EUGÊNIA PICKINA
eugeniapickina@gmail.com
Londrina, PR
(Brasil)
O não-ver
Melanie Klein
situa a inveja
como uma das
emoções mais
primárias. Para
ela, a inveja
emerge a partir
do sentimento de
impotência e
dirigido à
aspiração de um
bem, que outro
possui.
Ao mesmo tempo
em que o ciúme é
querer manter o
que se tem e a
cobiça é desejar
aquilo que não
lhe pertence, a
inveja é não
querer que o
outro tenha. E,
por isso,
geralmente, a
inveja tem
relação com o
ato de fingir,
dissimular,
falsear, porque
o invejoso não
se declara
abertamente, não
confessa seu
desgosto diante
da constatação
da felicidade ou
superioridade de
outrem
–
o invejado.
O mais renegado
dos sete pecados
capitais é uma
emoção dolorosa
e inerente à
condição humana,
embora para a
maioria das
pessoas seja
difícil
assumi-la.
Por fazer parte
dos mecanismos
de defesa do ser
humano, a
inveja, pelas
suas conotações
sombrias, exige
que o seu
portador a
esconda, o que
tanto dificulta
o educar dos
impulsos
comparativos
como instaura
bloqueios a
qualquer
potencial
criativo.
O invejoso,
geralmente, é
inseguro,
desconfiado,
observador
minucioso da
vida alheia.
Finge
superioridade
quando, na
verdade,
sente-se
inferiorizado e
isso lhe causa
exaustão, pois
necessita
continuamente
mascarar o seu
precário estado
de harmonia
interior.
Amiúde, as
pessoas
invejosas são
ansiosas,
tristes ou
tomadas pela ira
ou revolta. E
como a inveja
corrói a
autoestima, ela
se torna uma
máscara cômoda
que usamos
sempre que não
queremos assumir
responsabilidade
por nossa vida e
bem-estar.
Não sem razão,
Ovídio escreveu:
"a inveja habita
no fundo de um
vale onde jamais
se vê o sol.
Nenhum vento o
atravessa; ali
reinam a
tristeza e o
frio, jamais se
acende o fogo,
há sempre trevas
espessas (...).
Assiste com
despeito aos
sucessos dos
homens e este
espetáculo a
corrói; ao
dilacerar os
outros, ela se
dilacera a si
mesma, e este é
seu suplício".
O "olhar-de-equívoco"
está contido na
própria
constituição
etimológica da
palavra inveja.
Em latim, "invidere"
significa "não
ver". Por
conseguinte, o
invejoso,
contaminado pelo
desamor,
nutre-se da
projeção,
causando, a si
mesmo, o castigo
que lhe intoxica
os olhos.
A inveja nasce
quase sempre por
nos compararmos
com outros. Mas
são os impulsos
comparativos que
levam o
indivíduo a
ignorar sua
singularidade e
expressão
própria, pois
aprisionado pelo
sentimento de
inferioridade
criado pela
comparação.
Ainda, como o
portador da
inveja não
suporta a
suposta
felicidade
daquele que
inveja (seja uma
qualidade, uma
posição, um
estilo de ser
etc.), a
tendência é vir
a adulterar o
valor do objeto
desejado,
esquecido o
invejoso de que
somente sentimos
inveja do que
podemos por nós
mesmos
conquistar.
Como combater a
inveja?
Para livrar-se
da inveja é
essencial
assumi-la,
trabalhando este
algo em si mesmo
e que se
encontra
desajustado.
Descobrir, em
seguida, as
próprias
qualidades,
controlando os
impulsos
comparativos.
Por ser a inveja
o extremo oposto
da admiração, a
proposta é
individualista,
pois sempre
somos
responsáveis
pela escassez
que nos
atinge...
De verdade,
acredito que a
única forma de
nos livrarmos da
inveja é com
virtudes. Ou
seja: fortalecer
a nossa
disposição de
fazer o bem, no
aviso de
Aristóteles.
Oferecer vida,
oferecer amor,
oferecer o olhar
"nítido como um
girassol", do
poeta Pessoa. E,
no lugar de
reparar o que
nos falta,
simplesmente
valorizar nossa
completude. E em
contato com
nossas emoções,
ativar nossos
dons e abrir-se
ao fluxo do
"nós", pois é
sempre o outro
que nos estimula
a ultrapassar
nossos limites e
ir além de tudo
o que achamos
que somos.