O leitor Orlando Alcassio,
em carta publicada nesta
mesma edição, pergunta-nos:
Mediunidade inconsciente
existe ou não existe?
Sim, a mediunidade
inconsciente existe. Ocorre
que, no tocante à palavra
“inconsciente”, existem dois
conceitos diferentes na
literatura espírita.
Em O Livro
dos Médiuns,
item 188, ao tratar das
variedades comuns a todos os
gêneros de mediunidade,
Allan Kardec nos informa que
existem médiuns sensitivos,
médiuns naturais ou
inconscientes e os médiuns
facultativos ou voluntários.
Médiuns naturais ou
inconscientes são, segundo o
codificador da doutrina
espírita, os que produzem os
fenômenos espontaneamente,
sem nenhuma participação de
sua vontade e o mais das
vezes sem o saberem. É assim
que muitas pessoas que
jamais ouviram falar de
Espiritismo podem ser
médiuns sem se darem conta
disso.
Na obra de André Luiz, ao
reportar-se ao fenômeno de
psicofonia, o conceito
pertinente ao adjetivo
“inconsciente” aplicado à
mediunidade é colocado de
forma diferente. O assunto é
tratado por ele nos cap. 6 a
8 do livro Nos Domínios
da Mediunidade, obra
psicografada por Francisco
Cândido Xavier.
Para compreender melhor a
diferença entre psicofonia
consciente e psicofonia
inconsciente, notemos que na
primeira – psicofonia
consciente – André Luiz
compara a associação entre o
Espírito sofredor e o corpo
do médium a um sutil
processo de enxertia
neuropsíquica.
Descrevendo um desses casos,
em que atuou a médium
Eugênia, André diz que leves
fios brilhantes ligavam a
fronte da alma da médium,
desligada do seu veículo
físico, ao cérebro da
entidade comunicante. Embora
senhoreando as forças da
médium, o Espírito
comunicante permanecia
controlado por ela, a quem
então ele se imanava pela
corrente nervosa, através da
qual a médium estaria
informada de todas as
palavras que ele
mentalizasse e pretendesse
dizer.
Segundo o instrutor Aulus,
consciente de todas as
intenções do Espírito
infortunado, a médium
reservava-se o direito de
corrigi-lo em qualquer
inconveniência. "Pela
corrente nervosa,
conhecer-lhe-á as palavras
na formação, apreciando-as
previamente, de vez que os
impulsos mentais dele lhe
percutem sobre o pensamento
como verdadeiras marteladas.
Pode, assim, frustrar-lhe
qualquer abuso,
fiscalizando-lhe os
propósitos e expressões,
porque se trata de uma
entidade que lhe é inferior,
pela perturbação e pelo
sofrimento em que se
encontra, e a cujo nível não
deve arremessar-se, se
quiser ser-lhe útil. O
Espírito em turvação é um
alienado mental,
requisitando auxílio.”
Outro dado importante é que
a alma de Eugênia, a médium,
se conservava bem próxima do
seu corpo físico, visto que
nesse tipo de fenômeno,
sempre que o esforço se
refira a entidades em
desajuste, o medianeiro não
deve ausentar-se demasiado.
Com um demente em casa, o
afastamento é perigoso.
Na psicofonia inconsciente,
os fatos se processam de
forma diferente.
A médium agora chama-se
Celina. Descrevendo o
fenômeno, André diz que,
assim que viu o Espírito
sofredor, a alma da médium
desvencilhou-se do corpo
físico, como alguém que se
entregasse a sono profundo,
e conduziu consigo a aura
brilhante de que se coroava.
Fitando o desesperado
visitante com simpatia,
abriu-lhe os braços,
auxiliando-o a senhorear o
veículo físico, então em
sombra. Como se fora atraído
por vigoroso ímã, o sofredor
arrojou-se sobre a
organização física de
Celina, colando-se a ela,
instintivamente. Auxiliado
por outro Espírito, ele
sentou-se com dificuldade,
afigurando-se a André Luiz
estar intensivamente ligado
ao cérebro físico da médium.
No caso anterior, a médium
Eugênia revelara-se
benemérita enfermeira.
Neste, Celina surgia como
abnegada mãezinha, tal a
devoção afetiva para com o
hóspede infortunado. Partiam
dela fios brilhantes a
envolvê-lo inteiramente e o
recém-chegado, em vista
disso, não obstante senhor
de si, demonstrava-se
criteriosamente controlado,
assemelhando-se a um peixe
furioso entre os estreitos
limites de um recipiente. O
comunicante projetava de si
estiletes de treva, que se
fundiam na luz com que a
alma de Celina o rodeava,
dedicada. Ele tentava gritar
impropérios, mas em vão.
Celina era um instrumento
passivo no exterior,
entretanto, nas profundezas
do ser, mostrava as
qualidades morais positivas
que lhe eram conquista
inalienável, impedindo
aquele irmão de qualquer
manifestação menos digna.
O instrutor Aulus explicou
que Celina constituía um
exemplo de sonâmbula
perfeita e explicou: "A
psicofonia, em seu caso, se
processa sem necessidade de
ligação da corrente nervosa
do cérebro mediúnico à mente
do hóspede que o ocupa". A
espontaneidade dela é
tamanha na cessão de seus
recursos, que não tem
qualquer dificuldade para
desligar-se de maneira
automática do campo
sensório, perdendo
provisoriamente o contacto
com os centros motores da
vida cerebral. Sua posição
medianímica era de extrema
passividade. Por isso mesmo,
revelava-se o Espírito
comunicante mais seguro de
si na exteriorização da
própria personalidade. Esse
fato não significa que a
médium estivesse ausente ou
irresponsável. Junto de seu
corpo, agia como mãe
generosa, auxiliando o
sofredor que por ela se
exprimia, qual se fora
frágil protegido de sua
bondade.
Concluindo as observações
sobre o caso, Aulus
explicou: "O sonambulismo
puro, quando em mãos
desavisadas, pode produzir
belos fenômenos, mas é menos
útil na construção
espiritual do bem. A
psicofonia inconsciente,
naqueles que não possuem
méritos morais suficientes à
própria defesa, pode levar à
possessão, sempre nociva, e
que, por isso, apenas se
evidencia integral nos
obsessos que se renderam às
forças vampirizantes".
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