CLÁUDIO BUENO DA SILVA
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Osasco, SP
(Brasil) |
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"Novidadeiros"
O professor Herculano
Pires (1914-1979),
consagrado filósofo e
escritor espírita, usou
a palavra “novidadeiros”
para designar aqueles
que aparecem com “novas”
ideias ou teorias no
meio espírita, atraindo
simpatizantes, mas
também desencadeando
polêmicas e dissensões.
Alguns de seus livros,
como “Na Hora do
Testemunho”, “O Verbo e
a Carne”, “A Pedra e o
Joio”, foram escritos
exatamente para corrigir
o que ele entendia como
equívocos doutrinários
graves, trazidos ao meio
espírita por pessoas e
instituições que
lançavam confusão entre
os espíritas, na medida
em que suscitavam
discussões acaloradas,
volta e meia,
reacendidas. E o fazia
com a autoridade de
conhecedor da doutrina,
conforme reconhecimento
do Espírito Emmanuel,
através da psicografia
de Chico Xavier, quando
se referiu ao escritor
como o “metro que melhor
mediu Kardec”.
As sempre imediatas
intervenções do
professor Herculano se
constituíram num libelo
contra as investidas das
sombras que, envolvendo
os espíritas
invigilantes, os incitam
a criar correntes de
pensamento ou mesmo
ditam-nas
mediunicamente, na
tentativa de associá-las
ao corpo doutrinário do
Espiritismo ou mesmo
para simplesmente lançar
a confusão.
Sempre houve quem
sofresse a tentação de
acrescentar novidades de
cunho pessoal ou de
grupos no procedimento
espírita. E quem também
acatasse sem exame,
opiniões esdrúxulas só
porque ditadas pelos
Espíritos. No excelente
texto “Os conflitos”,
publicado na Revista
Espírita de dezembro de
1863, o Espírito Erasto
deixou um alerta sobre o
problema quando disse:
“E que querem certos
Espíritos da
erraticidade fomentando
entre as mediocridades
da encarnação essa
exaltação do
amor-próprio e do
orgulho, senão entravar
o progresso?” Outro
magnífico texto de
Erasto, que respalda o
assunto que tratamos
aqui, está no capítulo
XXI, de “O Evangelho
segundo o Espiritismo”:
Os falsos
profetas da erraticidade,
de leitura necessária
para todos os espíritas.
Alguns espíritas
preferem deixar os
caminhos da simplicidade
para entrar nos atalhos
da complicação. Foi
assim que vimos, em
vários períodos do nosso
movimento, abusos na
interpretação e
aplicação da água
fluidificada, que em
muitos centros espíritas
virou panaceia para
todos os males; do passe
magnético que, da
simples imposição das
mãos, passou a “requerer
um catálogo” para sua
aplicação, em vista de
excessiva teorização,
descaracterizando “toda
a beleza espiritual do
passe espírita”,
conforme expressão de
Herculano Pires; assim
também com a introdução
de certos métodos
polêmicos para tornar a
desobsessão mais
eficiente; a moda do
“Espiritismo sem
Espíritos”, uma forma
radical de priorizar a
opinião dos encarnados
em detrimento das
práticas mediúnicas; a
insistente vontade de
alguns em retocar,
reformar, atualizar os
textos de Allan Kardec,
e tantas outras
“novidades”.
Quando se fala em
mistificação, em desvios
de rota do movimento
espírita, impossível não
citar os célebres e
traumáticos “ismos”, que
causaram tantas
controvérsias: o
Ubaldismo, de Pietro
Ubaldi; o Ramatisismo,
de Ramatis; o
Roustainguismo, de J. B.
Roustaing; o Armondismo,
de Edgar Armond; o
Divinismo, de Oswaldo
Polidoro, e outros “ismos”.
Todos eles com uma
curiosa característica:
em meio a verdades,
muitos equívocos
destoantes da Revelação
Espírita, codificada por
Allan Kardec. Embora
algumas dessas
proposições não tenham
surgido propriamente
dentro do movimento
espírita, nele se
infiltraram, deixando
resquícios que perduram
ainda em muitos centros
e federações pelo país.
Mas as investidas das
sombras não param.
Há algum tempo, muitas
casas espíritas foram
“invadidas” pela teoria
das crianças índigo,
versão importada sobre a
reencarnação de muitos
“anjinhos” inteligentes,
cheios de independência
e malícia, mas cheios
também de rebeldia e
agressividade que,
segundo a fantasia dos
seus “criadores”
norte-americanos, têm a
missão de renovar (?) a
Terra. Muitos espíritas
ficaram encantados com a
novidade e durante bom
tempo não se falou de
outra coisa dentro da
casa espírita.
Outra mania que se
espalha insensatamente
na atualidade: a de
colher, não se sabe de
onde, a “genealogia
reencarnatória” de
personagens espíritas.
Quanto a isso, além das
informações aceitas
consensualmente, como
por exemplo, as que
Emmanuel revelou nos
seus romances, sobre
suas vidas passadas, e
algumas outras notícias
que o movimento espírita
entendeu como
autênticas, nada
justifica as
especulações que
circulam no movimento,
principalmente porque
baseadas em informações
de difícil comprovação,
e também porque vindas
de origens nem sempre
livres de suspeição.
Ou seja, as novidades,
os modismos no meio
espírita não cessam.
Apesar do “orai e
vigiai” evangélicos, e
das orientações
doutrinárias deixadas
por Allan Kardec à
disposição de todos, as
pessoas se descuidam e,
por isso mesmo, criam
tolices ou repassam
informações colhidas sem
critérios de segurança.
Herculano Pires tem
total razão quando
resume essa questão no
livro “Mediunidade (Vida
e Comunicação)”,
avisando: “Os Espíritos
mistificadores contam
apenas com dois pontos
de apoio para nos
envolverem: a vaidade e
a invigilância”.
Em verdade, perde-se
muito tempo e energia
com tudo isto, e o
movimento espírita —
agente que é do
Espiritismo — se atrasa
no cumprimento das
verdadeiras funções que
lhe compete realizar:
espalhar, no meio
social, o conhecimento
espírita com seu
conteúdo correto,
fazendo diminuir a
incredulidade, vencendo
o materialismo,
esclarecendo e
consolando, ajudando a
preparar o homem de bem
para o futuro melhor.
“Mas infelizes os que,
por suas dissensões,
houverem retardado a
hora da colheita”,
afirma o codificador em
“O Evangelho segundo o
Espiritismo”, capítulo
XX, Trabalhadores do
Senhor.
Resta-nos o consolo,
porém, de saber que as
turbulências vêm e
passam. É certo que
deixam marcas no coração
dos homens, mas também
lhes ensinam a separar o
joio do trigo.