Com a fidalguia que se
espera de um espírita
verdadeiro, três leitores de
nossa revista – Leandro
Cosme Oliveira Couto (Belo
Horizonte, MG), Luiz Alberto
Cunha da Silva (Viamão, RS)
e Fernando Rosemberg
Patrocínio (Uberaba, MG) –,
conforme mensagens
publicadas na seção de
Cartas desta mesma edição,
estranharam a resposta dada
à leitora Zilma Dias Keown
na edição 369 desta revista.
Eis a mensagem recebida da
leitora:
De: Zilma Dias Keown (Jacksonville
– Flórida, Estados Unidos)
Sexta-feira, 20 de junho de
2014 às 14:27:33
Boa tarde! Gostaria muito de
saber se Maria mãe de Jesus
teve outros filhos além de
Jesus. Li a respeito no
livro A Gênese, mas,
burrinha como sou, não
entendi muito bem. Desde já
agradeço-lhe pela atenção.
Zilma
Eis o que lhe foi
respondido:
“A questão proposta pela
leitora não foi jamais
examinada por Kardec nem, ao
que sabemos, por nenhum
autor espírita. Sempre que
esse assunto vem à baila,
dizemos o que está escrito
em nota de rodapé constante
da pág. 11 da edição do Novo
Testamento publicada em 1980
por LEB – Edições Loyola, a
saber: o Novo Testamento não
conhece outros filhos de
Maria, nem de José; nunca,
em nenhuma passagem do NT,
ninguém é chamado filho de
Maria, a não ser Jesus, e
nunca, em nenhum texto, de
ninguém Maria é chamada mãe,
a não ser de Jesus.”
A estranheza dos leitores
acima citados prende-se ao
fato de que o próprio Allan
Kardec referiu-se no cap.
XIV d´O Evangelho segundo
o Espiritismo aos irmãos
de Jesus, o que, para eles,
é uma clara evidência de que
José e Maria tiveram outros
filhos. Além da referência
feita a Kardec, os leitores
mencionaram várias passagens
do Novo Testamento em que
se faz alusão aos irmãos de
Jesus, fato que serviria
como comprovação do que o
Codificador do Espiritismo
escreveu.
Não ignoramos que Kardec e o
Novo Testamento fizeram
referência ao termo
“irmãos”, aludindo com isso
a Jesus de Nazaré, mas é
preciso convir, como
dissemos inicialmente, que o
Novo Testamento, em nenhum
de seus livros, fala sobre
“filhos” de Maria. E foi
essa, exatamente essa, a
questão tratada na resposta
dada à leitora Zilma Dias
Keown.
Ela não perguntou se Jesus
teve “irmãos”: ela perguntou
se Maria teve outros
“filhos”, o que é coisa bem
diferente.
Filhos de Jacó, José e
Benjamim, cuja mãe se
chamava Raquel, tinham dez
irmãos e uma irmã de nome
Dina. Raquel, porém, foi mãe
apenas de dois filhos, visto
que os outros filhos de Jacó
e irmãos de José e Benjamim
foram gestados por Bala (Dan
e Nefthali), Zelfa (Gad e
Aser) e Lia (Ruben, Simeão,
Levi, Judá, Isacar e Zabulon).
O Novo Testamento faz,
realmente, diversas
referências aos “irmãos” de
Jesus, como mostram os
trechos abaixo:
E não vi a nenhum outro dos
apóstolos, senão a Tiago,
irmão do Senhor.
Gálatas 1:19
Todos estes perseveravam
unanimemente em oração e
súplicas, com as mulheres, e
Maria mãe de Jesus, e com
seus irmãos.
Atos 1:14
Não temos nós direito de
levar conosco uma esposa
crente, como também os
demais apóstolos, e os
irmãos do Senhor, e Cefas?
Ou só eu e Barnabé não temos
direito de deixar de
trabalhar?
1 Coríntios 9:5-6
Chegaram, então, seus irmãos
e sua mãe; e, estando fora,
mandaram-no chamar. E a
multidão estava assentada ao
redor dele, e disseram-lhe:
Eis que tua mãe e teus
irmãos te procuram, e estão
lá fora. E ele lhes
respondeu, dizendo: Quem é
minha mãe e meus irmãos?
Marcos 3:31-33
E, chegando o sábado,
começou a ensinar na
sinagoga; e muitos,
ouvindo-o, se admiravam,
dizendo: De onde lhe vêm
estas coisas? e que
sabedoria é esta que lhe foi
dada? e como se fazem tais
maravilhas por suas mãos?
Não é este o carpinteiro,
filho de Maria, e irmão de
Tiago, e de José, e de Judas
e de Simão? e não estão aqui
conosco suas irmãs? E
escandalizavam-se nele.
Marcos 6:2-3
E, falando ele ainda à
multidão, eis que estavam
fora sua mãe e seus irmãos,
pretendendo falar-lhe. E
disse-lhe alguém: Eis que
estão ali fora tua mãe e
teus irmãos, que querem
falar-te. Ele, porém,
respondendo, disse ao que
lhe falara: Quem é minha
mãe? E quem são meus irmãos?
Mateus 12:46-48
E, chegando à sua pátria,
ensinava-os na sinagoga
deles, de sorte que se
maravilhavam, e diziam: De
onde veio a este a
sabedoria, e estas
maravilhas? Não é este o
filho do carpinteiro? e não
se chama sua mãe Maria, e
seus irmãos Tiago, e José, e
Simão, e Judas? E não estão
entre nós todas as suas
irmãs? De onde lhe veio,
pois, tudo isto?
Mateus 13:54-56
Disseram-lhe, pois, seus
irmãos: Sai daqui, e vai
para a Judeia, para que
também os teus discípulos
vejam as obras que fazes.
Porque não há ninguém que
procure ser conhecido que
faça coisa alguma em oculto.
Se fazes estas coisas,
manifesta-te ao mundo.
Porque nem mesmo seus irmãos
criam nele.
João 7:3-5
Tantas passagens não
permitem que se negue o
fato. Mas – perguntamos – o
termo “irmãos” usado por
Paulo e pelos evangelistas
teria o sentido estrito que
damos usualmente a essa
palavra?
Carlos Torres Pastorino
estudou meticulosamente o
assunto e chegou a uma
conclusão diferente da
opinião dos nossos três
leitores.
Segundo Pastorino, como se
pode ler em sua obra
Sabedoria do Evangelho -
Volume 2, os quatro
personagens citados como
“irmãos” de Jesus –
Tiago, José, Simão e Judas –
seriam, em verdade,
primos-irmãos de Jesus,
parentesco que costumava ser
abreviado com a simples
palavra "irmão".
Alguns pais da Igreja, como
Orígenes, Epifânio, Gregório
de Nissa, Hilário, Ambrósio
e Eusébio, entendiam que
eles fossem filhos de José,
frutos de um primeiro
matrimônio que o pai de
Jesus teria tido, hipótese
que Jerônimo refutou. Na
obra de Pastorino a que nos
reportamos, os interessados
podem verificar as fontes em
que Pastorino se baseou para
expressar suas conclusões.
Registra o evangelista João,
na parte final de suas
anotações, uma passagem
importante que dá apoio ao
pensamento de Pastorino.
Ei-la:
“E junto à cruz de Jesus
estava sua mãe, e a irmã de
sua mãe, Maria mulher de
Clopas, e Maria Madalena.
Ora, Jesus, vendo ali sua
mãe, e que o discípulo a
quem ele amava estava
presente, disse a sua mãe:
Mulher, eis aí o teu filho.
Depois disse ao discípulo:
Eis aí tua mãe. E desde
aquela hora o discípulo a
recebeu em sua casa.”
(João 19:25-27.)
Eis os comentários feitos
por Pastorino à passagem
transcrita:
“Foi quando Jesus cônscio de
si e com todas as Suas
energias, percorreu o olhar
pelas pessoas ali presentes,
e proferiu as frases curtas
e incisivas: Mulher, eis teu
filho (gynai, híde ho
huiós sou). Com isso
nomeava João, o discípulo
amado, como Seu substituto
legal no afeto de Maria.
Voltando-se, depois, para
João, ratifica o mesmo
legado: eis tua mãe (híde
hê mêtêr sou). E o
evangelista acrescenta: e
desde essa hora, tomou-a o
discípulo como coisa própria
(eis tà ídia), ou a
seu cargo.
(...)
Anotemos, de passagem, que
se Maria tivesse tido outros
filhos, ou mesmo enteados
(filhos do primeiro
matrimônio de José), esse
gesto de Jesus tem ensanchas
de magoá-los profundamente.
Daí termos aceitado, desde o
início, a hipótese da
expressão ‘irmãos de Jesus’,
como sendo seus primos
irmãos.
(...)
João, a essa época, parece
que contava cerca de 21 ou
22 anos. A partir daí, João
manteve Maria a seu lado,
tendo-a levado para Éfeso,
segundo a tradição, onde ela
veio a falecer muitos anos
depois.” (Sabedoria
do Evangelho, Volume 8, p.
154 a 158.)
No cap. 5 do livro Boa
Nova, psicografia de
Chico Xavier, Humberto de
Campos (Espírito) diz que
Levi, Tadeu e Tiago, filhos
de Alfeu e sua esposa
Cleofas, parenta de Maria,
eram nazarenos e amavam a
Jesus desde a infância,
sendo muitas vezes chamados
“os irmãos do Senhor”, à
vista de suas profundas
afinidades afetivas.
Quanto à informação de que
Maria foi efetivamente morar
em Éfeso com o evangelista
João, o cap. 30 da mesma
obra é recheado de preciosas
informações, que vale a pena
ler.
Eis alguns trechos do citado
capítulo:
Maria deixou-se enlaçar pelo
discípulo querido e ambos,
ao pé do madeiro, em gesto
súplice, buscaram
ansiosamente a luz daqueles
olhos misericordiosos, no
cúmulo dos tormentos. Foi aí
que a fronte do divino
supliciado se moveu
vagarosamente, revelando
perceber a ansiedade
daquelas duas almas em
extremo desalento. “Meu
filho! Meu amado filho!“
exclamou a mártir, em
aflição diante da serenidade
daquele olhar de melancolia
intraduzível.
O Cristo pareceu meditar no
auge de suas dores, mas,
como se quisesse demonstrar,
no instante derradeiro, a
grandeza de sua coragem e a
sua perfeita comunhão com
Deus, replicou com
significativo movimento dos
olhos vigilantes: “Mãe, eis
aí teu filho!. . .“ E
dirigindo-se, de modo
especial, com um leve aceno,
ao apóstolo, disse: “Filho,
eis aí tua mãe!”
(...)
Após a separação dos
discípulos, que se
dispersaram por lugares
diferentes, para a difusão
da Boa Nova, Maria
retirou-se para a Betaneia,
onde alguns parentes mais
próximos a esperavam com
especial carinho. Os anos
começaram a rolar,
silenciosos e tristes, para
a angustiada saudade de seu
coração.
Tocada por grandes
dissabores, observou que, em
tempo rápido, as lembranças
do filho amado se convertiam
em elementos de ásperas
discussões, entre os seus
seguidores. Na Bataneia,
pretendia-se manter uma
certa aristocracia
espiritual, por efeito dos
laços consanguíneos que ali
a prendiam, em virtude dos
elos que a ligavam a José.
Em Jerusalém, digladiavam-se
os cristãos e os judeus, com
veemência e acrimônia. Na
Galileia, os antigos
cenáculos simples e
amoráveis da Natureza
estavam tristes e desertos.
Para aquela mãe amorosa,
cuja alma digna observava
que o vinho generoso de Caná
se transformara no vinagre
do martírio, o tempo
assinalava sempre uma
saudade maior no mundo e uma
esperança cada vez mais
elevada no céu.
Sua vida era uma devoção
incessante ao rosário imenso
da saudade, às lembranças
mais queridas. Tudo que o
passado feliz edificara em
seu mundo interior revivia
na tela de suas lembranças,
com minúcias somente
conhecidas do amor, e lhe
alimentavam a seiva da vida.
Relembrava o seu Jesus
pequenino, como naquela
noite de beleza prodigiosa,
em que o recebera nos braços
maternais, iluminado pelo
mais doce mistério.
Figurava-se-lhe escutar
ainda o balido das ovelhas
que vinham, apressadas,
acercar-se do berço que se
formara de improviso.
E aquele primeiro beijo,
feito de carinho e de luz?
As reminiscências envolviam
a realidade longínqua de
singulares belezas para o
seu coração sensível e
generoso. Em seguida, era o
rio das recordações
desaguando, sem cessar, na
sua alma rica de
sentimentalidade e ternura.
Nazaré lhe voltava à
imaginação, com as suas
paisagens de felicidade e de
luz. A casa singela, a fonte
amiga, a sinceridade das
afeições, o lago majestoso
e, no meio de todos os
detalhes, o filho adorado,
trabalhando e amando, no
erguimento da mais elevada
concepção de Deus, entre os
homens da Terra. De vez em
quando, parecia vê-lo em
seus sonhos repletos de
esperança. Jesus lhe
prometia o júbilo encantador
de sua presença e
participava da carícia de
suas recordações.
A esse tempo, o filho de
Zebedeu, tendo presentes as
observações que o Mestre lhe
fizera da cruz, surgiu na
Bataneia, oferecendo àquele
espírito saudoso de mãe o
refúgio amoroso de sua
proteção. Maria aceitou o
oferecimento, com satisfação
imensa.
E João lhe contou a sua nova
vida. Instalara-se
definitivamente em Éfeso,
onde as ideias cristãs
ganhavam terreno entre almas
devotadas e sinceras. Nunca
olvidara as recomendações do
Senhor e, no íntimo,
guardava aquele título de
filiação como das mais altas
expressões de amor universal
para com aquela que recebera
o Mestre nos braços
veneráveis e carinhosos.
Maria escutava-lhe as
confidências, num misto de
reconhecimento e de ventura.
João continuava a expor-lhe
os seus planos mais
insignificantes. Levá-la-ia
consigo, andariam ambos na
mesma associação de
interesses espirituais.
Seria seu filho desvelado,
enquanto receberia de sua
alma generosa a ternura
maternal, nos trabalhos do
Evangelho. Demorara-se a
vir, explicava o filho de
Zebedeu, porque lhe faltava
uma choupana, onde se
pudessem abrigar;
entretanto, um dos membros
da família real de Adiabene,
convertido ao amor do
Cristo, lhe doara uma
casinha pobre, ao sul de
Éfeso, distando três léguas
aproximadamente da cidade.
A habitação simples e pobre
demorava num promontório, de
onde se avistava o mar. No
alto da pequena colina,
distante dos homens e no
altar imponente da Natureza,
se reuniriam ambos para
cultivar a lembrança
permanente de Jesus.
Estabeleceriam um pouso e
refúgio aos desamparados,
ensinariam as verdades do
Evangelho a todos os
espíritos de boa-vontade e,
como mãe e filho, iniciariam
uma nova era de amor, na
comunidade universal.
Maria aceitou alegremente.
Dentro de breve tempo,
instalaram-se no seio amigo
da Natureza, em frente do
oceano. Éfeso ficava pouco
distante; porém, todas as
adjacências se povoavam de
novos núcleos de habitações
alegres e modestas.
A casa de João, ao cabo de
algumas semanas, se
transformou num ponto de
assembleias adoráveis, onde
as recordações do Messias
eram cultuadas por espíritos
humildes e sinceros.
Maria externava as suas
lembranças. Falava dele com
maternal enternecimento,
enquanto o apóstolo
comentava as verdades
evangélicas, apreciando os
ensinos recebidos. Vezes
inúmeras, a reunião somente
terminava noite alta, quando
as estrelas tinham maior
brilho. E não foi só.
Decorridos alguns meses,
grandes fileiras de
necessitados acorriam ao
sitio singelo e generoso. A
notícia de que Maria
descansava, agora, entre
eles, espalhara um clarão de
esperança por todos os
sofredores. Ao passo que
João pregava na cidade as
verdades de Deus, ela
atendia, no pobre santuário
doméstico, aos que a
procuravam exibindo-lhe suas
úlceras e necessidades. Sua
choupana era, então,
conhecida pelo nome de “Casa
da Santíssima”. (Boa
Nova, cap. 30.)
Se Maria tivesse outros
filhos, motivo nenhum
haveria para ser levada para
tão longe, seguindo o
evangelista João, que para
ali havia ido por imposição
do Sinédrio, como é relatado
em minúcias no livro
Paulo e Estêvão, de
autoria de Emmanuel,
psicografia de Chico Xavier.
Esperamos que estas
observações satisfaçam a
todos aqueles que se
interessam pelo assunto de
que ora tratamos, conquanto
não tenhamos a pretensão de
haver esgotado o palpitante
tema.
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