A leitora Filomena Branco, radicada em Portugal, em carta
publicada na edição anterior
desta revista, perguntou-nos
se as expressões “princípio
inteligente” e “princípio
espiritual” são dois termos
que se utilizam para
designar uma mesma coisa, ou
designam fases distintas da
evolução.
A questão proposta não deveria ser, mas é, como a leitora
observou, bastante complexa.
Vejamos estes dois textos colhidos, respectivamente, nas
obras de André Luiz e
Emmanuel (os grifos a
seguir são nossos):
“Quero dizer, André, que o
princípio espiritual,
desde o obscuro momento da
criação, caminha sem detença
para frente. Afastou-se do
leito oceânico, atingiu a
superfície das águas
protetoras, moveu-se em
direção à lama das margens,
debateu-se no charco, chegou
à terra firme, experimentou
na floresta copioso material
de formas representativas,
ergueu-se do solo,
contemplou os céus e, depois
de longos milênios, durante
os quais aprendeu a
procriar, alimentar-se,
escolher, lembrar e sentir,
conquistou a inteligência...
Viajou do simples impulso
para a irritabilidade, da
irritabilidade para a
sensação, da sensação para o
instinto, do instinto para a
razão. Nessa penosa romagem,
inúmeros milênios decorreram
sobre nós. Estamos, em todas
as épocas, abandonando
esferas inferiores, a fim de
escalar as superiores. O
cérebro é o órgão sagrado de
manifestação da mente, em
trânsito da animalidade
primitiva para a
espiritualidade humana.”
(No Mundo Maior, de André
Luiz, cap. 4, pp. 56 a 59.)
“No infinito do Universo, a
evolução do princípio
espiritual tem de
escapar a todas as vossas
limitações de tempo e de
espaço, na tábua dos valores
terrestres. As aquisições de
cada indivíduo resultam da
lei do esforço próprio no
caminho ilimitado da
criação, destacando-se daí
as mais diversas posições
evolutivas das criaturas e
compreendendo-se que tempo e
espaço são laboratórios
divinos, onde todos os
princípios da vida são
submetidos às experiências
do aperfeiçoamento, de modo
que cada um deva a si mesmo
todas as realizações, no dia
de aquisição dos mais altos
valores da vida.” (O
Consolador, de Emmanuel,
questão 86.)
Observe-se que André Luiz e Emmanuel, nas obras citadas, não
usam a expressão
princípio inteligente em
momento nenhum, preferindo a
expressão princípio
espiritual, que não tem,
no entanto, guarida na
principal obra espírita –
O Livro dos Espíritos,
de Allan Kardec, como
podemos verificar à vista
dos trechos abaixo
reproduzidos, nos quais a
expressão princípio
inteligente é utilizada
com o mesmo sentido que
André Luiz e Emmanuel deram
à expressão princípio
espiritual:
“Que é o espírito? – O
princípio inteligente do
Universo.” (L.E., questão
23.)
“Pois que há dois elementos
gerais no Universo: o
elemento inteligente e o
elemento material,
poder-se-á dizer que os
Espíritos são formados do
elemento inteligente, como
os corpos inertes o são do
elemento material? –
Evidentemente. Os Espíritos
são a individualização do
princípio inteligente,
como os corpos são a
individualização do
princípio material. A época
e o modo por que essa
formação se operou é que são
desconhecidos.” (L.E.,
questão 79.)
“Que definição se pode dar
dos Espíritos? – Pode
dizer-se que os Espíritos
são os seres inteligentes da
criação. Povoam o Universo,
fora do mundo material.”
(L.E, questão 76.)
“A palavra Espírito é
empregada aqui para designar
as individualidades dos
seres extracorpóreos e não
mais o elemento
inteligente do
Universo.” (L.E, nota
aposta à questão 76.)
“Donde tiram os animais o
princípio inteligente
que constitui a alma de
natureza especial de que são
dotados? – Do elemento
inteligente universal.”
(L.E., questão 606.)
“Então, emanam de um único
princípio a inteligência do
homem e a dos animais? – Sem
dúvida alguma, porém, no
homem, passou por uma
elaboração que a coloca
acima da que existe no
animal.” (L.E., questão
606-a.)
A mesma ideia esboçada em O Livro dos Espíritos
aparece em O Livro dos
Médiuns, como adiante se
vê:
“Seja qual for a ideia que
dos Espíritos se faça, a
crença neles necessariamente
se funda na existência de um
princípio inteligente
fora da matéria.” (L.M.,
cap. I, item 1.)
“Numerosas observações e
fatos irrecusáveis, de que
mais tarde falaremos,
levaram à consequência de
que há no homem três
componentes: 1º, a alma, ou
Espírito, princípio
inteligente, onde tem
sua sede o senso moral; 2º,
o corpo, invólucro
grosseiro, material, de que
ele se revestiu
temporariamente, em
cumprimento de certos
desígnios providenciais; 3º,
o perispírito, envoltório
fluídico, semimaterial, que
serve de ligação entre a
alma e o corpo.” (L.M.,
cap. I, item 54.)
"Depois da morte do animal,
o princípio inteligente
que nele havia se acha em
estado latente e é logo
utilizado, por certos
Espíritos incumbidos disso,
para animar novos seres, em
os quais continua ele a obra
de sua elaboração. Assim, no
mundo dos Espíritos, não há,
errantes, Espíritos de
animais, porém unicamente
Espíritos humanos."
(L.M., cap. XXV, item 283,
pergunta 36ª.)
Curiosamente, em A Gênese o Codificador do
Espiritismo preferiu a
expressão princípio
espiritual, como podemos
verificar no cap. IV, item
16, e no cap. XI, itens 1 e
2. Chama-nos a atenção,
nessa obra, o trecho adiante
reproduzido, em que utiliza
princípio espiritual
com o mesmo sentido de
princípio inteligente
mencionado em O Livro dos
Espíritos:
“A existência do
princípio espiritual é
um fato que, por assim
dizer, não precisa de
demonstração, do mesmo modo
que o da existência do
princípio material. E,
de certa forma, uma verdade
axiomática. Ele se afirma
pelos seus efeitos, como a
matéria pelos que lhe são
próprios. De acordo com este
princípio: ‘Todo efeito
tendo uma causa, todo efeito
inteligente há de ter uma
causa inteligente’, ninguém
há que não faça distinção
entre o movimento mecânico
de um sino que o vento agite
e o movimento desse mesmo
sino para dar um sinal, um
aviso, atestando, só por
isso, que obedece a um
pensamento, a uma intenção.
Ora, não podendo acudir a
ninguém a ideia de atribuir
pensamento à matéria do
sino, tem-se de concluir que
o move uma inteligência à
qual ele serve de
instrumento para que ela se
manifeste.” (A Gênese.,
cap. XI, item 1.)
Já na Revue Spirite, em inúmeras passagens, Kardec
usa a expressão princípio
inteligente como
sinônimo de alma, o que é
possível verificar na
Revue de 1861, pág. 242;
na Revue de 1864, pp.
138 e 139; na Revue
de 1865, pág. 95, e na
Revue de 1868, págs. 259
e 260, conferindo à
expressão princípio
espiritual a ideia de
elemento espiritual, em
oposição a elemento
material.
Concluindo, entendemos, à vista do que foi exposto, que
devemos usar a expressão
princípio espiritual
como elemento, em oposição a
princípio material,
reservando a expressão
princípio inteligente
para os casos em que
queremos referir-nos à parte
imaterial individualizada
presente nos seres vivos que
sobrevive ao fenômeno da
morte. No caso dos animais e
dos homens, a essa parte
imaterial individualizada o
Espiritismo dá o nome de
alma.
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