MARCUS
VINICIUS DE AZEVEDO
BRAGA
acervobraga@gmail.com
Guará II, Distrito
Federal (Brasil)
A Casa espírita roubou
meu pai...
(...) de mim. Acalme-se,
prezado leitor. Não
estamos falando de
nenhum crime, à luz do
Código Penal, cometido
nas dependências de
nossos templos
religiosos. Estamos,
sim, verbalizando o
sentimento, que
percebemos ao longo de
nossa vida como
evangelizador, presente
em muitos jovens, filhos
de trabalhadores da casa
espírita.
Por vezes o indivíduo
dedica-se às tarefas da
casa e da causa, com
afinco e determinação,
privando cronicamente a
sua família do convívio,
por força de seus
inúmeros compromissos.
Além das demandas
profissionais, arvora-se
a encontrar no templo
espírita seu segundo
emprego, com chefe,
cargos, horários e
metas.
É alçado assim à
condição de
“trabalhador”, como se
fosse um nível
hierárquico acima do
“frequentador”, como se
a ele coubesse uma
atribuição especial,
acima dos outros.
Quantos jogos de poder e
de orgulho se escondem
nessas construções?
Quando constituímos uma
família, abraçamos ali
responsabilidades
afetivas que demandam
tempo, tempo de
conviver, de conversar,
de sermos amigos e
irmãos e por que não,
para o lazer. É
fundamental o lazer em
família, darmos
gargalhadas, brincarmos.
Esses momentos marcam a
história de nossos
filhos, que nos veem
como seus pais, únicos
para eles.
Quando abraçamos
diversas
responsabilidades na
Casa espírita, lembremos
que não nos cabe fazer
tudo. Por vezes, na
busca do evento
perfeito, sequiosos de
cargos e não de
encargos, relembrando o
velho Chico Xavier, nos
atolamos de atribuições,
muitas delas
burocráticas,
constituindo a vivência
espírita um fardo, um
segundo emprego,
estressante. Esquecemos
que esse trabalho todo
só terá valor se tiver
reflexos na reforma
íntima do trabalhador.
Essa ausência
prolongada, com causa
identificada, pode
alimentar no jovem uma
aversão à casa espírita,
vendo ali a fonte de
afastamento de seus
pais, como um protesto
por aquela situação, em
uma atitude típica da
juventude. Isso pode se
refletir na falta do
desejo de ir à casa
espírita, na falta de
envolvimento com as
atividades da casa ou
até na aversão completa.
Em hipótese nenhuma
estou fazendo uma
apologia à preguiça ou
pregando que não
venhamos a trabalhar na
seara do bem. Pelo
contrário, o que nos
deve chamar a atenção é
a motivação desse
trabalho, essa ansiedade
centralizadora de fazer
tudo, às vezes à nossa
maneira, e, pelo
discurso da perfeição,
abandonar o convívio dos
nossos, afogados de
atribuições.
A religião é uma
ferramenta de nosso
crescimento espiritual,
tão valiosa quanto é a
família. Esses
institutos não devem
concorrer entre si e sim
cooperar. Temos de ter
tempo de lazer, de
conviver com nossos
filhos, de conversar.
Temos de ter tempo para
o trabalho no bem. As
tarefas da casa espírita
devem crescer com a
adesão do grupo e não de
uns poucos que se matam
para fazer as coisas. Se
assim for, a casa não
está envolvendo as
pessoas e nos vemos nas
antigas armadilhas do
personalismo e do
perfeccionismo.
No livro Conduta
Espírita, o Espírito
André Luiz afirma que:
“Acima de todas as
injunções e
contingências de cada
dia, conservar a
fidelidade aos preceitos
espíritas cristãos,
sendo cônjuge generoso e
melhor pai, filho
dedicado e companheiro
benevolente”.
Relembrando o nosso
dever em todos os planos
e não apenas no
religioso. Esse modelo
de dedicação intensa à
religião, principalmente
no plano formal, já
existiu no mundo e
constatamos pela
história que ele não dá
certo.
No mesmo livro, André
Luiz assevera:
“Situar em posições
distintas as próprias
tarefas diante da
família e da profissão,
da Doutrina que abraça e
da coletividade a que
deve servir, atendendo a
todas as obrigações com
o necessário
equilíbrio”.
Apontado o equilíbrio
como a tônica de tudo.
Se tens família, se tens
filhos, deves dedicar a
eles um tempo, não como
obrigação de um dever,
mas como momento de amor
e de comunhão com esses
Espíritos, dádivas nessa
tua encarnação. Não te
permitas ser roubado por
múltiplas atribuições na
casa, pela perfeição dos
eventos, das
instalações, dos
documentos, em um novo
emprego oriundo dessa
visão empresarial de
gerir a casa espírita.
Pensemos na qualidade e
não na quantidade. Não
seremos questionados
pelo muito que fizemos
quando chegarmos ao lado
de lá, e sim pelo como
fizemos...