MARIA ENY
ROSSETINI PAIVA
menylins@terra.com.br
Lins, SP
(Brasil)
O reino de Deus,
na visão do
filósofo
Herculano
O EXEMPLO
Nesta série de
estudos sobre o
mestre em
Filosofia,
escritor,
literato,
jornalista e
espírita,
Herculano Pires,
estamos
examinando sua
obra “O Reino”,
em que nos
esclarece a
respeito do
Reino de Deus
que Jesus veio
anunciar,
vivenciar e
exemplificar.
No Capítulo IV,
O EXEMPLO,
mestre Herculano
ensina que O
Reino não é
privativo de
ninguém e que,
certa vez, para
quebrar a dura
cerviz dos
fariseus, diante
do centurião
romano que lhe
rogara a cura
para seu servo,
e a conseguira,
Jesus declarou:
“Em verdade vos
afirmo que não
achei tamanha fé
em Israel, e que
virão muitos do
Oriente e do
Ocidente
para assentar-se
à Mesa com
Abraão, Isaac e
Jacó, no Reino
dos Céus”.
Herculano
prossegue: “E
acrescentou com
a dureza de uma
martelada na
oficina de
Nazaré: Mas os
Filhos do Reino
serão lançados
nas trevas
exteriores em
que haverá choro
e ranger de
dentes!”.
Assim se
chamavam os
hipócritas de
Israel: Filhos
do Reino, porque
se consideravam
mais puros que
todos os outros
e escolhidos por
Deus para
julgarem os
goyn, os
estrangeiros
impuros. O Jovem
Carpinteiro os
ameaçava com as
trevas
exteriores, com
a cegueira da
alma que sucede
à cegueira da
mente, produzida
pelo orgulho. E
tomava o
centurião
romano, odiado
pelos Filhos do
Reino, como
exemplo de fé,
como tomara o
Bom Samaritano,
em cuja presença
os fariseus
cuspiam e
viravam o rosto
com desprezo,
como exemplo de
amor.
Quantos ensinos
esse simples
trecho nos traz.
Herculano sabe e
o mostra à
exaustão em
outros
interessantes
livros sobre a
época de Jesus,
como Barrabás,
Madalena e
Lázaro, como
sentiam os
judeus, e com
que orgulhosa
pretensão se
julgavam
superiores. Não
como adoradores
do Verdadeiro e
único Deus, mas
com relação aos
que eram o SEU
POVO, OS QUE ELE
ESCOLHERA PARA
PROTEGER. Povo
escolhido que,
embora sob o
tacão romano,
receberia o
Messias, que
viria
trazer-lhes de
volta a
liberdade e o
domínio, dos
tempos do Rei
David e Salomão.
Essa crença,
fruto do orgulho
da raça e do
povo, tem
sustentado o
povo de Israel
por milênios e
ainda hoje
mantém viva no
seio das
sinagogas a
esperança da
vinda de um
Messias político
ou apocalíptico,
não importa, mas
que lhes
devolverá o
domínio e
implantará O
Reino onde eles
reinarão para
sempre sobre
todos os demais
povos...
Podemos
repudiar essas
ideias, mas
seria
interessante
que, antes
disso,
analisássemos se
não temos a
mesma postura
fruto do
orgulho. Os que
se julgam donos
de uma verdade
maior assumem,
na maioria das
vezes, a mesma
postura. Podem
não se achar
escolhidos de
Deus, por serem
israelitas,
podem não
esperar “reinar
com Deus” sobre
os gentios, mas
julgam-se
melhores por
possuírem mais
conhecimento, ou
a fé em Cristo,
ou em uma Igreja
cristã ou não
cristã. Não
ouvimos nossos
irmãos se
chamarem de
“povo de Deus”?
Não ouvimos no
movimento
espírita as
pessoas dizerem
que o
conhecimento
espírita é
superior a todos
os outros, que
nada têm a
aprender com
outros
estudiosos,
teólogos,
exegetas,
estudiosos das
Escrituras, ou
mesmo da
Ciência? Não
encontramos a
mesma doença do
orgulho, quando
nós mesmos
sorrimos com
superioridade
diante da
ignorância ou
mesmo nos
revoltamos com
os avanços da
Ciência,
tão-somente
porque
contrariam
“revelações”
feitas por
médiuns
confiáveis?
Fico admirada,
muitas vezes,
que eminentes
oradores e
líderes da
evangelização
infantil
continuem
ensinando a
parábola do Bom
Samaritano, como
se nela Jesus
apenas nos
ensinasse a
sermos caridosos
para com os
necessitados e
exprobasse a
hipocrisia dos
religiosos que
não socorreram o
samaritano
assaltado e
caído.
A parábola é
muito mais do
que isso: nela
Jesus ensina a
nos livrarmos do
preconceito. O
judeu, quando
via um
samaritano,
cuspia e dizia “Racca”.
Dessa expressão
de desprezo vem
a expressão
brasileira
“raque tchu” e a
cuspida com que
as crianças se
enfrentavam em
pequenas
querelas na
infância e que
em alguns
municípios
brasileiros
ainda é usada.
Os judeus, que
se achavam
superiores aos
galileus, e
desprezavam com
nojo manifesto
os samaritanos,
foram, nessa
parábola,
reduzidos à sua
verdadeira
dimensão.
Se toda a Lei e
os Profetas se
resumem na
máxima “ama a
Deus sobre todas
as coisas e ao
próximo como a
ti mesmo”, quem
assim procede
não ama a
ninguém. O
orgulho o
domina. É essa a
principal lição
da Parábola do
Samaritano, não
divulgada pelos
diferentes
credos
religiosos,
porque, à
semelhança do
farisaísmo, cada
grupo se julga
melhor do que o
outro. Embora
não o
demonstremos de
modo tão
evidente,
cuspindo diante
de outro cidadão
que por algum
motivo julgamos
inferior a nós,
sentimos por ele
o mesmo
sentimento de
superioridade
que caracteriza
o orgulho. E a
diferença entre
Judeus e
Samaritanos se
assentava, ao
menos
exteriormente,
no fato de que
os Samaritanos
não iam ao
Templo de
Jerusalém, mas
adoravam a Deus
no monte. Ou, em
palavras
modernas, não
concordavam em
engordar com
seus sacrifícios
e oferendas de
dinheiro e
animais as
famílias dos
fariseus e
sacerdotes, que
faziam pior do
que os
dominadores
romanos que
viviam dos
impostos
recolhidos dos
povos que
oprimiam.
Os fariseus e
sacerdotes
viviam enganando
seu próprio
povo. A título
de salvação e
purificação,
obrigavam-no a
pagar caro seus
rituais, e
comprar animais
sagrados para a
oferenda, com o
dinheiro do
templo, que
deviam trocar
pelo dinheiro
dos romanos, às
mesas dos
cambistas. Só
com tal dinheiro
do Templo podiam
comprar os
animais sagrados
para o
sacrifício. Por
isso, as mesas
dos cambistas
que Jesus
derruba, e daí,
o
estabelecimento
de uma nova
forma de
adoração sem
sacrifícios
sangrentos, por
Jesus. Na
verdade, os
animais
sacrificados
ficavam em parte
para os
sacerdotes e
fariseus, que
assim
locupletavam
suas mesas à
custa da miséria
e do sacrifício
de seu próprio
povo.
Esse é um dos
motivos porque
Jesus os tratava
com tanta dureza
e dizia que eram
malditos.
Veja em A Gênese
o item “maldição
aos fariseus”,
que Kardec
coloca sem
comentários.
Claro que Jesus
não amaldiçoava,
nem bendizia,
apenas colocava
quem era maldito
e quem era
bem-aventurado,
diante da lei de
Deus. Não
podemos à moda
de feiticeiros
medievais ou
atuais lançar
bênçãos e
maldições. Cada
um de nós está
sujeito a
recolher bênçãos
e maldições por
sua conduta na
Vida regida pela
Lei Natural.
A tradução
adocicada feita
pela Igreja e
pelos tradutores
evangélicos,
substituindo a
palavra malditos
por “ai de vós”,
tem mantido
gerações na
ignorância do
significado do
Reino de Deus na
Terra, e de como
nossa conduta
diante das Leis
Universais nos
torna felizes
(bem-aventurados)
ou infelizes
(mal-aventurados
ou malditos).
O Capítulo IV
traz preciosos
ensinos de
Herculano, e nos
fala da pequena
comunidade
messiânica que
vivia segundo os
preceitos do
Reino, ao lado
de Jesus. Fato
ignorado pelos
que nos ensinam
sobre a vida de
JESUS. Mas disso
trataremos no
próximo
estudo...