Recebemos de uma pessoa
residente em Uberaba (MG),
que se identificou apenas
com o primeiro nome, uma
carta via internet datada de
13 de junho, redigida nos
seguintes termos:
“O espiritismo não tem nada
a ver com o cristianismo,
toda fé cristã se baseia na
crença de que Jesus é o
único Filho de Nosso Senhor,
que foi concebido pelo poder
do Espírito Santo, nasceu da
Virgem Maria, padeceu sob
Pôncio Pilatos, foi
crucificado, morto e
sepultado, desceu a mansão
dos mortos, ressuscitou ao
terceiro dia, subiu aos
Céus, está sentado à direita
de Deus Pai todo-poderoso,
donde há de vir a julgar os
vivos e mortos. O
cristianismo prega também a
ressurreição da carne sendo
que o espiritismo não
acredita nem que Jesus seja
filho de Deus muito menos
que ressuscitou.
A palavra Cristo significa O
Ungido. Os seguidores de
Jesus são chamados de
cristãos porque acreditam
que Jesus é o Cristo, ou
Messias, sobre quem falam as
profecias da Tanakh (que os
cristãos conhecem como
Antigo Testamento), sendo
assim qualquer crença que
não reconhece a divindade de
Jesus não pode ser
considerado cristã.” (sic)
Não costumamos responder a
cartas com conteúdos assim,
porque é óbvio que ela foi
enviada por uma pessoa que
professa a religião católica
e que tem, obviamente, o
direito de pensar como lhe
aprouver.
O Espiritismo, como Allan
Kardec deixou bem claro no
capítulo I de seu livro O
que é o Espiritismo, não
adota a prática do
proselitismo nem procura
forçar convicção alguma. Com
efeito, na obra em causa
Kardec escreveu:
“O Espiritismo tem por fim
combater a incredulidade e
suas funestas consequências,
fornecendo provas patentes
da existência da alma e da
vida futura; ele se dirige,
pois, àqueles que em nada
creem ou que de tudo
duvidam, e o número
desses não é pequeno, como
muito bem sabeis; os que têm
fé religiosa e a quem
esta fé satisfaz, dele
não têm necessidade. Àquele
que diz: ‘Eu creio na
autoridade da Igreja e não
me afasto dos seus ensinos,
sem nada buscar além dos
seus limites’, o Espiritismo
responde que não se impõe a
pessoa alguma e que não vem
forçar nenhuma convicção.
(...)
A seus olhos, toda crença,
quando sincera e não permita
ao homem fazer mal ao
próximo, é respeitável,
mesmo que seja errônea. Se
alguém fosse por sua
consciência arrastado a
crer, por exemplo, que é o
Sol que gira ao redor da
Terra, nós lhe diríamos:
‘Acreditai-o se quiserdes,
porque isso não fará que
esses dois astros troquem os
seus papéis’; mas, assim
como não procuramos
violentar-vos a consciência,
respeitai também a nossa. Se
transformardes, porém, uma
crença, de si mesma
inocente, em instrumento de
perseguição, ela então se
tornará nociva e pode ser
combatida.
Tal é, senhor abade, a linha
de conduta que tenho seguido
com os ministros dos
diversos cultos que a mim se
hão dirigido. Quando eles me
interpelaram sobre alguns
pontos da Doutrina, dei-lhes
as explicações necessárias,
abstendo-me de discutir
certos dogmas de que o
Espiritismo não se quer
ocupar, por serem todos os
homens livres em suas
apreciações; nunca, porém,
fui procurá-los no propósito
de lhes abalar a fé por meio
de qualquer pressão.”
(O que é o Espiritismo,
capítulo I, Terceiro Diálogo
– O Padre.)
Não temos, pois, ao escrever
estas notas, intenção
nenhuma de convencer o
missivista, mas somente
esclarecer dois lamentáveis
equívocos que ele cometeu em
sua carta, frutos certamente
da pressa com que a redigiu.
O primeiro equívoco foi
confundir Cristianismo com
Igreja Católica Romana.
Ao longo de sua história,
como poucos ignoram, o
Cristianismo vem resistindo
bravamente aos inúmeros
cismas e às disputas
teológicas diversas que
resultaram na criação de
muitas igrejas distintas. A
Igreja Católica Romana é
apenas um dos seus ramos,
como também o são a Igreja
Ortodoxa e as Igrejas
protestantes.
O Cristianismo professado
nos primeiros séculos, antes
que o Catolicismo dele se
apossasse, era inteiramente
destituído de dogmas ou
rituais e sua fonte
exclusiva eram os
ensinamentos de Jesus.
A Igreja Católica Romana, ao
contrário do que apregoam
seus adeptos, não tem sua
origem nos ensinamentos de
Jesus ou de seus apóstolos.
No Novo Testamento não há
referência à divindade do
Cristo, ao pecado original,
ao papado, à adoração a
Maria, ao batismo dos bebês,
às ordenações da Igreja que
estabeleceram os
sacramentos, à confissão
auricular, ao sacerdócio
organizado, ao purgatório,
às indulgências e a uma
série de rituais que lembram
as práticas do paganismo e
destoam inteiramente da
singeleza com que viviam e
exercitavam sua crença os
apóstolos do Cristo.
Um indivíduo, tanto quanto
uma doutrina, pode,
portanto, considerar-se
cristão sem que professe as
ideias católicas. O vocábulo
cristão diz respeito ao
Cristianismo, não ao
Catolicismo, como se pode
ler em qualquer dicionário.
É exatamente isso que ocorre
no tocante aos espíritas e
ao Espiritismo, que não
estabeleceu moral diferente
da ensinada por Jesus, fato
que Allan Kardec deixou bem
claro na Introdução d´O
Livro dos Espíritos, sua
principal obra: “A moral dos
Espíritos superiores se
resume, como a do Cristo,
nesta máxima evangélica:
Fazer aos outros o que
quereríamos que os outros
nos fizessem, isto é, fazer
o bem e não o mal. Neste
princípio encontra o homem
uma regra universal de
proceder, mesmo para as suas
menores ações”.
*
O outro equívoco do autor da
carta diz respeito à suposta
desconsideração que os
espíritas e a doutrina
espírita teriam com relação
a Jesus.
Quem pensa assim e o diz
publicamente revela que
jamais leu uma obra espírita
e, por isso, não poderia
julgá-la, porque constitui
princípio elementar que para
julgar uma obra é preciso,
primeiro, conhecê-la.
Ora, na questão 625 d´O
Livro dos Espíritos, de
Allan Kardec, lemos:
625. Qual o tipo mais
perfeito que Deus tem
oferecido ao homem, para lhe
servir de guia e modelo?
“Jesus.”
Nota de Allan Kardec: “Para
o homem, Jesus constitui o
tipo da perfeição moral a
que a Humanidade pode
aspirar na Terra. Deus no-lo
oferece como o mais
perfeito modelo e a
doutrina que ensinou é a
expressão mais pura da lei
do Senhor, porque, sendo ele
o mais puro de quantos têm
aparecido na Terra, o
Espírito Divino o animava”.
(Grifamos)
Na Introdução d´O
Evangelho segundo o
Espiritismo, Kardec
escreveu:
“Podem dividir-se em cinco
partes as matérias contidas
nos Evangelhos: os atos
comuns da vida do Cristo; os
milagres; as predições; as
palavras que foram tomadas
pela Igreja para fundamento
de seus dogmas; e o
ensino moral. As quatro
primeiras têm sido objeto de
controvérsias; a última,
porém, conservou-se
constantemente inatacável.
Diante desse código divino,
a própria incredulidade se
curva. É terreno onde todos
os cultos podem reunir-se,
estandarte sob o qual podem
todos colocar-se, quaisquer
que sejam suas crenças,
porquanto jamais ele
constituiu matéria das
disputas religiosas, que
sempre e por toda a parte se
originaram das questões
dogmáticas. Aliás, se o
discutissem, nele teriam as
seitas encontrado sua
própria condenação, visto
que, na maioria, elas se
agarram mais à parte mística
do que à parte moral, que
exige de cada um a reforma
de si mesmo. Para os homens,
em particular, constitui
aquele código uma regra de
proceder que abrange todas
as circunstâncias da vida
privada e da vida pública, o
princípio básico de todas as
relações sociais que se
fundam na mais rigorosa
justiça. E, finalmente e
acima de tudo, o roteiro
infalível para a felicidade
vindoura, o levantamento
de uma ponta do véu que nos
oculta a vida futura. Essa
parte é a que será objeto
exclusivo desta obra.”
(Grifamos)
Bastam as referências acima
para que o leitor se informe
sobre o que o Espiritismo
nos fala sobre Jesus e seus
ensinamentos. Contudo, caso
queira o leitor saber mais,
sugerimos que leia o artigo
“Como o Espiritismo vê Jesus
e a moral cristã”, que
publicamos na edição 36
desta revista. Eis o link
que remete o interessado ao
texto:
http://www.oconsolador.com.br/36/especial.html
Há na carta do missivista
católica outros pontos que
mereciam ser analisados, mas
isso alongaria por demais
estes comentários.
Sugerimos, então, aos
interessados pelo assunto
que vejam nos livros
Cristianismo e Espiritismo,
de Léon Denis, e A
esquina de pedra, de
Wallace Leal V. Rodrigues,
como surgiu a Igreja
Católica Romana e de que
maneira, sorrateiramente, a
singeleza dos ensinamentos e
dos exemplos de Jesus foi
enxertada com práticas e
ideias estranhas, para
acomodação dos interesses
dos que então se encontravam
à frente da Igreja.
Um exemplo desses enxertos é
exatamente a propalada
divindade de Jesus, citada
na carta, uma ideia que
provocou discussões durante
três séculos e foi rejeitada
por três concílios, até que,
insistindo no assunto, seus
partidários conseguiram
aprová-la no ano de 325, em
Niceia, nos seguintes
termos: “A Igreja de Deus,
católica e apostólica,
anatematiza os que dizem que
houve um tempo em que o
Filho não existia, ou que
não existia antes de haver
sido gerado”.
Jesus passou a ser
considerado desde então, no
seio do Catolicismo, não
mais um homem - o filho de
Deus -, mas uma divindade -
alguém que jamais foi gerado
-, em contradição formal com
as opiniões dos apóstolos e
com as palavras dele
próprio, que com frequência
se designava Filho do
homem, raramente se
chamava Filho de Deus
e nunca se declarou Deus.
(Cf. Cristianismo e
Espiritismo, de Léon
Denis, pp. 73 a 83.)
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