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Crônicas e Artigos

Ano 6 - N° 285 - 4 de Novembro de 2012

ALTAMIRANDO CARNEIRO
alta_carneiro@uol.com.br
São Paulo, SP (Brasil)
 


A jovem de riso triste


Castro Alves, através da psicografia de Jorge Rizzini, ditou uma poesia à Terra, intitulada: “Prostituição”, onde aborda o problema de forma bastante humana, denominando a moça que é forçada a prostituir-se de “jovem de riso triste”. A referida poesia está inserida no livro Sexo e Verdade,  com poemas ditados por Castro Alves, Guerra Junqueiro e Casemiro de Abreu, edição da Editora Espírita Correio Fraterno. O livro que temos em mãos é de setembro de 1988, 4ª. Edição.

Inicialmente, Castro Alves fala sobre a prostituição através dos tempos:

“Ó jovem de riso triste, / Entregue à prostituição, / Teu drama tem mil raízes, / Que antecedem a Platão... / Já na História Religiosa, / Tu surges, voluptuosa, / Frente aos deuses de granito... / Desde o culto de Astarté, / Tu bailavas nua, até, / Na Fenícia e lá no Egito!

Na Índia – o culto do Falo, / De Siva – o deus dos dois sexos, / Nos grandes ritos eróticos / Deixavas deuses perplexos... / Na imensa Mesopotâmia, / Rolavas na mesma infâmia, / - Em tempos de Babilônia! / Estás no culto a Milita... / E nos ritos de Afrodita, / Deusa lúbrica da insônia!

Também nos templos de Baco, / E outros deuses imorais, / - Mercúrio, Vênus ou Lesbos, / Dançavas nas saturnais! / Eras então a deidade / Da eterna fecundidade... / A prostituta sagrada! / Alugavas os teus dotes / Por ordem dos sacerdotes, / -  Nos templos, não na calçada!

Depois os cínicos bonzos, / De um modo um tanto poltrão, / Mandaram fosses às ruas / Fazer a prostituição... / E as casas de tolerância / São erguidas com abundância / No vasto Império de Roma! / Mulher, prazeres, bebida! / Eis a bandeira da Vida / - A ruína de Sodoma...”

Veja o leitor que a mulher foi praticamente jogada na prostituição. Isto é: não foi ela que se fez prostituta. Fizeram-na.

As estrofes seguintes são mais contundentes:

“E as moças de pele branca / São vendidas no mercado; / Todas menores de idade, / Como rebanhos de gado! / Muitas são filhas de escravos, / As outras, de pais ignavos; / Enchem-se mil lupanares! / Surge Calígula, então, / E explora a prostituição / Com taxas bem singulares!

Ó jovem de riso triste, / Teu romance é bem complexo; /  Vem de longe a grande rede, / Que explora os vícios do sexo! / Passa o tempo, ano após ano, / E cai o Império  Romano! / Estamos na Idade Média... / Sangrando em terríveis noites, / Terás torturas e açoites / Em satânica tragédia!...”

O poeta faz referência à Lei de Causa e Efeito:

“E em caso de reincidência, / Terás a mutilação / Do nariz e das orelhas! / - Eis a Lei de Repressão! / Fizeram-te de ti um rato / Fugindo às garras do gato / No esterqueiro medieval... / prisão – em meio ao excremento! / Açoite – ao invés de argumento! / Abuso – ao invés de Moral!”

O círculo vicioso continua:

“Mas o comércio não para? / Problema sem solução? / A fome enfrenta o pudor? / Aumenta a prostituição? /  E o Governo, teu parceiro, / Enche os cofres de dinheiro, / Com o Ministro da Fazenda... / Não combate teu comércio, / Mas pagarás o sestércio! / - Quer teu imposto de renda!”

O poeta fala da podridão da sociedade, da exploração de meninas e lança mais uma vez o seu olhar amoroso à jovem de riso triste:

“Alicerces estão podres / Da sociedade atual... / Tornou-se ridículo o Homem / Quando fala contra o Mal... / Olhai a culta Paris! / Exploram a meretriz / Mais de trezentos hotéis! / E há casas clandestinas / Que recebem só meninas! / Multiplicam-se os bordéis...”

A mão que afaga – como no dizer de Augusto dos Anjos, no soneto Versos Íntimos – é a mesma que apedreja:

“Ó jovem de riso triste, / Já enferma e sem ilusão, / Lamento ver-te a vagar / No lodo da perdição... / Nasceste em um ambiente / Pobre, cruel, negligente, / Onde faltava ternura... / E veio o primeiro engano! / Então, traçaste o teu plano! / Dinheiro! Amor! / Aventura!

Mas eras inda criança! E vivias na penúria... / Quem te trouxe às ruas, praças, / Não foi jamais a luxúria! / Não tinhas educação! / Não te deram profissão! / E o mundo a te cobiçar... / E hoje o mundo critica, / O Brasil, a Martinica, / Quando vais pro lupanar!”

Como nos tempos de Jesus, os críticos ainda continuam. Como naqueles tempos, são os mesmos que procuram o leito da jovem de riso triste, na calada da noite:

“Mas muitos que te criticam, / Procuram teu leito imundo, / E dizem-te belas frases, / Como qualquer vagabundo... / Talvez o próprio Juiz / Procure uma meretriz / Nas horas mortas da noite... / E depois proclama as penas / Para as murchas açucenas: / Dá-lhes três dúzias de açoite!

“Pobre jovem de olhar triste, / Presa no mundo dos vícios, / Quantas de tuas amigas / Hoje dormem nos hospícios! / Exploram-nas vadios, / Homens com falta de brios, / Traficantes, jogadores! / Vida tranquila? – Quimeras, / Que nesse mundo de feras, / Há olhos aterradores!...”

Por fim, o poeta dá um conselho fraterno:

“Ó moças agrilhoadas / No duro viver malquisto, / Lembrai-vos de Madalena / Libertada pelo Cristo! / Há Espíritos burlescos / Envolvendo-vos, grotescos, / E o jogo não percebeis! / Que desça do Céu a Luz! Socorrei-vos de Jesus! / - E honrai a Tábua das Leis!”
 


 


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