CHRISTINA NUNES
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Rio de Janeiro,
RJ (Brasil) |
|
Ser ou não ser
popular
O termo está na
moda. Ser
popular num
mundo
globalizado,
desde o contexto
do estudante do
fundamental,
necessitado de
aceitação para
firmar sua
personalidade,
até ao que é
disseminado pela
mídia como
padrão a ser
seguido na
atualidade,
tomou-se de uma
relevância que
podemos
classificar, sem
erros, como
absurda, dado o
disparate
flagrante de
critérios
adotados para se
glamourizar
um epíteto que,
à força, se
impôs como uma
necessidade
talvez tão
importante
quanto à de se
respirar.
O erro clamoroso
neste contexto
de grande
predominância e
influência no
universo
psicológico de
uma época, no
entanto, reside
na ausência de
esclarecimentos
de que nem tudo
o que é popular
é
necessariamente
bom. Nem sempre
o se ser
reconhecido
implica
qualidade real,
realização
pessoal, ou
conquista de
sonhos, de
felicidade, ou
da tão propalada
aceitação nos
grupos tidos
como bem
articulados.
Lembro-me
bastante de um
show de MPB
havido nos idos
da década de
oitenta, quando
o Maracanãzinho
lotava nos
festivais de
música onde
compositores e
cantores
competiam com os
lançamentos de
suas produções
musicais; e de
um em particular
entre eles, no
qual Guilherme
Arantes
concorreu com
uma canção que
hoje,
certamente, dada
a grande beleza
de melodia e de
letra, é
considerada
pelos amantes da
música e do meio
ambiente como um
hino de louvor à
vida: Planeta
Água!
Jovem na época,
talvez com meus
dezessete ou
dezoito anos, me
emocionei
extremamente com
a apresentação
no pequeno
estádio lotado,
onde a plateia,
num coro só,
cantou a altos
brados a linda
letra: Água
que nasce da
fonte/ serena do
mundo/ e que
abre um profundo
grotão/ Água que
faz inocente/
Riacho e
deságua/ Na
corrente do
ribeirão...
Era uma
unanimidade!
Ainda hoje,
estou certa,
para muitos, é!
E, no entanto,
no dia do
resultado, para
pasmo do povo
que compareceu
em peso à final,
e de todos que
torceram em
casa,
acompanhando as
apresentações em
dias certos do
mês, quem levava
o prêmio, de
acordo com o
julgamento e com
os votos dos
críticos
convidados para
o veredicto do
festival, fora a
polêmica
Purpurina,
interpretada por
Lucinha Lins, de
autoria do
consagrado
compositor Ivan
Lins!
O estádio quase
veio abaixo. E a
cantora – para
dó, inclusive,
dos mais
lúcidos, que
tenham embora
torcido por
Guilherme
Arantes – vaiada
do começo ao fim
de sua
interpretação,
finalizada a
custo, com
lágrimas
perplexas nos
olhos.
Foi, aquele
episódio,
portanto, um
demonstrativo
clássico de que,
pelo menos
segundo a visão
dos críticos de
arte, nem sempre
o popular é
merecedor de
prêmios!
Sem querer aqui
mencionar também
o famoso epíteto
mais rude,
pronunciado
outrora por
Nelson
Rodrigues, de
que toda
unanimidade é
burra – pois que
nem sempre é o
caso – e, penso
antes, que em
algumas
situações a
unanimidade é, e
com justiça, a
expressão da
vontade mais
justa de Deus,
todavia,
confirma-se
notória a
relatividade de
um conceito como
a popularidade,
apesar de tão
entronizada na
atualidade,
especialmente
entre os mais
jovens!
Principalmente
porque, meus
amigos,
popularidade em
muitas vezes
reflete ausência
de senso
crítico!
Procuro passar
esta noção aos
meus filhos,
ambos ainda em
fase estudantil,
já que reside
nesta questão
grande soma dos
problemas
relacionados à
prática do
bullying, a
meu ver
encarado, ainda,
de modo
frequentemente
desastrado por
escolas que, ao
invés de ensinar
tal senso
crítico aos seus
estudantes,
procuram
subterfúgios
paliativos
quanto
ineficazes para
um problema que
não demanda
solução imediata
nem fácil! E,
sim, muito
diálogo e
investimento na
formação de
mentalidades por
vezes
prejudicadas por
distorções
educacionais
originadas no
próprio lar.
Isto porque, sem
nenhuma margem a
dúvidas, a
questão do se
ser ou não
popular, num
contexto
positivo ou
negativo,
implica a
assimilação
desta noção de
relatividade e
de valores
importantes.
Deveriam ser
propostas aos
jovens reflexões
sobre o que mais
conta para uma
socialização
sadia ao longo
da vida: o ter
ou o ser?
As qualidades
muitas vezes
ocultas no
íntimo de cada
um, tais como
solidariedade,
ternura,
compaixão,
compreensão e
fraternidade?
Ou outros
vernizes que se
sobressaem
muitas vezes com
espalhafato
premeditado da
parte dos que
naturalmente são
verborrágicos e
extrovertidos: o
se exibir mais;
pronunciar
falsas
aparências de
bondade; o se
ser esperto na
hora de se dar
bem em situações
de competição no
mais das vezes
frívolas. A
atração
traiçoeira
motivada pelo
mero ímã de
acessórios como
aparências e
dinheiro, de
feição a cativar
não propriamente
popularidade em
função de
admiração e
amizade
sincera..., mas,
antes, pura e
simplesmente,
exploração e
interesse?!
Vemos por vezes
artistas famosos
reclamando desta
mesma enrascada.
Frequentemente
ricos, dotados
de uma boa
aparência, mas
solitários
afetivamente,
reclamam, com
franqueza, terem
aprendido da
pior forma não
poder confiar em
qualquer um.
Porque os
envolvimentos
afetivos lhes
demonstraram à
farta que o que
de fato atraía
era o seu
dinheiro, a
chance da
notoriedade em
situação de
sombra de sua
fama. Tudo!
Menos o que de
fato satisfaz os
anseios de
felicidade do
ser humano: a
estima
desinteressada,
a despeito de
qualidades e
defeitos! Não o
que se tem a
oferecer, e a
ser explorado,
neste ser
humano!
Qualidades e
defeitos!
Defino-os,
antes, como
meras diferenças
entre todos!
Porque
diferenças muito
severas de
opinião podem
facilmente ser
qualificadas, de
modo errado,
como defeitos,
e, no entanto,
tratam-se,
apenas, de meras
diferenças de
percepção!
Não seria
melhor, naquela
fase importante
de formação da
personalidade e
de assimilação
proveitosa de
valores para uma
socialização
saudável ao
longo da vida,
transmitir-se
esta noção? Oh,
sim, não
concordamos
todos! Uns
concordam com
uns mais do que
com outros! Mas
com que base
estamos
distanciando um
colega de
classe? É
natural que não
tenhamos empatia
ou simpatia por
todos com
unanimidade.
Preferências,
acontecimentos,
eventualidades
nos aproximam
mais de uns do
que de outros.
Todavia, seria
útil aprender a
não se
transformar
meras diferenças
e episódios
transitórios de
convivência, que
podem ser bem
contornados, em
causa gratuita
de agressividade
e hostilidade
para com o
próximo. Será
que o foco de
luz lançado com
privilégio sobre
alguém não se
baseia, única e
exclusivamente,
em fatuidade e
razões pueris,
ou
interesseiras?!
Porque o que
evidencia aos
olhos dos
outros, qualquer
coisa ou
indivíduo, é a
referência
externa: o facho
de luz! O
holofote
positivo ou
negativo lançado
sobre este ou
aquele, salvo
exceções, se
observarmos com
isenção, na
maioria das
vezes baseia-se
em motivações
egoísticas!
A despeito da
minha revolta
irrefletida de
jovem daqueles
tempos, todavia,
hoje entendo
que, talvez por
esta mesma
razão, a bela
canção de
Guilherme
Arantes não
levou o prêmio!
Há frustrações
que nos ensinam
a encarar tudo
de diversos
prismas! Assim,
a ótica que
levou a música
de Ivan Lins à
vitória foi a do
crítico musical
– que
provavelmente a
elegeu, e sem
entrar aqui no
mérito de valor,
em função de
pareceres
artísticos
técnicos!
A música popular
não ganhou – o
que não
significa que
não tivesse
beleza e
qualidade.
Reflitamos se
quem ou o que
andamos
excluindo de
nossos caminhos,
por outra, não
mereceria ser
admirado por
qualidades
ocultas que
apenas ainda não
pudemos
descobrir!?