A. Ante a pergunta de
Lisandra: "Por que sou
tão infeliz?!", o que
sua mãe lhe disse?
Artêmis, que retinha na
sua a mão da filha,
respondeu: "Porque a
felicidade se encontra
onde cada qual coloca o
coração, conforme
ensinou Jesus. Se você
situa as aspirações no
prazer fugidiço, no ouro
mentiroso e nas paixões
que ardem e se apagam
breve, a sua ausência
produz a desdita. No
entanto, se pensa em paz
de consciência, retidão
moral e dever
corretamente cumprido,
como metas de dignidade
e honradez, a ventura se
estabelecerá no coração
tranquilo..."
(Tramas do Destino, cap.
19, págs. 175 a 177.)
B. Que é felicidade, na
verdadeira concepção
espírita?
Eis como Artêmis se
expressou com relação à
pergunta: "Felicidade,
minha filha, é o bem que
fazemos, não o gozo que
fruímos. Não vemos os
mesmos desaires entre
opulentos e miseráveis,
as mesmas tragédias nos
palcos da glória e do
fracasso, os mesmos
desassossegos nos
palácios e nas taperas?
A felicidade não resulta
do que se tem e do que
se frui, mas do que se é
e do que se faz. Jesus,
podendo permanecer no
sólio do Altíssimo,
conviveu com as sombras
hórridas dos vales
humanos, a fim de
clarear com insuperável
luz as baixadas em que
chafurdam as criaturas,
fazendo-as anelar pelas
claridades estelares do
infinito".
(Obra citada, cap. 19,
págs. 177 e 178.)
C. Quais são os efeitos
da dor?
Um de seus efeitos é
este: submete a rebeldia
e alça o Espírito,
dignificando-o e
fazendo-o ressarcir as
misérias impostas
anteriormente a outros.
A dor tem, pois, função
educativa, não punitiva,
como muitos pensam. No
tocante aos sofrimentos
por que passava seu
marido e sua filha,
Artêmis aprendera, no
Espiritismo, que os
acontecimentos de
qualquer natureza
obedecem a uma
programação bem urdida,
pois que nem mesmo uma
única folha de árvore
cai que não seja pela
Vontade do Pai. (Obra
citada, cap. 20, págs.
183 e 184.)
Texto para leitura
76. O problema da
infelicidade -
Fora a providencial
interferência de sua avó
Adelaide que afastou o
terrível perseguidor,
cuja sanha nefasta não
fora aplacada com o
insucesso da
operação-suicídio. Claro
que uma tentativa
facilitaria outras, caso
não houvesse radical
mudança no
comportamento mental da
enferma. Os títulos
meritórios dos
familiares engendraram
recurso moratório para a
endividada, cujo tributo
a pagar se tornara mais
oneroso em decorrência
da agressão à vida. Na
verdade, apesar da ação
nefasta conduzida por
Ermínio, Lisandra
acalentava, pelo
pessimismo e pela
rebeldia, o falso
propósito de fugir à
vida, que mais se
agravava ante a sua
obstinação e
refratariedade em
recuperar-se dos
desmandos de outrora.
Ela recusara
sistematicamente a
mensagem do Cristo, por
preguiça mental e pelo
hábito insano de
fomentar e cultivar
ideias e pensamentos
negativos. Muitos pensam
evadir-se da
responsabilidade quanto
ao suicídio, dizendo não
saber o que estavam
fazendo, como se alguém,
em sã consciência,
pudesse ignorar o
gravame do suicídio,
particularmente no
Ocidente, onde o
Cristianismo o proscreve
e condena. Aliás, salvo
os imbecis e outros
dementes, todos
possuímos na
consciência a noção do
que é certo ou errado,
moral ou imoral. Agora,
Lisandra discernia e
compreendia o que é ser
responsável pelos
próprios atos e, pela
vez primeira, deu-se
conta dos desatinos da
sua insensatez e de
quanto a genitora – que
de nada se queixava –
devia amargar, asfixiada
no silêncio do martírio.
Lembrou-se, então, de
cenas que presenciara no
lar, com o pai agressivo
e a resignação materna,
o posterior
internamento de Rafael
na Colônia de
Hansenianos e a
indescritível angústia
que lhe sombreara os
olhos claros, que
perderam o fulgor
primitivo. Pensou na tia
Hermelinda, que
sacrificara a própria
vida para ajudá-los, sem
qualquer azedume ou
reclamação, e que,
ainda, como a própria
mãe, se sentia
agradecida a Deus!...
Perguntou-se, então, por
que se sentia tão
infeliz, e todos ouviram
sua débil voz indagar:
"Por que sou tão
infeliz?!" Artêmis, que
retinha na sua a mão da
filha, respondeu:
"Porque a felicidade se
encontra onde cada qual
coloca o coração,
conforme ensinou Jesus.
Se você situa as
aspirações no prazer
fugidiço, no ouro
mentiroso e nas paixões
que ardem e se apagam
breve, a sua ausência
produz a desdita. No
entanto, se pensa em paz
de consciência, retidão
moral e dever
corretamente cumprido,
como metas de dignidade
e honradez, a ventura se
estabelecerá no coração
tranquilo..." (Cap. 19,
págs. 175 a 177)
77. O que é
felicidade - A
mãe explicou-lhe, então,
que a Terra não é fim,
destino, mas é meio,
escola, recurso de que
nos utilizamos para
ascender a planos
realmente ditosos. "Quem
deseja usufruir sem
merecer, receber sem
dar, colher sem haver
semeado, é obrigado a
furtar e converte-se em
indigno beneficiário da
vida, que lhe impõe
recomeços difíceis",
acrescentou Artêmis.
"Todos podemos conseguir
a felicidade, se
soubermos e quisermos
bem conduzir nossas
aspirações. Muitos
desejariam um pomar
referto, um jardim de
messes... Por não
consegui-los,
desalentam-se,
esquecidos de que também
poderiam tornar-se um
arbusto verde no caminho
pedregoso, adornando a
estrada adusta, ou uma
árvore sobranceira,
mesmo solitária,
quebrando a inclemência
e aridez da terra..."
Dito isto, Artêmis
concluiu: "Felicidade,
minha filha, é o bem que
fazemos, não o gozo que
fruímos. Não vemos os
mesmos desaires entre
opulentos e miseráveis,
as mesmas tragédias nos
palcos da glória e do
fracasso, os mesmos
desassossegos nos
palácios e nas taperas?
A felicidade não resulta
do que se tem e do que
se frui, mas do que se é
e do que se faz. Jesus,
podendo permanecer no
sólio do Altíssimo,
conviveu com as sombras
hórridas dos vales
humanos, a fim de
clarear com insuperável
luz as baixadas em que
chafurdam as criaturas,
fazendo-as anelar pelas
claridades estelares do
infinito". A genitora de
Lisandra ainda disse
outras palavras
animadoras, lembrando à
filha a necessidade de
sair do egoísmo
vexatório, insatisfeito,
fator da sua
inquietação, para
descortinar belezas e
esperanças. Era
indispensável, enfim,
abrir-se à luz,
arrebentando as lentes
enfumaçadas através das
quais ela olhara a vida
até aquele momento... O
Dr. Armando, que a ouvia
fascinado, aplaudiu as
palavras da mãe de
Lisandra, que na verdade
falara sob a inspiração
de Adelaide. Lisandra
disse-lhe então que sua
mãe era espírita, o que
foi recebido com alegria
pelo médico, que também
disse militar nas
fileiras do Consolador,
onde encontrara o
consolo para as feridas
da alma, após o acidente
com seu filho Wander.
(Cap. 19, págs. 177 e
178)
78. O bem acaba
vencendo o mal -
Dr. Armando contou então
que vinha injetando no
filho o óleo canforado
da alegria de viver,
apesar do acidente que
o tornara paralítico.
"Só a reencarnação me
explicou
suficientemente o
transe por que passamos.
Minha mulher, após
alguma relutância,
tornou-se espírita,
igualmente", informou o
médico, que esclareceu
haver desejado muitas
vezes falar a Artêmis
sobre a Doutrina, mas
não se atreveu a isso.
Ela explicou então que
foi Cândido quem a
iniciara no
Espiritismo, tal como
ele fizera ao médico,
mantendo contudo reserva
sobre ambas as
conversões, como
verdadeiro espírita que
era: sincero, humilde e
nobre. Dr. Armando
perguntou se Rafael
sabia que a família
aderira ao Espiritismo.
Artêmis contou então que
ele também se fizera
espírita, graças ao
trabalho de Cândido, um
indivíduo que tornou a
vida uma verdadeira
pregação e que
discretamente ia
semeando, despertando
vidas para Jesus. O
médico percebera as
transformações por que
passara Rafael, mas não
atinava com os motivos.
A conversação no quarto
de Lisandra continuou
auspiciosa por mais
alguns minutos, findos
os quais o Dr. Armando
disse que seria dada
alta a Lisandra dentro
de dois dias, quando ele
próprio a levaria à sua
casa. "Não há por que
se preocuparem mais",
asseverou o médico.
"Entreguemos os
resultados a Jesus e
deixemo-la, agora,
repousar." As despedidas
foram afetuosas e
amenas, retornando as
duas almas irmãs,
reanimadas, para o labor
do futuro. O bem e a fé
venciam a astúcia do
mal, a agressão da
incredulidade. (Cap. 19,
págs. 179 e 180)
79. Os tormentos
de Rafael - No
dia seguinte ao
incidente ocorrido com
Lisandra, quando Cândido
chegou à Colônia, Rafael
o procurou, apreensivo.
Ele tivera uma noite de
torpes pesadelos e
estava sentindo-se muito
indisposto. Cândido nada
revelou sobre o
incidente, e Rafael
prosseguiu dizendo que
pressentimentos
vinagrosos o assaltavam,
fazendo-o experimentar
incontida agonia
interior. Ele dizia,
então, poder atinar,
enfim, com os males que
com certeza praticara,
em face das inquietações
que o consumiam. "Sinto
na alma e no corpo",
declarou Rafael, "a
violência dos danos que
me dilaceram,
respondendo aos apelos
das minhas desditosas
vítimas. Embora o
infinito consolo que
encontro no Espiritismo,
percebo-me enlouquecer,
à semelhança da minha
desventurada filha,
lenta, porém
seguramente". O
hanseniano disse
deparar-se com as
vítimas de suas
delinquências transatas,
ressumando ódio e
aguardando vertê-lo
sobre ele próprio. O
enfermeiro, que o ouvia
e observava, em prece
verificou nele,
estampadas, as garras da
enfermidade rigorosa. As
mutilações faziam-se
visíveis. O rosto,
demasiadamente
deformado, volumoso,
retinha os lepromas em
degenerescência; a
expressão leonina, os
olhos avermelhados e as
pálpebras feridas, as
abas das narinas
carcomidas produziam
compaixão. (N.R.:
Leproma ‚ nódulo
granulomatoso
superficial que
constitui a lesão
característica da
lepra.) As mãos
padeciam os reflexos das
amputações de alguns
dedos, o mesmo ocorrendo
com os pés que
completavam o quadro
externo, numa visão
constrangedora do
sofrido senhor. Um
sentimento de funda
piedade e insopitável
manifestação de amor
assaltou Cândido que,
intuitivamente,
compreendia serem
aqueles, apenas, os
princípios das dores...
Ele conhecia por
experiência pessoal a
agudeza das cobranças
morais promovidas pelos
desafetos, quando se
sentem defraudados e se
resolvem, enlouquecidos,
justiçar os seus
verdugos, fazendo-se, a
seu turno, arbitrários
sicários. Empedernidos
nos sentimentos, baldos
de emoções
enobrecedoras,
insaciáveis na fúria da
punição, chegado o
momento do ajuste de
contas, convertem-se em
chacais, cuja sanha não
cessa, mesmo quando os
despojos das presas nada
mais podem oferecer.
Contemplando, então, o
enfermo, disse: "Não se
desalente, nem se
arreceie. Seus
pressentimentos
tormentosos são justos,
seus pesadelos
procedem. Quem de nós
pode olhar para trás sem
defrontar a horda de
infelizes que se
asselvajaram por nossas
inconsequências?" (Cap.
20, págs. 181 e 182)
80. Lisandra volta
ao mutismo de antes
- Cândido exortou-o,
assim, a manter a
coragem e a inalterável
confiança em Deus, com o
que poderia combater de
espírito forte e
resoluto, rumando para
os objetivos de sua
liberação definitiva.
Era primordial ter o
ânimo inquebrantável nos
propósitos de reparar
todo mal e recuperar o
bem perdido, sabendo que
cada um recolhe conforme
espalha, porque Deus é o
Pai Amantíssimo de todos
nós. O enfermeiro deu,
depois, ante as
perguntas de Rafael,
notícias de sua casa.
Lisandra estava
internada no
Pronto-Socorro, mas fora
de perigo, em franco
refazimento. E
minudenciou a
ocorrência, buscando
dar-lhe um tom natural,
de modo a diminuir o
impacto da notícia,
acalmando o genitor
perplexo. O
acabrunhamento de Rafael
foi, porém, evidente e
dizia da profunda mágoa
que se apossava do
enfermo. Contudo, a
palavra amiga do
enfermeiro encarregou-se
de erguer-lhe o ânimo e
de incitá-lo ao
aproveitamento das
horas, com o consequente
lucro da aflição bem
recebida. A dor tem
essa função sublime:
submete a rebeldia e
alça o espírito,
dignificando-o e
fazendo-o ressarcir as
misérias impostas
anteriormente a outros.
Nos dias subsequentes,
como o Dr. Armando
Passos também mantivesse
com ele salutares e
eficientes conversações,
desvelando sua própria
condição de espírita
militante, Rafael
recuperou-se moralmente
do abalo, embora
dificilmente lhe
desaparecessem o
constrangimento e a
decepção defluentes da
malograda agressão da
Treva. Retornando ao
lar, Lisandra voltou ao
mutismo e à infelicidade
que lhe apetecia
entreter, sendo inúteis
todos os chamamentos do
carinho materno e as
advertências dos novos
amigos. Ela recusava-se
a sair do quarto e
encerrava-se, cativa,
nas sombras das janelas
e porta fechadas.
Negou-se também a
participar das reuniões
espíritas no Centro, e
só a custo assentia em
assistir às orações
conjuntas no lar. A
família Ferguson já
havia sido admitida nos
trabalhos mediúnicos da
Sociedade Espírita, após
a fase de preparação, e,
atendendo às sugestões
da médium Epifânia,
Lisandra não fora
forçada a ir, contra sua
vontade, ao Centro. Em
ocasião oportuna,
Natércio, mentor da
dedicada médium,
informou que os
problemas espirituais
relativos à família de
Artêmis seriam atendidos
por etapas. Esta exultou
em silêncio, porque
soubera confiar em Deus
e esperar, sem
importunar com
insistências
inconvenientes os
diretores daquela
instituição. A sofrida
mulher aprendera, no
Espiritismo, que os
acontecimentos de
qualquer natureza
obedecem a uma
programação bem urdida,
pois que nem mesmo uma
única folha de árvore
cai que não seja pela
Vontade do Pai. (Cap.
20, págs. 183 e 184)
(Continua no próximo
número.)