GUARACI LIMA SILVEIRA
glimasil@hotmail.com
Juiz de Fora, Minas Gerais (Brasil)
PAI – que pessoa é essa?
Foi no século IV a.C. que a figura masculina assumiu o controle das ações dentro das coletividades humanas. Antes, os cultos eram oferecidos às mulheres, notadamente pela maternidade. Naquela época os clãs eram dominantes e o homem teve que assumir o controle da família e todos os que não fossem do sexo masculino deveriam seguir seus comandos. Na história das civilizações encontramos constantemente a figura do escravo. Também o escravo devia obediência ao homem. A soberania masculina era hereditária e, assim, permaneceu por longos períodos históricos.
Os professores Aquino, Oscar e Denise, no livro “História das Sociedades”, fazem importante abordagem ao assunto, elucidando-o: “Antes, nas comunidades primitivas, a família se confundia com o próprio grupo; todos se consideravam ligados por laços consanguíneos e a descendência era fixada pelo lado feminino, pois a mulher exercia uma atividade mais importante para a sobrevivência do grupo – a coleta. Vigorava o direito materno... Com o surgimento da propriedade privada, o direito materno foi derrubado e a descendência passou a se fazer pelo lado paterno para garantir o direito dos filhos à herança. Desse modo garantia-se a acumulação da riqueza para a família. Da mulher passou a exigir-se a virgindade e a fidelidade conjugal – imposição feita principalmente para garantir a certeza da paternidade e, portanto, para legitimar o direito dos filhos à herança”.
Assim explica-se historicamente o porquê da soberania masculina na relação familiar. Acontece, porém, que a medida surgia apenas para garantir a descendência das riquezas. E como ficavam os filhos? Provavelmente eram educados para garantir a sobrevivência do clã e defendê-lo das agressões internas e externas. São notáveis os fatos que relatam a transferência do poder paternal ao primogênito, um deles, talvez o mais famoso historicamente, é o caso de Esaú e Jacó, netos de Abraão.
O tempo passou e o homem continuou como dominante. Filhos nasciam e cresciam sob os tetos constituídos. E lá estava ela, a mãe, cuidando da educação, enquanto o pai cuidava da manutenção do lar. Pai e Mãe tornaram-se assim peças importantes no constructo social. Os filhos nasciam e se preparavam para o matrimônio. Meninas dos doze anos em diante já podiam pensar em casamento e jovens meninos deviam assumir seus compromissos conjugais bem cedo e assim perpetuavam o “modus operandi” do processo.
Um dia houve uma revolução feminina na qual a mulher deixou o posto de submissão ao homem, buscando sua igualdade de direitos. Estamos vivendo presentemente essa situação. Ora, se os pais são independentes entre si e os filhos necessitam tanto deles para crescerem de forma psicologicamente sadia, como enfrentar a situação? Quem de fato predomina – o pai ou a mãe? Para um estudo mais profundo da questão devemos buscar as observações do psiquiatra e psicanalista e membro da Associação Freudiana da Bélgica e Lacaniana Internacional, Dr. Jean-Pierre Lebrun. Segundo ele a discussão de soberania entre pai e mãe remonta aos tempos dos sábios gregos, notadamente Ésquilo, um dos tragediógrafos, em sua história denominada Oréstia. Naquele episódio a mãe mata o pai e é morta pelo filho por causa do assassinato que cometera. A pergunta é: por que o filho matou a mãe? Seria o caso de ser o pai o legitimo genitor por ser ele o que fecunda e a mulher a que salvaguarda o jovem rebento, apenas nutrindo o germe que lhe fora semeado?
A questão é muito complexa se vista por este lado, contudo, o notável psicanalista apresenta outro fato contundente quando explica a relação de parentalidade. Segundo ele, “no primeiro tempo, a criança está presa ao gozo materno, mas é necessário que ela se desvincule para poder levar vida própria. O pai funciona como um anteparo, impedindo que esse gozo invada a criança. A figura paterna separa a criança da mãe porque constitui um outro polo do gozo”.
Segundo estas observações notam-se a importância de ambos no processo da condução dos filhos e o pai é aquela figura que oferece à criança uma nova oportunidade: a relação dela com o mundo, pois que ele, o pai, é o representante deste mundo no contexto familiar. Assim o pai passa a ser o dinamizador daquela consciência em direção ao futuro. A mãe representa o aconchego, o pai, a abertura. Assim se explica o porquê do “Honrar Pai e Mãe” inscrito no Decálogo.
Nas questões 582 e 583 de “O Livro dos Espíritos” temos a informação concisa dos deveres de ambos, notadamente quando a espiritualidade comenta que “Deus colocou a criança sob a tutela dos pais para que eles a conduzam no caminho do bem, e lhes facultou a tarefa ao conceder à criança uma constituição frágil e delicada, que a torna acessível a todas as impressões”. Joanna de Ângelis assevera que ”os pais não são os construtores da vida, porém, os médiuns dela, plasmando-a, sob a divina diretriz do Senhor”. Emmanuel, como que concluindo o pensamento acima, nos diz que: “os pais humanos têm de ser os primeiros mentores da criatura”.
De posse de todas essas informações podemos situar bem a posição do Pai, da Mãe e de ambos no processo de construção de um indivíduo saudável. Quanto ao Pai, ele é o grande orientador do filho em relação ao mundo. Mundo que ele conhece porque nasceu primeiro. A ele é dado o dever de conduzir o filho para as vias úteis dos seus crescimentos; representa o grande cicerone daquele que está retornando para mais um período no corpo físico.
No capítulo 46 do livro “Luz no Lar”, psicografado por Chico Xavier, encontramos a frase: “Ser Pai é ser colaborador efetivo de Deus, na Criação”. Hoje a moderna psicologia coloca os pais como educadores, e a sociedade corre sérios riscos se: “não transmitir à geração seguinte as ferramentas indispensáveis para enfrentar o que pertence à nossa condição comum”, ainda nas palavras de Jean-Pierre.
Ser Pai, portanto, é ser um amigo indispensável para que o filho cresça em paz enquanto se organiza física e psiquicamente para os embates que o aguardam no processo da sua evolução espiritual.