Apresentamos aqui um pouco
das lutas do início da
grande tarefa, transformada
em missão, de Chico Xavier,
narradas por Marcel Souto
Maior no seu livro “As Vidas
de Chico Xavier”, editora
Pensamento, extraída das
páginas 53 a 57.
Nas noites de segunda e
sexta-feira, ele colocava o
Evangelho segundo o
Espiritismo, de Allan
Kardec, embaixo do braço e
ia para o Centro Luiz
Gonzaga. Seguia à risca uma
instrução ditada por
Emmanuel: fidelidade
irrestrita a Jesus Cristo e
a Kardec, o codificador da
doutrina espírita. O guia do
outro mundo levava tão a
sério este mandamento que um
dia chegou a determinar a
Chico:
– Se alguma vez eu lhe der
um conselho que não esteja
de acordo com Jesus e
Kardec, fique do lado deles
e procure me esquecer.
Chico demorava na cartilha
espírita, praticava as
lições de caridade, promovia
sessões de desobsessão às
quartas-feiras, mas o centro
ficava cada dia mais vazio.
José Hermínio Perácio e a
mulher, Carmem, se mudaram
para Belo Horizonte –
precisavam ficar mais perto
da família. José Xavier teve
que trabalhar à noite numa
oficina de arreios para
pagar uma dívida. De
repente, o rapaz se viu
sozinho no barracão. Quando
pensou em sair de fininho,
ouviu a voz de Emmanuel.
– Você não pode se afastar.
– Como? Não temos
frequentadores.
– E nós? Nós também
precisamos ouvir o
Evangelho. Além disso, temos
aqui vários "desencarnados"
que precisam de ajuda. Abra
a reunião na hora marcada e
não encerre a sessão antes
de duas horas de trabalho.
Chico seguiu as instruções.
Às oito horas iniciava a
reza de abertura da sessão.
Em seguida, abria o
Evangelho segundo o
Espiritismo ao acaso e
comentava o capítulo em voz
alta. Nessa época, começou a
ver mortos e ouvir vozes com
maior frequência e nitidez.
Os seres invisíveis ocupavam
os bancos vazios.
Do lado de fora, vizinhos e
parentes acompanhavam aquele
espetáculo absurdo: o rapaz
falava sozinho, gesticulava,
rezava, duas horas seguidas.
Uma das irmãs, uma noite, se
pendurou na janela para
ouvir o monólogo:
– Tenhamos fé em Jesus,
minha irmã.
– ....
– Com paciência alcançaremos
a paz.
– ...
– Sem calma, tudo piora.
– ...
A espectadora interrompeu a
cena insólita:
– Com quem está conversando?
– Com a dona Chiquinha de
Paula.
– Ela já morreu, Chico.
– Você é que pensa. Ela está
bem viva.
A família ainda pensava em
levar o rapaz a um bom
hospício.
O padre Júlio Maria, da
cidade mineira de Manhumirim,
estava disposto a
providenciar uma
camisa-de-força para o
espírita de Pedro Leopoldo.
Todo mês, ele escrevia
artigos para o jornal local, O
Lutador, e fazia
o favor de enviar suas
opiniões pelo correio ao
autor do Parnaso de Além
Túmulo. Em nome de Jesus
Cristo, os textos
excomungavam o Espiritismo,
reduziam a pó a reencarnação
e à piada o porta-voz dos
mortos no Brasil. "Francisco
Cândido Xavier deve ter a
pele de um rinoceronte para
suportar tantos espíritos",
escreveu num dos seus
manifestos.
Chico ficou engasgado e
precisou da ajuda de
Emmanuel para engolir o
comentário.
Se você não tem a pele de
rinoceronte, precisa ter,
porque se cultivar uma pele
muito frágil, cairá sempre a
cada alfinetada.
O padre Júlio Maria espetou
Chico Xavier durante treze
anos. Só parou quando
morreu. E, nesse dia, Chico
ouviu um vozeirão de seu
guia:
Vamos orar pelo nosso irmão
Júlio Maria. Com ele sempre
tivemos um cooperador
maravilhoso. Dava-nos
coragem na luta e
concitava-nos a trabalhar.
(Retirado do site de Aninha
Spranger – Algumas Histórias
de Chico Xavier.)
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