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Estudando as obras de Kardec
Ano 4 - N° 188 - 12 de Dezembro de 2010

ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@oconsolador.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)
 

A Revue Spirite de 1868

Allan Kardec 

(Parte 1)

Iniciamos esta edição o estudo da Revue Spirite correspondente ao ano de 1868. O texto condensado do volume citado será aqui apresentado com base na tradução de Júlio Abreu Filho publicada pela EDICEL.

Questões preliminares

A. Quais os princípios do Espiritismo mais facilmente aceitos?

Segundo Kardec, são a pluralidade dos mundos habitados e a reencarnação. O primeiro reúne adeptos até mesmo no seio do materialismo. O segundo está no estado de intuição numa porção de indivíduos, nos quais é uma crença inata. Essa crença tende, pois, a se vulgarizar cada vez mais, com o que o Espiritismo só tem a ganhar em termos de adeptos. (Revue Spirite de 1868, pp. 4 e 5.)

B. O abade Poussin, em sua obra sobre o Espiritismo, reconhece dois fatos positivos por ele atribuídos à doutrina espírita. Quais são esses fatos:

O primeiro: O Espiritismo envolve, como numa imensa rede, a sociedade inteira. O segundo: Ele prestou à Igreja o serviço de derrubar as teorias materialistas do século 18. As consequências desses dois fatos são comentadas por Kardec na Revue. (Obra citada, pp. 7 a 13.)

C. Que ideias contidas no livro do abade Poussin fortalecem o Espiritismo?

Na Revue Kardec menciona estas ideias: 1. A crença nos Espíritos e sua intervenção no domínio de nossa vida remontam à mais alta antiguidade. 2. Deus fez os Espíritos seus embaixadores, diz o salmista. São os ministros de Deus, diz São Paulo. 3. Cada ser vivo neste mundo tem um anjo que o dirige, ensina Santo Agostinho. 4. O fato mais interessante e mais autêntico da história é a evocação de Samuel por uma pitonisa de Endor, a pedido do rei Saul. A médium que atendeu Saul disse, depois do episódio: “Eis que há quarenta anos faço profissão de evocar os mortos a serviço de estranhos; mas jamais vi semelhante aparição”. 5. O Eclesiástico, reportando-se ao fato, prova que ocorreu ali uma verdadeira aparição, e não uma alucinação de Saul. (Obra citada, pp. 13 a 17.)

Texto para leitura 

1. O ano de 1867 foi, como havia sido previsto pelos Espíritos, muito proveitoso para o Espiritismo. Diversas obras popularizaram na França os seus princípios. O número de reuniões particulares, ou de família, cresceu em grande proporção. As ideias espíritas se infiltraram por uma porção de brechas. Dizendo isso, Kardec adverte que estava, porém, distante o dia em que todas as prevenções erguidas contra a Doutrina seriam postas abaixo, o que exigiria tempo. Cada espírita deveria, pois, trabalhar e fazer a sua parte, sem desânimo com a pouca importância do resultado obtido individualmente, certo de que com o acúmulo de grãos de areia se pode formar uma montanha. (Págs. 1 e 2.)

2. Os princípios do Espiritismo mais facilmente aceitos, diz o Codificador, são a pluralidade dos mundos habitados e a reencarnação. O primeiro reúne adeptos até mesmo no seio do materialismo. O segundo está no estado de intuição numa porção de indivíduos, nos quais é uma crença inata. Trata-se de uma ideia que sorri a muitos incrédulos, porque aí eles encontram imediatamente a solução de muitas dificuldades que os levaram à dúvida. Essa crença tende, pois, a se vulgarizar cada vez mais, com o que o Espiritismo só tem a ganhar em termos de adeptos. O futuro do Espiritismo, sem contradita, está assegurado; é preciso ser cego para disso duvidar; mas, adverte Kardec, os seus piores dias ainda não passaram e muitos desafios virão pela frente. (Págs. 4 e 5.)

3. A Revue analisa o livro que o abade Poussin, professor no Seminário de Nice, escreveu sobre o Espiritismo, sua origem, natureza, certeza e perigos. Trata-se de uma obra de refutação do Espiritismo do ponto de vista católico. A primeira parte do livro é consagrada ao histórico do Espiritismo na Antiguidade e na Idade Média. A segunda parte é dedicada à parte doutrinária. O abade não contesta nenhum dos fenômenos espíritas, mas conclui que esses fatos são miraculosos e de fonte divina em certos casos, e diabólicos em outros. Na visão do abade Poussin, o Espiritismo “esforça-se por minar surdamente a Igreja católica”. (Págs. 5 a 7.)

4. Embora seu propósito fosse denegrir e não enaltecer o Espiritismo, o abade Poussin reconhece em sua obra duas coisas: 1a – Que o Espiritismo envolve, como numa imensa rede, a sociedade inteira. 2a – Que prestou à Igreja o serviço de derrubar as teorias materialistas do século 18. As consequências desses dois fatos são comentadas por Kardec, que faz a respeito as seguintes observações: I – Os espiritistas, em grande maioria, são recrutados entre os incrédulos. II – Os espíritas não creem nos demônios nem nas chamas do inferno, mas acreditam firmemente em um Deus soberanamente justo e bom e entendem que o mal não provém do Pai, fonte de todo o bem, nem dos demônios, mas das próprias imperfeições do homem; que o homem se reforma e que, por fim, vencer-se a si mesmo é vencer o demônio. III – Tal é a fé dos espíritas, e a prova de sua força é que se esforçam por tornar-se melhores, dominar suas inclinações más e pôr em prática as máximas do Cristo, olhando todos os homens como irmãos, perdoando aos inimigos e fazendo o bem pelo mal, a exemplo do Mestre. IV – O Espiritismo não buscou os que tinham fé e a quem esta bastava, mas sim aqueles a quem a fé faltava. Como Jesus, ele foi aos doentes e não aos sãos, aos famintos e não aos saciados. V – Que foi que fez para os trazer a si? Reclames, anúncios, pregação em praça pública? Violentou as consciências? Absolutamente, porque esses são os meios da fraqueza e ele tem como regra invariável não constranger ninguém, respeitar todas as convicções. VI – Os que dizem que tais coisas são obra de Satã devem lembrar-se da resposta que o Cristo deu aos fariseus, que o acusavam de curar os doentes e expulsar os demônios com a ajuda destes. VII – Como dizia monsenhor Frayssinous em suas conferências sobre religião, um demônio que procurasse destruir o reino do vício para estabelecer o da virtude “seria um demônio esquisito, porque se destruiria a si próprio”. (Págs. 7 a 12.)

5. Concluindo seus comentários e antes de transcrever alguns fragmentos da obra do Sr. Poussin, o Codificador asseverou: “O Espiritismo não teme a luz; ele a chama sobre suas doutrinas, porque quer ser aceito livremente e pela razão. Longe de temer para a fé dos espíritas a leitura de obras que o combatem, ele lhes diz: Lede tudo; pró e contra, e escolhei com conhecimento de causa”. (Pág. 13.)

6. Das ideias defendidas pelo abade Poussin destacamos os pontos seguintes: I – Negar o demônio é negar o Cristianismo e negar Deus. II – A crença nos Espíritos e sua intervenção no domínio de nossa vida remontam à mais alta antiguidade. III – Deus fez os Espíritos seus embaixadores, diz o salmista. São os ministros de Deus, diz São Paulo. IV – Cada ser vivo neste mundo tem um anjo que o dirige, ensina Santo Agostinho. V – O fato mais interessante e mais autêntico da história é a evocação de Samuel por uma pitonisa de Endor, a pedido do rei Saul. VI – A médium que atendeu Saul disse, depois do episódio: “Eis que há quarenta anos faço profissão de evocar os mortos a serviço de estranhos; mas jamais vi semelhante aparição”. VII – O Eclesiástico, reportando-se ao fato, prova que ocorreu ali uma verdadeira aparição, e não uma alucinação de Saul. (Págs. 13 a 17.)

7. Entre as curiosidades atraídas pela Exposição de Paris, uma das mais estranhas foi a dos exercícios executados pelos árabes da tribo dos Aïssaouá. O Petit Journal, de 30/9/1867, relatou uma dessas sessões, referida igualmente pela Revue. Os Aïssaouá, diz a reportagem, formavam uma seita religiosa muito espalhada na África, sobretudo na Argélia. O que se viu em Paris assustou a todos, e com inteira razão. Eis alguns dos fatos relatados pela imprensa: I – Um árabe tomou um carvão ardente e o pôs na boca. II – A um outro deram um pedaço de vidro para comer; ele o tomou e engoliu por inteiro. III – Outro árabe trouxe na mão um cacto de espinhos compridos; cada aspereza da folhagem era como uma ponta acerada. O árabe comeu a folhagem picante, como comeríamos uma salada de alface. IV – Dez serpentes saíam de um cesto; um árabe lhes fez um agrado e as fez enrolar em redor de seu corpo. Depois escolheu a maior e com os dentes mordeu e lhe arrancou a cauda; em seguida, com uma dentada, arrancou a cabeça da serpente e a comeu. (Págs. 18 a 21.)

8. Encerrando o assunto e sem aventar para os fatos qualquer explicação, Kardec promete examiná-los oportunamente. “Quem sabe se o Espiritismo, que já nos deu a chave de tantas coisas incompreendidas, não nos dará ainda esta? É o que examinaremos num próximo artigo”, disse o Codificador do Espiritismo. (Pág. 22.)

9. Um interessante caso de premonição, verificado em Marennes, é relatado pela Revue. Seis meses antes do falecimento de seu pai, a sra. Angelina de Ogé teve o pressentimento e todas as sensações de que tal fato se daria. Kardec comenta a notícia e reproduz comunicação dada na Sociedade Espírita de Paris sobre o episódio. O Espírito do pai tinha, em estado de desprendimento, conhecimento antecipado de sua morte e da maneira por que ela se realizaria. Foi ele próprio quem se manifestou à filha, seis meses antes, nas condições que deviam se produzir, para que, mais tarde, ela soubesse que era ele e, estando preparada, não ficasse surpreendida com sua partida. Angelina tinha também, como Espírito, ciência do que iria ocorrer. Foi isso que lhe deu a intuição de que alguém deveria morrer nas condições por ela referidas na carta enviada a Kardec. (Págs. 23 a 26.)

10. Segundo o Siècle de 29/4/1867, reproduzindo notícia publicada pelo Observateur, de Avesnes, um operário chamado Magnan, de 23 anos, desenterrou o cadáver de sua mulher, cuja morte ele não aceitara de forma alguma. Haviam-se passado 17 dias desde o óbito e, não obstante, o corpo se achava em perfeito estado de conservação. Convencido por seus amigos a sepultar novamente o cadáver, ele o recolocou na sepultura, mas, no dia seguinte, dizia não se lembrar do que fizera na véspera. Acreditava tão-somente que sua mulher o visitara durante a noite. (Págs. 26 e 27.)

11. Comunicação dada na Sociedade Espírita de Paris em 10/5/1867, por intermédio do Sr. Morin, revelou a causa do curioso episódio. Quando a mulher morreu, ela ali permanecera em espírito. Como o casamento dos fluidos espirituais e dos fluidos do corpo era difícil de romper, em razão da inferioridade do Espírito, foi-lhe preciso um certo tempo para retomar a liberdade de ação. Depois, quando pôde, ela apoderou-se do corpo do homem e o possuiu, produzindo-se então um verdadeiro caso de possessão. Fora ela quem levou o marido a fazer o que ela queria, para vê-lo sofrer. Em uma anterior existência cometeu-se um crime. Aquele episódio foi apenas o começo de um processo de vingança que ainda prosseguiria. Ela prometera voltar e voltou, e voltaria outras vezes. (Págs. 28 e 29.)

12. O último livro de Kardec: A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo, foi afinal posto à venda a 6 de janeiro de 1868. Ao dar essa notícia, a Revue reproduziu a tábua das matérias que compõem os dezoito capítulos da obra. Desses, doze tratam da Gênese segundo o Espiritismo, três focalizam os Milagres e três cuidam das Predições. (Págs. 30 a 32.)

13. Um longo artigo sobre alucinação e inspiração abre a Revue  de fevereiro de 1868. Trata-se de um dos manuscritos obtidos mediunicamente pelo jovem médium bretão que confiara ao Sr. Bonnemère o texto do Roman de l’Avenir (Romance do Futuro), referido na Revue  de 1867. (Págs. 33 a 42.)

14. Do artigo citado transcrevemos os pontos adiante resumidos: I – A alucinação é um estado provocado por uma causa moral que influi sobre o físico e à qual se mostram mais acessíveis as naturezas nervosas. II – A alucinação, por um pequeno lado, toca a loucura, como todas as superexcitações cerebrais. III - Enquanto o delírio se expressa sobretudo em palavras incoerentes, a alucinação representa mais particularmente a ação, a encenação. IV – Presa de uma espécie de febre interior, o alucinado vive em meio ao mundo imaginário que sua imaginação perturbada cria. V – Essas visões fantásticas existem para ele; ele as vê, as toca e se amedronta. VI – A inspiração é mais rara que a alucinação, porque não se deve somente ao estado físico, mas sobretudo à situação moral do indivíduo predisposto a recebê-la. VII – Há tantas categorias de inspiração e de inspirados quantas faculdades existem no cérebro humano para assimilar os diferentes conhecimentos. VIII – Os inspirados são geralmente seres puros, ingênuos e simples, sérios e refletidos, cheios de abnegação e de devotamento, sem personalidade marcante, bastante inteligentes para assimilar os pensamentos alheios, mas não moralmente bastante fortes para os discutir. IX – Por vezes a inspiração é inconsciente de si mesma. Às vezes um médico, ao se aproximar de certos doentes, acha de súbito o remédio que pode curá-los. Não foi a ciência que o guiou; foi a inspiração. X – O que se dá com o médico, pode ocorrer em todos os outros ramos do trabalho humano. Em certas horas o fogo da inspiração nos devora; há que ceder. XI – A inspiração vem indiferentemente de dia, de noite, em vigília ou durante o sono; exige apenas recolhimento. XII – Posto se dirija a todos, a inspiração desce mais geralmente sobre as naturezas doentias ou gastas por uma sucessão de sofrimentos, materiais ou morais. XIII – A alucinação é um estado doentio, que o magnetismo pode modificar de maneira salutar. A inspiração é uma assimilação moral que não se deve provocar com passes magnéticos. XIV – O alucinado entrega-se voluntariamente a arroubos e a contorções ridículas. O inspirado geralmente é calmo. (Págs. 33 a 42.) (Continua no próximo número.)



 


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