ANSELMO FERREIRA
VASCONCELOS
afv@uol.com.br
São Paulo, SP (Brasil)
Os bálsamos da esperança
Um traço saliente das
almas que estão abertas
às realizações humanas,
inclusive no campo da
fé, é a esperança. O
indivíduo esperançoso
combate com destemor
o vírus da
desesperança e do
desespero que
está sempre à espreita,
pronto a derrubar as
almas menos avisadas.
Na essência,
esperança é atributo das
almas que lutam e
esperam sempre pelo
melhor. Pondera o
Espírito Irmão José, na
obra Senhor e Mestre,
que “A esperança
é o alento da Vida”.
Desse modo,
conjecturamos que sem
esperança a vida se
extinguiria, pois não
teríamos vontade de
superar os duros
desafios da existência.
Posto isto, acreditamos
que o momento vivido –
repleto de provas e
experiências dolorosas -
é oportuno para
resgatarmos o tema.
Embora os dicionários
tratem basicamente
esperança e fé como
sinônimas, os
mentores espirituais
fazem clara distinção
entre os dois termos.
Por exemplo, o Espírito
Emmanuel, na obra
Vinha de Luz,
observa que “Nem
todos conseguem, por
enquanto, o voo sublime
da fé, mas a força da
esperança é tesouro
comum”.
Além disso, na resposta
dada à questão no. 257
do livro O Consolador
somos informados pelo
mesmo mentor espiritual
que “A esperança é a
filha direta da fé.
Ambas estão uma para
outra, como a luz
reflexa dos planetas
está para a luz central
e positiva do Sol”.
Ele ainda acrescenta o
seguinte: “A
Esperança é como o luar
que se constitui dos
bálsamos da crença. A Fé
é a divina claridade da
certeza”.
Por outro lado,
renomados cientistas
sociais também têm se
dedicado ao estudo desse
tópico. O acadêmico
Louis W. Fry, respeitado
pesquisador dos temas
espiritualidade e
liderança, argumenta que
a esperança constitui-se
de um desejo com ardente
expectativa de
realização. Na sua
opinião, pessoas
portadoras de esperança
e fé têm uma clara visão
para onde estão indo e
como chegarão lá.
Para Fred Luthans e
Carolyn M. Youssef,
referências na área do
estudo do comportamento
organizacional positivo,
um dos mecanismos-chave
da esperança é o
senso de agência
(isto é, a capacidade de
agir e de se desincumbir
de uma tarefa) ou o
chamado controle
internalizado que cria a
determinação e a
motivação para a
realização de metas. Por
fim, C.R. Snyder e seus
colegas - cientistas
devotados ao estudo da
psicologia positiva -
propõem que a esperança
serve de direção às
emoções e bem-estar das
pessoas.
Portanto, torna-se
perceptível que
esperança é apanágio das
pessoas otimistas; das
pessoas que possuem uma
visão positiva da vida;
das pessoas, enfim, que
têm metas e objetivos. A
esperança pode ser
considerada também como
uma espécie de energia
ou, melhor ainda, de
energia superior, pois,
conforme observa
Emmanuel:
“... vem de cima, à
maneira do Sol que
ilumina do alto e
alimenta as sementeiras
novas, desperta
propósitos diferentes,
cria modificações
redentoras e descerra
visões mais altas”.
Nesse sentido, para nós
espíritas ou
simpatizantes da
doutrina, a virtude da
esperança sugere
despertamento – e, por
extensão, alento - para
outras importantes
questões da vida, tais
como:
– a imortalidade da
alma;
– a confiança de que não
perdemos os nossos entes
amados que já se foram;
– a certeza de que o
amanhã será melhor do
que hoje;
– a compreensão de que
um dia atingiremos a
perfeição;
– a confiança de que,
por mais dolorosa que
seja a atual encarnação,
ela é passageira
(precisamos dessa
experiência para
avançar);
– a convicção, enfim, de
que não estamos
sozinhos; e,
– a certeza de que
retornaremos um dia à
pátria espiritual em
melhores condições.
Irmão José sugere, por
sua vez, alguns
conselhos práticos que
merecem a nossa
reflexão. Assim sendo,
se temos por objetivo
sermos espiritualmente
melhores, então devemos
“Não nos desviarmos
da trajetória traçada,
no que buscamos
alcançar”. Os
pressupostos são agir
sempre com disciplina,
coerência e força de
vontade. Para ele,
“Haja o que houver, não
devemos enveredar por
nenhum atalho”.
Aliás, não existe tal
possibilidade em se
tratando das coisas da
alma. Por isso,
consideramos que alguns
pilares são
imprescindíveis, ou
seja: o hábito do estudo
do Evangelho no Lar,
leituras edificantes,
meditação, oração e
trabalho constante no
bem.
O citado mentor nos
aconselha a “Fugirmos
a qualquer facilidade
aparente”. Desse
modo, devemos redobrar a
nossa atenção,
desconfiarmos das
promessas vãs e
ativarmos a consciência
no mais alto grau do que
somos capazes. Na
verdade, facilidades e
avanço espiritual são
coisas incompatíveis. No
mesmo sentido, Irmão
José também nos alerta a
não pensarmos em
“economia de suor”. Tal
recomendação, portanto,
nos remete ao
indelegável esforço
próprio, à
autodeterminação e ao
desenvolvimento da
paciência e da caridade.
Com efeito, já dizia
Allan Kardec que, sem a
caridade, não existiria
salvação, ou
ainda Jesus: “Se
alguém quiser vir após
mim, negue-se a si
mesmo, e tome a sua
cruz, e siga-me”.
(Marcos, 8: 34.)
Irmão José analisa que
as “pedras do caminho
podem representar
escoras para os nossos
pés”. De fato, não
há como negar que elas
nos acordam para a
realidade, bem como nos
dão experiência e
sabedoria, quando bem
interpretadas. Tal
conclusão nos faz
recordar de uma recente
entrevista do ator
Michael J. Fox, que
sofre do Mal de
Parkinson, na qual
ele declarou que
aprendera a ser humilde.
Ele igualmente admitiu,
entre outras coisas,
que: “À
medida que minha saúde
se deteriora, minha
condição mental e
espiritual melhora.
Estou muito mais feliz
em relação a certas
coisas do que quando era
mais jovem. Sou mais
tolerante, tenho mais
entusiasmo e compaixão
[...]”.
Por fim, Irmão José nos
alerta para nunca
tirarmos a esperança de
alguém, mesmo porque
nada sabemos em relação
ao futuro. Nesse
sentido, o tema ora sob
apreço nos faz recordar
de um episódio relativo
ao Sermão do Monte,
brilhantemente narrado
pelo Espírito Humberto
de Campos, na obra
Boa Nova.
Ao que nos consta, o
Sermão do Monte
constitui o mais
profundo hino de
esperança legado à
humanidade.
Resumidamente, conforme
relata o benfeitor, um
pequeno grupo de
necessitados procurou
Levi – mais conhecido
como o apóstolo Matheus
– na sua confortável
residência logo no
início do apostolado.
Manifestaram-lhe
sincero desejo de
entender o Evangelho e,
assim, “trabalharem
com mais acerto na
observância dos
ensinamentos do Cristo”.
Entretanto, foram
recebidos com certa
estranheza pelo apóstolo
que, em certo momento,
lhes indagou friamente:
“Que poderás realizar,
Lisandro, aleijado como
és?! E tu, Áquila, não
foste abandonado pela
própria família, sob o
peso de sérias
acusações? E tu, Pafos?
Acaso edificarias alguma
coisa nas tuas atuais
aflições?”
Humberto de Campos
esclarece que
aquelas almas sofridas
“... entreolharam-se
cabisbaixos, humilhados.
Somente então chegavam a
reconhecer as suas
penosas deficiências
[...]”. Na verdade,
a palavra rude de Levi,
além de os despertar,
lhes trouxera uma dor
terrível no fulcro da
alma. Achavam-se
embalados pelas
pregações carinhosas de
Jesus e acreditavam que
“... seu amor viera
buscar todos os que se
encontrassem em tristeza
e em angústias do
coração [...]”.
Graças
ao Mestre “... haviam
experimentado a
restauração de todas as
energias”. Mais
ainda: “Jubilosos,
guardavam as suas
promessas, relativamente
ao Pai justo e bom, que
amava os filhos
infelizes, renovando nos
corações as esperanças
mais puras [...]”.
Não obstante o fato de
se encontrarem exaustos,
“... a lição de Jesus
lhes trouxera novo
consolo às almas
desamparadas de qualquer
conforto material”.
No entanto, como o
Mestre pregaria no
famoso monte, naquela
mesma tarde, acalentaram
a possibilidade de lhe
ouvirem os ensinamentos
de que tanto careciam.
Decorrido algum tempo,
Jesus acompanhado de
André adentrou a casa do
coletor de impostos e os
três puseram-se a
conversar animadamente.
Levi relatou, de maneira
quase pueril, o fato
ocorrido minutos antes.
Em dado momento, expôs
com franqueza que não
via como os aleijados e
mendigos poderiam
contribuir para a
edificação do Evangelho.
Mas Jesus - que nunca
perdia oportunidade de
ensinar - falhou-lhe
brandamente:
“No entanto, Levi,
precisamos amar e
aceitar a preciosa
colaboração dos vencidos
do mundo!... Se o
Evangelho é Boa Nova,
como não há de ser a
mensagem divina para
eles, tristes e
deserdados na imensa
família humana? Os
vencedores da Terra não
necessitam de boas
notícias. Nas derrotas
da sorte, as criaturas
ouvem mais alto a voz de
Deus [...]. Já
observaste algum
vencedor do mundo com
mais alta preocupação do
que a de defender o
fruto de sua vitória
material?”
Levi sentia-se tomado de
grande emoção e, desse
modo, tentou se
justificar. No entanto,
Jesus esclareceu-lhe
quanto à necessidade de
se dar atenção aos
brandos, humildes e
vencidos, explicando que
era para os seus
corações que Deus
enviava “bênçãos de
infinita bondade”. E
para que ficasse mais
claro o seu ensinamento
argumentou: “Esses
quebraram os elos mais
fortes que os
acorrentavam às ilusões
e marcham para o
infinito do amor e da
sabedoria”. Jesus
concluiu concitando o
apóstolo quanto ao
imperativo de se amar
mais intensamente os
infelizes e
desafortunados do mundo,
pois através de suas
lágrimas e esperanças
mais ardentes o
Evangelho desabrocharia.
Feitas as sublimes
ponderações, os
apóstolos sentiam-se
muito emocionados. No
entanto, com a chegada
de Tiago, João e Pedro,
todo o grupo se dirigiu
para o referido monte,
onde o Mestre pretendia
pregar.
Lá chegando, diante de
centenas de olhares
sequiosos e alegres, o
Mestre iniciou a sua
pregação, deixando
entrever “... que
se dirigia aos
vencidos e sofredores do
mundo inteiro e, como
esclarecendo o Espírito
de Levi, que
representava a
aristocracia intelectual
entre os seus
discípulos..., Jesus,
pela 1ª vez, pregou as
bem-aventuranças
celestiais [...]”.
Esclarece Humberto de
Campos que a voz de
Jesus ecoava como uma
espécie de “bálsamo
terno” a cair sobre
aqueles corações tão
sofridos. Assim
sendo, uma a uma as
bem-aventuranças foram
proferidas. Conforme o
mentor espiritual,
durante muito tempo
Jesus “... falou do
Reino de Deus, onde o
amor edificaria
maravilhas perenes e
sublimadas [...]”.
Ao terminar a sua
exposição, as
estrelas já brilhavam no
firmamento e um
emocionante
congraçamento se
estabeleceu entre ele e
aquelas almas
necessitadas. Em
consequência do
ensinamento, Levi, por
sua vez, “... sentiu
que, naquele crepúsculo
inolvidável, uma emoção
diferente lhe dominava a
alma [...]”. Mais
especificamente,
compreendera a
necessidade de se
despojar das ilusões do
mundo para se elevar a
Deus.
Nesse ínterim, reparou
que os “... pobres
amigos que o visitaram à
tarde desciam o monte,
abraçados, com uma
expressão de grande
ventura, como se os
animasse em júbilo sem
limite”.
Deles se aproxima
saudando-os com imensa
alegria, demonstrando
ter aprendido a lição
momentos antes ensinada.
Conta ainda Humberto de
Campos que, no dia
seguinte, o ex-publicano
abriu as portas de sua
casa a todos os convivas
daquele crepúsculo
memorável. Jesus
participou da festa,
chegando a partir o pão
e se alegrar com eles e,
quando notou Levi
abraçando o deficiente
físico Lisandro, “...
com a sinceridade de sua
alma fiel”,
enternecido, assim se
expressou: “Levi, meu
coração se rejubila hoje
contigo, porque são
também bem-aventurados
todos os que ouvem e
compreendem a palavra de
Deus!...”
Concluindo, Emmanuel
sugere, com sabedoria,
para que
“Levantemo-nos e
prossigamos, convictos
de que o Senhor nos
ofereceu a luz da
esperança, a fim de
acendermos em nós mesmos
a luz da santificação
espiritual”.
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