CHRISTINA NUNES
cfqsda@yahoo.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
Simplesmente
vida!
Imagine uma
situação
hipotética na
qual sentimos
sede por um
período dilatado
demais, sem
conseguir beber
água. Se de
súbito nos
deparamos com um
manancial
abundante do
precioso
líquido, há que
se beber com
parcimônia – sob
o risco de
engasgar ou
afogar, se
simplesmente
mergulhar,
sôfregos, num
tanque
transbordante da
linfa fresca da
qual tanto
ansiávamos, não?
Coisa semelhante
acontece em
muitas situações
de retorno às
múltiplas
dimensões
extrafísicas,
depois do
período mais ou
menos extenso no
qual toda a
identificação se
confinou no
nosso dia-a-dia
material
terreno. Todos
os temos.
Horários e
compromissos.
Pessoas caras à
nossa estima,
que se
constituíram no
lume em torno do
qual girávamos
como girassóis
humanos,
constituindo-se
todas estas
coisas,
aparentemente,
no cerne
mesmo do nosso
ser!
Natural que, num
primeiro
momento, nos
sintamos sem
chão. Que fazer,
pois, desta
súbita, ampla e
irrestrita
liberdade -
deparando a
fonte vital
primeva, a
continuidade
pura e simples?
A mais patente
condição de
eternidade na
qual todos
estamos
mergulhados –
embora aqui, na
materialidade,
habitualmente
nos situemos em
estado crítico
de inconsciência
destas
realidades
definitivas?
Noutro dia, em
estado
semiprojetivo,
fui reportada a
um destes
momentos em
companhia de meu
mentor e de
outros afetos
deste Mundo
Maior; uma
condição de
lembrança vaga
do que foi
sentido e
experimentado.
Algo do que era
visto, dito,
ouvido e
instruído.
Olhava em volta,
para todos os
cenários, luzes
e cores
perolados –
indescritíveis
com exatidão
verbal aqui,
onde nos
situamos
transitoriamente
– e indagava de
mim mesma o que
fazer.
A angústia
momentânea pode
vir a ser fator
quase inevitável
a ser
experimentado.
Onde os que nos
ocuparam
integralmente, e
de maneira mais
imediata, o
coração e os
pensamentos, e
em relação aos
quais foram
nutridos todos
os nossos mais
bem-intencionados
cuidados e
zelos? Onde as
atividades
rotineiras,
quase
automáticas,
levadas a cabo
numa extensão
muitas vezes
longa de anos,
pelo menos,
segundo a nossa
percepção
esfacelada de
consciência?
Onde os fatores
de lazer e de
distração?
Preferências,
rejeições
particulares por
isto, ou por
este, ou por
aquilo, neste
despertar
definitivo no
estado redivivo
da existência,
embaçam, e quase
que se veem
dolorosamente
destituídos de
sentido –
extirpados de
nós a pulso,
neste puro,
simples e ao
mesmo tempo
renovado
continuar.
Subiam à tona
destas imagens,
por entre
névoas, as
perguntas: que
fazer agora? Num
lugar de beleza
inimaginável,
rodeada de
companhias
amigas e de
afetos
inestimáveis,
nada obstante, a
sensação de
perda e de
angústia se
fazia
inquestionável!
A falta dolorida
dos que deixamos
para trás nas
lutas corpóreas;
as preocupações
vívidas e
inarredáveis
sobre o seu
estado e o modo
como
continuariam,
sem a nossa
participação
assídua no
contexto de suas
jornadas
materiais! O
aconchego tão
presente e
familiar do lar,
dos detalhes;
dos cômodos, dos
cheiros, risos e
novidades
diárias. O
trabalho, as
atividades
cotidianas...
Onde fica tudo,
num tal contexto
de modificação
vital tão
radical, a
aguardar todos
nós, mais ou
menos à frente?
Nesta hora, o
amparo dos
mentores, amigos
e familiares
espirituais, bem
como o bom
hábito de quem
já se fez
afeiçoar ao
estado elevado
de prece e de
conexão com as
energias
depuradas e
sedativas da
Vida, se fazem
inestimáveis –
arrisco mesmo,
imprescindíveis
– em tal
conjuntura
delicada!
Afinal, é o
momento de se
reencontrar e de
prosseguir.
Instante supremo
de identificação
de nós mesmos
naquela verdade
maior e suprema
da existência,
com vistas a se
estabelecer
outros rumos e
um sentido mais
amplo, mais
autêntico, que
nos oriente os
passos nos
próximos
caminhos.
Voltamos para o
lugar de onde
viemos – melhor
dizendo, de
onde, em
verdade, nunca
nos distanciamos
em espírito,
somente que em
memória;
reencontramos
todos aqueles
afetos tão
importantes
quanto os que
ficaram na
retaguarda da
materialidade,
apenas que
esquecidos –
felizes com o
nosso retorno, e
em poderem nos
auxiliar na
adaptação de
volta ao lar! Ao
mais genuíno e
autêntico Lar!
E aos poucos
recobramos nossa
capacidade de
análise mais
acurada;
delicada e
progressivamente.
Sem
sobressaltos, e
bem conduzidos
pelo amor e
carinho destes
que tão
desveladamente
nos recebem!
Como desprezar
nossa realidade
maior? Como
ignorar que
prosseguir é a
opção única e
definitiva, só
dependendo de
nós mesmos a
aceitação desta
verdade de um
modo mais sábio,
sereno, sem nos
entregarmos a
estados de
perturbação e de
descontrole
emocional que em
nada nos
auxiliarão no
progresso
bem-sucedido de
nossas
vivências, em
qualquer lugar
onde a Vida nos
situe?
"Vive com
moderação as
tuas horas,
tendo em conta
que és imortal"
– diz um adágio
anônimo.
– Que farei
agora? – devo
ter articulado,
em confusa
perplexidade
naquele estágio
já tantas vezes
vivenciado de
ressurreição de
mim mesma. –
Onde as
referências às
quais estava
habituada? Os
que tanto
estimo, e que
não sei agora em
que estado se
acham, nem como
reagirão à nova
condição de
minha ausência?!
A sensação
deveria ser de
completo
desnorteamento,
de falta de
chão. Mas aquele
mentor tranquilo
e fiel, que
sempre esteve ao
meu lado – como
os possuem todos
vocês, queridos
leitores,
ciceroneando da
invisibilidade
as etapas de sua
jornada física,
sem nenhuma
sombra de
dúvidas –,
também ali,
naquele instante
de suprema
insegurança e
perturbação,
ainda daquela
feita não me
abandonaria sem
uma palavra de
inspiração; sem
uma atitude
segura e terna
que me ajudasse
a restabelecer a
certeza de que
nunca nos
achamos sós em
nossas
caminhadas
incessantes
dentro do eterno
presente apenas
insinuado em
luzes, sons e
cores
diversificadas,
na marcha
inexorável
quanto ilusória
dos minutos.
– O que você vê
em você mesma,
em mim, e em
volta, minha
querida? Não se
assemelha, em
linhas gerais,
ao que via
durante todo o
tempo também por
lá, na estadia
material? Não é
Vida –
simplesmente
Vida – o que
você, ainda
agora, vê e
sente em nós
mesmos, como em
tudo o que nos
cerca?
Ele sorria com
serenidade, como
lhe era usual, o
olhar brilhante
e profundo ao
dizer-me estas
verdades
singelas – como
alguém que busca
despertar
suavemente uma
criança em
sobressalto
depois de um
período extenso
de sono
profundo.
Devo ter
assentido em
ouvindo aquilo,
vagueando um
olhar, talvez
embaciado por
lágrimas mistas
de angústia com
encantamento,
pelos cenários
luminosos e
indescritíveis
ao derredor.
– Então, apenas
continuemos: com
calma e sem
pressa, porque
cada tempo e
lugar é um
aprendizado novo
e único, como
nos primeiros
dias em que, sob
os amorosos
cuidados
maternos, ainda
uma vez
reaprendeste,
criança, a
andar! – e,
tomando-me por
uma das mãos,
enquanto me
rodeavam outros
rostos felizes,
cheios de
entusiasmo,
olhos
rebrilhando de
pura alegria de
viver. – Venha
conosco! Vamos
conhecer e
reconhecer tudo
de bom que a
espera na nossa
– na sua! –
antiga, eterna e
bela morada,
presente
inestimável do
Criador, a
qualquer tempo,
para cada um de
nós!...
E tudo se foi
diluindo em meio
às brumas
alvinitentes –
nós, a
diamantina visão
maravilhosa!
Portal que
temporariamente
se fechava,
magnífico, sobre
a paisagem
excelsa! A
promessa de luz!
O sonho verídico
do qual,
reconfortada,
gradativamente
despertei!