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Estudando a série André Luiz
Ano 6 - N° 283 - 21 de Outubro de 2012

MARCELO BORELA DE OLIVEIRA
mbo_imortal@yahoo.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)
 

Sexo e Destino

André Luiz

(Parte 2)

Damos continuidade ao estudo da obra Sexo e Destino, de André Luiz, psicografada pelos médiuns Waldo Vieira e Francisco Cândido Xavier e publicada em 1963 pela Federação Espírita Brasileira.

Questões preliminares 

A. Que fato levou Pedro Neves ao lar de sua filha Beatriz?

Foi a doença da filha, que, segundo explicou Pedro Neves, atravessava os derradeiros dias terrenos, com o corpo torturado pelo câncer. Em conversa com André Luiz, Neves confessou ter estado por muitos anos à margem das tricas do navio familiar, mas agora, por amor à filha, era compelido a topar, com espí­rito de caridade, a irreflexão e o descaramento, conquanto se sentisse inapto, desambientado e de­bilitado pela expecta­tiva de erros constantes. (Sexo e Destino, capítulo I, pp. 17 e 18.)

B. Na situação em que se encontrava, Beatriz recebia o amparo dos benfeitores espirituais?

Sim. Ao lado de seu leito, Amaro, sisudo enfermeiro desencarnado vigiava, atento. Beatriz estava recebendo também o auxílio do irmão Félix, que dirigia importante casa socorrista ligada ao Ministério da Regeneração em "Nosso Lar", e era conhecido como sendo um apóstolo da abnegação e do bom-senso. (Obra citada, capítulo II, pp. 19 e 20.)

C. Além da enfermidade da filha, um fato estava deixando Pedro Neves amargurado. Que fato é esse?

O que amargurava Neves era a infidelidade conjugal por parte do esposo de Beatriz. Segundo ele, na quinta noite de sua permanência no lar da filha, notando que ela experimentava aguda crise de sofrimento, diligenciou buscar o genro para assisti-la, mas não o encontrou no escritório, onde supostamente ele estaria, conforme falsa informação que deixara em casa. Insistindo na procura do genro, ele acabou surpreendendo-o, em plena madrugada, junto de uma jovem, unidos, qual marido e mulher. (Obra citada, capítulo III, pp. 25 e 26.)

Texto para leitura

6. Uma família sem rumo - Pedro Neves informou, na sequência, que seus filhos Jorge e Ernesto, ludibriados pelo fascínio do ouro, enlou­queceram no mesmo delírio do dinheiro fácil e se animalizaram a tal ponto que nem de leve guardavam qualquer traço da memória paterna, em­bora fossem, à época, negociantes abastados, em idade madura. Aliás, intentando captar-lhes cooperação e simpatia, o padrasto chegou a in­sinuar que eles seriam filhos dele mesmo, através de união com sua mãe, o que Enedina não desmentiu. Enedina havia desencarnado, dez anos antes, pela imposição da icterícia, que lhe apareceu por ver­dugo invi­sível, evocado pelas bebidas alcoólicas. Ao vê-la enferma e vencida, Pedro tentara, na ocasião, todos os processos de socorro à sua disposição, temendo vê-la escravizada, na vida post-mortem, às forças avil­tantes a que se jungira sem perceber. Ansiava, então, retê-la no corpo físico, mas em vão. Colhida por entidades infelizes, às quais se con­sorciou levianamente, Enedina se comprazia na viciação. Não ha­via, pois, outro recurso senão esperar, esperar... Deplorando a situação da esposa e dos dois filhos, Pedro lembrou a André que a bondade de Deus não o havia arrojado, de todo, à solidão, porque sua filha Beatriz, de quem ele jamais se separara pelos laços do espírito, supor­tara pacien­temente as afrontas e conservara-se fiel ao seu nome. "Agora, com quase meio século de existência entre os homens, presa em­bora ao ca­rinho que consagra ao esposo e ao filho único –  continuou Neves – , prepara-se Beatriz para o regresso... Minha filha vem atravessando os derradeiros dias terrenos, com o corpo torturado pelo câncer..." Pedro Neves confessou, então, ter estado por muitos anos à margem das tricas do navio familiar... Como muitos procedem, fizera-se ao oceano largo da vida... Agora, por amor à filha, era compelido a topar, com espí­rito de caridade, a irreflexão e o descaramento, mas sentia-se inapto, desambientado, e via-se na condição do aluno de­bilitado pela expecta­tiva de erros constantes. (Capítulo I, pp. 17 e 18)

7. No lar de Beatriz - Em casa da filha de Pedro Neves, André pôde ver que a doença consumia a forma física de Beatriz, desde muito, porque, aos quarenta e sete anos de idade, ela mostrava o rosto singu­larmente engelhado e o corpo leve. A enferma denotava enorme cansaço e era fácil de lhe ver a preocupação, ante a crise iminente. Beatriz mostrava em seu pensamento a convicção de que a desencarnação estava próxima. Embora tranquila, inquietava-se pelos vínculos que a prendiam no mundo, o que não a impedia de visualizar as portas do Além, plas­mando formosos quadros íntimos e recordando o pai que perdera na in­fância, qual se visse prestes a recuperá-lo em definitivo, tal a extensão do amor que os unia um ao outro. Ao lado de seu leito, sisudo enfermeiro desencarnado vigiava, atento. Era Amaro, a quem Pedro Neves apresentou André. A enferma estava recebendo também o auxílio do irmão Félix, que dirigia importante casa socorrista, ligada ao Ministério da Regeneração, em "Nosso Lar". Félix, famoso pela bondade e paciência, era conhecido como sendo um apóstolo da abnegação e do bom-senso. Bea­triz experimentava, naquele momento, dores agudas e o companheiro mos­trou o propósito de aliviá-la, através do passe confortativo. De olhos cerrados, a doente - que revelava profunda sensibilidade mediúnica -, embora não assinalasse a presença do pai, lembrava a ternura do ge­nitor, que lhe parecia distante e inacessível no tempo... Na acústica da memória, ouvia as canções do lar, voltava, encantada, às horas da meninice e sentia-se no regaço paternal, à  maneira de uma ave de re­gresso ao ninho... Beatriz chorava e, sem que a boca enunciasse o me­nor movimento, clamava intimamente com toda a alma: "Pai, meu pai!..." (Capítulo II, pp. 19 e 20)

8. A enfermeira improvisada - Neves cambaleou, agoniado... André enlaçou-o, pedindo-lhe coragem. A ventania da angústia, porém, sobre o ânimo do companheiro atribulado, perdurou alguns momentos. Refeito, a recompor o semblante que o sofrimento transfigurara, espalmou a destra na fronte da filha e orou, suplicando o amparo da Bondade Divina. Chispas de luz, quais minúsculas flamas azulíneas, evolavam-lhe do tó­rax, a se projetarem naquele corpo fatigado, revestindo-o de energias calmantes. Beatriz acomodou-se a suave torpor. Uma jovem de aproxima­damente vinte anos de idade penetrou, então, cautelosamente, no quarto e tomou o pulso da enferma, verificando-lhe as condições. Em seguida, aplicou-lhe injeção anestesiante. A enferma não mostrou a mínima reação, continuando a descansar, sem dormir; o concurso magnético de mi­nutos antes insensibilizara-lhe os centros nervosos. A enfermeira im­provisada acomodou-se em uma poltrona, abriu parte da janela do quarto e acendeu um cigarro, passando a fumar distraidamente, dando a ideia de alguém que diligenciava fugir de si mesma. Pedro Neves fitou-a e informou: "Trata-se de Marina, contadora de meu genro, que se dedica ao comércio de imóveis... Agora, a pedido dele, desempenha funções de as­sistente..." Evidente sarcasmo transparecia-lhe da palavra reticen­ciosa. "Imagine! –  voltou a dizer –  fumar aqui, numa câmara de dor, onde a morte está sendo esperada!..." Os olhos de Marina denotavam recôndita inquietude. André aproximou-se, então, reverentemente, da jo­vem, no propósito de sondá-la em silêncio e colher-lhe as vibrações mais íntimas, mas recuou assustado. Estranhas formas-pensamentos, re­tratando-lhe os hábitos e anseios, em contradição com os propósitos de socorrer a doente, mostraram a André que Marina ali se achava a con­tragosto. Sua mente vagueava longe... Quadros vivos de esfuziante agitação ressumavam-lhe na cabeça... De olhar parado, escutava, dentro de si mesma, a música brejeira da noite festiva que atravessara na vés­pera... (Capítulo II, pp. 21 e 22)

9. O caso Marina - Marina experimentava ainda na garganta a impressão do gim que sorvera, abundante, na véspera. Apesar de surgir aos olhos dos homens como uma menina crescida, sob o turbilhão de né­voa fumarenta exibia telas mentais complexas, a lhe relampaguearem na aura imprecisa. Com o objetivo de compreender o que se passava, André deu início a ampla anamnese psicológica. Marina apresentou, a princí­pio, a figura de um homem amadurecido, cunhada por sua própria imaginação, a repetir-se-lhe, muitas vezes, acima da fronte. Ela e ele, juntos... Era fácil perceber, de pronto, a intimidade, o romance... Fisicamente, semelhavam pai e filha; entretanto, pelas atitudes senti­mentais, não conseguiam disfarçar a estuante paixão um pelo outro. Nos painéis sutis que surgiam e se desfaziam, alternadamente, mostravam-se ambos extasiados, ébrios de prazer, estivessem aboletados no automóvel de luxo ou enlaçados na areia morna das praias... Deslumbrantes paisa­gens de Copacabana ao Leblon desfilavam por admirável fundo pictórico. A jovem procurava registar com mais interesse as reminiscências que lhe empolgavam os sentidos, para, logo depois, mentalizar, surpreen­dentemente, outro homem, tão jovem quanto ela mesma, evidenciando-se na tela mental entregue às cenas de um filme interior, diferente... Formava novo tipo de palco para exibir a lembrança das próprias aven­turas, no qual se destacava igualmente ao pé do rapaz, como se esti­vesse afeiçoada aos mesmos sítios, desfrutando companhias diversas... Ela e ele também juntos, no mesmo carro entrevisto ou na condição de pedestres felizes, saboreando refrescos ou repousando em animados en­tendimentos nos jardins públicos, sugerindo o encontro de crianças enamoradas, a entretecerem aspirações e sonhos... Via-se com clareza que Marina revelava a personalidade dúplice da mulher dividida entre dois homens, jugulada por pensamentos de medo e inquietude, ansiedade e arrependimento. Pedro Neves, que também partilhara a inspeção, disse, abatido: "Está vendo? Julga que é fácil para mim, pai da do­ente, suportar aqui semelhante criatura?" (Capítulo II, pp. 23 e 24)

10. O esposo infiel - Passando ambos a pequeno salão de leitura, contíguo ao aposento de Beatriz, Pedro Neves cravou os olhos úmidos nos olhos de André e ponderou: "Após a desencarnação, achamo-nos na segunda fase da própria existência e ninguém, na Terra, imagina as no­vas condições que nos tomam de assalto... De começo, renovamos a vida... Equipes salvadoras, apoio na prece, estudo das vibrações, es­cola da caridade. Ensaiamos, felizes, o culto dos grandes sentimentos humanos... Depois, quando trazidos, de retorno, ao trabalho mais ín­timo, na arena doméstica, que supúnhamos varrida para sempre da memória, como na situação especial de meu caso, a didática é outra... É preciso espremer o sangue do coração para confirmar o que ensinamos com a cabeça... Avalie que me encontro nesta casa, em serviço, apenas há vinte dias e já recebi tantas punhaladas na alma, que, não fossem as necessidades de minha filha, teria fugido, incontinenti... Sem mi­nhas observações pessoais, não teria admitido tanta leviandade em meu genro... Bilontra, fanfarrão, despudorado..." André tentou cortar o assunto, comentando a excelência do esquecimento de todo mal e argu­mentando quanto ao merecimento do auxílio silencioso, através da prece. Neves sorriu, meio desconsolado, e ajuntou: "Compreendo que você se reporta à vantagem do pensamento positivo na fixação do bem e creia que, de minha parte, farei quanto puder para não esquecê-lo. Agora, porém, tolere, por favor, as minhas considerações talvez desca­bidas..."  "Saiba você –  prosseguiu Neves –  que na quinta noite de minha permanência aqui, notando Beatriz em aguda crise de sofrimento, diligenciei buscar meu genro para assisti-la em pessoa... E sabe onde o encontrei? Nada de escritório, segundo a falsa informação que dei­xara em casa. Indignado, fui surpreendê-lo numa furna penumbrosa, em plena madrugada, junto da menina que você acaba de conhecer. Os dois unidos, qual marido e mulher. Champanha correndo e música lasciva. En­tidades perturbadoras e perturbadas, jungidas ao corpo dos bailarinos, enquanto outras iam e vinham, a se inclinarem sobre taças, cujo con­teúdo lábios entediados não haviam conseguido sorver totalmente. Em recanto multicolorido, onde algumas jovens exibiam formas seminuas em coleios esquisitos, vampiros articulavam trejeitos, completando, em sentido menos digno, os quadros que o mau gosto humano pretendia apre­sentar, em nome da arte. Tudo rasteiro, impróprio, inconveniente... Fisguei meu genro e a colaboradora, nos braços um do outro, recordei minha filha doente e revoltei-me. Súbito desespero apossou-se de mim. Oscilou minha razão escurecida, pois cheguei a justificar, de relance, a deplorável atitude dos companheiros desencarnados que se transformam em vingadores intransigentes. O homem velho que eu fora e o homem re­novado que aspiro a ser digladiavam em minhas fibras recônditas..." (Capítulo III, pp. 25 e 26) (Continua no próximo número.) 



 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita