Vi um lobisomem!
Um caso de licantropia
Alguém já lhe
disse ter visto
um lobisomem? Ou
você já deu de
cara com ele? E
se eu lhe disser
que vi um? Quem
me conhece de
perto sabe que
não sou nada
chegado a
fantasiar coisas
nem propenso a
sensacionalismo,
tampouco a
histórias da
carochinha. E
quanto à
licantropia? Leu
ou ouviu algo a
respeito? Antes,
é claro, vamos
ao fato ocorrido
no ano de 1959,
pouco a pouco ao
cair da noite de
um típico
inverno
paulistano,
quando eu
residia num
bairro da zona
leste da cidade
de São Paulo, de
nome Vila
Formosa.
Brincávamos na
rua, eu e mais
alguns meninos
da vizinhança, a
jogar bolinhas
de gude, bem em
frente da casa
de dois daqueles
que comigo
tomavam parte na
brincadeira,
filhos de uma
senhora chamada
dona Sônia.
Ficávamos ali
até a mãe de
cada um pedir
que entrasse
(meninos e
meninas dormiam
cedo naquele
tempo). Eu,
porém, permaneci
um pouco mais,
livre de
preocupação.
Concentrado,
sozinho naquele
entretenimento
infantil, eis
senão quando a
certa distância,
vindo não sei de
onde, apareceu
um estranho
animal. Célere,
ele descia o
ponto mais alto
do declive da
rua em
desabalada
carreira, tendo
ao seu encalço
alguns
vira-latas dos
arredores; pelo
menos, um
daqueles cães vi
que era da casa
de uma linda
garota, moradora
daquela rua,
chamada Rosa.
Um lobisomem?! O
bicho era bem
maior que seus
perseguidores. A
despeito de
tamanho impacto,
notei-lhe a
expressão quase
humana, os olhos
salientes e
avermelhados
quais os de um
espavorido
insano. À
distância, deu
para ver-lhe o
pelo espesso, do
griséu ao negro,
e a bonita
pelugem
amarelada no
peito.
Se a bizarra
criatura estava
cheia de pavor,
imagine este que
vos narra! Tudo
sucedeu
depressa.
Infelizmente,
não vi ninguém
que pudesse
testemunhar o
insólito
acontecimento.
Nem sei como
pulara a bonita
cerca de madeira
da casa de dona
Sônia, toda
pintada de
branco; e o
portão só estava
encostado!
Escondido num
canto, de
cócoras, trêmulo
e imóvel,
esperei pelo
pior.
De súbito,
sequer um
latido. Silêncio
absoluto. Depois
de respirar
fundo e adquirir
coragem, fui ver
por que a
criatura não
passara em
frente da casa.
Ora! Os
vira-latas e o
bicho só podiam
ter passado para
o terreno baldio
— pensei —, um
espaço em forma
de “u” entre a
residência da
menina e a da
mãe de meus
amiguinhos,
sendo que a face
da casa de fundo
dava para outra
rua. Novo
detalhe: entre a
casa de d. Sônia
e a de fundo
havia
estreitíssima
passagem para
outro terreno
baldio, local
onde os meninos
fizeram dali um
campinho de
futebol. Onde se
meteram os
vira-latas, a
apavorante e
apavorada
criatura, se
naquela estreita
passagem só
podia transpô-la
apenas um garoto
magro de cada
vez, e de lado?
Decorreram-se os
anos, conheci o
Espiritismo.
Vindo à memória
aqueles
incríveis
instantes da
infância,
resolvi saber
através da
investigação, do
estudo, os
porquês do
extraordinário
acontecimento.
Que visão
impressionante
aquela!
Lobisomem
através dos
tempos
— Teria
eu realmente
visto o lendário
e antigo
personagem
mítico-sobrenatural?
Se não, vejamos,
remontemos às
antigas
civilizações.
Acreditava-se na
Antiguidade que
homens podiam se
transformar em
lobos. Egípcios
adoravam Anúbis,
ou Hermanúbis,
deus com cabeça
de chacal;
gregos
reverenciavam o
Lobo-Zeus;
romanos criam na
existência de
outro canino,
Cérbero, para
eles, o
“guardião do
Inferno”; na
Idade Média,
falava-se de
feiticeiros que
também se
transformavam em
lobos.
Cá entre nós:
você acredita
que um homem
pode se
transformar em
um animal em
noite de lua
cheia conforme
apresentam
novelas e
películas
hollywoodianas
da rentável
indústria
exportadora de
violência e
terror? Penso
que você, que
nos honra com a
sua leitura,
“não compraria
gato por lebre”,
não se
impressionaria
com superstições
do imaginário
popular.
Entretanto, há
certa
enfermidade que
mexe com a
imaginação e
causa repulsa,
preconceito: a
hipertricose. De
origem genética,
a hipertricose
apresenta
curioso sintoma:
o de crescimento
de pelos em todo
o corpo. Segundo
a Medicina, essa
doença provoca
mudanças no
organismo e está
visceralmente
ligada a um
transtorno nas
glândulas
suprarrenais.
Doença muito
antiga,
confundem
portadores da
hipertricose com
licantropos.
Licantropos, ou
licomaníacos,
“alienados”,
para a Ciência,
sofrem de
licantropia. Os
psiquiatras veem
apenas uma
doença mental
cujos pacientes
se julgam um
lobo, ao
portar-se como
tal ou outro
bicho (zoantropia).
É comum
zoantropos serem
acometidos de
licantropia, ou
licomania.
Diga-se a
propósito, assim
como há
licantropos, há
indivíduos que
sofrem de outra
curiosa psicose:
a teomania, ou
seja, tendência
que suscita
fanatismo
religioso, ou
psicopatia em
que o paciente
se acredita
inspirado, ou
possuído, por
divindades, por
Jeová, o deus
bíblico, por
Cristo,
considerado deus
pelos cristãos.
Já dizia o poeta
Murilo Mendes:
“O invisível não
é irreal, o real
é que não é
visto”. O
Espiritismo não
tapa o sol com
uma moeda, ou,
se o desejar,
“com a peneira”,
e não transige
com
superstições. Os
ensinamentos
espíritas
devassaram o
invisível, e
casos notáveis,
ditos
enigmáticos,
postos no âmbito
do fantástico,
do sobre-humano,
da milagraria;
ele prova por
a mais b que
todos esses
fatos se
explicam, por
mais estranhos
que nos pareçam.
Essas
ocorrências
pedem, sim,
esclarecimentos
científicos,
pois, se
acontecem, logo
fazem parte da
Natureza,
pertencem à
Criação.1
Tudo o que se
recusou como
extraordinário,
acima do saber
humano, agora se
percebe por
meios
irrecusáveis.
Por isso, o
Espiritismo,
ciência sublime,
acima de tudo,
seus
pesquisadores
nunca deixaram
de empregar
critérios
científicos. A
fé espírita, não
se resume à fé
cega, a que, por
falta de
discernimento,
tanto pode
admitir a
mentira quanto a
verdade.
Obsessor e
obsidiado
— De
volta ao dito
cujo, uma
vidência ou
mesmo, quem
sabe, um caso de
aparição
tangível, ou
materialização
de alguma
Entidade
sofredora? Não
posso garantir.
Veja, na
oportunidade, eu
era apenas um
garoto de dez
anos. Poderia
ter sido, sim,
um encarnado
cujo perispírito
perdeu o
característico,
por influência
de um
desencarnado, um
Espírito
obsessor,
apresentando
aquele aspecto
físico,
profundamente
transfigurado
numa forma
animalesca.
Aventemos ainda
a possibilidade
de ter sido o
próprio obsessor
nas mesmas
condições, com
idênticas
características
visíveis,
palpáveis. No
entanto, de uma
coisa pode estar
certo: homem
nenhum se
transforma,
segundo a lenda,
em lobo, em
vampiro, em
bode, em porco,
em
mula-sem-cabeça
ou no que quer
que seja em
noite de lua
cheia ou em
qualquer noite.
A licantropia
acontece a quem
faz o mal ao
próximo.
Possível
candidato, a
presa fácil de
si mesmo, e, por
conseguinte, de
Entidades
inimigas, será
aquele que se
perverteu no
crime; o que
abusa da
inteligência;
quem
mercantiliza o
próprio corpo,
disseminando
pornografias;
quem faz uso de
bebidas
alcoólicas,
maconha, crack,
cocaína etc.2
Há cura? Há! Mas
somente para os
que a desejam. A
cura acontece
através da
prática da Lei
de Amor e
Caridade,
ensinada e
exemplificada
por Mestre
Jesus, e não por
meio de
exorcismos, de
rezas decoradas,
repetitivas,
mediante
ostentação em
ato público ou
particular.3
A cura é
discreta, sem
alarde, processo
lento, com
auxílio de
passes e
irradiações
amorosas, a
induzir o
obsessor, ou
obsessores, à
prática do bem,
sobretudo
sugerindo ao
obsidiado a
evangelizar-se,
a reformar-se,
tornando-se
moralmente
melhor.
O Espírito e seu
corpo fluídico,
o perispírito,
nunca
retrogradam (não
confundir
zoantropia com a
metempsicose
dos budistas e
hinduístas); o
perispírito é
que degrada como
já vimos. Não há
nada de errado
com caninos do
tipo canis lupus
(lobos), com
felídeos, do
tipo felis
cattus
domesticus de
cor preta (gatos
pretos), com
quirópteros
hematófagos
(vampiros), com
aves
estrigiformes
(corujas) e
demais criaturas
aladas como
corvídeos
(gralhas e
corvos), com
catatidiformes
(urubus). Todos
animais são
dignos de nossa
consideração e
amor, todos
somos filhos de
Deus, e para
Ele caminhamos.
Licantropia, em
outras palavras,
trata-se de um
estado
mórbido-mental,
causado por um
obsessor (um ou
mais supostos
inimigos). Por
sugestão
hipnótica, ele
pode persuadir
alguém (suposta
vítima), mesmo
não pertencendo
mais a este
mundo, a se
transformar, por
vingança, num
ente animalesco.
4
O Ser Humano,
ser à parte, é
deveras curioso!
Às vezes, ele
desce tão baixo
ou pode se
elevar tanto! –
segundo resposta
da questão 592
de O Livro dos
Espíritos. Pois
é, meu amigo ou
minha amiga: se
os chamados
animais
irracionais
tivessem
consciência
moral dos
próprios vícios
e de todo erro,
se cometessem
desregramentos,
atos de
vandalismo, de
licenciosidade,
certamente
haveriam de
dizer: “é
simplesmente
humano” — tal
como dizem os
que se
consideram
racionais: “É
simplesmente
animalesco”.
_________________________________
1. KARDEC,
Allan. O
Evangelho
segundo o
Espiritismo, 62.
ed. São Paulo, Lake — Livraria
Allan Kardec
Editora, 2001,
capítulo 1o,
item 5, p. 39:
“O Espiritismo.
2. XAVIER,
Francisco C. Nos
Domínios da
Mediunidade, 22.
ed. Rio de
Janeiro:
Federação
Espírita
Brasileira (FEB),
1994. Capítulo
23:
“Fascinação”, p.
217 e 218.
3. KARDEC,
Allan. O Livro
dos Espíritos,
62. ed. São
Paulo, Lake —
Livraria Allan
Kardec Editora,
2001, capítulo 9o,
questão 473 e
474, p. 185.
4. Kardec
escreveu um
artigo na
Revista
Espírita, Jornal
de Estudos
Psicológicos, de
1865, s/ed., São
Paulo, Editora
Cultural
Espírita Ltda.,
s/d, pág. 331,
em que analisa
interessante
caso de
licantropia que
consta da
Bíblia,
referente a um
antigo rei da
Babilônia, uma
obsessão grave
ou, melhor
dizendo,
subjugação,
termo mais bem
apropriado,
segundo Kardec.
*
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