– Qual deve ser a
atitude dos dirigentes
espíritas relativamente
a essa enxurrada de
obras mediúnicas de
origem duvidosa, que tem
infestado o mercado de
publicações espíritas
nos últimos tempos? Será
que Kardec, no seu
tempo, ficaria calado
diante dessas obras?
Raul Teixeira:
Acredito que num período
em que o planeta está
vivendo tormentos de
todos os tipos,
confirmando o que
considera Allan Kardec,
em seu livro A Gênese,
ao afirmar que hoje, não
são mais as entranhas do
planeta que se agitam:
são as da Humanidade,
não poderia o nosso
Movimento Espírita estar
livre dessa avalanche
atormentadora de más
influências, seja de
indivíduos aventureiros
e insanos
─
que anseiam por vitórias
passageiras e/ou
lucrativas, sem a
necessária consciência
do tipo de semente que
estão plantando para
colheita complexa no
porvir
─,
seja de entidades
desencarnadas que
continuam zombando dos
esforços da Luz, das
Falanges Crísticas, que
visam desfazer as
sombras que se demoram
sobre a Terra.
Na medida em que os
dirigentes espíritas vão
se tornando mais lúcidos
e, por conseguinte, mais
coerentes com os
princípios do
Espiritismo, conseguem
dar-se conta de que
qualquer obra que
divulguemos em nome da
nossa Doutrina deve ter
a chancela do bom senso
kardequiano.
Compreenderão que não
vale oferecer ao grande
público tudo o que vai
surgindo no mercado
livresco porque tenha o
título de obra mediúnica
ou espírita, a fim de
obter o tão esperado
“lucro”. Primeiro,
porque nem tudo o que é
mediúnico tem que ser
espírita, já que a
mediunidade não é
patrimônio do
Espiritismo. Segundo,
porque o critério
utilizado pelo
Codificador do
Espiritismo para a
seleção e publicação de
textos é bastante
rigoroso,
indiscutivelmente
responsável. Sempre que
alguém se põe a publicar
e a comercializar
produtos sem qualidade
genuinamente espírita,
no mínimo comete o erro
de lesa-verdade
espírita, o que ao longo
do tempo deve acarretar
muitas coisas graves nas
mentes dos que as leem
sem os necessários
filtros do conhecimento
dos livros de Kardec.
Com relação a Allan
Kardec, estou certo de
que não aceitaria tal
fato com a passividade
que temos encontrado no
nosso Movimento, uma vez
que são muitos os
dirigentes, nos mais
variados níveis de
responsabilidades, que
não têm coragem de
afrontar o status quo
vigente nesse campo
literário, seja para não
terem aborrecimentos e
se pouparem das
investidas retaliadoras
dos interessados na
manutenção do que
acontece agora, seja
porque também não
dispõem do necessário
senso crítico para ver
os elementos
antiespíritas ou
inverídicos que tais
obras contêm. É na
Revista Espírita,
publicada por Kardec no
mês de maio de 1863,
quando ele faz um exame
das comunicações
mediúnicas que lhe eram
enviadas, que
encontramos suas
palavras dizendo: Em
grande número
encontramo-las
notoriamente más, no
fundo e na forma,
evidente produto de
Espíritos ignorantes,
obsessores ou
mistificadores e que
juram pelos nomes mais
ou menos pomposos que as
assinam. Publicá-las
teria sido dar armas à
crítica. Vemos, assim,
que o Codificador do
Espiritismo tomava
posição e se pronunciava
a respeito com a firmeza
que o caracterizava.
Temos lido livros ditos
mediúnicos onde são
apresentados o chulo da
pornografia, das
descrições libidinosas,
fantasiosas descrições
que não suportam o crivo
da razão espírita, ao
lado de outras coisas
sem nexo, sem sentido
para o processo de
renovação e crescimento
da criatura humana, sob
a ótica do Consolador.
Vejamos o que escreve
Kardec no texto
supracitado: Para
começar, convém delas
afastar (das massas)
tudo quanto, sendo de
interesse privado, só
interessa àquele que lhe
concerne. Depois, tudo
quanto é vulgar no
estilo e nas ideias, ou
pueril pelo assunto. Uma
coisa pode ser excelente
em si mesma, muito boa
para servir de instrução
pessoal; mas o que deve
ser entregue ao público
exige condições
especiais. Infelizmente
o homem é inclinado a
supor que tudo o que lhe
agrada deve agradar aos
outros. O mais hábil
pode enganar-se; tudo
está em enganar-se o
menos possível. Há
Espíritos que se
comprazem em alimentar a
ilusão em certos
médiuns. Por isso nunca
seria demais recomendar
a estes não confiar em
seu próprio julgamento.
É nisso que os grupos
são úteis: pela
multiplicidade de
opiniões que podem ser
colhidas. Aquele que,
neste caso, recusasse a
opinião da maioria,
julgando-se mais
esclarecido que todos,
provaria
superabundantemente a má
influência sob a qual se
acha.
Vale a pena continuar a
ler o que nos diz o
Codificador, Allan
Kardec, sobre o tema em
apreço: Aplicando estes
princípios de ecletismo
às comunicações que nos
enviaram, diremos que em
3.600 há mais de 3.000
que são de uma
moralidade
irreprochável, e
excelentes como fundo;
mas que desse número não
há mais de 300 para
publicidade, e apenas
cem de um mérito
inconteste. Essas
comunicações vieram de
muitos pontos
diferentes. Inferimos
que a proporção deve ser
mais ou menos geral. Por
aí pode julgar-se da
necessidade de não
publicar
inconsideradamente tudo
quanto vem dos
Espíritos, se se quiser
atingir o objetivo a que
nos propomos, tanto do
ponto de vista material
quanto do efeito moral e
da opinião que os
indiferentes possam
fazer do Espiritismo.
Bem entendemos, pois,
que Kardec não se
acomodaria
silenciosamente, como
não se acomodou em sua
época. Hoje em dia nos
deparamos com um
espírito acomodatício em
nosso Movimento, o que
se mostra indicativo do
descompromisso de muitos
com a grandeza e clareza
do Espiritismo, nada
obstante continuem
ocupando as mais
diversas posições nos
seus campos de
atividades.
Extraído de entrevista
publicada no jornal O
Imortal em março de
2009.