Impressões
Deodoro da
Fonseca
Volvidos
sessenta e um
anos sobre a
proclamação da
República no
Brasil, não
recordamos o
evento para
lastimar a
audaciosa
apostasia, ante
os princípios
monárquicos,
mesmo porque a
evolução
transita por
sendas
inelutáveis.
Muitos espíritos
comodistas
enxergaram em
nós somente o
pupilo ingrato
do grande
Imperador e nos
cumularam de
sarcasmo e
sofrimento que
nos seguiram até
à morte do
corpo; mas
outros, tanto
quanto nós
mesmos,
conseguiram
reconhecer no
homem pequenino,
que as
circunstâncias
arrebatavam ao
anonimato, o
simples
instrumento do
progresso
renovador.
O
povo determina
os
acontecimentos,
e os
acontecimentos
se encarnam nos
homens que o
representam.
Quantas vezes o
eleito da
multidão paga o
imposto do
sacrifício ou da
morte pela
escolha que não
pediu ou pelo
título que não
disputou?
Não
comparecemos,
pois, à tribuna
que o
Espiritismo nos
oferece, para
lamentar o
passado ou
repisar mágoas
que a memória
humana ainda não
esqueceu. Nosso
intuito, em
rememorando a
consagração
definitiva dos
nossos ideais
republicanos, é
o de alongar os
olhos mais ao
centro de nossas
realidades
essenciais.
Indubitavelmente,
na hora de
emancipação do
poder, não seria
lícito buscar
outros padrões
para a
constituição
orgânica da
comunidade
nacional senão
naquelas fontes
visceralmente
democráticas que
os povos
avançados nos
ofereciam; e a
nata
intelectual,
como também o
escol político,
se debruçavam
sobre os
princípios de
Auguste Comte e
devoraram as
tradições
inglesas e
norte-americanas,
com a volúpia do
artista de
imaginação
superexcitada
que descobrisse
no vasto
território
brasileiro uma
nova Hélade,
brilhante e
gloriosa,
perfeitamente
habilitada à
assimilação de
princípios
sublimes, sem
qualquer serviço
preparatório do
entendimento
popular.
Proclamada a
República e
lançada a Carta
Magna de 91, é
que reparamos a
enorme população
ruralizada, a
disparidade dos
climas, a
extensão do
deserto verde,
as tragédias do
sertão, o
problema da
seca, a
necessidade de
uma consciência
sanitária na
massa popular,
os imperativos
da
alfabetização, a
incultura da
liberdade, a
escassez de
sentimento
cívico, a
excentricidade
das comunas
municipais, e o
espírito ainda
estreito de
numerosas
regiões.
O
programa
compulsório do
País não poderia
afastar-se da
educação nos
mínimos pontos;
entretanto,
tecêramos
precioso manto
constitucional
com frases e
textos de fina
polpa
democrática,
quase
impraticáveis
além dos
subúrbios do Rio
de Janeiro.
Cabe-nos
confessar hoje,
honestamente,
que ignorávamos
a nossa condição
de povo juvenil,
com
idiossincrasias
que não
pudéramos
perceber; em vão
tentamos os
transplante das
árvores
ideológicas da
Inglaterra, da
França e da
Suíça para a
nossa gleba
político-administrativa,
de vez que o
conceito de
Estado não
passava de ideia
pragmática em
nossa mente
coletiva, ainda
incapaz de
vivê-la no
trabalho e na
responsabilidade,
no pensamento e
na emoção dos
povos que se
ergueram para
tomar as rédeas
dos próprios
destinos.
E, por isso, em
mais de meio
século, temos
agido e reagido,
através de
continuadas
experimentações,
tendendo, como é
natural, para a
centralização do
governo, contra
a expectativa de
quantos sonham
com o puro
parlamentarismo
britânico para
as nossas
realidades
imediatas.
Nossa palavra,
contudo, não
expressa
desilusão ou
desânimo.
Compreendemos
agora que uma
nação é setor da
Humanidade e que
um povo é uma
grande família
espiritual
operando no
tempo, com
tarefas
determinadas no
engrandecimento
do mundo.
A
República foi
descerrada ao
espírito
brasileiro na
hora certa; e se
é verdade que
pecamos por
incapacidade de
supervisão das
nossas
exigências
objetivas, não é
menos certo que
cada
coletividade,
quanto cada
indivíduo,
desfruta o
direito de
evoluir e,
consequentemente,
a prerrogativa
de experimentar
e de errar, no
sentido
construtivo,
pavimentando o
próprio caminho
de acesso aos
mais altos
valores da
Civilização.
Apaixonados,
presentemente,
pela obra de
educação e
assistência,
antes de
quaisquer
conquistas novas
em matéria de
liberdades
públicas,
aguardamos, com
alegria, a
vocação ao
retorno à lide
carnal para
melhor servir à
Pátria, credora
do nosso alto
espírito de
renunciação.
Não possuímos
milagroso
formulário de
emergência para
a cura das
dificuldades
políticas,
inevitáveis e
transcendentes
em todos os
gabinetes da
atualidade, ao
dispor daqueles
que orientam a
vida nacional.
Confiamos
sinceramente na
dignidade e na
boa-vontade de
quantos se
encontram nos
postos diretivos
e esperamos que
a Luz Divina tão
positivamente
evidenciada em
nossa destinação
histórica, se
fixe nas
atitudes dos
dirigentes e nas
deliberações do
povo, conjugando
autoridade e
colaboração no
erguimento do
progresso comum.
Efetivamente,
não dispomos
ainda do
equipamento
industrial, dos
recursos
técnicos, da
disciplina e das
virtudes
públicas que
caracterizam as
comunidades
anglo-saxônicas;
mas a grande
balança do
mundo, todavia,
acusa, em nosso
favor, uma
civilização
respeitável ao
calor dos
trópicos; um
potencial
econômico
inapreciável; a
verdadeira noção
de fraternidade
que podemos
definir por base
da democracia
genética; o
instinto de
solidariedade
humana; o culto
sistemático aos
ideais
superiores; a
ojeriza natural
pelo nefasto
orgulho de raça;
o pacifismo
construtivo; o
respeito
tradicional à
independência
dos outros; a
veneração aos
tratados e aos
compromissos
assumidos; a
bondade inata; a
penetração
rápida nos
enigmas
espirituais; o
sentimento
religioso na
exaltação da
caridade; a
iniciativa do
bem; a
colaboração
espontânea em
todas as obras
que colimem
erguer o
indivíduo para
níveis
superiores; o
zelo pela
justiça; a
vocação da
liberdade; o
sonho de
largueza; o
desprendimento
da posse
material e,
sobretudo, a
devoção sublime
à Humanidade que
converteu os
nossos oito
milhões de meio
de quilômetros
quadrados em
Nosso Lar do
Evangelho
redivivo para o
mundo faminto de
verdadeira
regeneração.
Exalçando,
assim, o Brasil,
berço de nossas
melhores
aspirações,
saudamos o nosso
glorioso futuro,
rogando a Deus
que tenhamos a
coragem de
sermos nós
mesmos, unidos
na execução do
novo mandamento,
que para os
jovens da Nação
pode ser
resumido numa
simples palavra:
– trabalhar.
Do livro
Falando à Terra,
por Espíritos
Diversos, obra
psicografada
pelo médium
Francisco
Cândido Xavier.