Em carta publicada nesta
mesma edição, o leitor Luís
Antônio Pereira Leite, de
Cachoeirinha (RS), volta à
história de Ascânio e Lucas,
assunto comentado na seção
de Cartas da edição 387.
Causaram estranheza ao
leitor, no caso em foco,
conforme dito em sua nova
carta:
-
o fato de mesmo no caso
de perdão, com adoção de
uma nova conduta por
parte do devedor, haver
ainda necessidade de
“pagar”, ou melhor,
resgatar uma dívida
perante a Lei contraída
no passado;
-
a circunstância de tal
“pagamento” ou resgate
ocorrer depois de muitos
séculos.
Os dois fatos, embora tenham
causado perplexidade no
leitor, têm fundamento nos
ensinamentos cristãos e,
obviamente, nos ensinamentos
espíritas, como adiante
veremos.
Vejamos primeiro o que nos é
dito nos textos evangélicos:
Ouvistes que foi dito aos
antigos: Não matarás; mas
qualquer que matar será réu
de juízo. Eu, porém, vos
digo que qualquer que, sem
motivo, se encolerizar
contra seu irmão, será réu
de juízo; e qualquer que
disser a seu irmão: Raca,
será réu do sinédrio; e
qualquer que lhe disser:
Louco, será réu do fogo do
inferno. Portanto, se
trouxeres a tua oferta ao
altar, e aí te lembrares de
que teu irmão tem alguma
coisa contra ti, deixa ali
diante do altar a tua
oferta, e vai reconciliar-te
primeiro com teu irmão e,
depois, vem e apresenta a
tua oferta. Concilia-te
depressa com o teu
adversário, enquanto estás
no caminho com ele, para que
não aconteça que o
adversário te entregue ao
juiz, e o juiz te entregue
ao oficial, e te encerrem na
prisão. Em verdade te digo
que de maneira nenhuma
sairás dali enquanto não
pagares o último ceitil.
(Mateus
5:21-26.)
E logo, aproximando-se de
Jesus, disse: Eu te saúdo,
Rabi; e beijou-o. Jesus,
porém, lhe disse: Amigo, a
que vieste? Então,
aproximando-se eles,
lançaram mão de Jesus, e o
prenderam. E eis que um dos
que estavam com Jesus,
estendendo a mão, puxou da
espada e, ferindo o servo do
sumo sacerdote, cortou-lhe
uma orelha. Então Jesus
disse-lhe: Embainha a tua
espada; porque todos os
que lançarem mão da espada,
à espada morrerão. (Mateus
26:49-52.)
(Grifamos.)
A dureza da Lei, sintetizada
magnificamente nos textos
acima, não poupou nem mesmo
João Batista, sobre o qual
Jesus disse as seguintes
palavras:
E, partindo eles, começou
Jesus a dizer às turbas, a
respeito de João: Que fostes
ver no deserto? uma cana
agitada pelo vento? Sim, que
fostes ver? um homem
ricamente vestido? Os que
trajam ricamente estão nas
casas dos reis. Mas, então
que fostes ver? um profeta?
Sim, vos digo eu, e muito
mais do que profeta; porque
é este de quem está escrito:
Eis que diante da tua face
envio o meu anjo, que
preparará diante de ti o teu
caminho. Em verdade vos digo
que, entre os que de
mulher têm nascido, não
apareceu alguém maior do que
João, o Batista; mas
aquele que é o menor no
reino dos céus é maior do
que ele. E, desde os dias de
João o Batista até agora, se
faz violência ao reino dos
céus, e pela força se
apoderam dele. Porque todos
os profetas e a lei
profetizaram até João. E, se
quereis dar crédito, é
este o Elias que havia de
vir. Quem tem ouvidos
para ouvir, ouça. (Mateus
11:7-15.)
(Grifamos.)
Destacamos no texto acima
estas duas informações
pronunciadas por Jesus: 1)
Ninguém é maior do João
Batista. 2) Ele é o Elias
que havia de vir.
Apesar disso, João Batista
foi degolado no cárcere, por
ordem de Herodes, como
relata o texto abaixo:
Naquele tempo ouviu Herodes,
o tetrarca, a fama de Jesus.
E disse aos seus criados:
Este é João, o Batista;
ressuscitou dos mortos, e
por isso estas maravilhas
operam nele. Porque Herodes
tinha prendido João, e
tinha-o maniatado e
encerrado no cárcere, por
causa de Herodias, mulher de
seu irmão Filipe, porque
João lhe dissera: Não te é
lícito possuí-la. E,
querendo matá-lo, temia o
povo; porque o tinham como
profeta. Festejando-se,
porém, o dia natalício de
Herodes, dançou a filha de
Herodias diante dele, e
agradou a Herodes. Por isso
prometeu, com juramento,
dar-lhe tudo o que pedisse.
E ela, instruída previamente
por sua mãe, disse: Dá-me
aqui, num prato, a cabeça de
João o Batista. E o rei
afligiu-se, mas, por causa
do juramento, e dos que
estavam à mesa com ele,
ordenou que se lhe desse. E
mandou degolar João no
cárcere. (Mateus
14:1-10.)
(Grifamos.)
Corre no meio espírita uma
tese, defendida também por
Chico Xavier, de que o fato
ocorrido com João Batista
não se deveu a um simples
capricho de uma jovem, mas
ao cumprimento da Lei, visto
que João resgatava naquele
episódio uma dívida
contraída séculos atrás
quando viveu na Terra sob o
nome de Elias.
Eis como o episódio foi
narrado no Antigo
Testamento:
Sucedeu que, no momento de
ser oferecido o sacrifício
da tarde, o profeta Elias se
aproximou, e disse: Ó Senhor
Deus de Abraão, de Isaque e
de Israel, manifeste-se hoje
que tu és Deus em Israel, e
que eu sou teu servo, e que
conforme à tua palavra fiz
todas estas coisas.
Responde-me, Senhor,
responde-me, para que este
povo conheça que tu és o
Senhor Deus, e que tu
fizeste voltar o seu
coração. Então caiu fogo do
Senhor, e consumiu o
holocausto, e a lenha, e as
pedras, e o pó, e ainda
lambeu a água que estava no
rego. O que vendo todo o
povo, caíram sobre os seus
rostos, e disseram: Só o
Senhor é Deus! Só o Senhor é
Deus! E Elias lhes disse:
Lançai mão dos profetas de
Baal, que nenhum deles
escape. E lançaram mão
deles; e Elias os fez
descer ao ribeiro de Quisom,
e ali os matou. (1
Reis 18:36-40)
(Grifamos.)
O resgate dos crimes
cometidos por Elias ocorreu,
como se vê, muito tempo
depois de haverem sido
cometidos, e não importou no
caso o fato de João Batista
(o mesmo Elias reencarnado)
ser, dos nascidos de mulher,
o maior que reencarnara no
planeta até aquele momento.
Quanto aos ensinamentos
espíritas, são vários os
relatos que mostram que
muitos resgates ocorrem
séculos depois da falta cometida.
A razão é simples: Deus não
apressa a expiação, Deus
sabe esperar, como nos
informa o texto seguinte
extraído da principal obra
espírita:
262-a. Quando o Espírito
goza do livre-arbítrio, a
escolha da existência
corporal dependerá sempre
exclusivamente de sua
vontade, ou essa existência
lhe pode ser imposta, como
expiação, pela vontade de
Deus?
“Deus sabe esperar, não
apressa a expiação.
Todavia, pode impor certa
existência a um Espírito,
quando este, pela sua
inferioridade ou má vontade,
não se mostra apto a
compreender o que lhe seria
mais útil, e quando vê que
tal existência servirá para
a purificação e o progresso
do Espírito, ao mesmo tempo
que lhe sirva de expiação.”
(O Livro dos Espíritos,
questão 262–a.) (Grifamos.)
O caso do incêndio do
edifício Joelma serve como
ilustração desse fato. Como
o leitor pode conferir lendo
os cap. 25 e 26 do livro
Diálogo dos Vivos, de
autoria de Chico Xavier, J.
Herculano Pires e Espíritos
diversos, as pessoas que
pereceram naquele incêndio,
ocorrido no dia 1º de
fevereiro de 1974,
resgatavam com aquele
episódio crimes cometidos na
época das Cruzadas, nove
séculos atrás.
Três Espíritos
manifestaram-se naquela
oportunidade: Emmanuel e os
poetas Cyro Costa e Cornélio
Pires. Do soneto Luz nas
chamas, de Cyro Costa,
destacamos a parte final:
Varrem com fogo e pranto as
sombras de outras eras
Combatentes da Cruz em
provações austeras,
Conquanto heróis do mundo,
honrando os tempos idos.
Na Terra o sofrimento, a
angústia, a cinza, a
escória...
Mas ouvem-se no Além os
hinos de vitória
Das Milícias do Céu saudando
os redimidos.
Explicando a dúvida que
muitos podem ter, como
ocorreu com o leitor gaúcho,
J. Herculano Pires escreveu
o seguinte texto:
Mesmo entre os espíritas,
alguns poderão perguntar por
que motivo dívidas tão
remotas só agora foram
pagas. As Cruzadas se
verificaram entre princípios
do Século XI e final do
Século XIII. É que a Lógica
Divina é superior à lógica
humana. Débitos pesados
esmagariam o espírito
endividado, sob cobrança
imediata. Convém dar tempo
ao tempo para que os
resgates se façam de maneira
proveitosa. Os espíritos
devem evoluir o suficiente
para que suas próprias
consciências os levem a
aceitar o resgate e a
pedi-lo, reconhecendo a
medida como necessária para
continuidade de sua
evolução. Entrementes, nas
encarnações sucessivas,
partes do débito vão sendo
pagas, aliviando o devedor.
Por isso Cyro Costa alude a
“resquícios de culpa” e não
à culpabilidade total.
Também por isso as vítimas
foram recebidas de maneira
gloriosa, pois agora
comparecem na
Espiritualidade como heróis
da evolução, espíritos que
se propuseram a passar na
Terra pelo que inflaram a
outros no passado. Não foram
submetidos compulsoriamente
ao sacrifício, mas
entregaram-se a ele de
maneira espontânea, no
exercício voluntário do seu
livre arbítrio. Essa a sua
glória. E o consolo para os
que ficam é evidente. Seus
entes queridos não foram
vítimas ocasionais de um
golpe nefando do destino ou
da fatalidade. Nada disso.
Sacrificam-se num momento
terrível mas passageiro,
para assegurar-se a
felicidade no mundo
espiritual e reencarnações
felizes no futuro.
(Diálogo dos Vivos, cap.
26.)
Cremos que as explicações
acima são suficientes para
que o leitor entenda que o
caso Ascânio e Lucas não
fugiu à normalidade e, com
certeza, é muito mais comum
do que pensamos.
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