No Horto
Olavo Bilac
Tristemente, Jesus
fitando os céus, em
prece,
Vê descer da amplidão o
Arcanjo da Agonia,
Cuja mão luminosa e
terna lhe trazia
O cálix do amargor,
duríssimo e refece.
(1)
— “Se puderdes, meu Pai,
afastai-o!...” — dizia,
Mas eis que todo o Azul
celígeno (2)
estremece;
E do céu se desprende
uma doirada messe
(3)
De bênçãos aurorais, de
Paz e de Alegria.
Paira em todo o recanto
a vibração sonora
Do Amor e o Mestre já na
sede que o devora,
De imolar-se por fim nas
aras (4)
desse Amor,
Sente a Mão Paternal que
o guia na amargura,
E sublime na fé mais
vívida, murmura:
— “Que se cumpra no
mundo o arbítrio do
Senhor!...”
(1)
Refece -
de maus sentimentos;
miserável, infame,
ordinário.
(2)
Celígeno
- procedente do céu.
(3)
Messe -
ceifa, colheita.
(4)
Aras
- plural de ara: altar.
Ara da cruz: a cruz em
que foi crucificado
Jesus Cristo.
Natural do Rio de
Janeiro, Olavo Bilac
nasceu em 16 de dezembro
de 1865 e faleceu em
1918. Considerado, ao
seu tempo, o Príncipe
dos Poetas Brasileiros,
foi Sócio fundador da
Academia Brasileira de
Letras. O soneto acima
integra o livro
Parnaso de Além-Túmulo,
obra psicografada por
Francisco Cândido
Xavier.
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