ANGÉLICA
REIS
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Londrina, Paraná
(Brasil) |
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A
Personalidade Humana
Fredrich
Myers
(Parte 10)
Damos
sequência ao estudo
metódico e sequencial do
livro A Personalidade
Humana, de Fredrich
W. H. Myers, cujo título
no original inglês é Human
Personality and
Its Survival of Bodily
Death. |
Questões preliminares
A. É correto dizer que a
raça humana tende à
degeneração nervosa?
Não. Não é correto
afirmar que a raça
humana tende à
degeneração nervosa, nem
que essa degeneração
alcance o auge entre
seus representantes mais
eminentes. Pode-se, sim,
dizer que a proporção de
perturbações nervosas
tende a aumentar em
relação a outras, mas
esse aumento, longe de
constituir o sintoma de
uma degeneração nervosa,
é antes devido a que as
modificações nervosas e
o desenvolvimento
nervoso se realizam
atualmente entre os
povos civilizados com
maior rapidez do que
anteriormente.
(A Personalidade Humana.
Capítulo III – O gênio.)
B. É racional supor que
existem ao redor de nós
energias de que não
suspeitamos?
Sim. As faculdades de
sensação e percepção
desenvolveram-se
gradualmente nos
organismos vivos. Para
dar um único exemplo: a
energia elétrica existiu
sempre, mesmo antes que
os homens disso
suspeitassem. Por que
não supor que existem ao
redor de nós outros
meios, outras energias
das quais não
suspeitamos e que a
qualquer dia chegaremos
a descobrir? E o que nos
impede de admitir que as
ações telepáticas ou as
influências que os
Espíritos exercem a
distância, sobre outros
Espíritos, formem parte
dessas energias a serem
descobertas, mas sem
dúvida existentes e
sempre ativas?
(Obra citada. Capítulo
III – O gênio.)
C. Como Myers vê a
explicação
exclusivamente
materialista da
evolução?
Ele diz que é absurda
tal tese e afirma mesmo
que é ela impossível.
Ninguém explica a
evolução sem a tácita
suposição de que, de
alguma maneira, a
Natureza tende a criar a
inteligência; que o
coelho e o micróbio da
gripe não constituem
seus resultados últimos.
Mas sobre a qualidade e
a quantidade de
inteligência que pode
criar, devemos dizer que
não se trata do homem
sensual mediano, mas dos
melhores exemplares de
nossa raça. A estes é
que devemos perguntar
qual é o fim da sua
vida: se o seu trabalho
tende apenas a
proporcionar-lhes o
tormento cotidiano ou se
é o produto do amor e da
sabedoria.
(Obra citada. Capítulo III – O gênio.)
Texto para leitura
212. Não é correto que a
raça humana tenda, de
modo geral, à
degeneração nervosa, nem
que essa degeneração
alcance o auge entre
seus representantes mais
eminentes. Sem dúvida,
pode-se reconhecer, com
alguma aparência de
razão, que a proporção
de perturbações nervosas
tende a aumentar em
relação a outras, mas
esse aumento, longe de
constituir o sintoma de
uma degeneração nervosa,
é antes devido a que as
modificações nervosas e
o desenvolvimento
nervoso se realizam
atualmente entre os
povos civilizados com
maior rapidez do que
anteriormente.
Assistimos, com efeito,
a uma adaptação a meios
cada vez mais amplos e
essa adaptação deve
inevitavelmente ser
acompanhada, nos casos
mais marcantes, de
determinado estado de
instabilidade nervosa.
213. Até certo ponto
essas modificações podem
parecer lamentáveis, mas
não se deve esquecer que
o aumento e o
agravamento das
perturbações nervosas é
apenas relativo, já que
outras causas de
doenças, como a fome e a
sujeira, tendem a
diminuir entre os povos
civilizados. É provável
que os selvagens e os
povos primitivos sofram
de instabilidade nervosa
com igual frequência,
mas não têm inteligência
suficiente para se dar
conta e preocupar-se com
isso. Quanto à minha
outra proposição,
segundo a qual a
evolução nervosa se
cumpriria em nossa época
com maior rapidez do que
anteriormente, vejo a
prova disso em todos os
atos que exigem uma
rápida e precisa
adaptação do sistema
nervoso. Os recordes
atléticos de nossos dias
são mais devidos aos
nervos do que aos
músculos. E o nível de
adaptação moderna, para
qualquer tipo de
trabalhos intelectuais
ou manuais, sobe tão
rapidamente quanto o
grau de perfeição da
maquinaria destinada a
substituir nossas forças
físicas.
214. Repito: o
desenvolvimento
acelerado de nossa
capacidade nervosa não
pode deixar de dar lugar
a um determinado grau de
instabilidade nervosa.
Mas não podemos esquecer
que essa instabilidade
nada mais é que uma
forma, que uma expressão
particular da evolução e
que todas as manias,
todos os tiques, gostos
fantásticos,
sensibilidade exagerada
e aberrante, que
Lombroso notou em grande
número de indivíduos
célebres, nada mais são
do que perturbações
passageiras que
acompanham o
desenvolvimento do
organismo humano até a
sua plenitude, ou que
precederam os
derradeiros esforços
destinados a apresentar
ao mundo um organismo
renovado. É esse o meu
ponto de vista.
215. Para torná-lo
aceitável, deveria poder
mostrar que se depreende
logicamente de
considerações mais
distantes e meramente
especulativas referentes
à natureza e ao valor de
toda a existência e toda
a evolução humanas.
Possuímos já diversas
sínteses desse gênero,
entre as quais a síntese
materialista aparece
como a mais superficial.
No nosso profundo
desconhecimento das
fontes e origens da vida
não temos o direito de
considerá-la, como os
materialistas, um
produto planetário
destinado a fins
igualmente planetários.
O biólogo que afirmasse
que a vida terrestre só
serve para produzir nova
vida terrestre
assemelhar-se-ia ao
geólogo que, antes do
surgimento da vida,
tivesse afirmado que as
forças geológicas
constituíam a única
fonte de atividade de
nosso planeta.
216. Desde que surgiu o
primeiro gérmen de vida
sobre a terra, sua
história foi não só a de
uma adaptação
progressiva a um meio
conhecido, mas também a
de uma descoberta
progressiva de um meio
desconhecido, ainda que
sempre presente. O que
chamamos de
irritabilidade primitiva
simples era, na
realidade, uma vaga
panestesia
(1), uma faculdade virtual, mas ainda inconsciente de todos os atos
aos quais tinha de
responder.
217. Com o
desenvolvimento dessas
faculdades de sensação e
de reação revelaram-se
gradualmente aos
organismos vivos meios
até então desconhecidos.
Para dar um único
exemplo: por acaso a
energia elétrica não
existiu sempre e não
manifestou sempre a sua
atividade, mesmo antes
que os organismos vivos
descobrissem que
possuíam a aptidão de
reagir a essas
atividades? Por que não
supor que existem ao
redor de nós outros
meios, outras energias
das quais não
suspeitamos e que a
qualquer dia chegaremos
a descobrir, mas que sem
dúvida atuam sobre nós e
sobre os outros seres
vivos, provocando
igualmente reações de
nossa parte, das quais
não nos damos conta
porque não atravessaram
ainda o limiar do eu
supraliminar? E o que
nos impede de admitir
que as ações telepáticas
ou as influências que os
Espíritos exercem a
distância, sobre outros
Espíritos, formem parte
dessas energias a serem
descobertas, mas sem
dúvida existentes e
sempre ativas? e de
admitir que vivemos num
meio inconcebível e sem
limites, mundo de
pensamento ou universo
espiritual carregado de
vida infinita, que
penetra e ultrapassa a
todos os Espíritos
humanos e ao qual uns
chamam Alma do mundo e
outros Deus?
218. No momento não me
ocuparei dessas
faculdades paranormais.
O que pretendo
demonstrar é que o
gênio, longe de poder
ser colocado na mesma
categoria da loucura e
considerado como uma
aberração do Espírito
humano ou como um sinal
de degenerescência,
constitui antes uma das
fases mais avançadas da
evolução humana; e que
as produções do gênio, a
meu ver a filosofia, as
artes plásticas, a
poesia, as matemáticas
puras, que tantos
consideram como
resultados acessórios,
sem qualquer utilidade
para a existência
material, são outras
intuições de verdades
novas e de novas forças,
inacessíveis ao homem
médio que, ao invés da
inspiração, só possui
esse consenso de
capacidades
diferenciadas que a
natureza elevou sobre o
limiar da consciência,
tendo em vista os fins
da vida cotidiana.
219. A explicação
meramente materialista
da evolução é
impossível. E é absurda
quando supõe como seu
objetivo a sobrevivência
dos animais mais aptos a
vencer os inimigos.
Ninguém explica a
evolução sem a tácita
suposição de que, de
alguma maneira, a
Natureza tende a criar a
inteligência; que o
coelho e o micróbio da
gripe não constituem
seus resultados últimos.
Mas sobre a qualidade e
a quantidade de
inteligência que pode
criar, devemos dizer que
não se trata do homem
sensual mediano, mas dos
melhores exemplares de
nossa raça. A estes é
que devemos perguntar
qual é o fim da sua
vida: se o seu trabalho
tende apenas a
proporcionar-lhes o
tormento cotidiano ou se
é o produto do amor e da
sabedoria.
220. A inspiração genial
e o pensamento
lógico-consciente formam
duas quantidades talvez
incomensuráveis. Da
mesma forma que o jovem
calculador resolve
problemas com o auxílio
de métodos que diferem
dos usados pelos
matemáticos, nas
produções artísticas
esse algo estranho, que
comporta “toda a beleza
deslumbrante”, pode ser
a expressão de uma
diferença real entre o
mundo da percepção
subliminar e o da
atividade supraliminar.
Parece-me que esta
diferença é
particularmente sensível
no que diz respeito às
relações do eu
subliminar com a função
da linguagem. Ao tratar
a linguagem como um ramo
da arte ou da poesia, o
eu subliminar ultrapassa
com frequência o esforço
consciente, e algumas
vezes permanece nesse
esforço, quando se vê
obrigado a usar as
palavras como uma forma
necessária para exprimir
ideias para as quais a
linguagem comum não foi
criada.
221. Desse modo, na
presença de uma das
obras-primas verbais da
Humanidade, o Agamenon
de Ésquilo, por exemplo,
temos a vaga impressão
de que uma inteligência
diversa da razão
supraliminar ou da
seleção consciente
contribuiu para a
elaboração desta
tragédia. O resultado,
mais do que a perfeição
de uma escolha racional
entre dados conhecidos,
assemelha-se a uma
apresentação imperfeita
de algum esquema baseado
em percepções por nós
desconhecidas. Mas, por
outro lado, ainda que o
gênio possa servir-se
das palavras de uma
forma que lembre um
pouco a nostalgia
misteriosa da música,
parece-me que a nossa
educação subliminar está
menos ligada à faculdade
da linguagem do que a
supraliminar.
222. Existe na linguagem
corrente uma frase cujo
alcance psicológico é
maior do que se pensa.
Daquilo que chamamos
gênio e de tudo que com
o gênio relacionamos,
arte, amor, emoção
religiosa, dizemos que
vai além do alcance da
linguagem. Ainda que a
linguagem falada e
escrita se tenha
convertido em nosso
principal meio de
expressão e de
comunicação de nossos
sentimentos e emoções,
não temos qualquer razão
para admitir a priori
que possa expressar
todos os nossos
pensamentos e emoções.
223. Afirmou-se que
“toda linguagem
principia como poesia e
termina como álgebra”. O
que resta por dizer é
que se inicia como uma
emergência subliminar
para terminar como
artifício supraliminar.
Os instintos orgânicos
determinam a emissão dos
primeiros sons, as leis
inconscientes do
Espírito proporcionam o
primeiro esboço da
gramática. Mas em nossos
dias, a singeleza da
linguagem começa a
desaparecer. As
necessidades da Ciência
e do comércio
tornaram-se dominantes,
a primeira por ter
criado deliberadamente,
para seu uso, um sistema
de signos, uma
disposição de letras e
de números ou
vocabulários técnicos,
construídos sobre um
plano, decidido de
antemão, o segundo
esforçando-se por
conseguir o mesmo
caráter algébrico com a
contabilidade, os
códigos telegráficos
etc.
224. É certo que os
progressos da linguagem
não dependem unicamente
do que se faz nos bancos
ou nos laboratórios.
Antigamente favorecia-se
a espiritualização da
linguagem humana, de
modo a tornar o nosso
vocabulário, ainda que
baseado em objetos ou
sensações diretas,
adequado à expressão das
ideias filosóficas. Mas,
apesar desses esforços,
nossas manipulações
supraliminares
deixam-nos um
instrumento cada vez
menos capacitado a
exprimir a crescente
complexidade de nosso
ser psíquico.
225. Recorrendo ao
simbolismo, no sentido
mais amplo da palavra,
tal como se expressa na
arte, o homem de gênio
consegue suprir a
insuficiência da
linguagem. Falo do
simbolismo no sentido de
um acordo preexistente,
mas oculto, entre as
coisas visíveis e
invisíveis, entre a
matéria e o pensamento,
este e a emoção, através
do qual as artes
plásticas, a música e a
poesia, cada qual a seu
modo e no domínio que
lhes é próprio, fazem
suas descobertas e as
põem em evidência, para
a felicidade e a
educação humanas.
226. Ao me valer da
palavra simbolismo,
estou longe, repito, de
aderir às fórmulas de
qualquer escola. O
simbolismo de que falo
nada tem em comum com o
misticismo. Acredito não
poder existir aí um
abismo real nem uma
divisão marcante entre
as escolas realistas e
idealistas. Tudo o que
existe é contínuo e a
arte não pode simbolizar
um determinado aspecto,
sem, ao mesmo temo,
simbolizar, de uma forma
implícita, outros
aspectos menos visíveis
e aparentes.
227. A arte expressa o
simbolismo em todos os
graus de transparência e
obscuridade, desde o
simbolismo que nada mais
faz do que resumir a
linguagem, até o
simbolismo que a
ultrapassa. Algumas
vezes, e este é o caso
da música, é inútil
buscar uma interpretação
demasiado exata. A
música flui e fluirá
sempre através do seu
mundo ideal e
imaginário. Sua melodia
pode ser de um forte
simbolismo, mas do qual
os homens perderam a
chave. A poesia, ao
contrário, vale-se das
palavras, cujo sentido
aspira a superar. Se
pretende continuar sendo
poesia, deve, segundo a
expressão de Tennyson,
“exprimir através das
palavras um encanto que
as palavras não podem
proporcionar”.
228. Considerada, quer
sob o ponto de vista de
seu desenvolvimento na
raça, quer na sua
manifestação entre os
indivíduos, a música
surge não como um
produto de nossas
necessidades terrestres
e de seleção natural,
mas como uma aptidão
subliminar, que se
manifesta de forma
acidental, independente
das influências externas
e do eu supraliminar.
229. Sabemos até que
ponto é difícil explicar
as suas origens, de
acordo com qualquer das
teorias concernentes à
evolução das capacidades
humanas. Sabemos que a
música é algo que se
descobre, antes de ser
um resultado fabricado,
e as sensações
subjetivas dos próprios
músicos estão de
perfeito acordo com essa
concepção da natureza,
essencialmente
subliminar, da referida
aptidão. Não existe
outro ramo onde o gênio
ou a inspiração
constituam uma condição
tão essencial do êxito.
As obras-primas musicais
não nasceram da reflexão
sobre as relações
recíprocas das notas da
música. Nasceram, como
no caso de Mozart, de
uma inesperada explosão
de sons, de uma alegria
imprevista que se
revelou espontaneamente.
Nasceram, como no caso
do Abade Vogler, de
Browning, das
profundezas da alma e
das alturas do céu.
Transportando essas
frases poéticas aos
termos de que nos
servimos, podemos dizer
que chegamos a um ponto
em que os afloramentos
subliminares são
reconhecidos pela
personalidade
supraliminar como mais
profundos, mais
verdadeiros, mais
permanentes do que os
resultados do
pensamentos voluntário.
(Continua no próximo
número.)
(1)
Panestesia significa hipersensibilidade
exagerada. |