Grilhões Partidos
Manoel Philomeno de
Miranda
(Parte
5)
Continuamos a apresentar
o
estudo do livro
Grilhões Partidos,
de Manoel Philomeno de
Miranda, obra
psicografada por Divaldo
P. Franco e publicada
inicialmente no
ano de 1974.
Questões preliminares
A. Faltava à Casa de
Saúde uma terapêutica
indispensável em
qualquer tratamento. Que
terapêutica é essa e
qual o seu valor?
O que faltava ali é o
sentimento do amor, que
consegue, não raro, o
que muitos medicamentos
não produzem.
(Grilhões Partidos, cap.
4, pp. 46 e 47.)
B. Que é que o obsessor,
ao revelar-se, disse a
Ester?
Ele lhe disse: "Estás
morta ou quase morta.
Logo mais culminarei
este processo de
vingança, extorquindo-te
a vida, desforçando-me
dele. Morrerás, como eu
morri, a fim de que ele
morra, também. Cá o
espero". O Espírito
confirmava então que ela
era inocente; no
entanto, ele a odiava,
por odiar seu pai,
desgraçava-a para
desgraçá-lo, vencia-a
para vencê-lo; e se
apresentava então como o
demônio da justiça, a
serviço da vingança e do
desforço pessoal.
(Obra citada, cap. 4,
pp. 47 a 50.)
C. Por que motivo, em
casos semelhantes ao de
Ester, a terapêutica
salutar há de ser
múltipla, acadêmica e
espírita?
Eclodindo a manifestação
da loucura, instala-se,
também, um simultâneo
processo obsessivo,
graças às vinculações
que mantêm encarnados e
desencarnados na
Contabilidade dos
deveres múltiplos,
poucas vezes
desenvolvidos com
retidão. Na obsessão, a
loucura surge na
qualidade de ulceração
posterior,
irreversível, em
consequência das cargas
fluídicas de que padece
o paciente. Por esse
motivo, em muitos
processos obsessivos a
terapêutica salutar há
de ser múltipla:
acadêmica e espírita,
imprescindíveis para
colimar resultados
eficazes.
(Obra citada, cap. 5,
pp. 51 e 52.)
D. Como se chamava a
jovem que acudiu Ester e
qual a sua história?
Rosângela. Apesar da
pouca idade física, a
auxiliar de enfermagem
experimentara desde cedo
o cadinho purificador
de muitas vicissitudes e
aflições, que
contribuíram para a
harmonia íntima de que
era possuidora. Órfã
desde os oito anos,
ficara aos cuidados do
pai, em subúrbio
carioca, o qual lutava
com bravura pela
sobrevivência. Sensível
e meiga, conseguira
granjear afeições
espontâneas entre os
vizinhos, que passaram a
assisti-la com desvelo,
inclusive matriculando-a
em escola próxima do
lar. O pai manteve-se
viúvo enquanto pôde,
mas, consorciando-se
alguns anos depois, a
esposa fez-se terrível
adversária da enteada,
que foi, então,
trasladada para digno
lar em Botafogo, onde se
alojou na condição de
ama de uma criança. Seus
patrões eram espíritas
convictos e a trataram
como membro da família,
iniciando-a nos estudos
doutrinários e cuidando
também da sua instrução
em Ginásio noturno, de
onde saíra
recentemente, após
concluir ligeiro curso
de enfermagem-auxiliar.
(Obra citada, cap. 5,
pp. 52 a 55.)
Texto para leitura
28. Ressurge a
esperança -
Faltava à Casa de Saúde
uma terapêutica
indispensável em
qualquer tratamento: o
amor, – que consegue,
não raro, o que muitos
medicamentos não
produzem. São raras as
pessoas que procuram a
inspiração divina ante a
nebulosa das
enfermidades complexas,
quer pela oração, ou
pela sintonia mental com
Deus. Diz-se, porém, que
nos tratados médicos não
existem as palavras Deus
e oração, e, todavia, é
seu providencial socorro
que liberta e encaminha
os padecentes da
amargura para as trilhas
da saúde e da paz... As
coisas caminhavam assim
quando ocorreu um fato
novo, que reacendeu as
esperanças de cura da
jovem Ester. Foi a
admissão de Rosângela,
uma moça igualmente
jovem, contratada na
condição de auxiliar de
enfermagem. A nova
funcionária, logo na
primeira visita que fez
ao pavilhão dos
desesperados, sentiu-se
tocada por Ester, então
atirada a recanto
lôbrego, atada à
camisa-de-força, no
desvario habitual.
Rosângela se interessou
de pronto pela esquálida
paciente, inscrevendo-a
na mente, como daquelas
a quem daria maior dose
de assistência e
carinho. Estava sendo
então introduzida para
tratamento psiquiátrico
a Rawfolvia
serpentina,
difundida como
Serpasil, que, sem
os inconvenientes dos
barbitúricos em geral,
possuía excelentes
qualidades
tranquilizantes. Segundo
Philomeno, a substância
atuaria sobre o tálamo,
realizando uma lobotomia
de natureza química, por
meio da qual diminui a
capacidade emocional da
usina elétrica ali
sediada, procedendo à
vitalização do cérebro
com produto químico, de
que este se ressente
para a manutenção do
equilíbrio mental.
Rosângela, que ouvira
ardentes opiniões sobre
a nova droga, pensou em
examinar o prontuário da
demente, calculando
fazer alguma coisa por
ela. (Cap. 4, pp. 46 e
47)
29. A
possessão
- Ester padecia
incalculáveis aflições,
que nem mesmo conseguia
exteriorizar. Sem poder
controlar a casa mental,
que apresentava então
os primeiros distúrbios
de funcionamento, após a
constrição demorada do
fluido morbífico do
Espírito que a
subjugava, era dominada
por agonias
inenarráveis.
Parecia-lhe ter sido
arrojada num abismo sem
fundo. Via-se fora do
corpo e, ao mesmo tempo,
via-o agitado, num
estado dúplice, sem
anotar os circunstantes,
chocados, na sua festa
de aniversário. Estava
expulsa do organismo
físico sem dele estar
liberta... A princípio
sofria impressões
confusas que a
perturbavam. Outras
vezes deparava-se com o
estranho possessor,
furibundo, em esgares de
demente... Agredida por
ele, procurava voltar à
realidade anterior,
como se perseguida em
terrível pesadelo, mas
em vão. Nos tratamentos
com o eletrochoque, era
impossível avaliar o que
sentia durante as
convulsões, até
desfalecer. Ao
despertar, fruindo o
calor orgânico,
defrontava-o, asqueroso,
senhorial, e fugia,
aparvalhada,
cedendo-lhe o lugar...
Minado o corpo pelo
desgaste de largo porte,
sucessivos desmaios
expulsavam o usurpador
que se deleitava, então,
ameaçando-a, grosseiro,
arrebatando-a para
lugares povoados por
espectros impossíveis de
descrever. "Nesses
sítios – relata
Philomeno – , onde
nenhuma claridade
lucila, a asfixia
pastosa domina;
impossibilitada de
qualquer ação,
tornava-se mais fácil
presa, arrastada aos
trambolhões". Supunha
ela encontrar-se então
em cemitério infinito,
de sepulturas abertas e
cadáveres exumados, ante
a contemplação de
verdadeiros
mortos-vivos. (Cap. 4,
pp. 47 e 48)
30. O obsessor se
anuncia - As
furiosas entidades que
Ester ali via formavam
um quadro inusitado: uns
tentavam reconduzir seus
cadáveres ao movimento,
após reapossarem-se
deles; outros se
lamentavam por havê-los
perdido
irremissivelmente;
lutadores diversos
defendiam suas vestes
apodrecidas dos
animais que delas se
locupletavam, ao lado de
um sem-número de
Espíritos tristes,
chorosos, em procissão
intérmina... "Sempre
noite, lamentos,
exacerbações, gritos
ensurdecedores – o
inferno!", descreve
Manoel Philomeno. As
aflições dementavam-na
pouco a pouco. Onde o
amor dos pais, sua
proteção, seu socorro?!
Gritava até perder as
resistências, recebendo
como resposta
gargalhadas zombeteiras
e agressões obscenas que
lhe chegavam aos ouvidos
através de rostos
patibulares, deformados,
agressivos... Exorava o
socorro de Deus, mas, ao
fazê-lo, tanta era sua
desdita, que perdia a
concatenação, a ordem
das súplicas, o que não
impedia, porém, de
chegar-lhe a resposta
divina, à semelhança de
brisa refrescante, em
aragem amena, vertida
sobre a ardência das
febres... " – Estás
morta ou quase morta –
ouvia, aturdida, em
blasfema acusação. –
Logo mais culminarei
este processo de
vingança, extorquindo-te
a vida, desforçando-me
dele. Morrerás, como eu
morri, a fim de que ele
morra, também. Cá o
espero". Ouvindo isso,
Ester julgava estar
delirando, dizia-se
inocente e lágrimas
pungentes escorriam como
chuva abundante... O
Espírito que a subjugava
confirmava então que ela
era inocente; no
entanto, ele a odiava,
por odiar seu pai,
desgraçava-a para
desgraçá-lo, vencia-a
para vencê-lo; e se
apresentava então como o
demônio da justiça, a
serviço da vingança e do
desforço pessoal.
Depois, recomeçavam as
dilacerações morais que
se repetiam todos os
dias. Faltava a Ester
qualquer preparação
espiritual. A família
cuidara-lhe apenas da
educação formal, agindo
como muitos pais que
pensam que as
dissertações sobre a
vida no além-túmulo não
devem ser ministradas
aos filhos, por
julgá-los imaturos para
os ministérios
superiores, as mensagens
morais do espírito
imortal. Subjugada,
assim, pelo possessor,
em comburência de ódio,
a jovem sucumbia,
inerme, lentamente,
quase vencida. (Cap. 4,
pp. 49 e 50)
31. A
insuficiência do
tratamento acadêmico
- Examinando o tema da
influência espiritual
em nossa vida, ensinada
pelo Espiritismo, Kardec
faz o seguinte
comentário (O Livro dos
Espíritos, questão 525):
"Assim é que,
provocando, por exemplo,
o encontro de duas
pessoas, que suporão
encontrar-se por acaso;
inspirando a alguém a
ideia de passar por
determinado lugar;
chamando-lhe a atenção
para certo ponto, se
disso resulta o que
tenham em vista, eles
obram de tal maneira que
o homem, crente de que
obedece a um impulso
próprio, conserva sempre
o seu livre arbítrio".
Os fatos pareciam agora
claros: Ester fora
surpreendida, na festa
de seu aniversário, pela
agressão de um Espírito
revoltado que, acoimado
por violenta crise de
ódio, encontrou na sua
sensibilidade mediúnica
o campo propício para a
incorporação
intempestiva e infeliz.
Evidentemente, em débito
ante os Códigos da
Divina Justiça, Ester
possuía os requisitos
para uma sintonia
perfeita, propícia ao
agravamento do problema.
Tal como ela, que
expiava delitos
cometidos no passado,
muitos outros pacientes
da Casa de Saúde eram
vítimas da constrição
obsessiva. Diz Philomeno:
"Naturalmente, eclodindo
a manifestação da
loucura, instala-se,
também, um simultâneo
processo obsessivo,
graças às vinculações
que mantêm encarnados e
desencarnados na
Contabilidade dos
deveres múltiplos,
poucas vezes
desenvolvidos com
retidão". Na obsessão, a
loucura surge na
qualidade de ulceração
posterior,
irreversível, em
consequência das cargas
fluídicas de que padece
o paciente, vitimado
pela perseguição
implacável. Por esse
motivo, em muitos
processos obsessivos a
terapêutica salutar há
de ser múltipla:
acadêmica e espírita,
imprescindíveis para
colimar resultados
eficazes. No caso de
Ester havia como
agravantes múltiplos
fatores cármicos, que
aumentavam o sofrimento
da aturdida obsessa.
Mas, como ninguém se
encontra marginalizado
ante a Providência, a
presença de Rosângela
representava ali o
recurso inicial
utilizado pelos
Benfeitores Invisíveis
para os primeiros
tentames favoráveis à
alienada, que jamais
ficou sem a superior
assistência. (Cap. 5,
pp. 51 e 52)
32. O caso
Rosângela -
Profundamente
amadurecida, apesar da
pouca idade física, a
auxiliar de enfermagem
experimentara desde cedo
o cadinho purificador
de muitas vicissitudes e
aflições, que
contribuíram para a
harmonia íntima de que
era possuidora. Órfã
desde os oito anos,
ficara aos cuidados do
pai, em subúrbio
carioca, o qual lutava
com bravura pela
sobrevivência. Sensível
e meiga, conseguira
granjear afeições
espontâneas entre os
vizinhos, que passaram a
assisti-la com desvelo,
inclusive matriculando-a
em escola próxima do
lar. O pai manteve-se
viúvo enquanto pôde,
mas, consorciando-se
alguns anos depois, a
esposa fez-se terrível
adversária da enteada,
que foi, então,
trasladada para digno
lar em Botafogo, onde se
alojou na condição de
ama de uma criança. Seus
patrões eram espíritas
convictos e a trataram
como membro da família,
iniciando-a nos estudos
doutrinários e cuidando
também da sua instrução
em Ginásio noturno, de
onde saíra
recentemente, após
concluir ligeiro curso
de enfermagem-auxiliar.
Participando dos
labores espíritas,
aguçaram-se-lhe as
faculdades mediúnicas,
que receberam carinhoso
e lúcido trato dos
benfeitores e do Centro
Espírita onde passou a
cooperar nos serviços do
socorro desobsessivo. Ao
ver Ester, pressentiu
logo a tragédia que se
desenvolvia além das
manifestações exteriores
da paciente e,
simultaneamente,
poderosa simpatia
brotou-lhe dos
sentimentos puros,
envolvendo a enferma,
desde então, na devoção
de suas preces.
Inspirada pelos seus e
pelos Guias Espirituais
da doente, foi-se pouco
a pouco acercando de
Ester, até conseguir
com sua simples presença
acalmá-la,
desembaraçando-a da
camisa-de-força a que
vivia jugulada, quando
não se encontrava sob as
altas doses de sedativos
que lhe eram impostas
com regular frequência.
(Cap. 5, pp. 52 e 53)
33. Rosângela fala
com os pais de Ester
- Rosângela dedicava
suas horas de folga a
Ester, que nem sempre a
recebia com lucidez ou
passividade. Todavia,
pelas emanações
psíquicas que
exteriorizava, conseguia
neutralizar a
agressividade do
obsessor, que se
submetia à sua força
moral, como se fora uma
energia balsamizante que
se contrapunha à sua
nefasta pertinácia.
Conhecendo os pormenores
do caso, e após
aconselhar-se com seus
tutores, resolveu
procurar os pais de
Ester, no propósito de
elucidá-los sobre a
enfermidade da filha.
Confiava poder ajudar,
fiel à recomendação
evangélica. Após o
necessário contato
telefônico, a jovem foi
recebida numa manhã de
setembro pelo Coronel e
Senhora Constâncio
Santamaria. O casal não
conseguia dissimular o
enfado e o desinteresse
pela sua presença, até
que ela relatou ter
ouvido naqueles dias,
após um mês de atenção
junto a Ester, uma frase
sintomática: "Mamãe!
mamãe, onde você
está?... Tenho medo,
mamãe..." A mãe da
enferma caiu em pranto
incontrolável e o
Coronel, também em
lágrimas, procurou
acalmá-la. Rosângela
disse-lhes, então, que
havia percebido no caso
de Ester algo que muitos
não conseguem ou
preferem não ver. E,
ante a surpresa do
Coronel, disse-lhe que
Ester não era uma louca
segundo os padrões
comuns, tradicionais...
Ele concordou,
informando que o
psiquiatra já lhe havia
dito o mesmo. Rosângela
pediu-lhe a ouvisse
primeiro e foi direto ao
ponto: "Não, por
favor... Não é comum
porque não a considero
louca". E acrescentou:
"Digo bem! É uma obsessa
por Espíritos!" (Cap. 5,
pp. 53 a 55)
(Continua no próximo
número.)