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Crônicas e Artigos

Ano 9 - N° 427 - 16 de Agosto de 2015

MARCELO TEIXEIRA
maltemtx@uol.com.br
Petrópolis, RJ (Brasil)

 



Falsos profetas aos borbotões

 
Guardai-vos dos falsos profetas que vêm ter convosco cobertos de peles de ovelha e que por dentro são lobos rapaces. Conhecê-los-eis pelos seus frutos. Podem colher-se uvas nos espinheiros ou figos nas sarças? Assim, toda árvore boa produz bons frutos e toda árvore má produz maus frutos. Uma árvore boa não pode produzir frutos maus e uma árvore má não pode produzir frutos bons. Toda árvore que não produz bons frutos será cortada e lançada ao fogo. Conhecê-lo-eis, pois, pelos seus frutos. (Mateus, cap. VII, vv. 15 a 20.)


Cuidado. Muito cuidado. Estejamos atentos. Não nos deixemos enganar. Jesus está dizendo a seus discípulos e a todos nós para sermos espertos e não cairmos na lábia dos falsos profetas. Como eles grassam por aí! Pelo visto, desde que o mundo é mundo, as pessoas se iludem com facilidade. Daí a importância de tal advertência. É preciso prudência.

E o que significa prudência? Do latim providere, prudência quer dizer olhar adiante, preparar, antecipar. O prudente, portanto, enxerga longe, percebe a enganação bem antes e prevê que, cedo ou tarde, a farsa ou ilusão virá por terra.

À primeira vista, temos a impressão que o Cristo se refere somente aos falsos profetas religiosos, que infelizmente aparecem aos montes. Podemos, no entanto, ir mais fundo no ensinamento e percebermos falsos profetas em várias situações. Mas vamos nos ater primeiramente ao aspecto religioso do ensinamento e tendo sempre em mente que toda árvore boa produz bons frutos e toda árvore má produz maus frutos. Por isso, se a árvore é má, de lá não sairão pêssegos carnudos ou maçãs suculentas, embora muita gente iludida viva cutucando os galhos da árvore má com um bambu, na esperança de que caia uma fruta saborosa.

É sabido que líderes evangélicos aproveitam a boa-fé e a credulidade alheias para amealhar fortunas. Pedem dinheiro no culto, seja ao vivo ou pela TV, e fazem um invejável pé-de-meia. Ao mesmo tempo, perseguem homossexuais e membros de outras religiões. Não satisfeitos, incitam os fiéis a fazerem o mesmo. Resultado: centros de umbanda e candomblé depredados e seguidores apedrejados, imagens de Nossa Senhora sendo chutadas e quebradas etc.

Jesus nunca perseguiu ou apedrejou ninguém. Condenava, sim, a hipocrisia, mas convidada as pessoas a se despirem de preconceitos e convenções e segui-lo, ajudando-o na construção de um mundo socialmente mais justo, em que os menos favorecidos tenham voz ativa.

Tais líderes evangélicos, no entanto, torcem os ensinamentos do Cristo e os utilizam para semearem a discórdia e iludirem pessoas desavisadas. E para encherem os bolsos também. Quero deixar claro que não estou me referindo a todas as lideranças de todas as igrejas evangélicas. Muitos são boas pessoas e contra esse mercantilismo que tomou conta de algumas denominações. Pregam, inclusive, o diálogo inter-religioso.

Mas como estamos falando de falsos profetas, lamento profundamente que alguns pastores utilizem os ensinamentos cristãos para arrancar dinheiro de cidadãos. E infelizmente, por falta de prudência – e também às vezes por carência –, as pessoas se deixam enganar. E isso não é prerrogativa do Brasil.

Em 1995, houve um ataque com o gás venenoso sarin no metrô de Tóquio, capital do Japão, país de primeiríssimo mundo. Mais de 6.000 pessoas foram asfixiadas e 13 morreram. As investigações concluíram que o atentado fora praticado por membros da seita Verdade Suprema.

Criada em 1984 por um homem chamado Shoko Asahara, a Verdade Suprema foi cooptando vários estudantes da elite universitária japonesa. Baseada (Pasmem!) em alguns princípios budistas devidamente adulterados, transformou-se não só numa seita, mas também numa rede de negócios e organização política com unidades paramilitares que produziam agentes químicos e armas leves.

Segundo o site www.cristaoconfuso.com, Asahara, que fundou a seita depois de ter sido preso por vender medicamentos chineses sem licença, conseguiu isenção de impostos para criá-la e instalou-se com seus seguidores ao pé do Monte Fuji. Por falar em seguidores, havia rituais pelos quais os adeptos recém-chegados tinham de passar. Um deles era beber a água na qual o líder havia tomado banho (Eca!). Depois de um tempo de adesão, o seguidor adquiria o mais maravilhoso dos privilégios: beijar o dedão do pé do líder (Duplo Eca!).

A Verdade Suprema divulgava uma teoria de fim do mundo baseada em Nostradamus. Seus membros, portanto, deveriam se preparar para a batalha do fim dos tempos. Com isso, virou uma espécie de estado paralelo e começou a fazer atos terroristas, achando que o Armageddon (Odeio esta palavra!) se aproximava.

Depois do atentado em Tóquio, acabou a brincadeira do falso profeta e seus seguidores. O líder foi preso e condenado à morte (Aí, não!). Outros seguidores receberam pena de prisão perpétua. E a árvore má que nunca havia produzido bons frutos foi arrancada.

A História também está coalhada de falsos profetas. O que dizer de Adolf Hitler, que incitou o povo alemão a segui-lo, a fim de recuperarem a supremacia germânica, que havia saído derrotada da I Guerra Mundial? Contando com forte aparato de comunicação, amealhou seguidores, fundou o partido nazista, que subiu ao poder em 1933, declarou guerra ao mundo anos depois, invadiu vários países e se tornou o responsável pelo genocídio de milhões de judeus. E levou muitos a seguirem sua crueldade, diga-se.

Apesar de a religião, a História e várias outras áreas terem falsos profetas entre seus representantes, vou, a partir de agora, falar de pseudoprofetas que geralmente passam despercebidos e que podem estar bem perto de nós. Para tanto, vou me valer do livro Criatividade em Propaganda, da autoria do publicitário Roberto Menna Barreto.

Experiente no assunto, Roberto, logo no primeiro capítulo, chama atenção para um tipo que encontramos muito em nossas atividades cotidianas: o especialista incompetente. Ele está presente nas empresas, hospitais, dá entrevistas na TV etc.

Geralmente, quando contemplamos o quadro de executivos de um grupo empresarial, achamos que todos eles são top de linha; profissionais supercompetentíssimos e megapreparadíssimos. Será? Segundo Menna Barreto, pelo fato de toda empresa ter um ou outro buraco administrativo e altos e baixos nos serviços, os especialistas incompetentes acabam se aninhando nessas brechas e são tolerados anos a fio, muitas vezes sem serem descobertos. E como temem que os colegas descubram, camuflam-se na própria especialidade. De que forma? Transformando-a num quebra-cabeças que só ele – o especialista incompetente – sabe montar. É, por fim, a pessoa que não atende às exigências da função que assumiu. Por isso, faz com que ela pareça mais complexa do que de fato é. Roberto ressalta: O raciocínio é óbvio: se ele consegue lidar com tal complexidade, sem dúvida é um gênio.

Observa o livro, com muita propriedade, que devemos ter cuidado com o médico que não explica direito a doença que diagnosticou em nós; com o advogado que prepara argumentos que o juiz não entende (e o cliente, muito menos); com o executivo que nunca tem tempo para nada; com o economista que, ao ser perguntado sobre alguma conjuntura econômica, cita outro economista em vez de dar uma resposta própria; com o gerente de marketing que vive utilizando expressões em inglês; com o ministro da Fazenda que vai à TV explicar o novo plano econômico, mas ninguém consegue entender como funciona; com o colega de trabalho que vive com a mesa cheia de papéis para que tenhamos a impressão de que ele é deveras assoberbado etc.

Trabalhei numa empresa da área editorial por cerca de cinco anos. Certa vez, um executivo de vendas foi contratado. Muito simpático, vivia viajando. Nunca estava na sede. O local de trabalho dele era a estrada, indo de filial em filial. Era difícil falar com ele. A correspondência que enviava à equipe e superiores era cheia de frases feitas e lugares comuns e sempre terminavam com a seguinte frase: Seja feliz.

Um belo dia, uma profissional mais competente que ele foi contratada para um cargo de assessoria. Ele, com medo de ser descoberto, tentou boicotá-la. Foi demitido. Acabara a farsa.

Você, caro leitor, já deve ter se deparado com algum profissional assim. Nem sempre são más pessoas. Muitas vezes, nem têm consciência de que são assim. São pessoas do mundo, lutando por um espaço. São inseguros, ansiosos... Devemos tratá-los com bondade e paciência e, aos poucos, fazê-lo ver que não é assim que se procede. Senão, a árvore será arrancada.

Mas do outro lado da questão está o especialista competente. Quem é ele? É o profissional que simplifica o assunto para que o leigo entenda. Vários gênios da humanidade eram assim. Oscar Niemeyer, conta Roberto, explicou a criação de Brasília em um folheto de 20 páginas. Tudo de forma original e objetiva, sem firulas, palavras difíceis ou equações matemáticas muito elaboradas.

William Faulkner (1897 – 1962) foi um célebre escritor norte-americano; prêmio Nobel de Literatura em 1949. Soube como ninguém narrar a decadência do sul dos Estados Unidos. Certa vez, perguntaram a Faulkner como ele escrevia. Se ele fosse um especialista incompetente, é quase certo que diria que se trancava no quarto para se concentrar e buscar inspiração. Ou então, que esperava um lampejo criativo brotar ao caminhar por entre os bosques. Mas como é dos times dos que simplificam, respondeu que escrevia da esquerda para a direita. Simples assim.

Nijinski (1890 – 1950), notável bailarino e coreógrafo russo, ficou famoso, entre outros predicados, pelo incrível salto em suspensão, que o fazia ficar no ar mais tempo que os demais. Um dia, perguntaram como ele conseguia o feito. Se fosse um falso profeta da dança, inventaria uma tese mirabolante mesclada a horas de dedicação estafante. Mas como não era nada disso, Nijinski deu a seguinte resposta: É só dar um pulo bem alto e parar lá um pouco. Mais simples e genial que isso, impossível.

Roberto Menna Barreto faz, ainda, uma observação muito interessante. Ele diz que os especialistas incompetentes conspiram contra os talentosos, a favor da mediocridade. Falsos profetas que temem ser desmascarados e dão um jeito de neutralizar a inteligência da simplicidade e manter os menos favorecidos na ignorância. É só nos lembrarmos de nomes como Sócrates, Santa Catarina de Siena, Gandhi e Giordano Bruno. Almas nobres que pagaram com a vida por serem simples e afrontarem os conchavos e fanatismos dos falsos profetas então dominantes. E o mais simples de todos, Jesus Cristo, autor do ensinamento ora analisado. Ninguém mais do que ele foi claro e objetivo. No entanto, tido à conta de mero agitador, foi crucificado graças a um julgamento parcial, arranjado às pressas pelas autoridades judias, e também graças à multidão teleguiada pelos ardis dos falsos profetas, que induziram a massa a preferir Barrabás ao Cristo.

Por fim, Allan Kardec, no livro Espiritismo e Justiça Social - Luiz Gonzaga Pinheiro enfatiza que Kardec pôs abaixo castelos de carta de embusteiros seculares ao acabar com os mistérios do além-túmulo, os milagres, o sobrenatural etc. Acabou com o dogmatismo e com tudo que foi sendo enxertado e adulterado na mensagem cristã ao longo dos séculos. Um gênio que tornou tudo mais simples.

Filósofo por excelência, Kardec, todavia, é desconsiderado nos círculos filosóficos. Talvez porque ele seja simples e objetivo. Filósofos, em contrapartida, costumam ser amantes do texto rebuscado que quase ninguém entende. Serão alguns deles falsos profetas? 

 

BIBLIOGRAFIA:
 

1- PINHEIRO, Luiz Gonzaga. Espiritismo e Justiça Social. EME Editora. 2ª Ed., 2004, Capivari, SP.
 

2- BARRETO, Roberto Menna. Criatividade em Propaganda. Summus Editorial. 3ª Ed., 192, São Paulo, SP.

http://www.minasnews.com/site/noticia/1040/mundo/mundo/fanatico-terrorista-se-entrega-no-japao-apos-16-anos-de-fuga.html

Read more: http://www.cristaoconfuso.com/2009/10/seitas-e-consequencias-verdade-suprema.html#ixzz3e18ZTziD


 

 


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