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Crônicas e Artigos

Ano 6 - N° 273 - 12 de Agosto de 2012

WELLINGTON BALBO
wellington_balbo@hotmail.com
Bauru, SP (Brasil)
 

A culpa de Carlos


Margarida era mulher bela e inteligente, por isso despertava nos homens o desejo de se aproximarem dela para um relacionamento amoroso. Aos 27 anos exalava alegria e entusiasmo por onde passava, o que a deixava com um certo ar de diva.

Porém, não obstante aos predicados, Margarida não se deixava levar com facilidade. O homem para tê-la como companhia precisava, segundo seus padrões, reunir atributos dos mais diversos e, dentre eles, a honestidade era o que mais ela apreciava. Dizia às amigas:

 – Para que eu tenha relacionamento com alguém, a beleza importa pouco, o que mais me chama atenção em um homem é a sua honestidade.

E as amigas, caçoavam dela, perguntando:

Defina honestidade, Margarida.

– Honestidade é ser fiel, íntegro, correto em todos os sentidos nesta vida. Para mim, o homem honesto é aquele que não se vende, não se corrompe e combate os seus vícios.

 – Ah, minha amiga, você quer um homem  perfeito.

 – Não – respondia Margarida –, apenas honesto.

E todas as suas amigas já haviam se consorciado, mas Margarida ainda não. Sabia que Carlos, que morava próximo à sua casa, a paquerava há muito tempo, contudo, nunca tiveram, nem ele tampouco, coragem para maior aproximação.

Era apenas uma paquera, troca de olhares, como ocorre costumeiramente com muitos pretendentes à paixão.

Por vezes ela pensava nele e divagava:  Carlos me chama atenção, mas será que é homem honesto?

 Entretanto, não havia como Margarida confirmar, já que ele não tomava a iniciativa e ela, muito tímida, receava aproximar-se dele.

Até que um dia, por conta da atividade voluntária em que trabalhava, Margarida conheceu Augusto.

Rapaz bonito, boa conversa e bons princípios. Margarida interessou-se pelo rapaz e ele por ela.

Descobriu nele um homem honesto, conforme desejava. Começaram a passear para se conhecerem melhor, até que tudo evoluiu para o namoro.

No entanto, Carlos, que nunca tivera coragem para se aproximar, ao ver Margarida de mãos dadas com Augusto, remou-se de ciúmes. O rapaz, que era tímido para estabelecer uma conversa com a moça, ficou desnorteado por saber que a perdera. Ao invés de se conformar com o que estava consumado, tratou de considerar Augusto seu rival. Um oponente que teria de ser tirado de seu caminho para que Margarida ficasse novamente sozinha, desimpedida, pois só assim ele teria chances.

Começou a pensar na melhor maneira de afastar Augusto de Margarida, pois a cada vez que os via juntos era como se fincassem uma faca em seu coração.

Ideias nebulosas começaram a rondar sua mente, abrindo campo para Espíritos infelizes que lhe sugeriam:

 – Só há uma forma de acabar com esse romance e tê-la em seus braços! É tirando a vida de Augusto. Tire a vida de seu rival e terá depois todo o tempo do mundo para conquistá-la, afinal, havia um interesse da parte dela por você. Lembra-se dos olhares que trocavam? Então, não perca tempo. Elimine este rapaz que se coloca em seu caminho!

Apalermado pelo ciúme e vibrando em baixa frequência, Carlos captou facilmente as sugestões dos Espíritos menos felizes e começou a arquitetar um plano para exterminar o seu rival.

Tinha ciência de que não poderia demorar muito, porquanto os laços entre Margarida e Augusto corriam o risco de se estreitarem ainda mais com o passar do tempo.

E foi assim que Carlos armou uma cilada para Augusto e, de maneira lamentável e sem levantar qualquer suspeita, pôs fim à existência daquele que considerava seu rival.

Completamente enfermo psiquicamente, compareceu ao velório para consolar Margarida e os familiares. Ao deixar o local, pensou:

 – Caminho livre! Desta vez a terei em meus braços!

No entanto, naquela mesma noite, Carlos começou a ter pesadelos com pessoas o acusando de assassino, covarde, fracassado!

Depois do ocorrido com Augusto, Carlos não tivera mais paz. Os dias transcorriam lentamente e a lembrança do homem morto não lhe dava tréguas.

Não conseguia mais se concentrar, tampouco trabalhar. Se os dias eram tenebrosos, as noites pareciam filmes de terror com pesadelos assombrosos em que pessoas desconhecidas diziam a ele:

 – Assassino, Assassino, Assassino!

Procurou ajuda médica, porém, nada adiantou.

Sua consciência é que o acusava e a culpa o esmagava.

Carlos tornara-se refém de sua lamentável obra. Vez ou outra chorava arrependido, questionando a si mesmo: Por que o matei? Por quê?

Em suma, Carlos não conseguia se livrar daquele tormento. O objetivo de conquistar Margarida já não mais existia, porquanto a culpa não lhe dava qualquer chance para seguir a vida em paz.

Não tardou para que os familiares o internassem em manicômio, pois, depois de algum tempo, Carlos não mais raciocinava direito.

E foi em triste quarto de um hospício que, atormentado pela culpa e perseguido pelos fantasmas criados pela sua lamentável atitude, que Carlos decidiu pagar seus equívocos com a pior das moedas existentes na face da Terra: o suicídio.

Reflexão:

O ciúme é, não raro, o agente causador de crimes dos mais diversos. Se pararmos para refletir com exatidão no relato acima, veremos que a mola propulsora de todas as ações lamentáveis foi justamente o ciúme que deixou Carlos cego.

São muitos os casos em que o homicídio é seguido de suicídio, tudo por causa do ciúme doentio.

O ciúme é um sentimento universal, inerente a todos nós, seres humanos ainda em busca do equilíbrio. Em nosso estágio evolutivo atual é quase impossível não sentir ciúme em maior ou menor grau.

A grande questão é aprender a lidar com ele.

Se o dominamos, tudo bem.

Mas quando o ciúme começa a dominar, a coisa se complica, como no caso de Carlos.

A imaginação transborda, fantasias se misturam à realidade formando na tela mental autêntico filme de horror.

Certamente, na alucinação provocada pelo ciúme exagerado, Carlos pensava assim:

 – Ele roubou a mulher de meus sonhos, de minha vida!

Imagino o transtorno, a vida insegura e o receio que vive quem se contamina pelo vírus do ciúme doentio.

O grave problema é que o ciumento julga ser o dono da pessoa, considerando-a objeto de sua propriedade.

Carlos julgava que Margarida era um objeto seu, por isso não poderia ser de mais ninguém.

Há no ciúme um autêntico desrespeito à dignidade humana.

Daí a necessidade de exercitarmos o autoconhecimento para sabermos se não estamos sendo dominados pelo ciúme que vem levando criaturas a cometer atos dos mais insanos, como na história de Margarida, Augusto e Carlos.

Não era o caso de Carlos e Margarida, pois nem compromisso tinham. Mas se você, prezado (a) leitor (a), se encontra no estágio de bisbilhotar a carteira do cônjuge, mandar alguém lhe seguir, se o proíbe de cumprimentar amigos,  e chegou inclusive à agressão, é hora de repensar. É justamente o momento de procurar um auxílio psicológico, de se religar espiritualmente, de buscar um momento seu, uma atividade, enfim, algo que lhe dê prazer e o faça viver realmente a sua vida e não a vida do outro.

Porque, venhamos e convenhamos, em realidade, nada nem ninguém nos pertence.

Pessoas transitam pela nossa vida, trocam experiência conosco e seguem seu caminho, enfim, não nos pertencem.

Cuidemos, pois, de nossos sentimentos para que não venhamos a ser dominados pelo ciúme, candidatando-nos a penosos estágios de reabilitação em que o sofrimento e a dor serão nossos companheiros por longo tempo.

Mensagem:

Todo ato cometido que burla as Leis Divinas não ficará impune no tribunal de nossa consciência. Seremos, pois, cobrados por nós mesmos. Mas, como Deus é Pai de infinito amor e misericórdia, sempre deixa-nos aberta a porta do arrependimento. Nesta porta entram apenas aqueles que querem se reabilitar do mal que cometeram.

Mas não basta apenas arrepender-se. É preciso um pouco mais: arrependimento, expiação e reparação são os estágios necessários para aqueles que de fato almejam estar quites com as Leis de amor que harmonizam o universo.

No caso de Carlos, por ter cometido aquele crime estaria ele destinado ao suicídio como forma de reparação ao mal cometido? Obviamente que a resposta é negativa. Só pagamos o mal com o bem.

O apóstolo Pedro afirma que o amor cobre a multidão dos pecados.

Ora, assim sendo, qual a melhor maneira de cobrirmos os nossos equívocos neste mundo, sejam eles quais forem?

A resposta já foi dada por Pedro: praticando o amor.

No premiado filme “Gandhi”, do ano de 1982, contém belíssima mensagem sobre o amor deixada pelo Mahatma. Certamente esta mensagem tocará muitos corações que se equivocaram nos caminhos da existência, mas que podem, obviamente, dar a volta por cima e não deixar que a culpa os corroa ao ponto de levá-los ao suicídio:

“Um pai desesperado, olhos esgazeados e coração atormentado, chega até a Grande Alma da Índia e diz temer ir para o inferno, pois esmagou a cabeça de uma criança. Questionado por Gandhi a razão de ato tão bárbaro, o desesperado pai em prantos explica:

 – Os muçulmanos mataram meus filhos, toda minha família.

Gandhi, então, em momento capital de sua existência, pois jejuava para que os conflitos entre hindus e muçulmanos cessassem, deu bela lição àquele pai e a todos os outros que ainda se debatem com seus velhos fantasmas:

 – Conheço uma fórmula para que você não vá para o inferno, meu filho. Adote uma criança cujos pais foram mortos em combate. Mas há uma condição: Ela deve ser muçulmana e você terá que educá-la dentro dos princípios desta religião”.

Perceba, caro leitor, que o amor deve sempre falar mais alto em todas as circunstâncias. Reflita na beleza da mensagem legada por Gandhi.

Obviamente que, como já dissemos, Carlos, mesmo modificando suas disposições íntimas, teria que colher o fruto de seu plantio. Mas poderia abrandar essa colheita com o exercício do amor. No entanto, enlouquecido, distante dos valores evangélicos, optou pelo caminho mais difícil: o suicídio.

Uma pena! Muitos são os Carlos que enceguecidos pelo ciúme e acusados pela culpa adentram a porta enganosa do suicídio como salvação de seus sofrimentos.

Ledo engano!

Só o amor, caro leitor, só mesmo o amor regado a muita oração e disciplina para não recair nos mesmos equívocos é que poderá trazer resquícios de paz a quem se deixou dominar pela dupla tenebrosa que atende pelos nomes de ciúme e culpa.


(Extraído do livro “Evite a rota do suicídio”, de Wellington Balbo/Arlindo Rodrigues/Alfredo Zavatte.)



 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita