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Crônicas e Artigos

Ano 6 - N° 285 - 4 de Novembro de 2012

CLÁUDIO BUENO DA SILVA
klardec@yahoo.com.br
Osasco, SP (Brasil)
 


"Novidadeiros" 


O professor Herculano Pires (1914-1979), consagrado filósofo e escritor espírita, usou a palavra “novidadeiros” para designar aqueles que aparecem com “novas” ideias ou teorias no meio espírita, atraindo simpatizantes, mas também desencadeando polêmicas e dissensões.

Alguns de seus livros, como “Na Hora do Testemunho”, “O Verbo e a Carne”, “A Pedra e o Joio”, foram escritos exatamente para corrigir o que ele entendia como equívocos doutrinários graves, trazidos ao meio espírita por pessoas e instituições que lançavam confusão entre os espíritas, na medida em que suscitavam discussões acaloradas, volta e meia, reacendidas. E o fazia com a autoridade de conhecedor da doutrina, conforme reconhecimento do Espírito Emmanuel, através da psicografia de Chico Xavier, quando se referiu ao escritor como o “metro que melhor mediu Kardec”.

As sempre imediatas intervenções do professor Herculano se constituíram num libelo contra as investidas das sombras que, envolvendo os espíritas invigilantes, os incitam a criar correntes de pensamento ou mesmo ditam-nas mediunicamente, na tentativa de associá-las ao corpo doutrinário do Espiritismo ou mesmo para simplesmente lançar a confusão.

Sempre houve quem sofresse a tentação de acrescentar novidades de cunho pessoal ou de grupos no procedimento espírita. E quem também acatasse sem exame, opiniões esdrúxulas só porque ditadas pelos Espíritos. No excelente texto “Os conflitos”, publicado na Revista Espírita de dezembro de 1863, o Espírito Erasto deixou um alerta sobre o problema quando disse: “E que querem certos Espíritos da erraticidade fomentando entre as mediocridades da encarnação essa exaltação do amor-próprio e do orgulho, senão entravar o progresso?” Outro magnífico texto de Erasto, que respalda o assunto que tratamos aqui, está no capítulo XXI, de “O Evangelho segundo o Espiritismo”: Os falsos profetas da erraticidade, de leitura necessária para todos os espíritas.

Alguns espíritas preferem deixar os caminhos da simplicidade para entrar nos atalhos da complicação. Foi assim que vimos, em vários períodos do nosso movimento, abusos na interpretação e aplicação da água fluidificada, que em muitos centros espíritas virou panaceia para todos os males; do passe magnético que, da simples imposição das mãos, passou a “requerer um catálogo” para sua aplicação, em vista de excessiva teorização, descaracterizando “toda a beleza espiritual do passe espírita”, conforme expressão de Herculano Pires; assim também com a introdução de certos métodos polêmicos para tornar a desobsessão mais eficiente; a moda do “Espiritismo sem Espíritos”, uma forma radical de priorizar a opinião dos encarnados em detrimento das práticas mediúnicas; a insistente vontade de alguns em retocar, reformar, atualizar os textos de Allan Kardec, e tantas outras “novidades”.

Quando se fala em mistificação, em desvios de rota do movimento espírita, impossível não citar os célebres e traumáticos “ismos”, que causaram tantas controvérsias: o Ubaldismo, de Pietro Ubaldi; o Ramatisismo, de Ramatis; o Roustainguismo, de J. B. Roustaing; o Armondismo, de Edgar Armond; o Divinismo, de Oswaldo Polidoro, e outros “ismos”. Todos eles com uma curiosa característica: em meio a verdades, muitos equívocos destoantes da Revelação Espírita, codificada por Allan Kardec. Embora algumas dessas proposições não tenham surgido propriamente dentro do movimento espírita, nele se infiltraram, deixando resquícios que perduram ainda em muitos centros e federações pelo país.

Mas as investidas das sombras não param. Há algum tempo, muitas casas espíritas foram “invadidas” pela teoria das crianças índigo, versão importada sobre a reencarnação de muitos “anjinhos” inteligentes, cheios de independência e malícia, mas cheios também de rebeldia e agressividade que, segundo a fantasia dos seus “criadores” norte-americanos, têm a missão de renovar (?) a Terra. Muitos espíritas ficaram encantados com a novidade e durante bom tempo não se falou de outra coisa dentro da casa espírita.

Outra mania que se espalha insensatamente na atualidade: a de colher, não se sabe de onde, a “genealogia reencarnatória” de personagens espíritas. Quanto a isso, além das informações aceitas consensualmente, como por exemplo, as que Emmanuel revelou nos seus romances, sobre suas vidas passadas, e algumas outras notícias que o movimento espírita entendeu como autênticas, nada justifica as especulações que circulam no movimento, principalmente porque baseadas em informações de difícil comprovação, e também porque vindas de origens nem sempre livres de suspeição.

Ou seja, as novidades, os modismos no meio espírita não cessam. Apesar do “orai e vigiai” evangélicos, e das orientações doutrinárias deixadas por Allan Kardec à disposição de todos, as pessoas se descuidam e, por isso mesmo, criam tolices ou repassam informações colhidas sem critérios de segurança.  Herculano Pires tem total razão quando resume essa questão no livro “Mediunidade (Vida e Comunicação)”, avisando: “Os Espíritos mistificadores contam apenas com dois pontos de apoio para nos envolverem: a vaidade e a invigilância”.

Em verdade, perde-se muito tempo e energia com tudo isto, e o movimento espírita — agente que é do Espiritismo — se atrasa no cumprimento das verdadeiras funções que lhe compete realizar: espalhar, no meio social, o conhecimento espírita com seu conteúdo correto, fazendo diminuir a incredulidade, vencendo o materialismo, esclarecendo e consolando, ajudando a preparar o homem de bem para o futuro melhor.

“Mas infelizes os que, por suas dissensões, houverem retardado a hora da colheita”, afirma o codificador em “O Evangelho segundo o Espiritismo”, capítulo XX, Trabalhadores do Senhor.

Resta-nos o consolo, porém, de saber que as turbulências vêm e passam. É certo que deixam marcas no coração dos homens, mas também lhes ensinam a separar o joio do trigo.



 


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