pp. 313 e
314.)
C. Depende apenas de nós
evitar esses
infortúnios?
Sim. É preciso que
deixemos de ver nas
misérias que sofremos em
virtude de faltas
cometidas no passado um
mistério inexplicável,
certos de que depende de
nós evitá-las. Saldadas
as dívidas, Deus não nos
fará pagá-las segunda
vez. Mas, se ficarmos
surdos a seus avisos,
exigirá de nós até o
último ceitil, ainda que
após séculos ou milhares
de anos. A morada dos
eleitos só é aberta aos
Espíritos purificados;
qualquer mancha lhes
interdita o acesso. Cabe
a nós retirá-la.
(Obra citada, pág.
314.)
Texto para leitura
246. Encantado com a
novidade tiptológica, o
Codificador observou:
“De todos os aparelhos
imaginados para
constatar a
independência do
pensamento do médium,
nenhum vale este
processo”. Nada porém,
segundo ele, seria capaz
de substituir a
facilidade das
comunicações escritas.
(PP. 308 e 309)
247. Em Bruxelas, na
presença de Kardec,
comunicou-se o Espírito
de Latour, que mais
tarde se identificou
como autor de vários
crimes. Escrevendo com
uma agitação
extraordinária, Latour
registrou estas
palavras: “Arrependo-me,
arrependo-me”. Indagado
por que ali se
comunicara, uma vez que
ninguém o havia evocado,
Latour falou por meio da
mesma médium, dotada da
faculdade de psicofonia:
“Vi que éreis almas
compadecidas e que
teríeis piedade de mim,
ao passo que outros me
evocam mais por
curiosidade que por
verdadeira caridade, ou
de mim se afastam com
horror”. (P. 309)
248. Começou então uma
cena indescritível, que
não durou menos de meia
hora: a médium, juntando
à palavra os gestos e a
expressão da fisionomia,
transmitia o desespero
do Espírito, suas
angústias e seus
sofrimentos com um tom
tão pungente, que os
assistentes ficaram
profundamente comovidos.
Alguns estavam mesmo
apavorados com a
superexcitação da
médium, mas Kardec sabia
que um Espírito que se
arrepende e implora
piedade não ofereceria
qualquer perigo. (P.
309)
249. Latour fora levado
à guilhotina, mas isto
nada era diante do fogo
que o devorava, porque
suas vítimas o rodeavam
e perseguiam com seu
olhar. Tocados por seus
lamentos, os assistentes
lhe dirigiram palavras
de encorajamento e de
consolo e um deles orou,
após o que, mais calmo,
o Espírito agradeceu e
se retirou comovido.
(PP. 310 e 311)
250. Finda a cena,
durante algum tempo a
médium ficou quebrada e
abatida; seus membros
estavam fatigados. Sua
lembrança era, a
princípio, confusa, mas
pouco a pouco
recordou-se de algumas
palavras que pronunciou,
mau grado seu, sentindo
que não era ela quem
falara. (P. 311)
251. No dia seguinte,
Latour manifestou-se de
novo, mas uma sensível
melhora se havia operado
nele, por efeito,
sobretudo, da prece que
o grupo proferiu em seu
benefício. (N.R.: O
caso Jaques Latour e
todo o seu desdobramento
constam do cap. VI da
Parte Segunda do livro
“O Céu e o Inferno”, de
Allan Kardec.) (PP.
311 e 312)
252. O Siècle de
5 de junho de 1864
relatou um fato
intrigante que envolveu
um berlinense abastado e
seu pai que, em
consequência de vários
reveses, havia caído
numa pobreza absoluta.
Abandonado pelo filho
rico, o pai recorreu à
justiça, que condenou o
filho a fornecer-lhe uma
pensão alimentícia.
Quando a sentença saiu,
o filho já havia
transferido seus bens a
um tio paterno,
tornando, desse modo,
infrutífera a decisão
judicial. Um fato
imprevisto veio,
contudo, tudo mudar: o
tio do rapaz morreu
subitamente, sem deixar
testamento, e sua
fortuna acabou sendo
transmitida ao parente
mais próximo, isto é,
seu irmão, justamente o
pai repelido pelo filho.
Os papéis ficaram então
invertidos: o pai está
rico, e o filho, pobre.
(PP. 312 e 313)
253. Comentando o fato,
Kardec diz que os
exemplos de castigos
imediatos são mais
comuns do que se pensa.
Se o homem remontasse à
fonte de suas
vicissitudes, veria que
quase sempre elas
decorrem de sua própria
conduta nesta vida, mas,
longe de se acusar por
seus infortúnios, ele
prefere atribuí-los à
fatalidade e à má sorte.
(P. 313)
254. Se o homem
aproveitasse os avisos
que recebe, se se
arrependesse e reparasse
seus erros desde esta
vida, satisfaria a
justiça de Deus e não
teria que expiar e
reparar, seja no mundo
dos Espíritos, seja em
nova existência. (P.
314)
255. É preciso que
deixemos de ver nas
misérias que sofremos em
virtude de faltas
cometidas no passado um
mistério inexplicável,
certos de que depende de
nós evitá-las. Saldadas
as dívidas, Deus não nos
fará pagá-las segunda
vez. Mas, se ficarmos
surdos a seus avisos,
exigirá de nós até o
último ceitil, ainda que
após séculos ou milhares
de anos. A morada dos
eleitos só é aberta aos
Espíritos purificados;
qualquer mancha lhes
interdita o acesso. Cabe
a nós retirá-la. (P.
314)
256. Em Marselha, um dos
mais honrados
negociantes da cidade
deu um tiro de pistola
no vigário de
Saint-Barnabé. A causa
foi uma carta anônima
que lhe informou que sua
esposa mantinha relações
íntimas com aquele
padre. Comprovada a
denúncia, o marido
traído decidiu agir.
(PP. 314 e 315)
257. Qual o mais culpado
neste caso: a mulher, o
marido ou o padre? A
esta pergunta, Kardec
não teve dúvida em
atribuir maior
responsabilidade no fato
ao vigário, que, de
sangue frio, com
premeditação, violou os
seus votos, abusou de
seu caráter e enganou a
confiança dos fiéis,
lançando a desordem, o
desespero e a desunião
numa família honrada.
Concluindo a análise do
triste episódio, observa
Kardec: “Se o medo das
penas eternas não detém
na via do mal e na
violação dos mandamentos
de Deus aqueles que os
preconizam, é que eles
próprios neles não
acreditam”. “A primeira
condição para inspirar
confiança seria pregar o
exemplo.” (P. 315)
(Continua no próximo
número.)