CHRISTINA NUNES
cfqsda@yahoo.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
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A moeda de troca
– crônica
espírita
Bom dia, e de
antemão meus
votos de ótimas
festas a todos
os amigos,
administradores
da revista O
Consolador,
e aos leitores!
O caso a seguir
é um relato de
mentores
espirituais,
transmitido
através da
ferramenta
mediúnica da
psicografia.
Em uma das
múltiplas
habitações da
invisibilidade,
acima da crosta
planetária, um
rapaz trajado de
branco e de
fisionomia
simpática
anuncia sua
entrada na
saleta onde um
círculo de
amigos ativos
nas tarefas de
assistência a
reencarnados
troca ideias em
meio a sorrisos
e comentários
otimistas. O
rapaz de
aparência jovem,
em questão, é
aprendiz do
ofício junto a
eles, e traz
consigo, por
indicação de um
amparador
missionário da
Terra, de seu
conhecimento, um
indivíduo de
modos
desconfiados e,
até certo ponto,
evidentemente
perplexos. Um
homem maduro,
que observa tudo
em volta como se
inesperadamente
se visse
constrangido à
visita ao
ambiente de um
outro país,
estranho a seus
hábitos e
costumes. É este
personagem, de
seu lado, ligado
a um dos
presentes em
reunião na
saleta, que age
à conta de
protetor
espiritual desde
a data do seu
renascimento na
matéria.
- “Inácio, meus
cumprimentos!
Este irmão, ao
que me
informaram, é
esperado por
você hoje, para
uma entrevista.
Só agora se
desligou pelo
sono, e me
pediram para
conduzi-lo até a
sua presença!” E
fazendo ao
cidadão um gesto
cordial para que
o seguisse,
encaminhou-se
com ele de
encontro ao
mentor de
atitude
acolhedora que,
de imediato,
interrompeu sua
participação na
conversa com
seus pares, para
destacar-se e
dar-lhes a
devida atenção.
– “Deise pediu
também para que
lhe informasse
de que ele, não
necessariamente,
solicitou este
encontro, por
meio de preces
ou convites
mentais que
fossem; mas
mencionou que
você já está bem
inteirado da
situação, que
pede sua
interveniência,
para um quadro
delicado que vem
persistindo no
cotidiano
terrestre do
irmão aqui
presente!”.
A isso, o outro,
de pronto,
devolveu-lhe o
cumprimento, com
um aperto de mão
cordial, e
confirmou com
simplicidade: -
“Sim! Obrigada,
Elias! Em
verdade, este
encontro, aqui,
deve-se mais à
minha
providência! O
irmão Cláudio,
de fato, precisa
de instruções!
Mas não pude
esperar mais que
ele mesmo se
voltasse
espontaneamente
para esta
necessidade
individual, de
vez que ignora
os mecanismos
que o
auxiliariam.
Houve que
requisitar o seu
encaminhamento
diretamente a
mim, nessas
condições, sem
mais demora!”. E
sorriu ao rapaz
solícito que o
escutava, com
serenidade: -
“Agradeço-lhe a
tutela ao meu
convidado! Você
pode ir, e
informar à Deise
que já nos
achamos em
entrevista,
estendendo a ela
os meus
cumprimentos
pelo favor do
auxílio!”.
Assim, Isaías
despediu-se.
Inácio
escusou-se com
os demais
presentes na
sala, sempre sob
a observação
aturdida do
personagem em
situação de
desprendimento
temporário do
corpo físico, e
depois depositou
nele, em
definitivo, sua
atenção
paternal.
Cumprimentou-o
também, com
breve aperto de
mão, e explicou
com brevidade,
convidando-o a
acompanhá-lo a
um ambiente
paralelo daquela
Instituição, de
menores
dimensões, onde
poderiam
palestrar com
privacidade. No
caminho,
esclareceu:
- “O irmão,
naturalmente,
não entende de
pronto o que
acontece aqui e
agora. E a
ocasião não
permite que me
estenda em
explicações
detalhadas de
como é possível
que esteja na
minha presença
no momento de
seu sono
noturno, quando
lhe é possível
vir de encontro
a amigos seus,
que residem no
outro lado da
vida, Cláudio!
Seu
condicionamento
reencarnatório
de momento
dificulta sua
compreensão para
essas coisas,
então devemos
nos ater ao que
de mais prático
e útil posso
mobilizar para
ajudá-lo no seu
quadro de vida
atual, onde vem,
voluntariamente,
de há tempos, se
envolvendo em
dificuldades
criadas por você
mesmo!”.
O visitante
enfim o encarou,
ante a alusão
mais clara às
causas
incompreensíveis
de sua presença
naquele lugar e
com companhias
que lhe
pareciam, em
tudo, estranhas.
– “Dificuldades
criadas por
mim?! A que se
refere? E quem é
o senhor,
afinal, se me
permite
perguntar?!”.
Na saleta de
tamanho menor do
que a anterior,
mas confortável,
silenciosa, e
agradavelmente
iluminada pelas
claridades de
janelas amplas
por onde
entravam as
aragens
perfumadas dos
canteiros dos
jardins do lado
de fora, Inácio
convidou seu
tutelado a
sentar-se no
estofado
confortável que
tinham diante de
si. Acomodou-se
a seu lado, e
começou a
esclarecer:
- “Meu nome é
Inácio. Sou seu
guia espiritual
na presente vida
na Terra, e você
me conhece, mas
não haverá de se
recordar agora;
e, como disse há
pouco, não
dispomos de
tempo suficiente
a que lhe
esclareça, neste
sentido, todas
as dúvidas.
Então, vamos à
sua pergunta. O
seu contexto
familiar,
atualmente, vem
lhe ocasionando
lastimável
estado de ânimo,
e rumos
equivocados de
conduta, meu
caro amigo. E,
embora não nos
solicite auxílio
e apoio,
todavia,
acompanho de
perto os
acontecimentos
de seus dias
desde que se fez
presente no seio
familiar onde
hoje habita,
pela
intermediação da
irmã que o
acompanha à
conta de mãe!
Ouço, nestas
condições,
reclamações
mentais
recorrentes a
respeito da
situação de seu
casamento! Você
precisa
urgentemente
entender
pormenores
importantes, que
nunca serão
demais reajustar
para que nos
encaminhemos,
pelos próprios
passos, num
roteiro mais
seguro de
felicidade e
maior
harmonização com
os que nos
rodeiam em cada
etapa da jornada
material, que é
curta!”.
Todavia, a cada
palavra do
mentor lúcido,
em princípio,
mais se
confundia o
homem em estágio
de reencarnação
terrena. Pediu
que o outro
fosse mais
explícito, e
este não se
negou,
recostando-se no
assento e
cruzando os
braços, com
bonomia. – “Meu
irmão, o que
entende, você,
do que é a
situação
matrimonial no
mundo?”.
- “O casamento?”
- “Sim!”
Cláudio deu de
ombros: - “O que
acontece com
todos! Casamos
com uma mulher,
assinamos
papéis, fazemos
uma festa, e
depois temos
filhos!”.
Paciente, Inácio
conduziu o
diálogo: -
“Apenas isso?
Que entende do
que deve
acontecer
depois? Da
participação dos
dois nos
acontecimentos
ao longo dos
anos, no
ambiente de uma
família?”.
- “Eu não
entendo o porquê
disso tudo, de
eu estar aqui
falando nestes
assuntos com o
senhor!” -
respondeu
Cláudio, ainda
intrigado, e já
ameaçando uma
condição de
humor ingrata
ante assuntos
sobre os quais
sentia
inevitável
incômodo.
- “Entenda que
sou um seu
grande amigo, e
que pretendo
ajudá-lo,
Cláudio! Mesmo
quando fazemos
reclamações
mentais, que
acreditamos de
posse só de
nossa mente e de
Deus, o pedido
de socorro, de
algum modo, é
lançado e, como
sempre acontece,
amigos atendem e
tentam oferecer
apoio e
amparo!”.
- “Mas..., que
reclamações são
estas?!”
- “Você reclama
constantemente
da irmã que
participa a seu
lado como
esposa, já de há
muitos anos!”.
- “É evidente!
Ela me relega ao
abandono e
esquecimento! É
indiferente
comigo, e com as
obrigações que
lhe cabem no
lar!”.
- “Vamos ver!” -
pediu Inácio,
confraterno –
“Enumere-as! As
obrigações que
reputa faltantes
às atenções de
sua esposa!”.
- “Há muita
coisa lançada ao
descuido dentro
de casa!”
- “Não cuida,
ela, dos
filhos?”
- “Não, não é
bem isso! Pelo
contrário!...”
- “Faltam os
cuidados devidos
à participação
dela na
manutenção do
lar?”
- “Não, mas
poderiam ser
melhores!”
- “Trata-o com
descortesia?
Humilha-o,
agride-o de
algum modo
vexatório?
Deprecia sua
pessoa na
presença de
estranhos?”
- “Não, se bem
tenhamos nossos
desentendimentos!...”
- “E não se
dedica, ela, às
obrigações
conjugais que
todos sabem
indispensáveis
ao repertório
matrimonial!
Eis, aí, o
pormenor que
mais lhe pesa
aos
ressentimentos!
A frieza e
desafeto da
companheira!”
- “Não posso
negar que sim!”
Claudio, sisudo,
e já francamente
incomodado
naquele diálogo
compulsório,
admitiu, dando
de ombros. E,
neste ponto, o
abnegado tutor
das esferas
espirituais
mudou sua
posição interna
e externa, e
conduziu a
conversa para
outro nível.
- “Bem. Vamos ao
que lhe diz
respeito! E qual
sua participação
na rotina do
lar?”
- “Estou
presente,
durante todos
estes anos!”
O tutelado de
imediato assumiu
a postura
defensiva,
desviando o
olhar agora de
brilho embaciado
pelas sombras de
descontentamento,
a se adensarem,
de momento para
momento.
- “Mas, meu
irmão, o que
chama de "estar
presente"?
Repetirei para
você as mesmas
lembranças a que
me referi em
relação à irmã
que lhe é
esposa! Cuida
dos detalhes que
merecem reparo
na casa onde
habitam? Aqueles
mesmos de que
disse, há pouco,
lançar ao
descuido a sua
companheira?...”
Houve uma pausa
incômoda.
Cláudio parou,
em silêncio, e
mexeu-se no
estofado onde se
acomodava.
- “Faço o que
posso!...”
Largou a
declaração um
tanto perdida,
enfim: -
“Trabalho muito!
Sinto cansaço!”
- “E sua esposa
trabalha apenas
no lar?”
- “Não, mas...”
- “Você observa
se ela, também,
faz o que pode?”
Novo silêncio.
E, desta vez,
uma expressão de
pesar sombrio
encobriu,
involuntariamente,
a fisionomia do
visitante, que
relanceou o
olhar combalido
de forma
inusitada ao
entrevistador
amável que o
fitava de dentro
da mais franca
cordialidade.
Não respondeu, e
Inácio
prosseguiu: -
“Meu amigo. Não
lhe ocorreu,
ainda, que
aqueles
pormenores
cotidianos que
você acusa
isentos de
atenções
melhores de sua
esposa,
poderiam, de
fato, ser
melhores com uma
sua colaboração
mais efetiva?”
- “Sim, mas o
cansaço me
impede!...”
- “Todavia...” -
notou o
interlocutor –
“seu cansaço
também, e
certamente é o
dela, uma vez
que atende
devidamente às
necessidades dos
seus filhos, e,
ainda, ao
trabalho
profissional
fora de casa! E
em mencionando
seus filhos...
Reflitamos! Que
cuidados vem
somando aos dela
às necessidades
desses que lhes
couberam para
orientá-los e
assegurar-lhes
um caminho
honrado nos
palcos do
mundo?”
-
“Encaminhei-os,
com ela, ao
estudo. Supro
algumas
necessidades
materiais!”
- “E as
espirituais e
emocionais? As
mais
importantes, meu
amigo, porque,
ainda que com o
estômago cheio,
se a alma se vê
faminta de afeto
e atenções a que
tem direito pelo
nascimento,
existe grande
risco de
desequilíbrio na
harmonia dos
caminhos do
mundo, de
futuro!”
Nova pausa, e o
entrevistado
considerou: -
“Ora, se eu não
tenho muito
tempo, minha
esposa, de seu
lado, os
paparica sempre
que pode!”
- “Meu irmão,
julgo
"paparicar" um
termo um pouco
inadequado para
este alimento de
espírito a que
me refiro! Seus
filhinhos não
foram ao mundo
somente para
estudar, comer e
vestir! E o
estímulo do amor
ostensivo em
atitudes e
palavras? Eis,
aí, o maior
esteio, fora do
qual a
humanidade se
lança na mostra
lamentável de
invigilância e
sofrimento na
qual a vemos nos
dias de hoje!”
E como Cláudio
somente o
encarasse, entre
a perplexidade e
um visível
estado de
conflito
interior, Inácio
inspirou,
relanceando o
olhar pensativo
nos arredores
agradáveis da
saleta, e
esboçou um gesto
conciliador,
acrescentando,
oportuno: - “São
estes os tópicos
sobre os quais
sugiro que
medite com a
devida
seriedade,
Cláudio! Porque
pode estar aí a
origem da
insatisfação
amarga de sua
companheira, que
determina todo o
quadro conjugal
que, no íntimo,
você reputa
injusto!”
- “Mas, apesar
do que insinua,
de fato é
injusto comigo
que ela não me
dê atenção e a
devida
importância!
- “A relação
matrimonial, à
semelhança de
todas as outras
que
experimentamos
ao longo da
vida, é uma
troca
confraterna! Já
parou, porém,
para avaliar,
nos assuntos que
aqui analisamos,
a qualidade da
importância que
você mesmo vem
dispensando a
ela, e aos
detalhes do
cenário familiar
que você mesmo
elegeu para
construir, ao
lado da irmã que
convidou a se
unir pelos laços
de amor?”
E como se nova
pausa pesasse no
diálogo
delicado,
Inácio,
compadecido da
amargura íntima
de seu tutelado,
cruzou as mãos
sobre o colo,
comentando a
instrução final:
- “Filho,
entenda uma
verdade! O
casamento é o
rumo pelo qual
os seres
escolhem
orientar sua
afetividade por
caminhos sãos,
distanciados da
promiscuidade
deprimente que
grassa no
planeta! Mas o
que pavimenta
este caminho são
justamente os
pormenores
diminutos da
rotina diária!
Você reclama
direitos
conjugais, como
se o papel
assinado no ato
do sacramento
representasse
moeda de troca,
pela qual sua
esposa,
obrigatoriamente,
se visse
constrangida a
lhe ofertar
determinadas
primazias de sua
intimidade; mas,
em
contrapartida,
despojada de
todos os demais
direitos a que
faz jus de sua
parte, de
amparo,
companheirismo e
afetividade, e
que, por
costume,
dispensamos,
muitas vezes e
de boa vontade,
aos mais
distanciados
conhecidos de
nosso convívio
consanguíneo!”.
Fixou-o, como
pai amoroso, e
continuou: -
“Entenda, então,
Cláudio, onde
está a raiz do
problema! O laço
matrimonial é
condição
escolhida, de
própria
iniciativa, por
dois seres, para
construção de
relações de
respeito,
cumplicidade e
harmonia, na
criação dos
filhos, e
durante as
lições
oferecidas a
ambos pela
escola pródiga
da vida!”
E, acentuando a
seriedade do
tom, arrematou:
- “Casamento não
é pagamento
efetivado com um
tipo de moeda
diversa e
através dos
papéis da
celebração nos
ofícios por
serviços, que,
apenas, neste
caso, estariam
travestidos pela
legalidade
civil, mas, em
realidade,
semelhantes às
meras negociatas
realizadas nas
sarjetas das
transações
sombrias da
venda vil da
sexualidade
feminina, nos
recantos de
maior sofrimento
do mundo!...”.
Entreolharam-se,
tutor espiritual
e protegido.
E Cláudio, nada
embora as
condições
precárias de
alcance
espiritual do
seu presente
estágio
evolutivo,
aparentou sentir
como que uma
nova luz,
bruxuleante,
acendendo-se no
seu íntimo
desalentado.