Prêmio acumulado
Em razão do
acúmulo do
prêmio da Megasena as
lotéricas
estavam
transbordando de
gente. Todos
ávidos pela
sorte grande,
afinal R$ 80
milhões é
dinheiro para
garantir a tranquilidade
financeira de
muitas gerações.
Minha filha que
caminhava comigo
pelas ruas da
cidade, ao ver a
fila
quilométrica de
pretendentes a
milionário,
questionou-me se
eu também queria
ser um sortudo.
Respondi a ela
que em meu caso
ganhar essa
fortuna não
seria sorte, mas
sim um grande
azar. Intrigada
com a resposta,
quis a garota
saber o motivo.
Então, expliquei
as minhas razões
para não querer
me apoderar da
“bolada”. Disse
que ainda não
tenho
consciência para
lidar com a
facilidade
material e
seria,
indubitavelmente,
colhido pelas
tentações que o
dinheiro
proporciona.
Despenharia no
desfiladeiro dos
vícios
degradantes e
seria
desmoralizado
por mim mesmo,
pelas minhas
próprias
dificuldades.
Não posso,
portanto, me dar
ao luxo de
perseguir uma
fortuna que em
nada me ajudaria
a superar minhas
limitações.
Minha filha
continuou sem
entender, e eu,
para sanar as
dúvidas de seu
coração
adolescente,
prossegui na
digressão
filosófica sobre
as tentações da
riqueza.
Contei-lhe que
presenciei
respeitáveis
pais de família
sendo seduzidos
pelas artimanhas
da moeda e, não
raro,
desviando-se do
seu caminho.
Lembrei-me de
Mané Garrincha,
o mago das
pernas tortas
que foi
ludibriado pelas
facilidades da
vida
embrenhando-se
pelo caminho do
álcool. No final
da existência
estava ele
completamente
dementado física
e psiquicamente
pelos exageros
de todos os
matizes.
Entretanto, não
creia você,
amigo leitor,
que eu faço
apologia à
pobreza. Nada
disso. O
dinheiro abre
muitas portas,
sem dúvida.
Devemos
naturalmente
buscar também o
progresso
material. Apenas
relatei à garota
que a prova da
riqueza material
não é esse mar
de rosas que
muitos pensam.
Aquele que se
apodera de
grande fortuna
assume enorme
responsabilidade
perante a vida:
a de contribuir
para que a
riqueza gere
progresso e
transforme
destinos,
erradicando a
miséria e
extirpando a
ignorância.
Os bens da Terra
são somente
empréstimos de
Deus para
exercitarmos a
inteligência,
solidariedade,
coibir a avareza
e também os
excessos de
todos os graus.
Para o Além não
levaremos ações,
bens materiais
ou qualquer soma
em dinheiro.
Tudo que
acumulamos será
repassado aos
herdeiros em
autêntica troca
de mãos.
Em famílias
deseducadas
quanto aos
objetivos da
existência
humana, essas
fortunas
costumam gerar
dissensões.
Causam
infindáveis
brigas aqui e no
Além, gerando,
inclusive,
processos
obsessivos entre
os envolvidos na
trama.
No livro Por
um fio, o
médico
cancerologista
Dráuzio Varela
narra alguns
dramas dos
pacientes que
estiveram sob
sua tutela. O
fator herança é
em muitos casos
um complicador
por dois
motivos:
1º O moribundo
não quer deixar
seus bens na
Terra;
2º Os parentes
não raro anseiam
a morte do
enfermo para
desfrutar de
suas economias.
Jesus afirmava:
“É mais fácil
um camelo passar
pelo buraco de
uma agulha que
um rico entrar
no Reino dos
Céus".
Naturalmente
referia-se ao
apego às coisas
da matéria em
detrimento aos
valores do
espírito. O
apego às moedas
é um tormento
constante para a
alma. Dia desses
uma amiga
confessou-me que
não faz viagens
para a Europa
para não ter que
pagar a passagem
do marido. Jesus
tinha razão: o
indivíduo
transita por
dúvidas e
dissabores, mas
não abre mão de
sua fortuna ou,
pelo menos,
parte dela. Até
a diversão é
deixada de lado
para não gastar
os tostões.
Pobre coitada!
Priva-se de seus
desejos porque
não quer gastar
com o
companheiro de
20 anos. É uma
escrava do
dinheiro, sem
dúvida.
Por essas e
outras tentações
é que prefiro,
pelo menos
atualmente, não
me aventurar a
fazer um
joguinho. Vai
que o azar está
ao meu lado e eu
me vejo na
obrigação de
administrar
milhões sem a
mínima condição
de fazê-lo.