I. Introdução
A Apometria é
uma técnica de
desdobramento
desenvolvida
pelo Dr. José
Lacerda de
Azevedo com o
propósito de
auxiliar
enfermos
encarnados ou
desencarnados
[1,2]. Ela se
apresenta como
uma teoria de
caráter
científico que
pretende “mostrar
um mundo novo”
através de
premissas “formuladas
cientificamente”
[1]. Em resumo,
na Apometria o
médium é levado
ao desdobramento
para atuar na
observação de
enfermos
encarnados e
desencarnados;
executar
comandos
oriundos de um
doutrinador; e
relatar
atividades
realizadas na
esfera
espiritual. A
eficácia das
técnicas da
Apometria se
baseia na
hipótese de que
processos
mentais de
contagem e
comando
aglutinariam e
condensariam
energias do
corpo físico e
do espaço vazio
para realização
das tarefas do
desdobrado na
ajuda a enfermos
ou na contenção
de Espíritos
obsessores.
Em vista de a
Apometria ser
baseada em
conceitos
científicos da
Física, e se
apresentar como
uma técnica
inovadora e de
consequências
mais eficazes
que o
Espiritismo [1],
este artigo tem
como objetivo
apresentar uma
análise
científica
rigorosa da
validade do
emprego de
conceitos da
Física e da
Matemática na
formulação da
teoria da
Apometria.
Mesmo sabendo
que a Apometria
é uma técnica
não condizente
com a orientação
espírita (vide,
por exemplo,
artigos de O
Consolador, Refs.
[3,4,5]), vários
grupos insistem
na adoção das
práticas da
Apometria nos
centros
espíritas
acreditando que
ela produz
resultados
melhores e mais
“fortes” do que
o Espiritismo, e
alegando que,
por usar
conceitos de
teorias modernas
da Física, a
Apometria seria
uma proposta
mais avançada do
que o
Espiritismo.
Da mesma forma
como se avaliam
os trabalhos
científicos na
área de Física,
analisaremos a
validade da
utilização dos
conceitos da
Física na
formulação da
Apometria.
Verificaremos se
a teoria da
Apometria
apresenta ou não
contradições
entre si ou com
os conceitos da
Física. Isso
será feito da
mesma forma como
novas teorias
são analisadas
dentro da área
da Física.
O principal
critério de
análise neste
artigo é:
existência de
inconsistências
ou
incoerências,
isto é, de
falhas,
conflitos e
contradições
entre conceitos
diferentes da
própria teoria
ou entre
conceitos da
teoria e da
Física. No caso
de uma equação
da teoria,
analisaremos a
consistência
lógica entre os
resultados
possíveis da
equação e sua
interpretação.
II. Análise de
alguns conceitos
e de uma equação
da Apometria
Neste artigo,
vamos nos ater à
análise de dois
conceitos da
Apometria que
usam conceitos
da Física e uma
equação
matemática usada
na definição de
uma lei da
Apometria. Essa
escolha foi
feita em função
de o nível de
complexidade dos
conceitos e
equação ser
baixo e,
portanto, mais
acessível ao
leitor. Um
artigo contendo
uma análise
completa de mais
conceitos e
equações da
Apometria será
publicado
futuramente na
coletânea de
trabalhos
apresentados no
8º ENLIHPE.
Reproduziremos
alguns conceitos
da Apometria
apresentados na
obra da Ref. [1]
e
apresentaremos,
em seguida, a
análise
científica em
linguagem o mais
acessível
possível ao
leitor não
especialista em
Física ou
Matemática.
Conceito 1.
Corpo astral
imaterial
Na seção
intitulada “8 -
Propriedades e
funções do corpo
astral” do
capítulo “III -
Corpo Astral” de
[1], é dito que
“Esta
facilidade de
separar-se do
corpo físico é
característica
do corpo astral,
imaterial e de
natureza
magnética, não
tem constituição
fluídica como o
duplo etérico
...”. Adiante,
na seção
intitulada “9 -
Alimentos e
‘morte’ do corpo
astral” do mesmo
capítulo é dito
que “Nosso
corpo astral
perde energia
constantemente,
necessitando de
suprimento
energético para
sua sustentação,
tal qual o corpo
físico. Mas a
natureza deste
alimento varia
muito; vai dos
caldos proteicos
necessários aos
Espíritos muito
materializados,
fornecidos pelas
casas de socorro
no astral, até
as
quintessenciadas
energias que
alimentam os
Espíritos
superiores,
(...)”.
Análise
científica:
Acima
encontramos
erros de
inconsistência
e
contradição,
já que se o
corpo astral é “imaterial”,
e “não tem
constituição
fluídica”,
não pode perder
“energia
constantemente,
necessitando de
suprimento
energético (...)
tal qual o corpo
físico”? Em
termos
filosóficos e
científicos,
qualquer coisa
que seja
imaterial
não contém nem
depende de
energia, já que
energia é uma
propriedade
associada a
corpos, objetos
ou partículas
materiais.
Conceito 2.
Tempo e Espaço
não existem na
dimensão mental
O conceito acima
é o título da
seção 7 do
capítulo “IV –
Corpo Mental” de
[1].
Análise
científica:
O título é um
exemplo direto
de
incoerência
e contradição
científica e
filosófica das
teorias
apresentadas na
Ref. [1]. Isso,
pois, se o tempo
e o espaço não
existem na
dimensão mental,
então não se
pode falar de
frequência,
vibração e
propagação de
ondas mentais já
que os conceitos
de frequência,
vibração e
propagação
dependem dos
conceitos de
tempo e espaço.
Para mais
detalhes sobre
equações de
ondas, o leitor
é referido à
obra da Ref.
[6].
Equação 1.
Energia do
psiquismo – W
e Ψ
No capítulo
intitulado
“”Nohtixon - O
pensamento como
trabalho do
Espírito”, da
obra Ref. [1], o
Dr. Azevedo
apresenta uma
análise de como
o pensamento
poderia agir
sobre a matéria
e propõe a
seguinte lei que
rege o
pensamento do
Espírito: “A
energia do
pensamento
manifestada no
campo físico é
igual ao produto
da energia
elétrica
neuronal (En)
pela energia
psíquica (da
alma) - Ψ na
potência v,
quando v tende
para o infinito”.
Em termos
matemáticos, a
lei acima pode
ser escrita numa
das seguintes
fórmulas que são
equivalentes
entre si:
W =
En Ψv→∞
,
ou W
= En lim
v→∞
(Ψv
) ,
(1)
onde W é
a energia total
do pensamento,
En a
energia neuronal
(do cérebro), e
Ψ a
energia psíquica
(da alma). Ψv
representa o que
em Matemática se
diz: “Ψ
elevado à
potência v”.
O primeiro erro
dessa lei é de
inconsistência
teórica,
pois consiste em
não definir-se a
variável Ψ.
Toda definição
matemática
requer algum
valor de
referência. A
teoria da
Apometria apenas
diz que Ψ
é de natureza
psíquica. O que
significa isso
em termos
quantitativos,
já que Ψ
faz parte de uma
fórmula
matemática? Ψ
é igual,
maior ou menor
que 1? Como
diferenciá-lo
entre as pessoas
ou seres? Que
experimentos
permitiriam
medir Ψ?
O segundo erro é
o que chamamos
de absurdo
matemático e
consiste da
análise da
própria equação
(1). Segundo Dr.
Azevedo, o que
diferencia os
seres é o valor
do expoente v
que valeria 1 (v
= 1) em
seres
unicelulares,
maior que 1 (v
> 1) em seres
animais, e v
tenderia ao
infinito em
humanos (v
→
∞:
esse símbolo
significa “tender
ao infinito”
ou “limite
quando v tende
ao infinito”)
[1]. A Apometria
propõe estimar o
valor da energia
do pensamento de
um ser humano
através do
cálculo do
limite da função
Ψv
quando v
tende ao
infinito (ou
v
→
∞).
Aqui, para
mostrar o
absurdo da
fórmula da
Apometria,
analisaremos o
resultado da
seguinte
expressão:
lim
v→∞
(Ψv
).
(2)
Explicaremos o
cálculo de modo
mais simples
possível para
que o leitor
menos acostumado
a este tipo de
operação
matemática
compreenda o
raciocínio. O
cálculo de
limites como o
que vamos fazer
a seguir se
aprende nos
cursos básicos
de Cálculo [7]
das carreiras
comuns do Ensino
Superior das
áreas de
Engenharias e
Ciências Exatas
e da Terra.
Para estimar os
valores do
limite definido
na equação (2),
identificaremos
a grandeza do
tipo
parâmetro e
a grandeza do
tipo variável
no cálculo do
limite. A
variável é
aquela que irá
para o limite
infinito: no
caso a grandeza
v. O
parâmetro é
o elemento
considerado fixo
no cálculo do
limite: no caso,
a grandeza Ψ.
A operação de
“calcular o
limite” é
aplicada a uma
função que no
caso, segundo a
equação (1) ou
(2), é Ψv.
Calcular o
limite de v
tender ao
infinito
de Ψv
nada mais é do
que analisar
para que valor
numérico a
operação Ψv
(lembrando: “Ψ
elevado à
potência v”)
se aproxima,
quando a
variável do
limite, no caso
v,
adquire valores
extremamente
altos, tendendo
ao infinito [7].
Para realizar as
estimativas de
cálculo do
limite da
equação (2),
precisaremos
testar todas as
possibilidades
para o valor do
parâmetro Ψ.
As
possibilidades
são: Ψ =
1 (possibilidade
1); -1 <
Ψ < 1
(possibilidade
2); Ψ > 1
(possibilidade
3); e Ψ ≤
-1
(possibilidade
4).
- Se Ψ =
1, sabemos que 1
elevado a
qualquer valor
de potência é
igual a 1 [7].
Portanto, o
limite da
equação (2)
quando v
tende ao
infinito, com a
possibilidade 1,
é 1 (um).
- Se -1 < Ψ
< 1, então
observamos que
Ψ tem
valor absoluto
menor que 1 e
sabemos da
Matemática que
um número de
valor absoluto
menor que 1
elevado a um
expoente de
valor elevado, é
um número tão
menor quanto
maior for o
expoente [7].
Assim, o limite
da equação (2)
quando v
tende ao
infinito, com a
possibilidade 2,
é 0 (zero).
- Se Ψ >
1, ou se “Ψ
tem valor maior
que 1”, sabemos
da Matemática
que um número de
valor maior que
1 elevado a um
expoente de
valor elevado é
um número também
elevado [7].
Assim, o limite
da equação (2)
quando v
tende ao
infinito, com a
possibilidade 3
é infinito,
isto é, tende ao
infinito na
medida em que o
expoente v
tende ao
infinito.
- Se Ψ ≤
-1, isso
significa que
Ψ tem valor
negativo.
Sabemos da
Matemática que o
limite de um
número negativo
de valor
absoluto maior
ou igual a 1
(um) elevado a
um expoente que
tende ao
infinito, é um
resultado
indeterminado,
pois, dependendo
do valor par ou
ímpar do
expoente, o
resultado é
positivo ou
negativo [7].
Por isso o
limite da
equação (2)
quando v
tende ao
infinito, com a
possibilidade 4
é
indeterminado.
Em resumo,
obtemos as
seguintes
soluções para o
limite definido
pela equação
(2):
lim
v→∞
(Ψv
) = 1
se Ψ
= 1
,
(3a)
lim
v→∞
(Ψv
) = 0
se -1 <
Ψ < 1
, (3b)
lim
v→∞
(Ψv
) = +∞
se Ψ
> 1
,
(3c)
lim
v→∞
(Ψv
) =
Indeterminado
se Ψ
≤ -1
.
(3d)
A interpretação
dos resultados
acima é a
seguinte:
- Se a equação
(3a) for o
resultado
válido, então a
energia da alma
não tem
utilidade, pois
que, na
composição da
energia do
pensamento, o
termo associado
à energia
material, En,
é multiplicado
diretamente por
lim
v→∞
(Ψv)
que é igual a 1,
e multiplicar
En pela
unidade (por um)
não altera o
resultado e a
energia do
pensamento é
apenas a energia
da parte
material.
- Se a equação
(3b) for o
resultado
válido, então a
energia total do
pensamento é
zero, pois
multiplicar
En por zero
é igual a zero.
Esse resultado
não serve para
nada e é
contraditório,
pois, segundo a
teoria da
Apometria, a
energia mental
de uma ameba
(para a qual
v tem um
valor finito)
seria maior do
que a de um ser
humano.
- Se a equação
(3c) for o
resultado
válido, então a
energia do
pensamento é
infinita, pois,
multiplicar
En por
infinito é
infinito. Esse
resultado não
serve para nada,
pois, em
Ciências Exatas,
não se trabalha
com valores
infinitos que
não podem ser
medidos,
calculados ou
comparados.
- Se a equação
(3d) for o
resultado
válido, então a
energia do
pensamento é
algo
indeterminado,
pois multiplicar
En por um
número
indeterminado dá
um resultado
indeterminado.
Portanto, essa
possibilidade
também não tem
utilidade
alguma.
Da análise acima
concluímos, por
absurdo, pela
não-validade
da equação (1) e
do enunciado da
lei que rege o
pensamento
segundo a
Apometria.
III. Conclusões
A análise acima
permite concluir
que a teoria da
Apometria foi
construída sem
nenhum respaldo
da Física ou da
Matemática, não
podendo,
portanto, ser
considerada
científica. Ela
apresenta erros
do tipo
incoerência,
inconsistência,
e contradição
entre seus
conceitos e
equações. A
Apometria,
portanto, não
representa um
avanço
científico
e, pelo
contrário,
demonstra
desconhecimento
a respeito dos
conceitos da
Ciência.
É importante
esclarecer que
essa análise não
teve a intenção
de desrespeitar
os praticantes e
simpatizantes da
Apometria. Uma
vez que temos a
orientação de
Jesus de que
devemos buscar a
verdade, pois
ela nos
libertará (João
8:32), e de que
devemos dizer
“sim, sim, não,
não” (Mateus
5:37), nosso
objetivo é
esclarecer e
alertar
espíritas e
não-espíritas
sobre as bases
falsas da teoria
Apometria. Se a
prática da
Apometria produz
resultados,
estes se devem a
fatores
diferentes do
que a teoria
ensina. As curas
e outros
auxílios que
eventualmente
ocorrem em nome
da Apometria são
decorrentes de
fatores como:
merecimento dos
envolvidos,
presença de
médiuns de
efeitos físicos,
concentração e
fé das pessoas,
e outros fatores
que o
Espiritismo
ensina. As
orientações para
que sejam usados
objetos ou
práticas como
contagens ou
outras técnicas
que foram
propostas com
base em
conceitos da
Física são
completamente
equivocadas e
sem fundamentos.
Conforme estudo
anterior [8], o
Espiritismo é a
teoria mais
moderna e segura
que temos na
atualidade para
tratar e
orientar a
prática
mediúnica.
Referências:
[1] José Lacerda
de Azevedo,
Espírito /
Matéria – Novos
Horizontes Para
A Medicina,
7ª edição, VEC
Gráfica e
Editora Ltda.,
Porto Alegre
(2002).
[2] José Lacerda
de Azevedo,
Energia e
Espírito, 2ª
edição,
Comunicação
Impressa, Porto
Alegre (1995).
[3] Jorge Hessen,
“A apometria e
as práticas
espíritas”, O
Consolador
67 (3 de
Agosto de 2008),
link:
http://www.oconsolador.com.br/ano2/67/especial.html.
[4] Astolfo O.
de Oliveira
Filho,
“Apometria não é
Espiritismo”,
O Consolador
130 (25
de Outubro de
2009), link:
http://www.oconsolador.com.br/ano3/130/especial.html.
[5] Gebaldo José
de Sousa,
“Apometria não
convém às Casas
Espíritas”, O
Consolador
139 (3 de
Janeiro de
2010), link:
http://www.oconsolador.com.br/ano3/139/gebaldo_sousa.html.
[6] D. Halliday,
R. Resnick e J.
Walker,
Fundamentos da
Física – Volume
2 – Gravitação,
Ondas e
Termodinâmica,
Editora LTC, 8a.
Edição (2009).
[7] H. L.
Guidorizzi,
Um Curso de
Cálculo – Vol. 1,
Editora Livros
Técnicos e
Científicos
Editora LTDA.,
2a. Edição
(1987).
[8] A. F. da
Fonseca,
“Estaria o
Espiritismo
ultrapassado?...
Ou muito na
frente?”, O
Consolador
271 (27
de Julho de
2012), link:
http://www.oconsolador.com.br/ano6/271/especial.html.
Alexandre Fontes
da Fonseca
é professor de
Física na
Universidade
Estadual
Paulista "Júlio
de Mesquita
Filho", em
Bauru-SP.